Capítulo XXVIII
— Apolo não está morto.
— Ceci eu sei que você está sofrendo e que é difícil aceitar, mas...
— Ele não está, Bella. — digo revirando os uniformes dos guardas em minha cama, e sinto o olhar pesado de minhas irmãs sobre mim. — Eu sinto isso. Tenho que ir atrás dele.
— Olha minha irmã, eu seria a primeira a te apoiar em qualquer tipo de loucura, mas dessa vez Arabella está certa. Não é bom que saia do castelo. — diz Violetta, parando a minha ação e segurando firme em meus braços.
— Vocês não entendem! Eu não estou maluca, não me olhem como se eu estivesse! Apolo não morreu. Não encontraram o corpo dele.
— Mas todos os outros guardas disseram que o viram sendo levado, irmã. Não tem como ele estar vivo. — diz Bella me olhando com pena. Não aguentava mais receber tantos olhares piedosos.
Se ninguém iria lutar para ir atrás dele, eu iria!
— Vocês não disseram que iam me ajudar? Que fariam qualquer coisa por mim? — pergunto limpando uma lágrima. As duas se olham sem saber o que dizer, e eu volto a pegar um dos uniformes que parecia menor. — Pois bem, já que não querem me ajudar, saibam que irei com ou sem o apoio de vocês.
— Nós vamos te ajudar. — Violetta diz rápido e Arabella a olha com repreensão. — Pelo menos nos convença de que não está agindo de cabeça quente. Você realmente está disposta a arriscar sua própria vida lá fora sozinha? Entende o perigo que está correndo?
— Deixei de sentir medo após o décimo bilhete que me ameaçava de morte, minha irmã. — amarro o cabelo para cima e começo a me despir, trocando o vestido luxuoso pelo uniforme grosso masculino. Nós sabíamos que o disfarce de guarda seria mais seguro do que o de uma plebeia. Ninguém ousaria me atacar enquanto eu estivesse na floresta sozinha se pensasse que eu fosse um homem. — Posso morrer a qualquer minuto dentro desse castelo, e ambas possuem noção disso. Não vamos fingir que o ataque ao castelo fora amador. Vocês duas são espertas demais para acreditar nas falas motivacionais de papai de que tudo está sobre controle.
— Você pelo menos tem certeza de que sabe mesmo usar aquelas armas? Está levando suprimentos suficientes? — pergunta Bella, me lembrando inteiramente nossa mãe.
— Estou levando o necessário. — escondo duas adagas por dentro da roupa, encaixo uma espada na bainha, e coloco mais uma boa quantidade de facas de arremesso em um saco que daria para ser carregado na bagagem junto com a cela do cavalo. Olho por alguns instantes para uma flecha, e pondero se eu saberia usar. Enfio junto por precaução. — Obrigada Vi por ter conseguido as armas para mim. Tem certeza que os guardas não irão notar?
— Se notarem, eu resolvo. — ela se aproxima e mais uma vez, me olha como se eu estivesse partindo em uma missão suicida. — Tem certeza que não quer que eu vá com você? Eu conheço melhor as estradas...
— Não minha irmã, já fizeste muito por mim até aqui. Não quero que tenha problemas por minha causa. — a abraço e vejo Arabella se sentar em minha cama, com a cabeça entre as mãos. — Não se preocupem, eu tenho o mapa completo gravado em minha mente. Sabia que algum dia meus estudos seriam úteis. Prometo que irei até o Leste, e se não o encontrar, voltarei para o palácio o mais breve possível. Eu ficarei bem.
— O que diremos a nossos pais? Não irá demorar até que percebam a sua ausência. — diz Bella, levantando a cabeça e me olhando com um último resquício de esperança de que eu pudesse desistir.
Respiro fundo e me olho no espelho, levantando o capuz da capa grossa preta e me sentindo um verdadeiro guarda. Pequeno, mas ainda assim, era um disfarce satisfatório. A armadura não era exatamente a vestimenta mais confortável do mundo, mas eu me acostumaria. Viro o rosto e sorrio para minha irmã, pronta para quebrar a maior quantidade de regras que eu jamais havia infringido em toda a minha vida.
— Então eu irei torcer para que vocês consigam distraí-los pelo maior tempo possível até eu voltar.
Sair do palácio não fora uma tarefa tão fácil quanto eu pensava. A guarda estava inteiramente mais rígida, e mesmo os garotos mais novos já pareciam segurar uma espada mais firme do que eu.
Violetta teve que criar um enorme esquema de distração com os guardas que eram seus amigos para que eu pudesse sair com o cavalo, e ainda assim, eu quase fui pega, mas não possuía tempo para relembrar disto agora.
A floresta estava sendo, para mim, um desafio ainda maior do que a fuga do castelo. Meu coração batia forte a cada barulho de ave que eu ouvia, e eu não conseguia mais esconder que estava inteiramente coberta de medo.
Tentei alcançar ao máximo a minha voz interior que dizia que esta havia sido uma boa ideia, e me agarrei ao sorriso de Apolo para continuar trilhando um caminho que eu não fazia ideia de onde daria.
As árvores pareciam todas iguais. Aprendi naquele momento, que teoria e prática eram situações exorbitantemente distintas. Quanto mais eu cavalgava, mais sentia que estava girando em círculos, e por um momento me senti novamente dentro do labirinto, correndo como uma princesa vulnerável que dependia de outras pessoas para se sentir segura.
Eu não queria mais ser aquela princesa.
— Os corredores não são iguais, princesa. Nunca são. Procure pequenos detalhes distintos dentre eles, e acredite em si mesma. Seja rápida e observadora.
A voz do soldado Carter ressoa em minha mente recordando-me de um dos treinamentos e apertando o meu coração. Naquela noite, eu reclamei de tantas formas... disse a ele que correr em círculos em um labirinto jamais me tornaria uma guerreira. A única reação que ele teve foi soltar mais um de seus sorrisos de lado, e me desafiar a vencer as minhas próprias fraquezas, que segundo suas palavras, não eram reais.
Quando Apolo me olhava, eu me sentia forte. Eu encontrava uma versão de mim mesma que possuía uma coragem inabalável, e foi usando essa versão que comecei a perceber que na verdade, as árvores não eram tão semelhantes assim. Os galhos.
Os galhos eram distintos, e a neve já quase derretida ainda formava poucas pegadas. Cavalguei com mais determinação buscando encontrar o caminho para o Leste, e sorri quando consegui observar pequenos vilarejos. Eu havia conseguido.
Senti meu estômago doer, e percebi que nunca havia passado tantas horas sem me alimentar. Desci do cavalo ainda com um pouco de dificuldade, e amarrei as rédeas em um tronco de madeira que havia por perto. Peguei algumas moedas de prata e me aproximei de uma idosa que parecia vender frutas.
A mesma possuía uma pele bastante enrugada pelo tempo e uma verruga no queixo. Os poucos fios de cabelo que pareciam quase brancos saíam emaranhados de seu capuz preto e suas vestes gastas. Tentei modificar um pouco o tom de como minha voz iria sair, e segurei uma fruta que não conhecia de cabeça baixa.
— Com licença, a senhora poderia me informar quanto custa esta fruta?
— O que seguras não é uma fruta, meu bem. O que queres comer, não tenho a lhe vender. — ela responde sem me olhar.
— Mas aqui está cheio delas...
— Não são comestíveis, são para porções. Esta que seguras pode ser moída e transformada em um pó venenoso. Deveria saber alteza, já que foi dela que saíra o aroma que a fizeste dormir.
— A senhora é a feiticeira. — solto a fruta e dou um passo para trás, sentindo meu coração se acelerar.
— Não temas futura rainha, seu disfarce não será descoberto até o fim de sua missão. Saiba que no fim dela, no entanto, terá quebrado o teu coração. — ela diz e levanta o rosto, mirando seus olhos escuros em mim e me causando calafrios. Corro de volta até meu cavalo sentindo minhas mãos suarem e entro em completo desespero quando encontro o tronco vazio.
O cavalo foi roubado.
Não...não...não...isso não deveria estar acontecendo. Aperto os olhos com força e abro novamente completamente ofegante. Eu não iria olhar para trás. Não acreditaria nas palavras de uma velha feiticeira, e definitivamente não desistiria do meu Apolo.
Me misturo em meio ao povo da vila e começo a andar sem rumo pensando em como eu iria voltar sem meu cavalo, carregando apenas as armas do corpo e doze moedas de prata. Esbarro em alguém e me surpreendo ao encarar uma criança.
— Perdão senhor, perdão senhor, eu não queria ter esbarrado no senhor, nunca mais atrapalharei o seu caminho. — ele diz se encolhendo de medo, sem ter olhado para meu rosto. Seu pequeno corpo tremia, como se eu fosse agredi-lo. Senti um aperto no peito ao ver que o mesmo possuía uma cicatriz no rosto.
— Tudo bem, não foi nada. — digo baixo e o vejo fechar os olhinhos com mais força. Me agacho ficando de sua altura e toco seu rosto, sentindo-o tremer ainda mais. — Quem fez isso com você?
— Os homens maus.
— Quais homens maus?
— Os que querem matar a princesa. — ele diz com a voz fraca, prestes a chorar. — Papai disse que eles mataram vários guardas na cabana de pedra. Contei tudo o que sei, por favor me deixe ir, não me puna.
— Eu não irei puni-lo, abra os olhos. — retiro a mão de seu rosto e me ergo de pé, vendo-o abrir os olhos com receio. Ele franze o rosto, e pisca várias vezes.
— O senhor é um guarda muito pequeno. — ele diz ainda com os ombros tensos.
— Sou sim. — sorrio um pouco, vendo-o se decidir se saía correndo ou não. — Pode me dizer onde fica essa cabana de pedra?
— Fica atrás do rio, bem ali naquela direção. — ele se vira e aponta com o dedinho.
— Certo, muito obrigada. Posso saber qual é o seu nome? — pergunto olhando na direção em que ele havia apontado, e quando me viro, vejo que o mesmo havia ido embora.
Olho ao meu redor e me desespero ao ver que já estava anoitecendo. Eu não conseguiria ir a tal cabana de pedra hoje. Meu corpo reclama de cansaço e meu estômago se aperta novamente.
Observo uma casa velha com uma placa de madeira quase solta escrita hospedagem e entro, esperando que as minhas doze moedas me fornecessem pelo menos um alimento e uma cama para dormir.
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