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Capítulo VIII


— O que a senhorita pensa que está fazendo aqui? Estás louca?

— Quer me matar do coração? — grito sentindo meu corpo inteiro suar tentando se recompor do susto, enquanto tentava lidar com a reação das mãos de Apolo cobrindo a minha boca logo depois.

— Fale baixo! — ele diz de forma pausada e séria, mantendo meu corpo sob a parede. O barulho dos gritos das pessoas estava passando aos poucos, como se eles estivessem se dividindo para tentar descobrir aonde eu havia ido. — Agora me explique como eu encontro a futura rainha de Várzea andando sozinha sem proteção pela cidade. É por acaso algum plano para querer que te matem?

— Nunca mais toque em minha boca novamente! — digo empurrando sua mão, e o vendo soltar uma respiração profunda. — Não irei lhe contar. Tenho que procurar Violetta.

— Princesa Violetta a ajudou nesta insanidade? — ele me olha incrédulo e afasta o corpo do meu, colocando o rosto entre as mãos. Pela primeira vez, eu percebi que estava prendendo a respiração quando todo o ar pareceu ter voltado de uma única vez.

— Sim. — respondo engolindo uma saliva. — Porque ela pode andar livre sem guardas e porque ninguém aqui a reconhece?

— Porquê depois de sua irmã ter fugido por diversas vezes, a guarda desistiu. Ela nos provou que sabia se defender sozinha e mudou de nome. A maioria da população da cidade a conhece como Victória, uma missionária do sul que distribui alimento e mantimentos básicos. Se nunca percebeu, sua irmã não costuma aparecer em bailes ou nada relacionado a realeza e seu pai sempre soube esconder os escândalos das fugas dela. Ninguém imagina que a filha do rei de Beaumont andaria a cavalo com roupas simples em meio ao povo, além do mais, são poucos os rumores sobre ela.

— Mas então porque eu...

— Todos te conhecem, Cecília... — ele me olha de novo, e eu sinto um arrepio me envolver ao ouvir meu nome sair de sua boca. Ele parece perceber o erro logo depois, e desvia o olhar. — ...Alteza. Será a futura rainha. Não são poucos os rumores da bela princesa de cabelos loiros e olhos azuis incomparáveis que irá assumir ao trono em poucos meses.

— Você disse bela princesa? — pergunto chocada demais por ter pensado ouvir um elogio da parte dele.

— Opinião dos outros, não disse que era minha.

— Porquê você sempre tem que ser tão rude? — pergunto com raiva quebrando o nosso espaço de distância, e me repreendo ao ver que havia ficado com o rosto tão perto do seu.

— Porque...

— Aí está você! — Violetta aparece furiosa no pequeno beco segurando a barra do vestido, e desviando das poças. Me afasto rápido de Apolo, e tento ignorar a dúvida que sondava em minha cabeça sobre o que ele teria respondido. — Carter, o que está fazendo aqui?

— Impedindo a morte de sua irmã. Pelo visto, sou obrigado a trabalhar mesmo em meu dia de folga. — ele responde com a mesma impessoalidade constante e eu reviro os olhos, sentindo a raiva me invadir novamente.

— Cecília, eu te disse para não deixar a touca cair. O povo está em alvoroços tentando te encontrar, mas a sorte é que muitos estão em dúvida se era realmente você ou não. Vamos, precisamos ir embora já!

— Irei levá-las de volta ao castelo. — soldado Carter responde, começando a andar em nossa frente e saindo do beco.

— Apolo, não precisa. Sabe que conheço bem os caminhos e sua família...

— Minha família irá ficar bem, alteza. — ele interrompe Violetta, e encontra seus olhos aos meus, como se estivesse falando diretamente para mim. — Eu também sei colocar meus deveres em primeiro lugar.


A volta para o castelo fora confusa e inesperada. Aparentemente, os rumores pela cidade se espalhavam rápido, e sendo assim, já havia chegado aos ouvidos de papai sobre a minha fuga aparente. Não preciso dizer quanto tempo passei ouvindo gritos do rei Joseph, e todas elas se resumiram em frases repetidas que continham as mesmas três palavras.

— Irresponsabilidade, inconsequência e tolice, Cecília! Foi isso que resumiu a sua atitude de hoje. Eu esperava isso de qualquer um, principalmente de Violetta... — ele olha para a minha irmã, que apenas abaixa a cabeça acostumada. — ...mas não de você. Como pôde ter saído do castelo sem minha permissão e sem proteção? Não sabe o que estamos vivendo? Não reconhece os perigos que há lá fora?

— Eu precisava ir, papai. — digo dando um passo em sua direção, e vendo-o se afastar com um olhar magoado. — Eu nunca saio daqui, não sei como as pessoas vivem, eu precisava conhecê-los para ser uma rainha melhor!

— Não Cecília! Isso só prova o quanto você não está preparada para assumir esse cargo. Irei adiar a coroação.

— Não, o senhor não pode! — digo em súplica sentindo meu coração se abrir. — É tradição de Beaumont, a coroação sempre é feita no vigésimo primeiro aniversário do sucessor.

— Você não está preparada. Talvez eu deva esperar Arabella crescer.

— Ainda bem que ele sabe que eu não aceitaria. — Violetta sussurra, e papai a olha de lado com o semblante sério. Arabella se desespera.

— Eu? Eu não! De jeito nenhum! Por obséquio! — ela arregala os olhos, e meu pai leva as mãos ao rosto.

— Não foi culpa dela, meu irmão. — era a voz de tio Oliver. — Eu a dei a ideia. Ela estava tão angustiada, pensei que fosse a fazer bem...

— Você não sabe criar filhos Oliver! Nunca teve, claro que isso tinha que ser ideia sua, mas não isenta as responsabilidades de Cecília.

— Você está de cabeça quente, querido. — era mamãe, segurando o braço de meu pai com calma.

— Você tem razão. Por hoje chega de decepções. Soldado Carter... — meu pai se vira para Apolo, e acena com a cabeça. — ...mais uma vez, obrigada por ter trazido elas para o castelo, e por ter protegido a minha filha mesmo em seu dia de folga. Meus pêsames pela sua família.

— Não fiz mais que minha obrigação, senhor. — Apolo faz a reverência, e meu pai sobe ao lado de minha mãe.

Arabella sai do salão desesperada com medo de ser a próxima a reinar, e Violetta bufa de raiva correndo sem modos para fora e largando os sapatos. Tio Oliver me lança um olhar terno e também sai do ambiente, me deixando sozinha com um enorme aperto no peito.

— Eu sou uma decepção. — digo tentando controlar as lágrimas que queriam descer. Eu sabia que Apolo escutava.

— Você foi corajosa. — ele responde baixo, e eu olho ao redor sentindo tudo vazio e enorme demais.

— Fui tola. — deixo a lágrima cair, e sorrio sem humor. — Posso perder meu trono por isso, papai nunca irá me perdoar.

— Seu pai a ama, princesa. — me viro ao ouvir sua frase, e sinto meu coração se acelerar ao vê-lo me olhar profundamente. — Ele está revolto agora, mas é momentâneo. Irá passar.

— A propósito, me perdoe. — digo dando um passo a frente, e segurando apertando firme meus próprios dedos. — Não sabia sobre seu irmão. Eu sinto muito. Você deveria estar com sua família agora se não fosse por minha culpa...

— Me fizeste um favor, alteza. — ele diz e cruza os braços atrás de si, engolindo uma saliva. — Estava sobremaneira difícil permanecer por lá. Prefiro ficar sozinho.

— A frase que você disse na cidade... não deve me considerar um dever em primeiro lugar. Não quero ser uma líder assim. O dever não deve vir acima de tudo.

— Foi ignorando seus próprios conselhos que aceitou se casar? — ele pergunta me olhando firme, e eu sinto a frase me atingir em cheio.

— É diferente... — digo tentando ignorar o assunto, e começo a andar para fora do castelo. Como sempre, ele me seguia.

— Não, não é. Todos dizem que o amor deve ser a base de uma escolha matrimonial.

— Corações servem para nos enganar e mudar o foco do que realmente queremos.

— Queres convencer a mim ou a ti mesma com tal citação? — sua voz me faz parar. Respiro fundo tentando esquecer sobre o compromisso com Christian, e me viro, sentindo o vento bagunçar meu cabelo e balançar a barra do vestido surrado que eu ainda vestia.

— É suficiente saber que se nunca amarei, também nunca terei um coração partido.

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