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𝟐𝟑. › DARK PLACES

𝟎𝟐𝟑.                    LUGARES ESCUROS

INVERNO⠀──⠀ DEZ. 6, SEGUNDA-FEIRA
NARROWS, COMPLEXO DE APARTAMENTOS.

AJUDAR ALGUÉM nunca foi algo que Delilah recusasse, ainda que o momento não fosse o ideal, mesmo que os sinais apontassem para ela fazer o contrário. Havia um peso na escolha, sempre havia. Oferecer ajuda significava mais do que estender uma mão; significava arriscar-se a ser puxada junto para o abismo onde a outra pessoa já estava. Era perigoso, imprevisível, mas inevitável. Delilah sabia disso e, ainda assim, escolhia o risco. Naquele momento, ela nem tentou racionalizar.

Rachel estava na porta, a figura dela um recorte trêmulo contra a luz fraca do corredor. O rosto sujo, os olhos desesperados, e as mãos — as mãos eram o que mais chamavam atenção, tão rígidas ao segurar a alça de uma bolsa grande de pano que os nós dos dedos pareciam prontos para estourar. Delilah não hesitou. Abriu a porta, deu um passo para o lado e esperou que Rachel entrasse.

Quando ela finalmente cruzou a soleira, Delilah lançou um último olhar ao corredor. Não havia ninguém. Ou, pelo menos, ninguém visível. Ela fechou a porta com um clique firme, mas o som soou absurdamente alto no silêncio que caiu sobre a casa. Nenhuma das duas falou de imediato. Era como se o ar estivesse saturado com o peso do não-dito.

Delilah se moveu pelo apartamento com uma calma, quase performática. Não se apressou, não fez perguntas imediatas. Apenas caminhou até a cozinha, abriu a geladeira, pegou um copo e o encheu com água gelada. O som do fluxo de água contra o vidro preencheu o silêncio, uma distração breve, mas necessária. Ela retornou à sala de estar com o copo, estendendo-o para Rachel, que o segurou com as duas mãos, os dedos sujos de sangue seco tremendo ao redor do vidro.

Delilah sentou-se na poltrona mais próxima. Limpou as mãos suadas na calça jeans e observou Rachel beber a água. Os goles eram apressados, desesperados, mas cada um parecia arrancar um pouco do pânico que ainda pairava ao redor dela. Quando o copo ficou vazio, Rachel o pousou sobre a mesa de centro, com cuidado demais, como se qualquer gesto descuidado pudesse fazer tudo desabar.

Agora Delilah podia realmente vê-la. O suéter pêssego que Rachel vestia estava sujo, o tecido marcado por manchas escuras que não eram apenas sujeira, mas sangue. As calças jeans pareciam gastas demais, como se ela tivesse corrido quilômetros com elas. As marcas arroxeadas no pescoço eram inconfundíveis, o queixo ferido contava sua própria história, e o cabelo desgrenhado sugeria que Rachel tinha enfrentado algo ou alguém que não se conteve, e Delilah tinha uma ideia de quem poderia ter sido.

── Rach... o que aconteceu? ── a pergunta de Delilah é seguida por uma pausa breve, a preocupação transparecendo em sua voz, então seus olhos recaem para a roupa manchada de Rachel. ── De quem é esse sangue todo?

Demorou alguns segundos, porém Rachel bebeu todo o líquido dentro do copo de vidro e limpou a boca com as costas da mão.

── Não se preocupe, não é meu, ── disse Rachel, finalmente, um sorriso incerto e deslocado se formando em seus lábios. Era quase um pedido de desculpas, uma tentativa de fazer o momento menos terrível do que era.

Delilah ergueu uma sobrancelha, a expressão cética.

── Bom saber ── murmurou, o sarcasmo presente, mas não o suficiente para desviar o foco. ── Mas você ainda não me disse o que houve. Me conta. Eu só posso ajudar se você me disser.

Rachel desviou o olhar, respirando fundo enquanto usava as mangas do casaco para enxugar as lágrimas que escorriam pelas bochechas, silenciosas, mas impossíveis de conter. Delilah viu novamente as marcas em seus pulsos, contusões tingidas de um roxo escuro e doentio. A visão trouxe uma onda de náusea, um nó pesado que se enroscava no estômago dela, mas ela se obrigou a manter o olhar firme. Não era hora de desviar.

── Meu namorado, Walker... ── começou Rachel, hesitante, com os olhos presos em suas próprias mãos, imóveis no colo. ── Ele começou a trabalhar em uma fábrica em Crown Point. Um cara que trabalhava numa oficina, Rusty, disse que tinha iniciado um negócio próprio, algo maior. Achei que Walker finalmente tinha conseguido algo bom, sabe? Algo decente.

Delilah assentiu devagar, com um cuidado que vinha da prática, de alguém que sabia quando palavras demais podiam quebrar algo frágil. Ela escutava, cada palavra adicionando peso a uma sensação que já se formava dentro dela. Walker. O nome tinha uma ponta cortante, como se o próprio som já trouxesse problemas. Delilah nunca o conheceu direito, mas mesmo aquele breve encontro semanas atrás fora o suficiente para deixá-la desconfortável. Janet, a mãe de Rachel, também não gostava dele, deixando isso bem claro sempre que podia.

Janet acreditava que Walker era o culpado por arrastar Rachel para um abismo — drogas, mentiras, escolhas ruins. Mas Delilah sabia que as coisas nunca eram tão simples. Culpa era um fardo coletivo, compartilhado entre quem fazia escolhas e quem sofria suas consequências. E, no fim, as pessoas sempre buscavam algo para aliviar a dor, ainda que o preço fosse alto.

── Mas era tudo uma fachada para uma gangue. ── A voz de Rachel tremia, mas continuava, cada palavra um pedaço da verdade que ela parecia desesperada para expor. ── Depois do expediente, eles saem para roubar lojas. Walker... ele se envolveu nisso. A fábrica e a oficina são só um disfarce e ficam próximas uma da outra. Tudo bem planejado, pra ninguém desconfiar.

── E há quanto tempo isso está acontecendo?

A jovem hesitou, mordendo levemente o lábio.

── Dois meses. Talvez mais. ── A voz dela falha, quebrada por uma mistura de culpa e vergonha por não ter percebido antes. ── Eu realmente pensei que ele tinha conseguido um emprego de verdade. Jamais imaginei que ele estava roubando... machucando pessoas inocentes.

Delilah inclinou-se levemente para frente, os olhos fixos em Rachel.

── Ele já machucou alguém? ── Delilah perguntou, a voz firme, mas baixa, como se o volume pudesse diminuir o impacto da pergunta. ── Em algum desses roubos, alguém foi ferido?

Rachel hesita de novo, mordendo o lábio até ele parecer à beira de sangrar. Aquele silêncio foi a resposta o suficiente. Delilah solta um suspiro pesado, inclinando-se para trás na poltrona.

── Hoje, foi hoje. ── A confissão saiu apressada, entrecortada por respirações rápidas. ── Ele me pediu ajuda, disse que precisava de alguém na oficina, mas mentiu. Me colocou como motorista de fuga para um roubo que o chefe dele mandou que ele fizesse sozinho. Só que tudo deu errado porque... eu entrei em pânico. O dono da loja apareceu e Walker... ── Ela arfou, piscando rápido para conter as lágrimas. ── Walker matou ele. Bem na minha frente. Porque o homem nos viu de cara limpa. Eu tentei ajudá-lo, mas não adiantou.

Rachel aponta para as manchas de sangue em suas roupas, e então suas mãos cobriram o rosto, abafando soluços que só tornavam o silêncio mais denso. Delilah sentiu seu estômago revirar novamente. Cada palavra era um empurrão mais fundo em um buraco que parecia não ter fim.

── E depois? ── Delilah perguntou, quase temendo a resposta.

── Quando voltamos para casa, ele gritou comigo. Disse que tudo foi culpa minha. ── Rachel não levantou o rosto, mas sua voz veio trêmula, embargada. ── Como o cara chamou a polícia, ele teve que fugir às pressas. Disse que eu teria que arrumar o dinheiro que faltava, ou... ou ele mesmo me mataria.

Por um breve momento, Delilah sentiu o ar pesar ao redor delas, mas permaneceu em silêncio enquanto Rachel continuava.

── Ele veio pra cima de mim. Ia me bater. Pela primeira vez, eu... eu me defendi.

Ela olhou para Rachel, a voz dela diminuindo até se perder. A pergunta que vinha se formando finalmente escapou, baixa, quase um sussurro.

── Você o matou?

── Não, não... ── Rachel balançou a cabeça rápido, os olhos arregalados com uma mistura de pânico e urgência. ── Eu só lutei. Peguei uma garrafa de cerveja e acertei a cabeça dele. Depois disso, usei o abajur. Quando saí de casa, ele estava desacordado, mas ainda respirava.

Analisando cada palavra enquanto a mente trabalhava em um ritmo constante, Delilah teceu hipóteses como se fosse um instinto, pensando no que fazer.

── Ele deve ter tido uma concussão leve. ── A voz dela era mais reflexiva do que alarmada. ── A essa altura, provavelmente já está de pé e procurando por você. Um desmaio assim geralmente dura entre trinta segundos e um minuto, dependendo do impacto. E aqui... aqui seria o primeiro lugar onde ele procuraria. Sua mãe é a conexão óbvia. Mas, por sorte, ela não está em casa. Disse mais cedo que ia visitar sua tia.

── Ela vai voltar em algum momento, Delilah. Eu não posso envolver minha mãe nisso. ── Rachel fungou. A voz dela era tensa, desesperada,as mãos inquietas agarrando o tecido da calça enquanto a preocupação escalava. ── Não posso deixar que ele a machuque.

── Nada vai acontecer com a sua mãe, Rach. ── Delilah respondeu, seu tom firme, mas gentil. Ela se inclinou para frente, segurando as mãos de Rachel com firmeza, tentando transmitir uma segurança que talvez nem ela tivesse. ── Eu garanto. Vamos resolver isso. Eu vou te ajudar.

O desespero de Rachel se transformou em um sussurro, um som frágil, quase inaudível.

── Estou com tanto medo... ── Lágrimas voltaram a descer por suas bochechas. ── Não queria que as coisas saíssem tanto do controle. Eu juro que não queria.

── Eu sei. ── Sua voz era baixa, quase um murmúrio. Delilah apertou suas mãos levemente, um gesto que ela esperava que acalmasse, mesmo que minimamente. ── Mas a situação já chegou a um ponto sem volta.

Ela respirou fundo, escolhendo as palavras como se fossem ferramentas de uma autópsia. Precisava ter cuidado, todo corpo era frágil demais, assim como toda mente.

── Walker e os outros precisam ser presos. ── A firmeza em sua voz contrastava com o caos da situação. ── Além de roubar, ele tirou a vida de alguém, Rach. E, sinceramente, não acho que seja a primeira vez. ── Ela pausa por um momento, antes de continuar. ── Temos que ir até a polícia. É a única saída.

── Não! ── Rachel se afastou como se ela tivesse feito a pior sugestão possível. ── Se eu for até a polícia, também vou ser presa. Não posso ir para a cadeia, Delilah! Não posso!

O pânico dela era quase tangível, preenchendo o ar ao redor. Delilah inclinou a cabeça para a frente, ainda observando-a e pedindo com as mãos para que ela se acalmasse.

── Rachel, calma. ── Sua voz era um equilíbrio de gentileza e firmeza.

Mas Rachel balançou a cabeça, desesperada.

── Você não entende... ── murmurou, antes de finalmente desabar em um choro que a fez parecer ainda mais jovem do que já era. Quando ela finalmente falou, as palavras saíram cortadas, cada uma carregando o peso de um segredo que parecia quase insuportável para ela carregar sozinha. ── Eu... estou grávida.

As palavras pairaram no ar como uma nuvem de tempestade, densa e pesada sobre a cabeça de ambas. Delilah piscou, surpresa transparecendo em seu rosto antes que ela pudesse controlá-la. A revelação rearranjou tudo em sua mente — o medo de Rachel, o desespero em sua voz. Não era apenas sobre ela ou a mãe. Era sobre o filho que carregava, um filho que também pertencia a Walker, o mesmo homem que agora queria matá-la.

── Não quero que meu filho nasça na cadeia... ── Rachel murmurou, suas mãos apertando a barriga em um gesto instintivo de proteção.

── Eles não vão prender você, Rach. ── Delilah falou com mais certeza do que realmente sentia, segurando novamente as mãos dela. ── Podemos conseguir um acordo. Até proteção, se for preciso.

── Não existe proteção em Gotham, Delilah. ── A dureza na voz de Rachel era cortante, mesmo que ela ainda sussurrasse. ── Se eu não for presa, eles vão me matar. Eu preciso sair daqui. Não posso ficar nesta cidade, não depois de tudo isso. Você tem que me ajudar a fugir ou... ou a conseguir o dinheiro. Se eu pagar o Rusty, talvez... talvez isso acabe.

Delilah não respondeu de imediato. Cada palavra que passava por sua mente parecia tanto uma solução quanto uma ameaça, um fio instável que poderia cortar qualquer chance de manter Rachel ao seu lado. Ela prometera ajudar, e sabia que questionar a decisão da jovem poderia afastá-la, jogando-a direto para o perigo.

Respirou fundo, tentando sufocar o peso da incerteza. O olhar de Rachel estava fixo nela, cheio de um desespero que deixava claro que, para ela, aquela era a única opção. Delilah não acreditava que fugir ou pagar Rusty fosse o caminho certo, mas como convencê-la disso quando cada fibra de Rachel clamava por uma saída imediata?

Sua mente vagou, buscando outra solução. E então, seus olhos desviaram para o quarto. O rádio. Estava escondido na gaveta da mesa de cabeceira, fora de vista, mas não esquecido. Era como se a resposta estivesse ali, à espreita. Ele poderia ajudá-las. Ele ajudaria, sem dúvida. Mas trazer alguém mais para aquela situação? Envolvê-lo nisso? Delilah sentiu um nó formar no estômago.

Estava prestes a falar quando o som de batidas pesadas ecoou pela sala, seguidas por um grito furioso que fez o sangue gelar em suas veias.

── Rachel! ── A voz masculina era grave e tão furiosa quanto suas batidas contra a porta do apartamento. ── Eu sei que você está aí! Sai agora, porra!

Walker.

Delilah viu o terror instantâneo se instalar no rosto de Rachel. As duas viraram-se para a porta, que tremia a cada golpe.

── Como... como ele sabia? ── Rachel gaguejou, os olhos inundados de lágrimas novamente.

── As luzes estão acesas. Ele deve ter notado. ── Delilah falou rápido, a voz baixa e controlada, mesmo enquanto o coração batia forte. Ela agarrou o pulso de Rachel e a puxou, forçando-a a se levantar. ── Não importa como, mas ele está aqui. Vai se esconder. Eu cuido disso.

── Delilah, não...! ── Rachel tentou protestar, mas Delilah não deu tempo. Empurrou-a para dentro do quarto e fechou a porta antes que ela pudesse continuar.

Do lado de fora, os golpes ficaram mais fortes, como se Walker estivesse disposto a atravessar a porta à força.

── Rachel! Porra, para de me testar! ── Ele rugiu, a raiva e o desespero misturados em um som animalesco.

Delilah respirou fundo, tentando manter o controle sobre o tremor que ameaçava tomar conta de seu corpo. Foi até a cozinha, os passos firmes, mas silenciosos. Pegou uma faca do bloco de madeira e, com a outra mão, alcançou o celular. O metal frio na palma de sua mão parecia um estranho conforto, uma promessa de que, mesmo em desvantagem, ela não estava completamente vulnerável, e discou o numero da policia.

── Departamento de Polícia de Narrows, no que posso ajudar?

── Preciso de ajuda agora. Invasão de domicílio. Um homem armado está tentando entrar. ── Sua voz era baixa, mas carregada de calma e tensão. Ela forneceu o endereço rapidamente, os olhos nunca deixando a porta que ainda tremia sob o impacto dos golpes de Walker.

── Por favor, mande alguém rápido. Ele não vai parar.

Delilah desligou o celular no momen seguinte.

Parada diante da porta, ela sentiu cada músculo de seu corpo se tensionar, a faca escondida atrás das costas enquanto sol o celular com força e o colocava no bolso de trás da calça. O som dos golpes continuava, cada vez mais altos, e a voz de Walker reverberava pelas paredes como intensidade.

── Raaaaachel! ── O grito cortou o ar, carregado de uma loucura crescente. ── Eu não vou embora sem você!

Delilah sabia que não tinha mais tempo para hesitar. Respirou fundo uma última vez, destrancando a porta lentamente e abrindo-a apenas o suficiente para se colocar entre Walker e o interior do apartamento.

── O que você quer? ── Sua voz era firme, impassível, apesar do coração disparado. Seus olhos fixaram nos dele, frios, avaliando cada detalhe. ── A Rachel não está aqui.

Walker era um homem alto, com ombros largos e um olhar cavernoso, carregado de fúria. Olhos fundos com olheiras roxas próxima ao nariz. Sua mandíbula estava rígida, os dentes cerrados visíveis por trás da barba ruiva acobreada, desigual e falhada em alguns pontos. Ele parecia mais uma fera acuada do que um homem, e o cheiro de álcool misturado ao suor o precedia.

── Eu sei que ela está aqui. Onde ela está? ── Ele rosnou, dando um passo à frente tentando intimidá-la.

── Não tem ninguém aqui. Você veio ao lugar errado. ── Delilah manteve-se firme, o corpo ainda como pedra, a faca escondida em segurança atrás das costas.

O olhar dele estreitou, os olhos verde escuro varrendo o ambiente como se pudessem penetrar pelas paredes.

Em seu pescoço parcialmente coberto pelo casaco, Delilah consegue ver o sangue que escorre do ferimento causado na parte de trás da cabeça dele por Rachel. Mas também há marcas de arranhões no rosto e no pescoço, marcando a pele de vermelho, contusões raivosas e superficiais, as marcas que Rachel deixou para se defender de ataques daquele homem.

── Não mente pra mim, sua desgraçada. Eu sei que ela tá aqui. Sei que você tá tentando me foder. Sai da frente. ── ele retrucou.

Delilah ergueu o queixo, seu olhar desafiador.

── Eu disse, Walker. Ela não está aqui. E você está prestes a cometer um erro que vai custar muito caro. ── ela o avisou. ── Vai embora.

O olhar de Walker escureceu, o desdém evidente em cada linha de sua expressão. Ele apoiou a mão pesada no batente da porta e se inclinou, invadindo o espaço pessoal de Delilah com a ousadia de um predador que acredita ter a presa encurralada.

── Quero falar com a Rachel. ── Sua voz era um rosnado baixo, carregado de ameaça mal contida. ── Sei que ela tá aí dentro. Então, me deixa entrar ou você vai se arrepender de me fazer esperar.

── Ela não está aqui, Walker. — Delilah não se moveu e sua voz era gelada, quase casual, o que apenas acendeu mais a fúria nos olhos dele. ── E mesmo que estivesse, você acha que eu deixaria um verme como você passar dessa porta?

A raiva no rosto de Walker se intensificou, a linha da mandíbula travada enquanto ele dava um passo à frente, encurtando ainda mais a distância entre eles. O cheiro forte de álcool atingiu Delilah como um golpe.

── Verme? ── Ele soltou uma risada curta e cruel antes de empurrar a porta com mais força, mas Delilah continuou firme, sem ceder um centímetro. ── Quem você acha que é, hein? Quer se meter numa coisa que não tem nada a ver com você? Vou te dizer uma coisa: isso não vai acabar bem.

── Eu não sei muito sobre você, Walker. Nem quero saber. Mas pelo jeito como Rachel fugiu de você, eu diria que ela tinha todos os motivos. E sabe de uma coisa? Ela estava absolutamente certa. ── Delilah inclinou a cabeça ligeiramente, um sorriso seco se formando nos lábios, mas seus olhos brilhavam ── Agora, por que você não faz um favor a si mesmo e volta para o buraco de onde veio antes que se arrependa?

Walker deu outra risada, mais amarga desta vez, os olhos estreitando enquanto a raiva e o desprezo lutavam pelo controle de sua expressão.

── E o que você vai fazer, hein? Me ameaçar com essa cara amarrada? ── Ele bufou, inclinando-se mais, tentando usar sua presença para intimidá-la.

── Eu disse: saia. ── Com o dedo indicador, apontou calmamente para fora de seu apartamento, como se estivesse falando com uma criança desobediente enquanto ele a ameaçava sobre a soleira.

Delilah permaneceu imóvel, mas seus olhos endureceram. Num movimento inesperado, Walker estendeu a mão, tentando empurrá-la para o lado. Ela reagiu rápido, o braço em um movimento firme. Sua mão, até então escondida, se moveu, revelando a faca que segurava. A lâmina brilhou à luz fraca, e a tensão na sala mudou instantaneamente.

── Acha que sou indefesa? ── A voz dela era um murmúrio, mas o peso nas palavras fez Walker congelar.

Por um momento, ele parecia surpreso, mas se recompôs rapidamente, soltando uma risada nervosa que não combinava com a hesitação em seus olhos.

── Você não teria coragem, vadia. ── Ele rosnou, o olhar oscilando entre a faca e o rosto dela.

── Quer apostar? ── Delilah inclinou-se ligeiramente para frente, a faca fixa como uma extensão da sua determinação quando ela ergueu, colocando apontada para o pescoço dele. ── Liguei para a polícia. Eles estão a caminho. Se quiser testar sua sorte, fique. Vamos descobrir quem sai daqui primeiro ─ eu ou você.

O silêncio entre eles era sufocante. Walker era maior, mais forte, mas não era corajoso. Ele sabia quando o risco não valia a pena. E agora, com o som distante de sirenes se aproximando, seu tempo estava se esgotando.

── Tá bem. ── Ele recuou um passo, levantando as mãos em um gesto de rendição teatral, mas o sorriso venenoso em seus lábios não desapareceu. ── Mas isso não acaba aqui. Diz pra Rachel que só quero o que é meu. Paga o que me deve e tudo fica numa boa. Entendeu? Eu não quero machucar ninguém... desde que ela colabore.

Ele deu as costas e saiu pelo corredor, mas Delilah não relaxou. Ficou na porta, observando cada passo até ele desaparecer escada abaixo. Só então fechou a porta, girando a tranca com um clique que parecia ecoar por todo o apartamento.

Seu corpo estava tenso, o coração batendo em uma cadência frenética. A faca tremia em sua mão, e ela a colocou sobre a mesa com cuidado, como se precisasse se forçar a soltá-la. Encostou-se na bancada, soltando um suspiro pesado que parecia carregar toda a tensão daquele confronto.

Mas o alívio foi breve. Sabia que Walker não desistiria tão facilmente. Ele tinha um objetivo, e Rachel ainda estava na mira.

Ela foi até a janela, puxando a cortina o suficiente para espiar. Viu o ruivo na calçada, falando ao telefone, os gestos amplos e os xingamentos audíveis até mesmo dali. Ele parecia uma bomba prestes a explodir. E, ao que tudo indicava, Rachel ainda estava no epicentro. Porém agora ele direcionava toda a sua raiva mau contida na direção da pessoa com quem conversava.

A porta do quarto se abriu lentamente, rangendo sob a hesitação. Rachel surgiu, pálida como um fantasma, os olhos arregalados e o corpo tenso. Ela segurava a bolsa contra o peito como se fosse um escudo que a mantivesse de pé.

── Ele foi embora? ── murmurou, a voz trêmula, quase inaudível sob o peso do desespero.

Delilah olhou uma última vez pela janela. Walker já estava dentro do carro, arrancando da vaga com a raiva estampada no modo como girava o volante. Delilah respirou fundo, tentando recuperar o controle. Colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha enquanto se afastava da janela.

── Por enquanto, sim. ── Seu tom era calmo, mas carregado de urgência. Ela se virou para Rachel, os olhos fixos no rosto pálido da jovem. ── Mas ele vai voltar. E, mais cedo ou mais tarde, ele vai encontrar você. Precisamos decidir o que fazer.

── Você tem razão... — murmurou, quase para si mesma. Rachel baixou o olhar, os ombros cedendo sob o peso da realidade que ela tentava ignorar. ── Eu não posso ficar aqui. Se eu for, ele não vai machucar você... ou a minha mãe. ── Sua voz quebrou na última palavra, mas ela se obrigou a continuar. ── Mas eu não sei como fugir, Delilah. Eu não sei nem por onde começar.

O silêncio se acomodou entre elas por um instante, carregado de possibilidades amargas. Delilah fechou os olhos, e a imagem do rádio em sua gaveta surgiu, clara e insistente. Havia uma única pessoa que poderia ajudar — uma escolha que a fazia hesitar, mas que parecia a única saída.

── Vou ligar para alguém. ── Disse ela, com firmeza renovada, olhando para Rachel como se quisesse transmitir segurança. ── Alguém que talvez consiga te tirar de Gotham. Fique aqui. Não abra a porta para ninguém. Eu volto em um instante.

Rachel assentiu, o rosto pálido e vazio. Delilah se virou, passando por ela com passos rápidos. Quando entrou no quarto, ajoelhou-se ao lado da mesinha de cabeceira. A gaveta deslizou com um rangido suave, revelando o rádio escondido no fundo. Ela o pegou, o peso familiar pressionando sua palma enquanto encarava o objeto.

Por um momento, ficou ali, o polegar pairando sobre o botão de transmissão. A escolha era tão clara quanto arriscada. Sabia que o próximo passo a levaria a um território nebuloso, onde as soluções podiam se transformar em problemas em um piscar de olhos e talvez ele não agisse como ela esperava.

Mas então algo chamou sua atenção — um detalhe deslocado na ordem cuidadosa do quarto. A gaveta do lado oposto, que ela lembrava ter fechado, estava ligeiramente aberta. Delilah se levantou, a cautela assumindo o controle. Quando puxou a gaveta, encontrou a caixa de joias aberta. Seu interior forrado de veludo estava vazio, as peças que antes ocupavam o espaço desaparecidas.

Um calafrio percorreu sua espinha. Colocando o rádio e a caixa sobre a cama, saiu do quarto com passos apressados.

── Rachel? ── Chamou, a voz baixa, mas carregada de urgência.

Não houve resposta, nada vindo da parte de Rachel. Tudo o que Delilah escutou foi o silêncio interminável e a sala estava vazia, a porta do apartamento aberta apenas o suficiente para que a ausência fosse uma confirmação cruel.

Delilah praguejou, o coração disparado, e correu até a porta tentando alcançá-la. No corredor, tudo estava em silêncio, mas o eco de passos rápidos na escada indicava que não estava sozinha.

Ela desceu os degraus como uma flecha, ignorando qualquer regra ou precaução, mas chegou ao térreo apenas a tempo de ver Rachel atravessar as portas do prédio. Quando alcançou a rua, a jovem já estava entrando na traseira de um táxi.

── Droga, Rachel! ── Delilah murmurou, cerrando os punhos enquanto o carro se afastava, deixando para trás apenas a poeira e a sensação de impotência.

Ela ficou ali por um momento, respirando com dificuldade, a frustração e a culpa entrelaçadas como um nó apertado no estômago. Quando subiu novamente, cada passo parecia um golpe contra sua paciência já desgastada.

De volta ao quarto, ela não hesitou. Pegou o rádio sobre a cama, e, desta vez, pressionou o botão de transmissão sem pensar duas vezes.

As ruas de Gotham estavam mergulhadas em um silêncio pesado, um marasmo gelado que parecia congelar o ar. O inverno fazia questão de varrer qualquer traço de movimento com seu vento cortante, enquanto o toque de recolher próximo reduzia ainda mais a presença de transeuntes. Delilah acreditara que a travessia até o distrito de Diamond demoraria mais, que as ruas vazias e o frio a fariam sentir a distância, mas, estranhamente, chegara rápido demais. O táxi parou perto de uma oficina antiga e, ao descer, seus olhos logo se fixaram no prédio ao lado.

Rachel havia mencionado que era ali, perto do trabalho de Rusty. Delilah se embrenhou pelo beco ao lado do motel vizinho, subindo pela escada de emergência para obter uma visão melhor do edifício de quatro andares. O local exalava decadência, uma estrutura envelhecida e desgastada que parecia quase vazia, um velho prédio industrial em desuso. Mas ao se concentrar nas janelas parcialmente iluminadas, ela notou silhuetas masculinas pelas janelas movendo-se lá dentro. Rusty vivia dizendo que a família ocupava o prédio, mas Delilah sabia que aqueles eram seus homens, sua gangue, não primos nem parentes.

Por um longo minuto, ela permaneceu imóvel, os olhos atentos, ignorando o vento que atravessava o casaco fino que pegara às pressas. A noite avançava, o frio mordendo sua pele enquanto seus pensamentos oscilavam entre a dúvida e a determinação, pensando em Rachel e onde ela poderia estar agora. Um arrepio subiu por sua espinha, um pensamento obscuro e enervante de que havia chegado tarde demais. Ainda assim, não desviou o olhar daquelas janelas.

Foi quando a voz grave surgiu ao seu lado, como uma sombra materializada.

── Você não deveria estar aqui ── disse ela, seu timbre soou baixo e denso, um aviso sério seguido de sua presença que só fora notada depois que ela sequer pudesse perceber sua aproximação.

── E deixar você com toda a diversão? Nah, isso não faz o meu estilo ── Delilah respondeu, o sarcasmo afiado e um meio sorriso seco, sem desviar os olhos do prédio à sua frente. Luzes piscavam nas janelas, silhuetas se moviam apressadas dentro do edifício. Ela se mantinha firme, sem a menor intenção de ir embora.

Batman parou ao seu lado, a capa pairando sutilmente contra o vento.

── Você já fez a sua parte. Volte para casa ── disse, a voz firme e final. Seus olhos, embora mascarados, a encaravam com uma intensidade impassível. ── Eu cuido de tudo.

── Eu não vou embora. ── Delilah se virou para ele, o olhar fixo, desafiador. ── Prometi que a ajudaria, e vou cumprir minha palavra.

Ele manteve o silêncio, mas era como se uma muralha de gelo pairasse entre eles.

── Não há garantia que ela esteja realmente aqui, você sabe disso. ── insistiu, o tom sombrio, como se lhe lembrasse de um fato inquestionável. ── Ela roubou você.

── Porque estava desesperada. ── Delilah suspirou, exasperada. ── Ele sabia que ela estava ouvindo tudo, que cederia se acreditasse que só precisava pagar o que devia. Não estou com raiva dela ── completou, desviando o olhar para a rua enquanto mordia os lábios, tensa. ── Foi uma escolha idiota, não devia ter me roubado, mas... não estou com raiva. Agora, só quero tirá-la dessa e mandar todos esses filhos da puta para a cadeia. Vai me ajudar ou não?

Ela o encarou, a determinação incandescente nos olhos. Sabia que ele poderia muito bem mandá-la embora, deixá-la no limite entre seu orgulho e sua frustração. Mas quando o chamara pelo rádio, o fizera para conseguir sua ajuda, não para que ele assumisse o controle e lhe negasse qualquer autonomia.

Houve um breve silêncio. Então, a voz de Batman soou dura, um tom de autoridade que não admitia qualquer tipo de resistência da parte dela.

── Se vamos fazer isso, você segue as minhas regras. Faz apenas o que eu mandar. Sem discussões.

Delilah assentiu, mesmo sabendo o quanto cada palavra imposta a ela queimaria em sua língua. Ela não tinha problemas em seguir ordens, mas a forma como ele agia a irritava fortemente, a impulsionando agir contrariamente.

── Claro, chefe. ── Suas palavras carregavam certa ironia, o brilho em seu olhar entregava isso quando olhou para o Batman de relance.

── Eu estou falando sério ── ele segurou o braço dela, fazendo com que Delilah o encarasse. ── Isso não é um jogo.

── E você acha que eu não sei? ── ela rebateu, igualando seu tom ao dele e enfrentando de frente aquele desafio, criando um impasse entre os dois.

Ninguém nunca diz que coragem é quase indistinguível do medo. Ela nasce do mesmo instinto: aquele impulso incontrolável, quente e urgente, que toma o corpo e sufoca a razão. Delilah sabia disso. Sabia que a linha entre os dois era tênue, que decisões impensadas, regadas a essa chama inconstante, eram capazes de arrastar qualquer um para o abismo.

E, ainda assim, algo a impelia a seguir em frente. Uma parte sua — a parte mais teimosa e furiosa — gritava que ela tinha de estar ali, ao lado dele. Havia uma promessa feita, e Delilah não era de recuar.

Batman se afastou primeiro, soltando o braço dela. Ele manteve o silêncio e sua postura distante, ampliando a tensão entre eles. Delilah não compreendia o porquê de tanta irritação. Ele não tinha motivos para se preocupar com ela, nem deveria. Os dois tão pouco se conheciam. Mas julgou que fosse por instinto, afinal ao se tornar um vigilante e todas as noites jurar proteger Gotham colocava ela nesse meio de pessoas que também deveriam ser protegidas.

── Walker... Tem certeza que ele está aqui? ── ele a questionou.

── Aquele é o carro dele estacionado na porta ── Delilah apontou para o sedan cinza, o mesmo que Walker havia entrado antes.

A resposta dele foi um silêncio inicialmente; seus olhos se estreitaram enquanto analisava o carro, calculando possibilidades e riscos. A cada segundo que ele demorava, Delilah sentia sua paciência se esvaindo, substituída por uma crescente ansiedade. Ele estava certo, ela não tinha certeza que Rachel estava ali. Ela poderia ter pegado as joias, vendido e comprando uma passagem para fora da cidade. Mas também havia a outra possibilidade: a ideia de Rachel trancada naquele prédio, cercada por gente que não hesitaria em usá-la como isca, apertava o peito de Delilah com uma intensidade desconfortável.

Batman retirou do cinto de utilidades um pequeno dispositivo cilíndrico, um scanner térmico compacto com uma lente infravermelha. Delilah observou enquanto o vigilante ajustava o visor embutido em sua máscara, e, com um clique quase inaudível, ativou o escaneamento. Pelos olhos dele, o prédio agora estava desenhado em contornos de calor — silhuetas humanas ganhando vida em tons incandescentes de vermelho, laranja e amarelo. Batman inclinou a cabeça ligeiramente, concentrando-se nos detalhes que surgiam em sua visão.

── Três no térreo, perto da entrada, ── murmurou, quase como se falasse consigo mesmo. ── Dois no segundo andar, cada um em uma extremidade do corredor. Quatro no quarto andar. ── Ele pausou, o dedo roçando o botão de ampliação enquanto ajustava o foco para algo mais distante, mais baixo. — Dois no terceiro andar, fundos, lado esquerdo... guardando uma sala com um refém.

Delilah deu um passo à frente, uma tensão evidente em sua voz quando o questionou.

── É ela?

── Parece ser. ── Ele fez um gesto para o visor. Batman não se apressou em responder, a análise ainda se desenrolando em sua mente. ── É uma mulher, amarrada a uma cadeira.

A análise terminou quase tão rápido quanto havia começado. Ele desligou o scanner e se virou para encará-la. A máscara cobria tudo, menos o peso tangível de sua seriedade, realçado pela luz fraca que piscava do outdoor próximo.

── Apenas uma assinatura térmica no último andar ── ele continuou, antes de finalmente cruzar os olhos com os dela. ── Se alguém subir para checar os outros andares, você terá uma chance de passar despercebida. Vou fazer com que se distraiam.

Ela assentiu, já prevendo a movimentação. Ele ajustou o scanner e o entregou para Delilah para que ela também pudesse ver o que ele viu.

── Eles usam travas de segurança eletrônicas. Se eu desligar todo o sistema de energia, você conseguirá entrar pelos fundos ── explicou ele, enquanto Delilah ajustava o dispositivo e observava o prédio.

── Certo, e eles vão ficar no escuro por quanto tempo? ── questionou, devolvendo o objeto a ele. Batman guardou o scanner de volta no cinto.

── Não muito se tiverem um gerador de energia. Os sistemas se ligam novamente em 5 minutos ── explicou. ── Você tem que entrar e subir as escadas até o terceiro andar. Vou avisar quando sua passagem estiver livre. ── Batman afirmou. ── Fique atenta e siga o plano.

Ela se forçou a engolir qualquer resposta sarcástica e apenas assentiu. Mas a tensão na mandíbula de Batman indicava que ele percebeu sua hesitação, o que não ajudava em nada. Delilah sentiu os olhos dele sobre ela por um instante a mais do que o necessário, e então ele se moveu para a frente. Em um movimento ágil, ele retirou algo pequeno e discreto do cinto de utilidades, estendendo-o em sua direção.

── Coloque isso no ouvido. Assim posso te guiar e ouvir o que acontece. ── disse ele, com uma seriedade que Delilah não ousou contestar. ── Se algo der errado, vou saber imediatamente.

Delilah pegou o dispositivo e o deslizou no ouvido, o gesto mecânico, mas a sensação que veio depois estava longe de ser indiferente. Estavam oficialmente conectados agora, algo que parecia tanto um consolo quanto um peso.

Antes que ela pudesse falar, ele retirou outra coisa do cinto: uma arma de choque compacta. O design era funcional, mas letalmente eficiente, o brilho metálico refletindo a luz tênue ao redor.

── Isso não é pra atacar. Só use em defesa própria se algum deles vier pra cima de você. ── disse Batman, colocando a arma de choque na mão dela com um olhar firme. ── Ela tem carga para uma única descarga de alta voltagem, então não desperdice. Não vai te salvar de uma bala, mas pode dar alguns segundos a mais.

Delilah segurou o objeto, o peso frio e compacto contra a palma de sua mão. Ela o inspecionou, quase distraidamente, enquanto um comentário escapava de seus lábios.

── Você realmente está sempre preparado para tudo, não é?

Ele não respondeu, mas o silêncio dele parecia confirmar. Delilah ergueu os olhos para ele, uma mistura de ironia e gratidão em sua voz.

── Obrigada. ── Delilah comprimiu os lábios, abaixando a mão com a arma, mantendo-a ao lado do corpo.

Ele assentiu uma única vez, o movimento breve, quase imperceptível. Por um momento, seus olhos permaneceram sobre ela, intensos, avaliando, debatendo. Não era um olhar vazio, mas um silêncio carregado de decisões ainda não verbalizadas. Então, sem mais uma palavra, ele deu um passo para trás, deixando a escuridão engoli-lo.

O arpéu disparou, rasgando o silêncio com um som agudo. O gancho cravou-se em algum lugar no alto, e em um movimento fluido, ele desapareceu. Sombras e aço se fundiram enquanto ele subia, até que não restou mais do que o eco distante e a promessa tácita de que estaria por perto.

Delilah suspirou pesadamente, permanecendo imóvel por um instante, os olhos fixos no vazio onde ele estivera. Havia algo sobre aquela ausência que a incomodava, mas ela não tinha tempo para pensar nisso. Ele já estava em ação e ela também deveria estar, não podia perder mais tempo.

Descendo as escadas de emergência, ela atravessou a rua deserta, onde a fábrica abandonada se erguia como um gigante sombrio. A entrada dos fundos era sua meta — trancas simples, uma janela trancada. Nada que parecesse fora do ordinário. Esperou, pressionada contra a parede fria, enquanto o ar ao seu redor parecia prender a respiração. Então, aconteceu. O prédio apagou-se de uma só vez, um silêncio pesado caindo sobre ela quando o sistema de segurança foi desligado.

Sem hesitar, Delilah abriu a porta, o som do metal rangendo como um grito abafado em seus ouvidos. Ela entrou, escorregando para dentro do corredor mal iluminado. O lugar exalava umidade e abandono, o cheiro acre de ferrugem e poeira se misturando ao concreto frio que absorvia os ruídos ao redor.

Acima de sua cabeça, passos pesados ecoavam no andar superior, acompanhados por vozes abafadas, apressadas. A pouca luz que entrava pelas janelas quebradas era tudo que tinha para guiá-la, projetando silhuetas distorcidas no chão e nas paredes, Delilah alcanço as escadas graças a elas.

── Estou dentro ── murmurou pelo comunicador, sua voz baixa e firme, apesar do aperto no peito. Por mais que estivesse mantendo a calma, seu coração estava acelerado.

O rádio permaneceu em silêncio. Nada. Ela se preparou para repetir quando as luzes fluorescentes piscarem, voltando à vida com um estalo. O apagão durara pouco. Muito pouco. Menos tempo do que Batman havia previsto.

O som de vidro estilhaçando no andar de cima cortou seus pensamentos. Ele. Criando a distração prometida. Em seguida, o comunicador em seu ouvido ganhou vida.

── O caminho está limpo ── a voz rouca de Batman finalmente soou, calma e sem pressa. Instantaneamente, Delilah sentiu alívio ── A maioria está no quarto andar. Cinco minutos, talvez menos.

Delilah começou a avançar tentando não fazer barulho, embora o eco das botas no chão de concreto fosse inevitável. Subiu o primeiro lance de escadas, pressionando-se contra as paredes para evitar qualquer ângulo de visão. Passou por uma porta entreaberta e espiou para dentro: um homem estava ali, distraído, a pistola pendendo frouxa em sua mão enquanto ele escutava os sons vindos de cima.

Ela seguiu em frente, subindo o segundo lance de escadas até alcançar o terceiro andar. Batman havia descrito os fundos como o provável local onde Rachel estaria — um espaço isolado e fácil de vigiar.

Os corredores eram estreitos, claustrofóbicos, as paredes riscadas com pichações e marcas de umidade que pareciam cerrar o espaço ao seu redor. O som de vozes masculinas a fez parar, duas figuras saindo apressadas de uma sala antes de desaparecerem no corredor oposto.

── Dois homens no corredor oeste, terceiro andar ── sussurrou no comunicador, as palavras mal um fio de som. ── Estão indo atrás de você.

── Registrado. Prossiga.

A resposta dele foi como um comando direto ao sistema nervoso de Delilah. Movendo-se mais rápido, manteve a arma de choque preparada. Os barulhos acima dela continuavam, vidro quebrado, ordens murmuradas, um caos orquestrado que ela sabia ser obra de Batman. Em sua cabeça, as instruções dele se repetiam como um mantra: localizar Rachel e recuar ao menor sinal de perigo. Ele cuidaria do restante, garantira isso. Mesmo assim, a ideia de deixar Rachel para trás, de possivelmente abandoná-la à própria sorte, fazia o sangue ferver. Não era uma opção que Delilah gostaria de recorrer.

Quando alcançou a sala ao final do corredor, havia a porta verde marcada por ferrugem e sujeira parecia ao lado oposto da entrada. Delilah caminhou até ela e, segurando a maçaneta com cuidado, a abriu, revelando o interior daquele cômodo. Uma única luz branca sobre uma mesa iluminava o espaço, destacando ferramentas enferrujadas e a cadeira no centro.

A sala era pequena, iluminada apenas pela luz pálida de uma lâmpada em uma mesa de ferramentas. No centro, uma cadeira vazia. E aquele vazio gritou como uma afronta, enchendo a mente dela de questionamentos que logo foram apagados, colocados de lado no instante seguinte quando sentiu uma presença atrás de si, uma sombra que se alargou acima dela.

O coração de Delilah afundou, mas antes que pudesse reagir, algo a interrompeu — algo frio, sólido.

A pressão da arma pressionado contra suas costas foi tão paralisante quanto o click que veio em seguida. O som do gatilho sendo engatilhado parecia ter um peso impossível, reverberando no silêncio da sala e enchendo-a com tensão. Delilah não se moveu, ela não ousou dar nenhum passo, mas sua respiração vacilou.

O que quer que viesse a seguir, seria decidido em segundos. E esses segundos, agora, pertenciam a outra pessoa. 

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