𝐋𝐗𝐗𝐕𝐈 _ 𝐑𝐞𝐜𝐨𝐫𝐝𝐚𝐜̧𝐨̃𝐞𝐬
Devo dizer que fui a um sebo na minha cidade e comprei 6 livros. 5 de Game of thrones e 1 que nunca vi NGM falar. ENTÃO, se a autora sumir, já sabem hehehe
Skskskksks
Boa leitura amores ❤️
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O ar daquele local fedia, o odor pungente de sangue predominava o ambiente enquanto os corpos enfileirados continuavam a jorrar até suas últimas gotas de sangue no chão sujo. Annie, beirando aos seus treze anos, observava atentamente a lâmina de sua faca enquanto limpava com delicadeza. As mulheres de diversas idades terminavam de torturar e matar seus abusadores enquanto a jovem permanecia em pé ao fundo. O som dos atos violentos não lhe causavam há muito repulsa e náuseas, as imagens não lhe atormentaram mais os sonhos e, agora, tudo o que via já era considerado normal e já havia se acostumado com tamanha violência.
As mulheres olhavam umas para as outras, a fúria sendo liberada depois de anos naquelas condições decadentes, mas, além disso, havia a confusão e a dúvida. Afinal, o que fariam com a liberdade que acreditavam não serem capazes de conseguir? O que fariam? Para onde iriam? E quem era aquela criança parada tão despreocupada e que, de alguma forma, foi a responsável pela libertação de suas vidas e corpos?
— Você aí! – gritou uma mulher segurando um pedaço de ferro com tanta força que seus nós dos dedos estavam brancos, os cabelos sujos e bagunçados tinham fios grudados em seu rosto suado e igualmente sujo – Quem é você?
— Annie. – a garota murmurou sem olhá-la nos olhos.
— O que você quer?
Annie finalmente olhou para a mulher à sua frente, as feições desconfiadas e assustadas mescladas em seus olhos, era óbvio que para a mulher que a garota queria algo em troca. Uma recompensa. Ninguém entraria numa velha fábrica sozinha e lutaria contra trinta homens fortemente armados sem um desejo em troca. Os dedos se firmaram mais ainda naquele ferro em suas mãos.
— Eu to com fome. – ela deu de ombros – Tem comida? Adoraria comer feijão enlatado.
A mulher franziu o cenho, as mãos vacilando um pouco a firmeza que segurava, olhou-a atentamente por mais alguns segundos tentando captar a piada ou o possível tom de deboche em sua forma de falar e agir. Nada. Não havia nada ali. A garota mal tinha expressões, seu olhar não brilhava e não passava absolutamente nada além de um vazio frio e corrosivo. Ela engoliu em seco e abaixou sua arma.
— Por que… por… por que fez isso? – sua voz vacilou.
— Isso o que? – a garota arqueou uma sobrancelha.
— Nos ajudar. Nos libertar.
A garota novamente deu de ombros enquanto guardava a faca perfeitamente limpa em seu coldre na cintura, então cruzou os braços e a olhou diretamente nos olhos.
— Não parecia justo vocês ficarem presas.
— Você… sabe o que eles… faziam aqui? – ela perguntou com um pouco de cuidado.
— E isso importa? Se eu vi que podia libertar vocês, por que não fazer?
A mulher a encarou sem acreditar. Ela teria entrado ali por escolha, por saber que poderia libertá-las? Ela precisou de alguns segundos para assimilar aquilo, piscou uma, duas, três vezes, mas por mais que tentasse não conseguia impedir as lágrimas de rolarem por seu rosto. A tristeza, a dor, a repulsa, tudo finalmente sendo liberado em suas lágrimas com tanta força que seus joelhos vacilaram e caiu ajoelhada ao chão. Ela continuou chorando copiosamente, os soluços não parando, o ranho escorrendo por seu nariz e os braços abraçando o próprio corpo com força, tanta que as unhas arranhavam e cortavam sua pele. Annie se aproximou, colocou as mãos em seu ombro, não havia empatia ou bondade em seu olhar e expressão, tampouco raiva ou repulsa, não havia nada, mas algo naquele olhar fez a mulher se sentir acolhida. Se sentir protegida.
— Qual é seu nome? – perguntou Annie.
— Jade. – respondeu, a voz trêmula e embargada pelo choro.
— Jade. – repetiu e uma sombra de sorrisos surgiu em seus lábios, então afastou a mão de seu ombro e a ofereceu para a mulher se levantar – Vem, vamos sair daqui.
*
A imagem de repente se tornou apenas borrões, um borrão laranja e amarelo parecia brilhar ao seu lado enquanto vozes distantes e abafadas conversavam ao seu redor. Ela não entendia o que estava acontecendo, apenas sentiu aquela dor latejante espalhada pelos seus corpo, mas a pior era em sua cabeça. Era como se milhares de cacos de vidro penetrassem no seu olho esquerdo e se arrastassem, arranhando seu crânio querendo chegar ao seu cérebro. A dor era tanta que voltou a desmaiar.
*
— Mada. Mada, acoda!
Annie devia ter quase cinco anos ali. Uma jovem bonita, de pele delicada e lisa, com cabelos dourados e longos, dormia calmamente à sua frente enquanto suas mãozinhas balançavam seu corpo a fim de despertá-la.
— Hum, Annie? – ela gemeu se remexendo na cama com o cenho franzido e sem abrir os olhos – Me deixa dormir, vai.
A garota devia ter por volta de dez anos, era mais velha.
— Vamos. Papa vai chega. Vamos! – exclamou animada enquanto subia em sua cama, ajoelhando ao seu lado enquanto dava pequenos pulos de felicidade – Vamos, mada.
— Tá, tá… Já vou. – murmurou virando-se na cama e puxando o cobertor até a cabeça.
— Eleador vai fica bava.
— Foda-se aquela velha. – resmungou, o insulto fez Annie levar as mãos até a boca em espanto.
— Dão pode fala palavão! É feio! – exclamou com expressão de raiva.
— Okay, okay! – a garota se sentou, rindo daquelas palavras – Desculpa, desculpa.
— Hum, tá descupada. Vem, Kaila, vamos espela o Papa. – Um enorme sorriso se abriu em seus lábios e então se levantou saindo correndo porta afora.
Kaira riu com a irmã mais nova e sua animação. Annie tinha recém completado cinco anos, ainda tinha muitas dificuldades na fala, mas a garota sabia que era normal dada a sua idade. E ainda trocava palavras, como o “n” pelo “d” e transformando palavras como “Eleanor”, “não” em “Eleador” e “dão”. Além de cortar sempre o “r” de suas palavras, principalmente se esse estivesse seguindo outra consoante, como “palavrão”.
Ela puxou o cobertor de suas pernas e se levantou, bocejando enquanto esfregava os olhos, até que o som de algo caindo e se partindo fosse ouvido de seu quarto, sendo seguido por um estalar forte e novamente outra coisa caindo com um baque surdo ao chão. Sem esperar a garota correu até o local ouvindo gritos e insultos no andar de baixo, ao chegar lá viu uma mulher alta, negra e muito linda gritar com Annie que estava caída ao chão com a mão no rosto ocultando uma vermelhidão causada pelo tapa que a mais velha deu. Ao fundo um vaso grande estava ao chão, quebrado, e um garotinho negro de seis anos chorava ao seu lado vendo a mãe tão transtornada.
— Fui eu! – gritou o menino entre as lágrimas – Mamãe, fui eu!
— Cala a boca, Gabriel! – a mulher rugiu fuzilando-o – Pare de tentar levar a culpa por essa desgraça que o amigo de seu pai trouxe. Ela não passa de uma rata miserável!
— Cala a boca! – Kaira gritou e correu até a irmã, jogou-se contra a mulher e a empurrou com toda a força que seu corpo de dez anos podia ter – Não toque na minha irmã ou eu vou contar pro Joel!
— Baratas. – a mulher rosnou com os dentes cerrados enquanto fuzilava a menina que se mantinha de forma protetora a frente da mais nova – Vocês duas. Baratas! Vá correndo e conte para aquele demônio, quero ver o que ele vai fazer.
E então Kaira pegou o braço de Annie que ainda estava caída e a puxou para fora de casa. O local era cercado por uma floresta morta, bem afastada do deserto, mas não do calor incessante. Os troncos brancos se retorciam para o alto e as pontas de seus galhos se estendem ao alto de forma desnuda, sem uma única folha. Não havia vida ali. Elas andaram até os fundos da casa onde encontraram um banco, a mais velha se sentou e colocou a mais nova em seu colo, abraçando-a com força. Até aquele momento Annie não havia chorado, uma única lágrima não tinha sequer escorrido por seu rosto, mesmo com a perfeita marca dos dedos da mulher de trinta anos marcados em seu rosto.
— Tá tudo bem. – ela sussurrou tentando acalmar a mais nova – Tá tudo bem. Joel logo vai chegar.
Annie deitou a cabeça no ombro da mais velha encontrando ali o conforto e segurança necessários, então as primeiras lágrimas começaram a escorrer e se transformaram em um choro doloroso.
— Dói. – sussurrou entre as lágrimas – Dói.
*
O carro deu um forte solavanco e então parou. O movimento despertou Annie de sua inconsciência, ela via pessoas saindo às pressas dos carros e abrindo a porta para retirá-la com cuidado. Estava ferida demais para se mover, a dor preenchia seus membros e diminuía drasticamente sua capacidade de compreensão. Foi quando foi retirada por um dos homens, este que passou seu braço pelos próprios ombros para apoiá-la, que o reconheceu. Era o barman do bar que sempre ia. O que ele estava fazendo ali?, ela perguntou a si mesma.
Foi como um soco em seu cérebro que as lembranças vieram no segundo seguinte, cada lembrança um poderoso soco que balançava seu cérebro e fazia tudo girar e girar.
A captura.
A traição de Priscila e Gabriel.
A morte de Eleazar.
A morte de Jade.
Annie vomitaria, suas pernas fraquejaram e ela cairia ali ao chão se não fosse o homem que a segurava. Eles gritavam ao seu redor, mas suas palavras eram confusas e distantes para a garota que só sentia dor e mais dor. Viu com a visão levemente embaçada o corpo de Darlan ser levado às pressas. Viu Gally se debatendo contra três fortes homens enquanto gritava e olhava para ela, eles também o levaram para longe dali, e então outro homem veio e apoiou o braço de Annie em seu ombro. Era Mattie.
Ela queria falar, queria gritar, queria fazer mil e uma coisas, mas não pode. Não conseguia. A morte de Eleazar e Jade minou suas forças mais do que qualquer ferimento fosse possível. Quando eles adentraram finalmente o prédio em direção a enfermaria, ela moveu os braços e empurrou com toda a força restante os homem e então lançou seu corpo contra o chão. Eles vieram ao seu auxílio, mas Annie apenas grunhiu para que se afastasse. O barman hesitou, mas Mattie ignorou e tentou puxá-la, mas ela o empurrou novamente e voltou ao chão.
Os ferimentos estavam com curativos ensanguentados, tentaram a todo custo cuidar dos ferimentos enquanto viajavam, o máximo que podiam até chegarem à base e deixarem que Ágatha cuidasse do resto.
Annie apoiou o corpo nos joelhos e nos cotovelos, ignorou a dor em seus pulsos tão profundamente cortados e lançou seu corpo para cima. Ela balançou, tentou se firmar, mas logo caiu ao chão novamente. Os moradores da base e aqueles que não eram, assistiam a cena em agonia, não podiam ajudá-la já que nem mesmo Mattie conseguia. Por mais que ele a agarrasse, a levantasse e gritasse contra ela, ela dava um jeito de se livrar de sua ajuda.
Mais uma tentativa de se levantar após três tentativas falhas e ela finalmente ficou em pé. O sangue que havia encharcado seu curativo agora escorria por seu rosto, deslizava até seu queixo e pingava no chão. O mesmo acontecia em seus pulsos. O sangue deslizava por suas mãos e dedos e caíam ao chão enquanto ela forçava suas pernas a darem os próximos passos.
Ela se arrastou deixando um caminho de sangue, apoiou-se nos corrimões e paredes para se manter em pé, mas seguiu sem a ajuda de ninguém. Agarrou-se firmemente aquela raiva, aquela dor e aquele resquício de força que restara em seu corpo e continuou sua caminhada. Subiu lances e mais lances, caiu novamente contra o chão frio e então se levantou para voltar a andar. Quando finalmente chegou ao seu destino, ela empurrou a porta usando o corpo e adentrou a sala vendo o homem andando de um lado para o outro em preocupação. O som rangido da porta se abrindo ecoou pelo ambiente e o fez olhar na direção, encontrando apenas a imagem da filha ensanguentada e fraca.
— Annie. – sua voz saiu fraca, quase sem acreditar naquilo.
— Mataram ela. – sua voz fraca, trêmula e cortada saiu de seus lábios enquanto se aproximava lentamente dele. As mãos agarrando qualquer coisa que pudesse mantê-la em pé. – Mataram… mataram eles… tiraram eles de mim, pai…
Ela tinha a raiva estampada em seu rosto enquanto andava até ele, mas mais que isso, tinha uma dor terrivelmente profunda. Ela estendeu os braços para ele ainda tão distante, os dedos trêmulos tentando alcançar o homem que vinha em seu encontro, mas as pernas de Annie fraquejaram e ela despencou novamente ao chão. Lawrence a alcançou, agachando ao seu lado e a puxou para si, agarrando a filha contra seu próprio peito enquanto sentia o cheiro forte de sangue e suor vindo dela. E então, ela desatou a chorar.
— Eu sei, querida. – ele sussurrou fracamente. Já sabia de tudo aquilo, já havia tido a conversa com Tanya e Mattie pelos walkie-talkie. – Sinto muito.
— Ela foi a primeira mãe que tive. – e toda aquela força, aquela raiva, desapareceu e a dor e tristeza tomaram conta do corpo frágil e fraco da garota. Mesmo fraca e sem forças alguma, ela chorou, agarrando-se ao peito do mais velho como uma criança assustada. – Tiraram ela de mim.
Lawrence não fazia ideia do que falar para consolar a filha, apenas afagou sua cabeça com cuidado, então Annie novamente desmaiou e foi imediatamente levada para a enfermaria. Enquanto isso, Gally gritava contra os soldados que o seguravam, impedindo-o de sair correndo por toda a base em busca da garota.
Enquanto isso, naquela sala completamente destruída e revirada pela luta que ocorreu no dia anterior, estava Gabriel. Seu olhar fixo na mancha de sangue que pertencia a Jade, olhando com pesar onde o corpo da mulher que o apoiou por longos anos morreu de forma cruel e fria. Passos lentos se aproximaram, mas não passaram despercebidos já que os cacos de vidro estavam por toda a parte.
— Foi você. – Gabriel disse com a visível dor em sua voz, sem sequer se virar para a irmã que se aproximava – Você fez isso.
— Olho por olho. – a voz de Priscila soou fria, sem emoção. – Essa era a única forma de ela sentir o que nós sentimos quando matou nossa mãe.
— Eu te pedi para não fazer isso. – ele sussurrou – Eu implorei tantas e tantas vezes.
— Era necessário, se não…
Ela se aproximou e tocou seu ombro, entretanto quando o rapaz sentiu seu toque ele rapidamente se virou e desferiu-lhe um golpe certeiramente no rosto fazendo a garota cair pelo impacto.
— Pro inferno com esse papo! – gritou ele, as lágrimas enchendo seus olhos – Não use o papo que nosso pai usou por anos com você, eu não vou me deixar cegar por essa vingança ridícula! Annie pode ter matado nossa mãe, mas Jade era minha amiga. Ela era doce, gentil e cuidadosa! Cuidou da gente com amor desde que a conhecemos! Não finge que você não sentiu nada quando a matou, eu sei que você sentiu porque você conhecia Jade tão bem quanto eu para saber que ela não merecia isso!
Priscila tentou se levantar, mas Gabriel se afastou e andou até a saída. Entretanto, foi barrado por um homem alto e com uma expressão furiosa. Seu nariz era torto, sua pele queimada pelo sol era grossa e enrugada e uma barba mal feita ocupava algumas partes de seu rosto. Seu cabelo era grisalho e seus olhos encaravam tudo com ódio e fúria. Gabriel recuou quando o viu, os olhos se arregalando com a imagem do homem à sua frente, Priscila também se levantou no mesmo instante e ignorou o corte dolorido em seus lábios. Foi então que o homem olhou tudo ao redor, vendo a bagunça no ambiente, então se virou para os dois jovens e perguntou:
— Que porra vocês fizeram?
Era Andrey.
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