L'Air
O dia no trabalho tinha sido extenuante. Thiago chegou em casa exausto, não tanto pelo trabalho em si, mas pela monotonia das tarefas burocráticas na polícia. Desabou no sofá sem muito ânimo, e logo uma lembrança de Bruna invadiu sua mente.
"Estipulamos passar o final de semana juntos, na casa dele. Ao se deitar no sofá, puxei-a para cair sobre mim, provocando cócegas.
- Para, Thiago! - ela pedia, entre risos desesperados. - Precisamos comer alguma coisa...
- Eu me contento com você. - respondi com um sorriso malicioso.
Ela virou-se para me encarar e começou a me encher de beijos. Empolgada, tentou tirar minha camiseta, mas eu me esquivei.
- Vou cozinhar algo para nós. - Dei-lhe um pequeno tapa na mão, arrancando um grunhido de protesto."
Thiago foi interrompido por um toque no celular. Atendeu sem checar o número, e Rodrigo imediatamente se fez ouvir:
- Thiago, coloque o uniforme. Tem dois foragidos da Fundação Casa, da rebelião da semana passada, rondando a porta de uma faculdade no Tatuapé.
- Que ótima notícia! Isso acabou de melhorar meu dia... - riu sádico, desligando o telefone em seguida.
Ele se preparou rapidamente, vestindo o colete com a caveira desenhada, ajustando o coldre na cintura, pegando sua arma e colocando a máscara que impunha medo a qualquer um que não estivesse na linha.
Sobe na motocicleta, escondida nos fundos da casa para preservar sua "identidade secreta". O som do motor acelerando parecia injetar um novo vigor em suas veias; era como música para seus ouvidos. O ronco da moto já espantava muitos criminosos, mas ele acelerava ainda mais, pronto para persegui-los onde quer que fossem.
Sai pela garagem em alta velocidade, em direção à sua missão.
Embora o horário de pico em São Paulo estivesse diminuindo, o trânsito ainda era inevitável na grande metrópole. Para o justiceiro, isso só aumentava sua adrenalina, forçando-o a correr pelas escadas, praças e calçadas.
Seu trabalho paralelo lhe dava prazer e satisfação. Ver o sangue de delinquentes jorrando era uma forma de vingança pela morte de sua esposa. Cada vez que puxava o gatilho, enforcava, socava, chutava ou esfaqueava algum criminoso, lembrava-se dos belos olhos castanhos de Bruna e daquela noite em que queria ficar com ela, mas ela estava com fome.
Sentia um peso de culpa em seus ombros. Por que não havia negado o pedido dela? Por que não ficou para salvá-la ou até morrer junto? Por que se demorou no mercado com aquela fila interminável? Maldita hora em que marcaram aquela viagem! Se soubesse que seria a última vez que a veria, nunca teria saído da cidade.
Mesmo com algum congestionamento, chegou em menos de vinte minutos ao local indicado por Rodrigo. Para sua surpresa e alívio, os dois garotos estavam cercando uma jovem. Um tentava puxar sua bolsa, enquanto o outro a ameaçava e abafava seus protestos.
Aproximou-se silenciosamente, anunciando:
- E aí, vítimas da sociedade. O que estão fazendo?
- Caralho, é o justiceiro! - exclamou o garoto da bolsa, apressando-se.
Thiago, com sua excelente mira, disparou na perna esquerda do fugitivo. Em seguida, atirou mais sete vezes, aproximando-se a cada estampido até que o corpo do bandido estivesse sem vida.
Virou-se para enfrentar o outro, mas viu que ele estava segurando uma arma apontada para a cabeça da garota. Reconheceu o rosto da vítima e seu corpo estremeceu.
"Merda, essa pirralha de novo!?" - esbravejou mentalmente.
Por alguma ironia do destino, os dois sempre se cruzavam. Ainda não conseguia acreditar que havia perdoado Daniel.
Aproximou-se com a arma apontada para o bandido.
- Se continuar se movendo ou fizer um gesto suspeito, eu mato essa vadia! - ameaçou.
O criminoso, tremendo, levantou as mãos em rendição.
- Sem problemas, eu me rendo. Só não a machuque! - implorou.
O transgressor riu, achando-se vitorioso. Soltou a garota e avançou em direção ao "herói". De maneira inesperada, disparou quatro vezes contra o peito de Thiago. No entanto, as balas não tiveram efeito.
- Que merda...?
Antes que pudesse terminar a frase, Thiago o agarrou pelo colarinho da camisa e o ergueu do chão.
- Eu sabia que você ia fazer isso... Seu imbecil! - comentou antes de tomar a arma do bandido e disparar contra sua cabeça.
Pâmela gritou em desespero, com gotas de sangue no rosto.
- P-por que você fez isso? - perguntou com os lábios trêmulos.
- De nada, a propósito! - respondeu cínico. - Esses vermes não merecem viver. São a escória da nossa sociedade. - Pegou-a pelo braço e a conduziu em direção à moto. - Onde você mora? Vou te levar para casa!
Ela murmurou o endereço e, felizmente, Thiago já conhecia o local. Fez com que ela se agarrasse a sua cintura e correu até a porta da casa dela.
Despediu-a e acelerou para se despistar.
Pâmela entrou em casa aos prantos. Seu pai já estava de pijama, mas ainda estava acordado na sala. Ao ver a filha naquele estado, perguntou sobre o que havia acontecido. Ela estava em choque, incapaz de explicar o ocorrido, apenas gemendo.
Fábio chamou a esposa, atônito. Ela apareceu de camisola, com o rosto coberto de creme. Embora estivesse prestes a reclamar por ter sido acordada, ao ver o estado da filha, a preocupação tomou conta.
Ofereceram água com açúcar, calmantes e abraços, mas Pâmela não conseguia responder.
Thiago já estava de volta em casa, tentando ser o mais silencioso e discreto possível. Rodrigo ligou novamente para parabenizá-lo pelo trabalho. Desligou o telefone ao ouvir batidas na porta. Ao abrir, foi surpreendido por um pedido inesperado:
- Senhor Thiago, peço desculpas por incomodá-lo a essa hora, mas o senhor disse que poderia ser chamado para um favor. Precisamos que nos leve ao hospital. Nossa filha está em estado de choque e não sabemos o que aconteceu.
- Claro. Só me deixe colocar uma roupa. - respondeu, vestindo apenas uma camisa velha e uma cueca. Fechou a porta e correu para o quarto.
Vestiu-se rapidamente, tirou o carro da garagem e estacionou em frente à casa dos vizinhos. Pâmela saiu enrolada em um cobertor, sendo amparada pela mãe. Ao vê-lo, se apavorou, mas lembrou-se do que ele havia dito no almoço.
"Vítimas da sociedade..." - recordou. O justiceiro usou as mesmas palavras. O que eles teriam em comum?
Entraram no carro e chegaram ao hospital rapidamente. Fábio apressou-se com a filha até a recepção, mas a responsável parecia não dar muita atenção ao problema. Era uma situação comum no Sistema Único de Saúde do Brasil.
Thiago, irritado, bateu com força na mesa da recepcionista, fazendo-a esbugalhar os olhos.
- Ela acabou de sofrer um assalto e você precisa atendê-la. AGORA! - exigiu.
- Vou ver o que posso fazer. - assustada, a enfermeira pegou os dados de Pâmela e começou a digitá-los no computador, sem encarar os presentes.
Não muito tempo depois, a notícia já circulava pela mídia: "Justiceiro de São Paulo impede morte de garota". A descrição da vítima coincidiu com as características de Pâmela. Fábio logo percebeu o que havia acontecido. O repórter forneceu detalhes do incidente com base em depoimentos de testemunhas. O público idolatrava o justiceiro, chamando-o de herói.
- Não posso acreditar que esse filho da puta fez isso... - murmurou para Maria e Thiago, enquanto sua filha estava dentro da sala de consulta.
- Ele a salvou. - Thiago rebateu.
- Mas poderia ter matado sem a presença dela! Por culpa dele, ela está assim. - Fábio resmungou entre dentes.
- Pelo menos, esses caras não farão mais mal a ninguém! - insistiu Thiago.
- Senhor Fábio, - chamou o médico. - Pâmela já pode ir para casa. Foi só um susto. Darei uma semana de descanso para ela do trabalho e dos estudos. Distraiam-na com outras atividades. Se dentro de sete dias não voltar ao normal, tragam-na novamente.
Os pais agradeceram e voltaram para o carro de Thiago. Maria sentou-se com a filha atrás, apoiando sua cabeça em seu peito e a acariciando.
Thiago dirigiu calmamente e deixou-os em casa. Durante o trajeto, não pôde deixar de notar, pelo retrovisor, que mesmo com o rosto vermelho e inchado, Pâmela ainda era bonitinha. Repreendeu a si mesmo por fazer tal consideração sobre uma moça tão jovem e que acabara de conhecer.
Ao chegarem, Maria se despediu:
- Boa noite, senhor Thiago. E obrigada! Prometo que vou te pagar o dinheiro da gasolina quando receber.
- Não precisa... - respondeu ele, rindo sem graça.
- Eu insisto! - Maria acena e se dirige à porta, carregando a filha.
Com um pensamento silencioso, Thiago refletiu: "E a semana está só começando..."
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