CAPÍTULO 04
— Ela está começando a ficar quente. — comentei. Olhei para Abul que macerava algumas ervas secas com um pouco de água. — Desde quando você anda com esse tipo de erva no bolso? — ele sorriu ainda concentrado no que está fazendo.
— Sempre que viajamos para algum lugar onde sei que posso precisar. — ele aponta para a cobra morta. — Entre todas as espécies de cobras, as mais letais estão nessas areias, fora escorpiões e outros bichos peçonhentos. — ele rasga um pedaço de tecido da roupa dela, e usa o pedaço de pano para colocar a mistura que fez. — Abra a boca dela. — fiz o que pediu, e ele apertou o pano fazendo com que um líquido verde escorresse dentro da boca de Ayra. — Isso vai manter a febre baixa e deixar a circulação sanguínea lenta, assim o veneno não se espalha com facilidade, assim ela terá chances de sobreviver. Apesar de não saber o quanto desse veneno ela ingeriu e o corpo já absorveu. — ele me olha. — O que faremos agora? — é a pergunta que estou me fazendo desde que a encontramos, e não tenho a menor ideia do que fazer.
— Ela está bem longe de casa. — pondero, ele concorda. — Vamos levá-la para o acampamento. Se ela sobreviver até lá, eu vejo o que faço.
Levantei o corpo de Ayra e o apoiei na pilastra, Abul o segurou enquanto eu montava em meu cavalo e com a ajuda dele consegui colocar o corpo de Ayra de frente para o meu. Passei uma corda amarrando-o junto a mim. Isso ajudaria a mantê-la segura para o longo trajeto que faríamos.
Já estávamos cavalgando há duas horas, e o trajeto se tornou mais longo já que não podíamos ir na mesma velocidade que viemos. E os pensamentos não paravam de rondar na minha cabeça. O que ela tinha ido fazer ali?
Quem havia feito isso com ela?
Ou foi tudo coisa do acaso?
Eram muitas dúvidas e questionamentos, que no momento não teriam respostas.
Tudo estava muito estranho. Tinha três cavalos, e somente Ayra e um guarda fora encontrados. E pela falta do outro corpo eu não acreditava que tivesse sido um acidente. Não sabia se a maldade que emanava de minha mente, era a culpada por não me permitir acreditar em acidente.
Mais duas horas de cavalgadas chegamos ao nosso acampamento. Os servos se aproximaram assim que nos viram chegar.
— O que aconteceu? — a pergunta veio de Melissa.
— Depois explico. — Abul me ajudou a descer e assim que desamarraram as cordas que segurava o corpo de Ayra, a peguei no colo. — Vá buscar o Mohamed, e mande ele ir a minha tenda.
— Sim, senhor. — fui em direção a minha tenda.
Assim que coloquei seu corpo sobre a cama e tirei o véu que cobria seu rosto Melissa se debruçou sobre Ayra.
— Meu Deus, é a Ayra. O que aconteceu? — ela me olhou incrédula. — O que você fez com ela? — tirei minha blusa que estava suada e suja.
— Porque acha que eu fiz algo? — ela revirou os olhos.
— Porque você disse a ela a alguns dias que seria bom ela morrer para que a égua fosse só sua? — eu nem lembrava mais disso. Acabei rindo.
— Você tem uma memória de elefante, mas seja lá o que aconteceu, não fui eu. Já a encontrei assim, na verdade quem a encontrou foi Abul. — falei me sentando e começando a tirar as botas. — E se eu tivesse feito algo a ela, não seria inteligente ter trazido ela, não acha? — Melissa ponderou e acabou concordando. Mohamed entrou em minha tenda.
— Mandou me chamar?
— Sim, quero que aplique soro antiofídico nela. — todos me olharam. — O que foi?
— Ele é veterinário. — Melissa falou.
— Eu sei. — respondi o que era óbvio. Coloquei meus sapatos de lado.
— Ela precisa de um médico e não de um veterinário. — Melissa continuou a falar.
— O hospital mais próximo levará horas para chegar, ela pode não resistir até lá, já foi sorte chegar até aqui viva. — respondi a Melissa que começava a chorar. Encarei Mohamed. — Consegue fazer isso ou tenho que providenciar outro veterinário para meus animais? — ele pareceu sair de um transe.
— Vou pegar tudo que preciso. — ele saiu da tenda.
— Acredito que não tenha sido um acidente o que aconteceu. — falei me aproximando da cama. — Mas só vamos ter certeza quando ela acordar.
— Porque alguém faria isso com ela? — Melissa estava chorando. — Ela é tão legal.
— Não sei, mas vamos descobrir.
Pedi para que Melissa saísse, e que chamasse Nadia. Dei ordens para que ela tirasse as roupas de Ayra para que pudesse ser limpa, e para que ela procurasse por alguma picada, ou machucado que indicasse algo. Quando ela informou que não havia encontrado nada, eu tive a certeza que ela havia sido envenenada. Entrei junto quando Mohamed voltou. Ele trouxe diversos aparelhos que eu não fazia a menor ideia para que servia. Ele explicou que antes de qualquer coisa colheria um pouco de sangue para fazer alguns exames e então a deixaria no soro.
— Eu costumo trazer alguns exames rápidos. — ele mostrou uma caixinha com várias ampolas. — Aqui já poderemos descartar algumas possibilidades.
Após aplicar o soro antiofídico de forma intravenosa ele deixou um frasco de soro fisiológico pingando lentamente, e começou a fazer os testes com o sangue que havia colhido, e na terceira ampola que testou, ele sorriu e mostrou o que tinha acontecido com o sangue.
— É veneno de cobra. — afirmou o que para mim era obvio.
— Isso eu já sabia. — pontuei.
— Mas não há picada senhor. — concordei com ele, sabendo que esse detalhe mostrava que alguém tentou matá-la.
— Faça o que tem que fazer para salvá-la. — Mohamed injetou mais uma ampola no frasco de soro, e voltou a mexer em sua maleta.
Sai da tenda dando de cara com Abul e ele segurava um cantil de água nas mãos.
— Estava no cavalo dela. — ele levantou um copo e mostrou um liquido turvo. — Envenenaram a agua. Se realmente foi somente por via oral, ela pode ter vomitado e expelido maior parte do veneno, o que é bom. — cheirei o copo e não tinha cheiro nenhum que pudesse dar algum indício de ter alguma substância na água. — Pretende avisar alguém que ela está aqui?
— Não. — falei categórico. — Até descobrir o que aconteceu, não fale nada a ninguém, e avise a todos que não quero comentários sobre o assunto, se alguém falar qualquer palavra sobre terem visto que chegamos com ela, será a última coisa que falaram, porque não terão mais língua assim que eu descobrir. — ele concordou. — Guarde isso, poderemos precisar.
— Sim senhor.
Ayra passou parte da noite tendo febre e alucinações, segundo Mohamed era normal, porque era a corpo se livrando da toxina. Os sinais vitais dela estavam bons apesar da pouca assistência. Eu pensei algumas vezes se não seria melhor levá-la para a cidade, mas ao que tudo indicava alguém havia atentado contra sua vida. Até descobrir quem, ninguém era digno de confiança.
Por volta das quatro da manhã a febre baixou e não voltou mais, o que era um bom indicativo. Mohamed havia falado com um médico especialista por telefone, o que somente orientou mantê-la hidratada e que nas próximas horas ela deveria acordar, aí poderia ter noção se haveria necessidade de ir até um hospital.
— Senhor. Vai acompanhar a largada? — Abul me perguntou assim que entrei na tenda da cozinha. Concordei.
— Irei sair em meia hora. — ele me entregou um mapa que fez.
— Aqui está, é somente ele seguir o que está aqui, e não terá problemas.
— Onde estão os cavalos que trouxemos?
— Estão em uma das baias extras. Somente um deles está bem estressado.
— Cuide de tudo aqui e me mantenha informado, voltarei assim que possível.
— Sim senhor. — ele saiu e fui me sentar ao lado de Melissa que comia algo.
— Você está péssimo. — ela falou. — Quem diria que você ficaria assim por ela. — ela riu.
— Estou assim porque não dormi, e não porque estou preocupado, não foi a mim que tentaram matar. — não dessa vez pelo menos. Pensei enquanto pegava uma maçã e mordia. — Ou esqueceu que na noite passada alguém me incomodou na madrugada? — ela revirou os olhos. — São duas noites sem dormir direito.
— Você poderia ter dormido mais pela manhã ontem quando acordou.
— Poderia. — pensei que se tivesse feito isso, eu não teria encontrado Ayra.
— Eu sei que vim para ir com você, mas prefiro ficar. — ela falou, eu sorri.
— É até melhor, assim quando ela acordar terá alguém que ela conheça.
Eu sentia minha consciência indo e voltando. Ora numa escuridão profunda, ora tomando ciência de que ainda estava viva. Nesses momentos rápidos de lucidez, eu ouvia vozes e sentia meu corpo todo dolorido, mas não conseguia me mexer. Tentei abrir os olhos, mas as pálpebras estavam pesadas, e eu acabava caindo na escuridão novamente.
Quando estava num momento de lucidez senti um ardor em meu braço, e um gemido de dor acabou escapando da minha boca. Então senti mãos em minha cabeça, e quando consegui abrir os olhos, a visão estava turva. Fechei os olhos sentindo incomodo.
— Ela vai lembrar de algo? — ouvi uma voz perguntar.
— Talvez, não sei. — eram vozes de mulheres. Quando abri os olhos novamente e minha visão focou em um rosto, senti medo ao não reconhecer a mulher a minha frente. Tentei me afastar, mas meu corpo todo doía. — Calma, está tudo bem.
— Ela não sabe quem você é. — a outra voz falou e outro rosto surgiu em meu campo de visão. — Arya, sou eu a Mel, fica calma você está bem. — seu sorriso era tão gentil ao falar comigo. — Você está segura. — a mulher que falou comigo antes eu não conhecia, mas Melissa sim.
Voltei a deitar e olhei em volta, tentando me localizar, mas estava cansada demais, e acabei dormindo novamente. Quando acordei me assustei ao abrir os olhos, o homem que estava perto eu não conhecia, mas a voz que ouvi era conhecida.
— Como ela está? — procurei pelo dono da voz e o encontrei mais ao lado. Mustafá me encarava.
— Eu estou... — comecei a falar, mas senti minha garganta arranhar de tão seca que estava. — Bem...
— Todos que estiveram a beira da morte quando acordam falam isso. — ele falou e voltou a olhar para o tal homem. — Então? — o homem pareceu querer rir, mas disfarçou.
— Ela está bem, irá sentir algumas dores nos membros e articulações, mas irei manter analgésicos e vai melhorar. — sorri em agradecimento.
— Obrigada. — falei baixo. — Farei questão de lhe retribuir todo o cuidado que teve comigo. — Mustafá riu.
— Agradeça a mim, afinal eu pago um belo salário para manter meus animais bem cuidados. — eu o encarei e olhei para o homem. — Mohamed, é meu veterinário. — ouvi a risada de Mustafá ao meu lado e ignorei.
Eu sabia o que poderia ter acontecido comigo se ele não tivesse cuidado de mim, independente de sua profissão e especialidade, eu era grata.
— Obrigada do mesmo jeito. — o homem sorriu, levantou se despedindo, e saiu. — Você foi indelicado com ele. — tentei sentar, mas as dores eram fortes, então foi impossível não gemer para sentar.
— Aqui. — Mustafá me entregou um copo e dois comprimidos. — Para as dores.
Tomei água primeiro por que minha garganta parecia ter navalhas toda vez que eu falava. Mustafá olhou os comprimidos na minha mão e o copo vazio. Ele balançou a cabeça e pegou uma garrafa de água, completando novamente o copo.
— Já que está bem, agora vai me dizer o que aconteceu? — ele puxou um banco e se sentou ao meu lado.
— Eu não me lembro. — menti. Lembrava de algumas coisas vagas e não falaria nada até ter certeza. — Como vim parar aqui?
— Caiu de um tapete voador. Ou era uma vassoura? Agora eu também não lembro. — ele falou sério e me encarou. — Se você não me falar o que sabe, porque eu tenho que falar o que sei?
— Só estou confusa. — e realmente estava. — Sai para cavalgar, e... — as lembranças estavam confusas, tinha uma cobra, o homem que eu não conhecia.
— Você está longe de casa, não é possível que tenha cavalgado toda essa distância.
— Estou com fome. — desconversei. Mustafá ficou me encarando por um tempo em silêncio.
— Vou aproveitar enquanto come e avisar sua família. — ele se levantou.
— Não! — falei rapidamente. — Por favor, não faça isso. —ele sorriu.
— Você vai comer e depois vai me contar tudo o que aconteceu. — concordei.
Melissa veio junto com uma mulher que se chamava Nádia, depois de contar o que estavam fazendo no meio do deserto, elas me ajudaram a tomar um banho. Foi uma das melhores sensações que já senti. Eu sabia que a qualquer momento Mustafá iria querer saber o que aconteceu. Quando estava terminando de me vestir com uma muda de roupa que deixaram em cima da cama, Nádia entrou trazendo uma travessa com comida. Eu realmente estava com fome, mas tão logo eu engoli, senti uma forte dor.
— De preferência aos líquidos. — ela falou. — Seu organismo ainda está sensível.
— Obrigada. — tomei uma sopa, e suco. Ela ficou me olhando.
— Fico feliz que as roupas tenham servido. — olhei para o vestido simples e sorri. — Não é algo que esteja a sua altura, mas ao menos serviu.
— Ele está perfeito, e, obrigada por ter me emprestado. — ela concordou.
— Quando estiver pronta pode ir lá para fora a noite está fresca por enquanto.
— Obrigada. — agradeci, e ela saiu.
Sair dali significava ter a tal conversa com Mustafá. Mas ela disse que a noite estava agradável, então era bom eu conversar logo com ele, porque afinal já tinha se passado algumas horas e meu primo estaria a minha procura. Acabei rindo em imaginar o desespero de Haidar, ele deveria estar a ponto de matar alguém. Era bom que ele ficasse mesmo, afinal eu quase morri, e tudo graças a quem ele contratou.
Comecei a ouvir vozes e som de música. Respirei fundo e sai vendo a fogueira, e pelo menos por hoje eu aproveitaria a noite como qualquer outra pessoa, e agradeceria a Allah por ter poupado minha vida.
Amanhã eu ligaria para Haidar.
Primeiramente quero agradecer a todas orações por meu irmão. Mas na quarta feira dia 5, ele descansou. Obrigada a todos, pelas orações e mensagens.
Sei que Deus ouviu a cada uma, mas sEus planos eram outros. E não cabe a mim questionar, tenho aprendido muito nesses últimos dias. Ficarei essa semana em off. Se Deus assim permitir, semana que vem eu volto. Obrigada mais uma vez. ❤
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