11 | sem tapete
Oi, oi, incomunzetes do meu coraçãoooo!!! Como foi o mês de vocês??? #momentoretrospectiva Espero que bom! Aqui foi inesperadamente corrido, mas por causa de coisas boas, então alegria!
Muito, muito, muito obrigada mesmo a quem acompanha e comenta, sério 🥺 é super importante pra mim e fico bobinha com os comentários!
Só lembrando que esse capítulo é narrado pelo Jungkook (o CD é o emoji dele!)
Boa leitura e, se gostarem, comentem, porque amo saber o que vocês estão achando!!
»»💿««
acostumado à visão elevada
sempre rei da minha torre de tapetes
tenho minha hegemonia questionada
e sou atulhado de lembretes:
um, dois, três
sou capaz de perder minha tapeçaria
uma de cada vez
Minha soberania é uma farsa, erguida em letargia
como forma de me tapear
e agora, sou nada mais que um Alladin
sem a habilidade de voar
💿
Acordo sem Jimin na cama. Depois de enrolar nos lençóis, deixando todo tipo de pensamento corroer minhas entranhas como os vermes que roeram as frias carnes do cadáver de Brás Cubas (não li, só Jimin que tentou me seduzir a ler com a dedicatória que, tenho que admitir, é bem divertida), rolo para fora da cama e me deixo demorar no banheiro também (nunca fiquei com os dentes tão limpos). Em vez de começar o dia com disposição, tenho é medo de onde ele vai me levar.
No fim, acho que foi só eu me torturando, porque quando desço para cozinha, Jimin está lá tomando café e conversando com meus pais como se esse fosse seu habitat natural: comer e comungar com pessoas de meia idade. Não dá para ver nada de diferente em sua expressão: nem desagrado, nem desconforto, nem nada. Nadinha. Está com a felicidade convencida de sempre, o ar de eterno controle sobre qualquer situação.
Talvez, ele só não estivesse na cama porque acorda cedo. E, se acordou cedo, não tinha por que ficar acordado nos braços de um namorado que é de mentira. Nenhuma das teorias aterrorizantes (e mirabolantes) que eu me deixei remoer se justifica.
Respiro fundo e tento voltar a ser o Jeon Jungkook que sempre fui: direto, com a profundidade de um pires, cérebro liso como um peito de frango, incapaz de se preocupar com qualquer coisa que não seja chegar a tempo na academia e lançar música mediana.
— Bom dia, dorminhoco — minha mãe diz.
— Bom dia, dorminhoco. — Segue meu pai.
— Bom dia, dorminhoco. — É Jimin quem finaliza, com um sorriso insuportavelmente convencido e uma tranquilidade zombeteira.
Verifico o relógio de parede todo estampado de borboletas que minha mãe mantém na cozinha. Reviro os olhos e vou buscar uma caneca (é de Sonic, do meu primo mais novo; como nunca fui fissurado em nenhum desenho, ninguém nunca soube qual caneca comprar para mim) antes de sentar à mesa. Minha mãe me serve de café com leite.
— São sete da manhã, como eu posso ser um dorminhoco assim?
— Dormindo muito, ou estando sempre disposto a dormir — fala Jimin.
— An?
— Essa é a definição de dorminhoco. É assim que se pode ser dorminhoco.
— Mas eu não dormi muito.
— Dormiu mais que as outras pessoas nessa cozinha.
— Vocês que são estranhos! Eu hein, metabolismo de velho.
— Você que é velho — minha mãe interrompe. — Eu tô é na flor da idade.
— Estamos, querida — meu pai ajunta.
Deixo os dois se divertirem com a juventude deles. Olho para Jimin, mas ele não parece disposto a reivindicar a própria. Sorve seu café em bicadas e se encolhe dentro de um pesado poncho de lã, todo decorado com padrões geométricos coloridos. A alma de velho está lá mesmo.
Não demora muito para todo tipo de comida aparecer na mesa: pães, queijos, requeijões; bolo, bolo de chuva, broa; geleias e manteigas. Típico dos meus pais. E claro que apenas uns dois itens foram feitos ou comprados por eles; a maioria é presente de vizinho que fez ou comprou demais.
Eu como que nem um dragão. Talvez que nem uns três dragões. Não é que meu apetite na capital seja pequeno, mas na casa dos meus pais parece que fica cinquenta vezes pior. Sempre tenho fãs percebendo meus quilos a mais quando volto (nisso, invejo Jimin, que come e engorda sem culpa, e sabe o quão delicioso é com qualquer peso).
Meu pai é que nem eu, ou eu sou que nem ele: um aspirador de comida. Minha mãe não aguenta comer quando acaba de acordar, então vai ser quase hora do almoço quando ela decidir beliscar alguma coisa. Jimin come que nem um passarinho.
— Sem fome? — pergunto.
— Com uma fome moderada, estou comendo, não vê? — Levanta uma das sobrancelhas e ajeita os óculos. — Você fagocitou sua comida, é injusto comparar nossas velocidades.
— Então, meninos, planos para hoje? — minha mãe interrompe, porque já ouviu eu ter esse tipo de discussão com meu irmão, que resulta sempre numa grande briga (por parte do meu irmão, não sei por quê. Nunca me estressei). Jimin não brigaria por causa disso, muito menos eu. Ou meio menos eu. A vontade de provocá-lo e roubar sua atenção para mim é gigante, e mordo os lábios para me conter.
— Jungkookie não queria ir atrás do tio Daejin? Acho que hoje ele tá em casa. — Meu pai mata de vez a possibilidade de voltar à discussão com Jimin.
— Ah, é, tem isso... — concordo, mas olho para Jimin. Não sei se ele gostaria de ir comigo, mas também não sei se é decente deixá-lo sozinho. É complicado, isso de ter consideração demais por alguém, de me apaixonar de verdade. Eu fazia todas as considerações que todos meus ex-namorados gostariam que eu tivesse feito por eles; mas logo para Jimin, que não ligava para nenhumazinha.
— É para melhorar seu álbum, certo? — Jimin tombou a cabeça. — Devia ir. Também preciso trabalhar no planejamento de uns capítulos.
Apesar de ele não ter mencionado especificamente isso por estar na frente dos meus pais, eu sabia que ele estava me lembrando: carreira acima do relacionamento. Até porque só nossas carreiras existem de verdade, e o relacionamento é só um propulsor, um degrau para chegarmos mais alto.
Apesar da broa quentinha e doce, minha boca amarga. E, mesmo depois de um gole de café com leite, continua seca. A macarronada imaginária da minha mãe pesa a barriga, e sei que estou incomodado. E quero que seja só preocupação: de deixar Jimin sozinho depois do dia anterior; de estar sendo sem consideração indo resolver só os meus problemas. Mas não, cada vez mais, os lembretes de que somos falsos me incomodam, como uma picada de mosquito que se coça demais.
— Tá bem — digo, porque não tenho justificativas para dizer algo diferente.
Antes, seguro a mão dele. Está quente, quase solto porque a minha está fria, mas logo ambas estariam ainda mais quentes que antes. O bom de estar na casa dos meus pais é que posso ser mais carinhoso e colocar na conta de não estragar nosso disfarce, nossa falsidade. O ruim é que não dá para fazer muito mais que isso também, seria constrangedor. Já basta eles fingirem que não ouviram a música "me come inteiro" e eu fingir que acho que eles não ouviram.
Jimin não recua, nem reclama, mas também não carrega a diversão de sempre. Na verdade, desde a premierè, suas expressões frente minhas investidas não são mais convencidas e divertidas: são meio neutras. Complicado, partindo do princípio que quero que se apaixone de volta.
De novo, começo a pensar mais do que deveria e do que é de meu costume. Então, depois de todos terminarem de comer, dou um beijo em Jimin, um abraço nos meus pais, e vou atrás do tio Daejin. Se eu acho que minha nova pegada com a música me deixa mais interessante, Jimin há de achar também, não? Aprendendo coisas novas, posso contá-las a ele. Coletar, embalar e presentear uma das novidades que tanto o seduzem e, então, convencê-lo a ficar comigo por mais e mais tempo.
Tio Daejin mora duas ruas para baixo. É difícil não achar a casa mesmo depois de tanto tempo (não pela fachada, mas pela falta dela); é a única com tanta bugiganga acumulada no quintal da frente que é difícil ver a fachada. Tio Daejin e a esposa, tia Hyeja, são ambos acumuladores natos, uma combinação perigosa. Mas os dois também faziam amizades como ninguém (talvez também fossem acumuladores de pessoas, mas não dá para guardar pessoas no quintal da frente), então sempre alguém leva algo para si de tempos em tempos ou, quando está atulhado demais, vem gente para organizar um bazar e esvaziar os cômodos.
Quando toco a campainha, vejo o característico bigode do tio Daejin aparecer por entre as tralhas. A voz meio fina e engraçada (ainda mais engraçada se comparada ao gigantesco tamanho dele) grita "OLHA QUEM CHEGOU, A ESTRELINHA DO BAIRRO". A única coisa que mudou nele foram os cabelos a menos e as rugas a mais. Tia Hyeja também está em casa, visto que logo grita "PARA DE GRITAR, HOMEM, DÁ PRA TE OUVIR SE VOCÊ FALAR NORMAL". A forma de comunicação do casal é grito desde que me entendo por gente, entre si e com os outros.
Além de careca, bigodudo e gritalhão, tio Daejin é meu guitarrista favorito. Tio Daejin mesmo, não Jimi Hendrix, não Slash, não Eric Clapton. Nem ao menos João Gilberto, que não parava de tocar na garagem (oficina durante o dia, local de ensaio durante a noite) do meu pai antes e depois da banda ensaiar. Tio Daejin quem me ensinou a tocar violão e guitarra, sob os protestos do meu pai baterista para que eu parasse de ser estrelinha e aprendesse a tocar bateria com ele (aprendi também, mas os instrumentos de corda sempre foram meus favoritos).
Todos os integrantes da banda do meu pai e, assim sendo, tio Daejin, tocavam por diversão. Não tinham público alvo nenhum, nem um gênero queridinho (o que enfurecia os amigos de outras bandas, todos roqueiros). O hobby generalizado era descobrir o que existia de novo no mundo da música. Se desse para tocar nos instrumentos que tinham, faziam questão de tocar; se não desse, tentavam fazer uma adaptação e, se falhassem, compensavam comprando vinis e botando para tocar baixinho ou nos intervalos, ou quando era forçada pelos vizinhos impacientes com o som a hora de petisco e cerveja.
Desse jeito, ouvi de tudo enquanto crescia: blues, jazz, bossa nova, todos os tipos de rock possíveis, country, trot, MPB, raggae, salsa, flamenco, música celta, indiana e por aí vai... Duvido que Jimi Hendrix conseguisse tocar Carlos Gardel no violão (até porque ia matar todos os argentinos de desgosto porque o violão nem é um instrumento principal no tango), mas tio Daejin consegue, talvez mais por insanidade do que habilidade.
Acostumado ao caos da infinidade de músicas do mundo, não tive vergonha nem medo de me encherem o saco quando virei um artista indie meio puxado para o pop. Eu poderia até fazer remix de EDM que ninguém me encheria o saco. É impossível colocar em palavras o quanto a banda do meu pai, em especial o dito cujo e o tio Daejin, fizeram por mim. E, por isso, volto agora a eles como uma criança o faria depois de tropeçar e ralar o joelho no chão.
— Ei, filho, ficou famoso e esqueceu que a gente existe? — tio Daejin diz após me estrangular com seu abraço de urso.
— Você sempre fala isso — respondo com dificuldade, a cara enterrada em mais de 100kg de tiozão.
— Você sempre esquece da gente.
— Acho que você que é carente demais.
— Talvez, a idade faz essas coisas.
Paro de ser esmagado apenas para ser conduzido entre a tralha (como uma espécie de trilha selvagem pós-apocalíptica) até a parte de dentro da casa, onde sou esmagado de novo, agora por uns 80kg de tiazona. Só depois de um café e uma broa (que reconheço ser a mesma do café da manhã lá de casa e agora sei quem foi a fornecedora), tio Daejin me puxa até o escritório-meio-oficina-meio-sala-de-música.
Não é fácil se localizar na bagunça, mas meus olhos logo se fixam na bela, brilhante e bem cuidada Gibson Les Paul vermelha do meu tio. Eu a pego. E eu sento numa cadeira para apoiá-la no colo e deixar os dedos correrem pelos acordes de seu braço. Não pedi nada, mas tio Daejin não briga, apenas deixa o bigode esconder o sorriso manso típico e acha um canto para sentar também.
— Mas me diz, tem algo que um senhor de idade como eu ainda tenha a ensinar para você? Talvez minha receita secreta de molho de cachorro quente?
— Não é secreta?
— É, mas sem filhos, resta passar pros sobrinhos perpetuarem a tradição.
— Não sou muito bom na cozinha — respondo. Tio Daejin não é meu tio de sangue e, portanto, me sinto no direito de fugir da responsabilidade moral de carregar a receita para frente. — Jinyong, filho do Jinwoo, que cozinha bem, né? Passa pra ele.
Tio Daejin me olha de baixo a cima, alisando o bigode. Sabe que é mentira, até porque minha mãe gosta de contar para o bairro inteiro o quão bem criou os filhos e, se tem uma coisa que a faria morrer de desgosto, é se fossemos incapazes de fritar um ovo. Eu e meu irmão interpretamos de jeitos diferentes: ele certamente é capaz de fritar um ovo, mas não muito além disso. Eu não entendo muito bem a dificuldade das pessoas em cozinhar, então se eu quero comer algo, faço. E gosto de comer mais coisas que ovo e arroz.
— Pelo menos meu amor pelo violão corre nas suas veias — ele suspira. — Mas realmente não sei mais o que te ensinar.
— Vim só pra conversar mesmo, tio, não precisa me ensinar nada.
Ele parece ainda mais incrédulo do que quando eu me recusei a aprender a receita do molho. Sinto as pontinhas da orelha aquecerem.
— Você, só vindo conversar?
— É.
— Tem certeza?
— Aham.
— Absoluta?
— Sério, qual o problema? — pergunto, meio alto. Talvez, meio irritado. Tio Daejin abre ainda mais a boca.
— Problema nenhum...
— Mas?
— Mas o quê?
— Tem que ter um "mas"! Olha o jeito que você tá me encarando!
— Ah, Jungkookie... Cê sabe bem que você não é muito de conversar.
— Então o que a gente fez minha adolescência inteira?
— Você aparecia, tocava violão, ficava de olho na guitarra, e ia embora — responde. Meio que tenho lembranças de algo do tipo. — Jungkookie, você nem ao menos me pediu pra te ensinar, seu pai só te trouxe aqui um dia, você agarrou a guitarra pra nunca mais largar e ficou tocando umas coisas de doer os ouvidos até eu decidir te ensinar.
— É... Acho que eu era um adolescente meio esquisito mesmo.
— E é um adulto esquisito também. Ou era, sei lá. Agora até quer conversar, mas nem sei o que conversar contigo, meu filho! Primeira vez que tô nessa situação.
— Eu vim conversar sobre música...
— É? Por quê?
— Porque acho que preciso... Pra fazer música também.
— Mas você tá se virando bem, não tá? Sempre conto pro açougueiro que meu sobrinho é famoso.
— Acho que tô me virando... Mas não queria isso. Sei lá, só me virar na música. Queria fazer música. Tipo, uma música com um som diferente de agora, agora é tipo... Sei lá. Como se eu fizesse no automático.
— Não acho que é necessariamente ruim trabalhar com a música no automático... — Tio Daejin alisa o longo bigode com a mão, pensativo. — Se você esperar que as músicas caiam do céu, direto no seu colo, não dá pra viver com isso. Esperar a criatividade, o alinhamento das estrelas... demora tempo demais, ainda mais se for teu ganha pão. Seu pai é assim, por isso que acho que ele fez bem continuando com a oficina do seu vô.
Penso. De fato, seria horrível ficar paralisado na hora fazer música, nem consigo pensar como é. Ao mesmo tempo, sinto que sou fútil demais, raso demais. Não procuro inspiração no divino, mas também não a procuro nem em mim mesmo, nem nas coisas ao redor.
— Tio, você gosta das minhas músicas?
— Claro! Por que não gostaria?
— Verdade... Você gosta de tudo... — Suspiro. Nem sei se é bom, ou um elogio. Pelo menos, se meu tio gosta, sei que é música. Depois de pensar um pouco, completo: — Tio, você acha minhas músicas interessantes?
— Jungkookie, você não gosta desse tipo de discussão, lembra? Não gosta que nenhum de nós fale da sua música... Por quê?
— Porque preciso saber.
— Mas aí você vai ficar com a cara de cu e, depois, emburrado por uns dez dias! Se já quase não visita a gente sem estar rancoroso, imagine rancoroso!
— Tio, não vou ficar emburrado!
— Você acredita nisso?
— Não... — solto, e nós dois caímos no riso de repente. — Na verdade... Acho que vou ficar meio bravo. Ou talvez meio triste. Mas não por dez dias e não com você, só comigo. Por favor, tio Daejin! Eu aprendo sua receita secreta e passo pra próxima geração!
— Meu filho... Não se faz isso com um pobre homem que nem seu velho tio... — Suspira. — Deixa eu ver... Não sei se interessante é a palavra certa, Jungkookie. Tem um charme. Mas acho que... não acho sua música muito... Sei lá, inovadora. Diferente.
Se fosse o antigo Jungkook ouvindo isso, ele realmente não expressaria nenhuma emoção e vestiria uma cara de cu até processar o que sentia a respeito da crítica. E, bem provavelmente, ficaria mastigando com ódio aquelas palavras depois de entender que bateu mal.
Meio que quero ser o Jungkook de antes, porque meu peito dói, o estômago pesa e as bochechas queimam de vergonha.
— Mas meu filho! Todo mundo já fez tanta coisa, já tem tanta inovação... Não acho que seja um problema seu som ser parecido com os outros. A maioria das músicas é assim, na verdade.
É, mas não é como quero que minhas músicas sejam. Não era a música que o jovem Jungkook queria compor quando improvisou um estúdio fuleiro enquanto ajudava na oficina, em vez de entrar na faculdade como o irmão. Não era aquela a música que eu fiz e me garantiu os primeiros fãs; fãs o suficiente para eu acreditar que poderia ir para a capital fazer pequenos shows em bares e chamar a atenção de alguma gravadora.
Prendo a respiração. E entendo. Entendo por que minhas músicas não são diferentes. Já foram: meu primeiro álbum, "literal demais", foi diferente quando saiu. E estourou. E, a partir dali, tudo mais que eu fiz foi "literal demais"... Literalmente.
Perguntas enchem minha cabeça, parece que vai estourar. Por que me acomodei? Por medo do fracasso? Por pressão da gravadora? Ou só porque... tive preguiça de mudar?
Não consigo achar a resposta antes do meu pai irromper pela porta do escritório-meio-oficina-meio-sala-de-música. Vejo o alívio tomar a cara de tio Daejin. Eu até segui como o prometido: não fiz cara de cu, mas acho que a cara que fiz deve ter sido muito pior do que sequer imaginado.
— Temos um baterista e dois guitarristas aqui! — meu pai exclama. De trás dele, puxa um Junghyun resignado. — E um baixista preguiçoso! Chamando a Hyeja pro teclado, temos uma banda completa!
Sem mais nem menos, tio Daejin monta todos os instrumentos (óbvio que ele, o rei da tralha, tem não só uma banda, mas uma orquestra inteira espremida no quartinho; tudo doado pelo dono da loja de música do bairro quando a fechou) e o equipamento de som em velocidade recorde. Meu pai vai buscar dona Hyeja, que vem gritando que estava terminando o crochê dela, mas aceita rápido a mudança.
Meu pai e tio Daejin engajam em um debate fervoroso de qual música devemos tocar. Quando começam a sair demais da casinha, meu irmão dá seu ultimato:
— Se querem que eu toque, vocês podem escolher entre Knockin' on Heaven's Door, Let it Be, Wonderwall, Yellow, Smoke on the Water ou Stand by me. — Cruza os braços e dona Hyeja, atrás dele, concorda. — Nem pensem em Bossa Nova.
Ambos os tios malucos de banda suspiram e pegam os instrumentos. Nós nos arrumamos também. Tio Daejin dá os primeiros acordes de Knockin' on Heaven's Door e, a partir daí, tenho certeza de que os planos são tocar todas as músicas dentro do repertório do meu irmão e da minha tia, então a ordem nem é relevante.
Meu pai, como sempre, assume o vocal. Acho incrível sua estabilidade, dada a empolgação (ou melhor, brutalidade) com que atinge a bateria. Tio Daejin fica com as harmonizações, e a voz fina combina perfeitamente bem com a do meu pai. Eu me dou ao direito de cantar também, porque mais chato do que sou com a guitarra, sou com o microfone. Sempre fui o terror de qualquer karaokê, ainda cantando quando todo o resto estava pronto para ir para casa, ou bêbado demais para se levantar.
Consigo ouvir meu irmão resmungar "fominhas", mas tem um sorriso no rosto enquanto toca o baixo, devagar. O baixo também sempre combinou com meu irmão: grave, meio sério, tranquilo e confiável. A base dessa nossa casa cheia de malucos de todas as espécies. Eu que nunca fui muito que nem a guitarra, a não ser quando eu a pegava em mãos.
Ou, melhor, a não ser quando eu a pego em mãos. Depois de tanto tempo agarrado só ao microfone, esqueci essa sensação. A aspereza energizante das cordas contra o meu dedo, o prazer de, a cada vai e vem, construir, junto dos outros instrumentos, o som delicioso que sai dos amplificadores. A delícia que é ser parte de uma banda. Não sendo Jeon Jungkook, artista solo com uma banda de apoio, mas ser Jeon Jungkook, guitarrista da banda.
O tempo voa, só vejo o tanto ao final de Stand By My, quando todos se interrompem. O repertório acaba, mas sobra o calor gostoso em meu corpo, o sorriso no rosto, os calos nos dedos.
Sobra o êxtase, o êxtase que só a música poderia me dar.
-💿-
Soube que música era meu destino quando minha mãe veio me buscar na casa do tio Daejin depois da minha primeira lição de guitarra e disse: "misericórdia, nunca vi o Jungkookie com essa cara" (eu tava sorrindo). Quando me olhei no espelho, eu mesmo nunca tinha me visto com aquela cara.
Havia sinais, claro. Eu sempre abandonava o futebol na rua com as outras crianças quando via meu pai levantar a porta da garagem só para assistir a banda dele tocar, mesmo que a traição fosse gerar xingamentos e uma crise nas minhas amizades infantis. Tentava surrupiar o toca discos toda vez que ninguém estava vigiando. Admirava de longe a estante de CDs do meu pai, bem no alto para que eu não tivesse chances de colocar minhas mãos (sempre sujas, na época) neles.
Por isso que, enquanto tomo o café da tarde compulsório na casa do tio Daejin e da tia Hyeja, mando uma mensagem para Hoseok, pedindo que parasse de editar as músicas que eu tinha passado. Agora entendo ainda melhor o que ele queria quando me mostrou a crítica de Min Yoongi: ele me aceitou na gravadora por ter gostado do meu som, um som novo, e prometeu sempre me dar liberdade para testar o quanto eu quisesse. Mas nunca mais testei. Joguei fora a liberdade pela qual tanto insisti.
hoseok [16:11]
ih, broder, já to na mixagem
mas a gnt pode refazer!
só avisa a heeyeon vc pq isso vai atrasar o cronograma e tenho mto medo dela
mas assim, essas músicas q vc passou já tão boas dms, juro
olha, vou te passar a "sem tapete" q já mixei
ta do balacobaco
Meu coração acelera quando recebo o arquivo. Assim que despeço dos meus tios, com um sorriso que os assusta, atravesso a rua e sento no meio fio para escutar o áudio; sei que meu pai vai demorar horrores falando com tio Daejin na calçada, como se já não tivesse falado o suficiente. Junghyun, também acostumado, senta do meu lado.
Pego o fone que sempre levo no bolso e o coloco com pressa enquanto meu irmão resmunga que sou antissocial demais e resmungo de volta que é trabalho. Meus dedos formigam quando aperto o play.
É isso. "sem tapete" toca e me teletransporto para aqueles primeiros dias com Jimin, em que ele me parecia apenas cor e confusão. Todas as memórias ardem dentro de mim. E não, não é nada "literal demais". Literal, sim, mas não demais.
Hoseok está certo, a música é boa. Não exatamente o que quero fazer nas próximas, mas não preciso guardá-la também, representa bem o que eu era, e o que eu sentia.
Quero superar a vergonha que senti quando Jimin ouviu "parafraseei". E depois, quando eu mesmo ouvia. E quando pensava no Hoseok ouvindo. E, pior, quando lembrava que Yoongi ouviu. Quero mostrar que ainda tenho, dentro de mim, coragem de fazer algo diferente. Ser o músico que sonhei em ser e, por um momento, me iludi que era.
-💿-
Encontro Jimin deitado na espreguiçadeira, tomando um Sol morno do fim de tarde de inverno que faz os fios laranjas resplandecerem e a pele macia ser uma coletânea de luz e sombras. Está com o caderno apoiado nas coxas, mas seus olhos parecem perdidos nas páginas e sua caneta batuca o queixo. Até desse jeito, com o cabelo e o poncho bagunçados, com a expressão séria, é lindo. Lindo como se ninguém no mundo fosse sequer capaz de ser mais bonito que ele um dia.
E vê-lo ali, no quintal dos meus pais, não causa nem a falta de tapete, nem a macarronada. Causa um aperto no peito, uma mistura de ataque do coração e tristeza. Um medo. Estranho, porque gosto de vê-lo ali.
De tão distraído, só me nota quando sento aos pés da espreguiçadeira. Ele fecha o caderno e abre espaço ao seu lado. Escorrego até lá.
— Aqui tá frio, não quer entrar? — digo, e uso o mesmo frio como desculpa para passar meu braço ao redor de seus ombros e trazê-lo para perto. Ele me inspeciona como se todos meus atos fossem muito óbvios (provavelmente são).
— O clima me é agradável.
— Hm, sei. O que você tá escrevendo?
— Palavras.
— E o que são essas palavras? Livro novo?
— Talvez, é o que costuma acontecer com elas.
— É sobre o quê?
— Pessoas. Sempre é, não? Até quando não é, ou não deveria ser, ao menos. Nós, humanos, somos um tanto egocêntricos.
Respiro fundo e o encaro. Ele prende um riso sacana, mas pelo menos me deixa mais relaxado. É ruim acompanhar Jimin escondendo o jogo porque não gosta que saibam dele, mas a diversão dele é deliciosa quando o faz para irritar.
— Eu devia usar minha pergunta da semana pra isso?
— Você usou ontem — lembra, o olhar por trás dos óculos fulminantes e acusadores.
— Mas aquela contou?
— Todas contam — responde em um ultimato. Acomoda o caderno debaixo da bunda para deixar as mãos livres, e não consigo deixar de notar cada detalhe do ato. De como depois de meses, ainda me prende como se fosse a primeira vez. Pior, me prende com ainda mais determinação. — E a conversa de música com seu tio? Como foi?
— Foi ótimo! — falo, com uma sinceridade e empolgação que espanta não só a Jimin, mas a mim também. — Sei lá, tava meio em dúvida sobre o som que faço. Mas acho que tô no meu melhor momento agora. E ainda deu tempo pra tocar um tiquinho com o pai, o tio e o Junghyun.
— Parece ótimo.
— E eu tenho uma surpresa!
Espero de Jimin uma expressão malandra de alegria. Ele adora surpresas; fazer e receber. E eu a recebo, mas só depois de uns momentos de hesitação. Rápido, tão rápido que talvez tenha sido coisa da minha cabeça, mas não afastei meu olhar dele um segundinho que fosse (por motivos condenáveis).
Bem, não adianta pensar demais, até porque esse é meu grande charme: não pensar demais.
Agora, o que resta é lançar arqueologia. Meu aglomerado de sons diferentes e acidentais, todos resultado do calor arisco entre meus braços. Dessa vez, não vou sentir vergonha, só sinceridade. Dessa vez, não vou me acomodar, e sim usar como uma forma de fazer melhor na próxima. Fazer diferente. Fazer como o eu de antes sempre quis.
Dessa vez, vou ser sincero. Com o que sinto também. E, quem sabe, Jimin perceba que todas as palavras sobre nosso amor de mentira são de verdade.
💿
❧luzinha quer ser casadinha☙
@jungkookamoreterno
vou ter q cancelar os jikook n pensam nos solteirosssss!!!! ai deussssss sou tão triste e sozinhaaaaaaa e eles não param de postar stories com a fml do jk misericordia PAISSSS imagina eles com uma CRIANCINHAAAA
ethan está lendo 2H1B
@ethanluvsjk
em resposta a @jungkookamoreterno
AMIIII! LÊ DOIS HOMENS E UM BEBÊEEEEEE!! ESSA FIC JIKOOK É TUDO, BEM FAMÍLIA, BEM CASADINHOS!!!!
❧luzinha quer ser casadinha☙
@jungkookamoreterno
em resposta a @ethanluvsjk
mds pq vc n falou antes????? vou ler agrrrrrrrrrrrr
ethan está lendo 2H1B
@ethanluvsjk
em resposta a @jungkookamoreterno
EU FALEI!!! MAS VC NUNCA LÊ AS FICS QUE EU RECOMENDO
❧luzinha quer ser casadinha☙
@jungkookamoreterno
em resposta a @ethanluvsjk
leio simmm! vc q lê rápido demais!!
»»💿««
Eeeeeeeeeeeeeita que o Jungkook vai se declarar por música!! (quem poderia imaginar? hushaushasu) Aliás, passo mal com vocês falando que o Jungkook se estrepou por estar apaixonado pelo Jimin kkkkkkkkkkkkk (obs cirúrgica, se estrepou mesmo!)
Ah, não esquece de deixar seu votinho! 💜
Qual foi sua parte favorita? Adoro o sonso do Jungkook redescobrindo o amor dele pela música, sério!!
Ahhhh! Lembrando que a rede social na qual sou mais ativa é o instagram (sou a callmeikus lá também) e posto o dia a dia escrevendo fanfics!
Queria muito muito mesmo agradecer por terem acompanhado Incomum Acordo esse ano e desejo um maravilhoso Natal para vocês e quem vocês amam; além de um incrível ano novo 💜 Vocês deixaram meu ano melhor, com certeza!!
Beijinhos de luz, amo vocês, e até sexta dia 03/01/2025 às 19:00!
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