09 | macarronada platônica
Oi, oi, incomunzetes!!! Como vocês estão??? Espero que bemmmm, amo Incomum Acordo e amo o fato de vocês estarem lendo!
Ah, esse capítulo é programado, tá bem? Nesse exato instante devo estar comemorando meu casamento com a @mulherdaminhavida. Mas quero ver os surtos quando eu olhar aqui de novo porque acho que esse cap vai render surtos, hein!!
Só lembrando que esse capítulo é narrado pelo Jungkook (o CD é o emoji dele!)
Boa leitura e, se gostarem, comentem, porque amo saber o que vocês estão achando!!
»»💿««
sinto as entranhas pesarem, malditas
salpicadas com aquela sensação gostosa e aflita
de macarronada de domingo
você sabe, nunca aprendi a me conter,
sempre paro de comer
depois da hora, da hora.
E em tudo que eu era contido,
essa habilidade tenho perdido
e pensar que isso me deixa despido
enquanto te vejo tão vestido,
sem nenhum empanzinamento,
fico sem alento,
vísceras em laço.
Vou te convidar pra um almoço
quem sabe assim
seu estômago também vira um preguiçoso
💿
Penso se devo interromper. Não que tenha algo de importante acontecendo: tudo é bem banal, rotina do dia a dia. Talvez por isso eu não tenha certeza se posso interromper. É como atrapalhar um ritual.
Sungjin afina sua guitarra como se ela não estivesse sempre obsessivamente afinada. Tem coisa que só o ouvido dele pega, e é chato com afinação não só com a guitarra dele, mas com todos os instrumentos da banda. Jaesung, por exemplo, brinca com as cordas de seu baixo e evita contato visual com Sungjin, que deve estar pronto para reclamar sobre a corda G. Sempre a corda G.
Yeri lustra o saxofone, também como sempre. Só não a coloco no mesmo nível de obsessão que Sungjin porque pelo menos ela não persegue os outros. Sooyoung só gira as baquetas entre os dedos, com cara de tédio.
Nesses dois anos que calhei de trabalhar com eles, o pré-show é sempre assim. Não sei se devo quebrar um silêncio tão milimetricamente construído.
— Nervoso com a apresentação? — Sungjin interrompe com uma expressão de desagrado. Não me incomoda, porque raro mesmo é vê-lo com um sorriso na cara. — Bom se recompor, hein? Aquece a garganta e faz um polichinelo que passa.
— Mas Jungkook nem é disso — Sooyoung devolve, mas o assunto parece irrelevante frente às baquetas. — Achava que ele nem conseguia ficar nervoso, na real.
— Mas gente, vocês não viram? — Yeri entra na conversa com seu tom conspiratório. Yeri é fofa, de aparência e de tom de voz. É um perigo, porque tem o maior coração peludo. — Ele tá de namoradinho novo, né? Deu o que falar. Já brigou com ele, Kookiezinho?
— Eu não brigo com ninguém — respondo.
— Tá, tá. — Ela espana o ar em sua frente. — Ele já brigou com você, então?
— Jimin não briga com ninguém.
— Eu sou fã, pega um autógrafo pra mim — Jaesung pede, sem parar de dedilhar o baixo. Só assim para ele dar um sinal de vida mesmo.
— Então por que você tá assim? A gente tem que se preocupar com o show? — Sooyoung pergunta.
— Não, sem preocupações. Só tava pensando se puxava uma conversa.
— Você?! Jeon Jungkook?! — Yeri escarneia. — Puxando uma conversa? Nunca fala nada com a gente além de trabalho!
— Isso é uma reclamação?
— Depende. — Ela coça o queixo e retorce toda a cara para mostrar que está pensando. — Se você for muito chato falando de assuntos pessoais, talvez seja um elogio.
— Talvez seja melhor manter o silêncio. Do jeito que ele tem ex-namorado chato, deve ser bem chato também — Sungjin argumenta.
— Só sou meio dedo podre, gente. Pode até ser maldição, mas não é pecado.
O pessoal dá uma risadinha. Sinto o peso nos ombros aliviar um pouco. Não sabia que minha banda é tão complicada de conversar.
— Mas aqui, você sabe falar de algum assunto que não seja namorado? — Yeri quem pergunta e, por mais que me doa admitir, nem tem maldade na voz.
Tento pensar em um assunto aleatório para falar. Qualquer assunto mesmo, mas minha cabeça nunca gosta de me obedecer, ainda mais em momentos de pressão.
— Ei, precisa levar a sério, não — Yeri complementa dado meu silêncio patético. — Eu falo demais! Ó, tenho a boca tão aberta que nem consigo fechar! Um aeroporto de mosca.
— Eu... sei falar de academia.
— É um bom começo! Realmente, seu muque indica uma certa paixão pelo supino — é Yeri que continua a conversa. Os outros não parecem nem um pouco inclinados a se envolverem, mas prestam atenção com um ar divertido de quem assiste uma novela na TV.
— E... agora eu sei falar de cafeterias. Mais alguém aqui que gosta de café?
— Park Jimin — Jaesung coloca. Quando eu o encaro, ele desvia o olhar como se nada tivesse saído da sua boca.
— Por que todo mundo nessa cidade que conhece Park Jimin sabe que ele gosta de café?
— É importante sobre a personalidade dele. Café e caminhadas. Sempre está na biografia dos livros — Jaesung retruca e dá de ombros. Resmunga para si: — É só não ser analfabeto funcional.
— Você não tem cara de quem lê fantasia — Yeri aponta.
— O que é pra fazer pra parecer alguém que lê fantasia? Vir trabalhar vestido de hobbit?
— Não inventem de brigar antes do show — Sungjin resmunga.
— Jungkook, infelizmente você vai ter que voltar a ser o assunto — avisa Yeri, num tom sóbrio. Uma palhaça. — Por acaso agora você só sabe de cafeteria por causa de seu namorado?
— É, talvez.
Cafeterias, restaurantes, museus e obras de artes. Caminhadas, nasceres do Sol, teatros. Tudo novo, tudo que eu poderia falar que fiz ou até gosto envolve ele. É difícil buscar uma lembrança sozinho.
— Incrível ver um homem viver a triste experiência feminina de virar uma máquina de gostar das mesmas coisas que seu homem de interesse — Yeri suspira.
— Mas é normal ter gostos parecidos com seu namorado. E aprender a gostar das mesmas coisas.
— Sim, mas não é normal não saber mais das coisas que você mesmo gosta. Sozinho — Sungjin resmunga.
— Sungjin?! Dando conselho de amor?! — Yeri engasga.
— É, Jungkook, complicou para você — Sooyoung concordou, com uma voz simpática que não combinava com a cara, com a frase, com ela, de um modo geral.
Até mesmo Jaesung parece espantado com a possível revelação de que Sungjin consegue beijar a boca de alguém mesmo com as manias de perfeição e a personalidade difícil. Muito, muito chocante.
— Então, qual seu gosto supremo, impossível de ser influenciado por qualquer romance? — pergunto, talvez por estar mesmo curioso. Será que estou preocupado com minha própria futilidade?
— Não é óbvio? — resmunga Sungjin, ultrajado com a pergunta. Levanta o braço da guitarra e beija o headstock. — Essa belezinha aqui. Música também, claro. Mas a guitarra... Nada melhor que ela.
Jaesung, Yeri e Sooyoung dão uma risada de escárnio. Cada um tem certeza absoluta de que seu próprio instrumento é o mais incrível.
Olho minha guitarra, apoiada no suporte, aguardando a hora do show. Só tinha uma música na tracklist em que eu precisaria tocá-la: "literal", a mais bem-sucedida do meu álbum de debut como artista solo.
Mesmo "literal" sendo uma música de encerramento, pego a guitarra e passo a correia pelo ombro. O peso dela ali é absolutamente familiar. Mas familiar como um parente distante, que não vejo há muito tempo.
— Ei, o guitarrista principal sou eu! — Sungjin reclama ao meu observar.
Olho as horas no meu relógio de pulso e dou um sorriso.
— Não vamos inventar de brigar antes do show — digo.
Sungjin revira os olhos e os outros dão risada. Todos se levantam, porque é hora de entrar no palco.
A animação me corrói. E não é a animação típica de um show, de cantar, de me entregar àquelas horas com meu público e com o calor das luzes e da multidão.
Tem uma outra animação: de expectativa, talvez até de alívio. Porque agora sei o que preciso fazer.
-💿-
Jimin brinca com o colar no pescoço e fica olhando para fora da janela do carro em silêncio. Não sei se ele está reconhecendo para onde vamos, mas pelo menos não tem nenhuma foto dele lá em nenhuma das redes sociais.
Não que significasse muito também, Jimin não é muito ligado em redes sociais, apesar de adorar seus momentos em qualquer cantinho e fotografá-los com frequência. Mas o que eu já presenciei um bocado de vezes é, ao final de cada semana, a assessoria de imprensa dele o intimando a enviar algumas fotos para terem conteúdo. Exceto quanto a eventos profissionais como conferências, lançamentos e tal; as redes de Jimin são atrasadas em pelo menos uma semana.
— Não vai perguntar onde vamos? — chamo sua atenção.
— Você me responderia?
— Não.
— Então. — Estende a mão, como se provasse um ponto. — Não há por que perguntar.
— Mas eu poderia te dar dicas!
— Lindo, por que está tão agitado? Não é de seu feitio.
Consigo pensar em vários motivos para minha agitação. Provando que a necessidade faz, sim, o homem; fiquei bom em analisar minha cabeça nos últimos dias. Motivos: Jimin está quieto demais. Jimin está apenas com nossa pulseira de namoro no pulso, nada mais. Por fim, estou nervoso se Jimin vai gostar do encontro, até porque é bem diferente do que ele pediu.
— Não vou te falar — retruco e cruzo os braços da forma mais infantil possível. Vejo ele levantar uma sobrancelha e esboçar um pequeno sorriso. Enfim, atraio sua atenção.
— Nem o motivo de toda sua revolta?
— Esse, eu conto. Não te falo mais nada porque você respondeu minha primeira pergunta da semana que nem sua bunda!
— Que mentira! Eu meditei bastante sobre a resposta da girafa.
— Você inventou sua resposta da girafa.
— Claro que não, girafas são belíssimas, muito fascinantes mesmo. Eu cuidaria muito bem de uma: apenas aceitaria se fosse uma que não pode voltar à natureza e a colocaria em um santuário. Só acho que eu não consigo com minha lábia porque preciso de algum tipo de comprovação ou licença ambiental, não? Nem graduação eu tenho.
— Seria engraçado se você tivesse graduação em biologia, mas não duvido nada vindo de você. — Quando imagino Jimin biólogo, cuidando de animais com aquelas roupas dele, começo a rir comigo mesmo. — Mas acho que o mais óbvio é você ter feito letras.
— Não tenho graduação em nada, só tive educação formal até o ensino médio — diz em um tom que não me deixa interpretar nada. Tem vergonha? Tem orgulho? É ressentido?
— Eu também.
— É? Por quê?
— Decidi investir na carreira antes de entrar numa faculdade de Música, só pra pegar como era. Deu certo o suficiente pra eu não ter tempo pra estudar integral. E você?
— Acho que também é possível dizer que investi na carreira primeiro.
— Só não uso minha pergunta da semana porque o dia só começou — resmungo, Jimin ri.
Ele volta a olhar pela janela. Os fios ruivos estão domados para trás por um arco preto em zigue-zague, e as pontas espetadas formam uma coroa preguiçosa. Não sei se é porque falei para ele se vestir com algo confortável, mas usa uma jaqueta corta-vento rosa, com um conjunto esportivo verde por baixo. Os pés parecem estranhos usando um simples tênis de caminhada. Não dá para dizer que Jimin está discreto (talvez seja incapaz de ser), mas as escolhas parecem muito normais se ele mesmo for tomado como referência. Uma escolha quase melancólica.
No rosto, nenhuma maquiagem. É lindo, lindo demais, e a pele de seu rosto sendo iluminada apenas pelo Sol é mais cativante do que se esperaria. Mas, de novo, soa triste. Quando contou sobre a irmã, Jimin ficou melancólico e incomodado de um jeito que nunca vi. E, desde então, age como se estivesse com uma preguiça monstra do universo. Pode ser só paranoia minha também, é difícil enxergar Jimin do mesmo jeito depois daquilo tudo. Ou talvez seja justo isso que incomode Jimin: eu não vê-lo do mesmo jeito.
Quando o carro estaciona, um lampejo de curiosidade passa pelo seu olhar. As coisas parecem mais em seu lugar.
— Parece que era a casa de um casal — explico ao sair do carro. Os arredores são bonitos, e o clima está ótimo: fresco, mas com um Sol morno. — E aí esse casal deixou a casa pra que pudesse ser uma fundação cultural. Tem um parque, uma casa de chá, um acervinho de arte e hoje tem um concerto. Você gosta dessas coisas, né?
— Gosto. — Ele sorri.
— Também tem tipo um clube do livro! Todo mês eles se reúnem pra discutir um autor ou a literatura de um país... Claro que não dá pra fazer hoje, mas talvez você goste e...
— Está nervoso, lindo?
— Talvez. Enfim. Devemos começar com uma caminhada pelo parque?
— Claro, acho que abre o apetite.
Claro também que é Jimin quem dita a direção e o ritmo das nossas passadas. O caminho é formado por pedrinhas e cada pisada faz um barulho engraçado. A construção da casa fica para trás.
Olho para as mãos de Jimin: enterradas nos bolsos da jaqueta corta vento. Bem, está mesmo um tanto fresco. Tento desacelerar as passadas, acho que o parque não é tão grande assim.
— Gosto desse lugar — diz Jimin. Talvez para me deixar aliviado (e fico mesmo). — Onde o descobriu?
— Quer a história rápida ou longa?
— Ah, lindo. Certamente a longa!
— Tudo começou comigo pensando que talvez fosse uma boa opção pedir recomendações de outras pessoas, pra tentar sair do óbvio, algo assim. Foi um dia antes do meu show que comecei a pensar, então achei que o pessoal da minha banda seria uma boa ideia.
— Eles têm mau gosto?
— Nem sei dizer, porque a conversa tomou um rumo completamente diferente. Aliás, tenho que pegar seu autógrafo pra um deles... Enfim, não tô muito acostumado a jogar conversa fora, ainda mais com eles, então foi meio esquisito.
— Foi divertido?
— Hm... — Penso, porque, para variar, não sou de refletir nada, a não ser que seja um pé na bunda ou outra coisa negativa. — É, foi. Acho que mais que divertido... Foi esclarecedor? — Minha escolha de palavras me espanta, e Jimin ri de mim.
— Quanto mistério...
— Enfim, aí deu errado o plano e fiquei meio sem alternativas, tive que vasculhar o perfil da Heeyeon de novo. Ela e a namorada sempre vão pra lugares legais.
— É, sáficas têm essa fama mesmo.
— Até agora, o esteriótipo tá vencendo. Fiquei lá vendo foto e mais foto de restaurante, chalé, lugares que elas com certeza usam pra fingir uma vida de recém-casadas do campo em alguns fins de mundo.
Jimin dá outra risadinha. Eu me sinto bem.
— O final da história é esse: encontro patrocinado pela habilidade milenar sáfica de garimpar lugares românticos.
— Por que não perguntou a Heeyeon desde o início?
— Porque queria algo diferente. É sempre ela quem dá ideias. Pelo menos eu mesmo decidi entre as opções dessa vez.
— Entendi, eu deveria tê-la agradecido ainda mais na dedicatória do livro... Pelo visto, ela tem um papel maior que previsto nessa nossa relação.
— Foi mal. — Cocei a nuca. — Tava acostumado a sair pra barzinho e boate nos meus antigos namoros. Ou ficar em casa mesmo.
— Não creio que eu sou o primeiro com alma de idoso que você namora.
— Não o primeiro com alma de idoso, mas o primeiro cult.
— Não sou cult. — Parece ofendido com a palavra. — Só curioso. E tem várias pessoas por aí que gostam de visitar museus, para seu interesse.
— Sei...
Depois disso, o silêncio reina. Não é exatamente um silêncio desconfortável, porque não há nenhuma tensão. Mas sinto que, a cada segundo a mais nele, ele vai se tornando um pouco mais melancólico. Para minha desgraça, nenhum assunto faz o favor de aparecer na minha cabeça para eu poder puxá-lo.
Faz dez minutos que caminhamos. Sua mão continua enterrada nos bolsos da jaqueta corta vento. Sem opção, porque sei que a caminhada não vai durar muito mais, esgueiro minha mão para dentro de seu bolso.
A mão de Jimin está quentinha, macia. Ele não entrelaça os dedos nos meus, mas não reclama quando tomo iniciativa. Também não troca nenhum olhar comigo, continua distraído com o teto caprichoso formado pelas copas das árvores.
— Você tá assim por causa da sua irmã?
— É a pergunta da semana?
— Não, não é.
Ele me olha de cima a baixo, do jeito típico dele. Empurra o óculos para cima do nariz e meneia a cabeça de um lado para o outro antes de dizer:
— Bem, também é por causa dela. Só ando meio pensativo esses dias, mas não é algo necessariamente ruim.
— Você é especial mesmo, acho péssimo pensar.
— Pensar é meio péssimo mesmo — ele concorda e deixa uma risada breve escapar dos lábios. Sou idiota, porque fico esperando cada risada como uma planta esperaria água. — Deprimente, mas, na maioria das vezes, libertador. Quando penso, não demoro a chegar à conclusão de que meus problemas são pequenos demais frente ao universo. E que tudo que está acontecendo não tem nenhum motivo para acontecer. Não é destino, nem infortúnio: é mero acaso. Acho que para a maioria pode parecer ruim pensar assim, meio desesperador. Mas para mim é bem tranquilizante.
— Você é bem melancólico quando quer.
— Na verdade, acho que sou bem enérgico quando quero — responde e me encara com um olhar ferino. Engulo em seco.
Não tem mais tapete sob meus pés. E a macarronada que vive pesando meu estômago virou costume. Agora, acho que o que sinto quando estou perto de Jimin é um arrepio. Como o de ouvir um bom riff de guitarra. Talvez o primeiro acorde de uma orquestra. Já aceitei que Jimin é como uma das suas amadas obras de artes, só não foi emoldurado em um museu ainda.
-💿-
Não sei Jimin, mas eu estou pronto para cair na cama e não levantar mais. Depois de um brunch, de uma quantidade ridícula de caminhadas, de uma visita ao acervo e de assistir a um dueto de harpas, o corpo pede arrego. Apesar de fazer show me moer bem mais, o cansaço de hoje parece mais profundo; toma meu corpo e também faz uma pressão na parte da frente da minha cabeça.
Então, deito na minha cama na primeira oportunidade, mesmo sabendo que eu deveria secar meu cabelo antes. Logo Jimin, devidamente banhado, aparece pela porta também. Inabalável, ele senta em meu colo.
— Lembro de ter te pedido para me levar a algum lugar que gerasse burburinho na mídia. Sinceramente, estávamos quase só nós dois lá.
— Hm... — Viro o rosto. — Aposto que lá ia encher, mas rolou um imprevisto pro pessoal.
— Imprevisto para todas as pessoas menos nós? — Ergue a sobrancelha.
— É, ué! Nas fotos que eu vi, tava super cheio! Deve ser porque é meio da semana... e a maioria é assalariado. Não calculei isso. Desse jeito, pra gente conseguir um lugar cheio no meio da tarde, só se for em restaurantes de prato feito. Ou no órgão de trânsito. Ou esperar horário de pico pra pegar um ônibus. Você pode escolher um desses que na próxima te levo.
— Certo, lindo — ele desiste e dá uma risada gostosa. Mesmo com meu corpo capenga de cansado, meu interior se agita. — Dessa vez você escapou. Mas saiba: só por um triz.
— Obrigado por me poupar!
Com uma risada, derrubo Jimin deitado na cama e puxo seu corpo contra o meu. Ele tava com ares de planejar algo, algo que ignorasse meu cansaço e a preocupação aparente dele.
Ele se remexe, acho que testando minha determinação em agarrá-lo ali. E estou bem determinado, então ele não consegue se livrar dos meus braços. Jimin me olha de cima a baixo, e fico admirando o nariz e as bochechas avermelhadas pelo banho quente. Ele está todo quentinho, e, ao contrário de mim, secou os cabelos, que parecem mais finos, claros e fofinhos quando ele acaba de secar. Jimin suspira, alto, e se vira de costas para mim.
— Boa noite, Jungkook.
— Boa noite, Jimin.
Desligo as luzes e, sem perguntar, eu o abraço por trás. Nunca sei se Jimin gosta ou não, mas não foge nem reclama, então continuo fazendo.
— Posso fazer a pergunta da semana?
Sinto seu corpo se retesar sob o meu. É discreto, um movimento pequeno de nada, e a respiração dele nem muda; mas de tão grudado ao corpo dele, é impossível não notar. Um peso esquisito aparece em meu peito, como uma mão apertando a parte de dentro. É bem ruim.
— Qual sua comida favorita?
Jimin fica em silêncio por muitos segundos, o que é bem esquisito da parte dele. Mas talvez só seja ele na fase reflexiva mesmo.
— Esse é um problema, nunca tenho favoritos. Nem comida, nem cor, nem estação, nem livro, nem música. Nada — responde por fim, com a voz tão baixa que até rouca fica. Fica em silêncio mais um pouco, o suficiente para eu aceitar o fim da resposta e me surpreender quando ele continua: — Jungkook, eu tenho fome, de tudo, de comer até fazer esse mundo ser meu. Então amo todas as comidas que conheço e quero comer todas as que ainda não comi. Espero que essa resposta seja suficiente.
— Fica difícil te fazer sua comida favorita de aniversário desse jeito... — desconverso, porque não tenho capacidade cerebral para entender a fundo a resposta. — Aliás, quando é seu aniversário? O meu é em setembro.
— Tem na internet. — A voz é sacana. — No pior dos casos, a Heeyeon vai te avisar quando estiver chegando.
— Você é muito difícil — bufo.
— Eu sou — diz, com toda a alegria que faltou nas últimas frases.
Com isso, acho que nós dois podemos dormir bem.
-💿-
Isso é bom. Isso faz sentido. E, infelizmente, talvez eu tenha que concordar com Min Yoongi.
Hobi [14:32]
mas vc não tá com raiva de mim?????
Jungkook [14:33]
n
pq eu ficaria?
mas aí, o q achou da música?
Hobi [14:33]
acha msm q ouvi????
porra
vc é um cabeção pqp
tipo
vc tá dias sem falar cmg
dps de ter explodido
e agr vem com música nova falar q n tá com raiva de mim?
obv q tá
ou tava
pq me perdoou?
Jungkook [14:35]
eu não te perdoei, pq n tava com raiva de vc
fiquei com raiva de mim por ficar com raiva, só
eu n fico c raiva, vc sabe, né?
aí foi esquisito p mim
Hobi [14:36]
pqp
eu n sou pago o suficiente p isso
vc é maluco, sério msm
piradão msm
tipo mto
Jungkook [14:37]
é, acho q sim
agr ouve a música
Hoseok não manda outra mensagem. Por um bom tempo. De repente, meu celular toca e, quando o atendo, Hoseok só grita:
— Vem pro estúdio agora! Eu já cheguei aqui.
Gargalho. Acho que ele gostou da música.
-💿-
Eu e Hoseok passamos a noite toda juntos, num estado de êxtase bizarro, quase como se fosse a noite das nossas vidas. Favor, que não seja interpretado errado, porque sou um homem pseudo comprometido. Acho que nem pseudo; nessa altura do campeonato, já sei muito bem que, apesar de Jimin chamar a atenção de todos, ele chama a minha, especialmente. Não tiro os olhos dele.
Enfim, foi uma noite regada de café e de dor nas costas. Hoseok adorou a primeira música que ajustei: "sem tapete". Peguei um pouco das músicas mais interessantes que eu já tinha mandado para ele, mas, para a base, usei mais instrumentos musicais e os usei melhor. Lembrei de mim, adolescente do interior viciado em tocar guitarra e em ouvir os discos ecléticos dos meus tios: que tipo de música ele gostaria de tocar?
As minhas, imagino que não. Não são divertidas o suficiente; ou não eram. Minha missão agora é a diversão.
Repaginei toda a letra. Não parou de ser eu, mas eram mais... interessantes, talvez. Mais temperadas. Pode ser porque estou lendo CDA devagarinho. Jimin usa muitas palavras bonitas, e acabei pegando algumas emprestado.
E aí, Hoseok me alugou a noite inteira, e todos aqueles instrumentais que mandei e que já estavam separados sofreram uma transformação digna dos shows tóxicos de moda da TV que minha mãe e minha tia desembestavam de assistir. Apesar de ser muito bom no teclado, Hoseok me obrigou a tocar eu mesmo. A bateria também, apesar de eu estar tão enferrujado que meu pai teria vergonha de mim.
Dos instrumentos que conheço, só o saxofone ficou de fora, mas me chateou notar que queria ouvir um baixo mais marcado nas minhas músicas. Claro que eu faria minha banda regravar cada um dos instrumentos porque eles os tocam melhor. Mas é como saber uma língua: mesmo se você pedir uma tradução, as palavras não são suas e o significado pode ficar meio diferente. Às vezes, nem tem como ter o mesmo significado, porque cada língua se organiza de um jeito diferente, com uma lógica própria, com palavras para certas coisas e sem palavras para coisas que, na cultura, não são tão importantes assim (sim, Jimin quem iniciou a discussão linguística, e passou muito tempo discorrendo sobre a diferença estrutural de línguas latinas e anglófonas. Depois, falou sobre a diferença das línguas de sinais. Acho que teria falado de todas as línguas se não tivesse sido interrompido pela chegada do prato de seu jantar. Eu entendi uns 50% da conversa, mas eu meio que gosto de ouvi-lo falar).
O baixo que Hoseok improvisou em seu teclado ficou bom, mas não conversava com a música como eu queria. Se eu quisesse melhorar, se eu quisesse comunicar exatamente o que queria, teria que aprender a língua do baixo para resolver. E é por isso, às oito da manhã, sem nem ter ido dormir ainda, estou ligando para os meus pais:
— Ei, filhão! — atende meu pai, animado como de costume. Consigo ouvir mesmo pela ligação os arredores caóticos; a oficina sempre é barulhenta, mesmo o dia mal tendo começado. — Já falei que te amo hoje?
— Hoje ainda não, mas te dou o crédito que tá bem cedinho ainda — ri. Meu pai é tão presente que acho que é gatilho para pelo menos 80% da internet. — Também te amo pai, como o senhor tá?
— Nesse exato momento, muito suado. O capeta deve tá é fazendo comício nessa pobre cidade interiorana. Sério, só hoje chegaram cinco carros pra arrumar o ar-condicionado, isso porque tamo no inverno. É o fim dos tempos mesmo!
— E emocionalmente?
— Tirando o fato de que faz muito tempo que sua mãe não faz a parmegiana dela e que faz mais de dois dias que você não me liga, a moral está lá em cima!
— O senhor é nem um pouco dramático, né?
— Sou só muito sensível. Gosto que todos no bairro saibam o quanto eu sou amado pelo meu filho artista.
— E seu filho intelectual, o amor dele não conta?
— Claro que conta, mas já sabem, né? Ele sempre passa aqui com a esposa dele no fim do dia. Por isso que não tem parmegiana. Parmegiana virou coisa de ocasião especial. Acho que preciso de um filho artista que mora na capital vindo visitar os pobres pais no interior pra conseguir realizar meu desejo de comida.
— Pensei que queria ver eu, não a parmegiana, pai! Fico ofendido?
— Mas quero ver você e a parmegiana! Não fica preocupado do seu irmãozinho mais novo nascer com cara de parmegiana?
— Acho que não é assim que funciona essa história! — Gargalho alto. Só lembro do meu objetivo principal quando vejo meu caderno jogado na bancada da pia. — Pai, o tio Daejin ainda toca baixo?
— Claro, filho, toca mais que a sanidade da esposa dele permite. Por quê?
— Acho que preciso estudar mais sobre.
— Contrata um professor de baixo, ué. Não estão pagando seus royalties? Não criei filho meu pra assinar contrato cilada!
— Não, não. É só que tô acostumado com o jeito que vocês me ensinaram a tocar. Acho que eu deixaria qualquer professor de música maluco nos primeiros dias e tô precisando trocar ideia sobre baixo pro meu novo álbum, então seria melhor algo mais rápido.
— Sempre instrumento de corda, né? Nunca uma batera de respeito... — Ele suspira tão alto que até minha vó, na casa ao lado, deve ter ouvido. — Criei mesmo um cara que só quer o holofote.
— Deixa de drama, pai! A parte da bateria eu já fiz, o senhor sabe que sei tocar direitinho.
— Sabe, mas não o tanto que saberia se fosse seu instrumento principal.
— Ih, pai, nem guitarra eu tô tocando direito, pra ser sincero. Vou tomar vergonha na cara.
Ouço a porta do meu apartamento se abrir. Jimin aparece de trás dela, com uma sacolinha kraft nas mãos com um logo que reconheço. É da padaria preferida de Jimin, que virou minha padaria preferida também. Minhas bochechas queimam quando lembro da banda falando que só gosto de coisas por causa de namorados. Mas aí, lembro da conversa com meu pai e tudo volta ao seu equilíbrio.
— Então, pai, tô pensando em ir aí visitar vocês e falar com o tio Daejin, pode falar com ele? Próxima semana, talvez.
— Posso, mas você vai ter que trazer seu namorado dessa vez, você sabe, né? Sua mãe não vai deixar nem que você pise o pé na soleira se não for pra apresentar seu pretendente famosinho. A gente já até comprou os livros dele aqui em casa. Até que é bom. Parece que seu irmão já era fã.
Claro que Junghyun já era fã do Jimin... Não me surpreende em nada a informação. Tampo o microfone do celular para sussurrar para Jimin, não tão sussurrado assim porque ele está em outro cômodo:
— Você foi intimado a ir comigo pra Busan semana que vem. Sua agenda tá muito apertada?
A expressão de Jimin deixa transparecer algo diferente. Algo que não vejo dele, talvez perplexidade. Nunca fui bom em entender nem minhas próprias emoções, imagine a dos outros. Acho que eu deveria comprar para mim aquele livro de criança: o emocionário, quem sabe viro gente. De qualquer modo, eu considerava Busan uma proposta irrecusável para Jimin: conversar com pessoas aleatórias e falastronas sobre a vida, o universo e tudo mais? Visitar outra cidade? Desvendar uma árvore genealógica gigantesca? Tudo um prato cheio para um esquisito como ele, mas agora tenho minhas dúvidas.
— Vai depender dos dias — ele logo responde. — Tenho umas reuniões com os roteiristas de CDA e algumas coletivas de imprensa que sobraram da estreia.
— Ah, é verdade! — Por ser uma mala sem alça, esqueço que eu mesmo devo estar com uma agenda terrivelmente horrorosa. Heeyeon me deu alguns dias de descanso porque quase não dormi na primeira semana do lançamento conjunto de "parafraseei" e de "ruínas minhas", mas são só uns dias de descanso, e não férias como minha empolgação imaginou. — Pai, esqueci que as coisas tão um caos aqui por causa dos lançamentos. Jimin tá com uma agenda apertada também. Vou olhar e te conto, tá bom?
— Tá bom, filhote. Passo o celular pra sua mãe?
— Manda um beijo meu pra ela e fala que eu ligo amanhã, pode ser?
— Claro, pudinzinho da mamãe. Pai te ama. Mãe também. Aproveita seu dia aí.
— O senhor também.
Quando chego na sala, Jimin já montou a mesa para nosso café da manhã na mesa de centro baixinha. Já é comum: ou ele traz café nas manhãs, ou comida japonesa nas noites (que acho que ele compra até demais para mim); depende da nossa agenda. Em geral é jantar, Jimin se isola um tanto às manhãs.
— É... Te incomodou o convite pra Busan? — pergunto, meio aflito. Ele abre espaço e sento no chão, ao lado dele. Nossas costas se apoiam no sofá. — Achei que ia deixar nosso namoro mais convincente, né? Aparecer na minha cidade natal com minha família... E acho que você vai achar minha família... interessante.
— Interessante, é?
— Aham. Tudo que você gosta: caos, maluquice, vozes altas e muita história pra boi dormir.
— Parece bom mesmo. — Ele dá uma risadinha e a interrompe com um croissant. — Não me incomodo, mas é necessário dar atenção à nossa agenda. O acordo visa ajudar o profissional, não nos distrair dele.
Sinto um aperto no meu peito. Não deveria acontecer só porque Jimin mencionou a falsidade do nosso namoro: ele é falso, até eu a mencionei mais cedo. Ao mesmo tempo, é a única coisa de diferente que falou para causar essa reação.
Mas eu sei por quê. Não era para eu saber estufando minha boca de pão, presunto e queijo. Nem de forma tão simplista e direta. Das histórias dos meus pais, dos roteiros de filmes, eu esperava que fosse ser mais bonito, mais lírico, menos normal. Que rendesse ao menos mais de um parágrafo na autobiografia da minha vida.
Mas eu só soube daquele jeito mesmo, sem ser gradual nem bonito, sem ser o que fiquei esperando em vários relacionamentos, sem achar, sem entender. No fim, só soube porque é ruim e incômodo. Meu estômago pesa e meu peito aperta porque estou, mesmo, apaixonado por Jimin.
Sei disso e, relembrando, reconheço a falsidade em cada um dos meus comentários displicentes: quero Jimin na casa dos meus pais porque quero sua imagem emoldurada em cada um dos cenários que compõe minha simples vida; quando eu o lembro do acordo, é para não afastá-lo, para amarrá-lo com firmeza na única garantia que temos, mas quando ele o lembra, não sei o que pensa.
Na realidade, nunca sei o que ele pensa, e creio que isso tenha me vendido (por uma pechincha) à paixão: a curiosidade de saber mais, entender mais; a vaidade de conseguir me ver ali, dentro de pensamentos tão desprendidos. Meio idiota e meio paradoxal, porque me coloca numa posição platônica a qual não quero ocupar. Nunca fui platônico, mas também nunca me apaixonei de verdade.
Para não ser platônico, tenho duas opções: desapaixonar ou fazê-lo se apaixonar por mim. A segunda opção é a menos recomendada, sem dúvidas, mas é a que a curiosidade e a vaidade me obrigam a trilhar.
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❧luzinha é sua barda E ASSISTIU O JK DE NOVO☙
@jungkookamoreterno
MEU DEUS MELHOR SHOW DO JK DA VIDA!!! ELE TAVA O TERROOORRRRRRRRRRRRRRRRRRRR ONTEM A NOITE
ethan QUER CHORAR PQ N VIU O JK
@ethanluvsjk
em resposta a @jungkookamoreterno
SÉRIOOOO? O Q ROLOU? DEUS PQ ME FEZ NASCER TÃO LONGE DE JEON JUNGKOOOOOOOOOOOOK!!! QUERO ASSISITRRDHFASJKDHFKAS
❧luzinha é sua barda E ASSISTIU O JK DE NOVO☙
@jungkookamoreterno
em resposta a @ethanluvsjk
nss amg nem sei explicar!!! ele só tava mtomtomtomto inspirado!! ahhh, e ele tirou um solo na guitarra do nadaaaaaa! brincou até com a bateria sério SOBE UM CALOR SÓ DE LEMBRAR
ethan CHORAR PQ N VIU O JK
@ethanluvsjk
em resposta a @jungkookamoreterno
N GRAVOU NENHUM VIDEOZINHO??? UNZINHO????? PENSEI Q ISSO AQUI ERA UMA AMIZADE VERDADEIRA
❧luzinha é sua barda E ASSISTIU O JK DE NOVO☙
@jungkookamoreterno
em resposta a @ethanluvsjk
eu graveiiiiiiii mas ficou só meus grito, dedo na frente, borrão e luz piscando TT
ethan CHORAR PQ N VIU O JK
@ethanluvsjk
em resposta a @jungkookamoreterno
aceito desse jeito msm!!! pode mandarrr
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Depois de nove capítulos, Jungkook se notou apaixonadinhoooo! Pensando o quanto minhas histórias são slow burn, até que não demorou tanto, né? Esses jikook são diferentes dos outros, acho. Mas pensando que vai ter uns 19 caps, até que demorou. O que acharam da epifania?
Ah, não esquece de deixar seu votinho! 💜
Qual foi sua parte favorita? Confesso que esse capítulo é suuuuuuuuper difícil de escolher pra mim. Amo os diálogos dos jikook de paixão, amo o jungkook notando a paixão da pior forma possível, amo os pais dele... ENFIM será que é ser metida, como escritora, gostar tanto de tantas cenas?
Ahhhh! Lembrando que a rede social na qual sou mais ativa é o instagram (sou a callmeikus lá também) e posto o dia a dia escrevendo fanfics!
Beijinhos de luz, amo vocês, e até sexta dia 01/11 às 19:00!
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