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Every Sunday's getting more bleak
A fresh poison each week
We were born sick
You heard them say it

Cada domingo fica mais desolador
Um veneno fresco a cada semana
Nós nascemos doentes
É o que eles dizem
(Hozier - Take me to Church)

Inspiro fundo e mordo o punho fechado, em uma tentativa inútil de reduzir a dor excruciante nas minhas costas. Nem o alívio do pano úmido e gelado é capaz de impedir que, mesmo contra a minha vontade, solte um gemido de dor.

— Eu estou tentando ser o mais delicada possível.

Eu sei que sim. A Irmã Adelaide jamais tentaria agravar meu sofrimento, por mais que ela condene minhas atitudes. Já tem quase uma hora que estamos aqui no meu quarto e, levando em conta as experiências passadas, ainda vai demorar bastante.

Enfim, sinto-a pressionando a parte mais alta das minhas costas, entre as escápulas, exatamente no local mais ferido e a dor é tão forte que sinto que posso desmaiar a qualquer instante.

Eu não quero chorar.

Não posso chorar.

Mas as lágrimas transbordam mesmo assim.

Ouço-a puxar o ar com força, como se estivesse se preparando para dizer algo, mas ela desiste no final das contas. Depois da terceira vez que isso acontece, finalmente diz o que vem pensando nesses últimos minutos.

— Por que você tem que ser assim, Cecília? Por que não pode abaixar a cabeça e agir como todas as outras meninas?

Isso não é uma bronca. É só um questionamento, mesmo. Ela não consegue entender porque, mesmo depois de todas as punições, eu ainda seja desse jeito. Coitada, ela simplesmente não consegue entender e não a culpo por isso. A Irmã Adelaide é aquele tipo de pessoa que prefere guardar para si seus pensamentos, para evitar conflitos. Acho que essa é a razão de ser a única pessoa que gosta de mim nesse lugar.

— Eu odeio esse lugar. Odeio essas pessoas e sei que elas me odeiam também — murmuro, mais para mim mesma do que para ela.

— Elas não te odeiam! Elas só fazem isso porque querem o seu bem.

— O meu bem? — Uma risada sem qualquer humor escapa dos meus lábios. — Eu não sei em qual realidade paralela açoitar uma pessoa até que ela perca a consciência significa querer o seu bem, mas eu agradeço pela tentativa, Irmã.

Um mísero livro foi o responsável pela minha punição. Não sei como o encontraram, já que eu o mantinha escondido, mas lá estava ele, nas mãos da Madre. Um misto de pavor e constrangimento me acertou, assim que me dei conta que estava perdida. Pela sua cara, já sabia que ela tinha folheado o livro e sabia muito bem o seu conteúdo. Um romance bobo e sem muita graça, mas cheio de descrições de sexo. O tipo de livro totalmente proibido em um convento.

Ela ainda alegou que me pouparia, caso eu contasse a ela de onde esse livro surgiu, mas não sou idiota. Ela jamais livraria minha pele, então não lhe contei que o homem que nos traz carne uma vez por semana é o meu contrabandista de livros proibidos.

Ela quis me punir pelo livro, pela afronta e por não lhe contar quem estava a enganando bem debaixo do seu nariz. Quinze golpes de chicote na frente de todas as mulheres que vivem aqui. Não tenho certeza, mas acho que ouvi algumas risadas, enquanto era chicoteada até desmaiar.

— Sua vida seria tão mais fácil se você simplesmente se rendesse...

— Eu odeio esse lugar — repito, a voz distorcida pela dor. — Eu nunca vou me render. Vou passar todos os dias da minha vida mostrando para essas pessoas que eu preferia estar morta do que viver aqui.

Eu tinha sete anos quando fui mandada para cá, assim como todas as outras meninas. Na segunda semana aqui levei minha primeira punição, por não ter arrumado a minha cama, como deveria. Com nove anos, já estava tão habituada a ajoelhar no milho, que tiveram que pensar em punições mais severas. Jejum, castigos corporais... esse tipo de coisa. Aos dezenove, já fui açoitada três vezes. A primeira, por ter desrespeitado a Madre na frente de todas as noviças, a segunda, por ter questionado o Padre, durante uma missa, e a terceira, graças aos meus gostos literários.

Sete anos, essa é a idade limite que um filho incompleto pode ficar sob tutela dos pais. É quando o governo inspeciona todas as casas e constata quem é digno ou não de ter uma vida perfeita. Algumas doenças não são constatadas a olho nu e é por isso que todos somos levados para os diversos hospitais do país, para que vários exames e testes sejam feitos. Os resultados definem quem volta para casa, agraciado com um futuro brilhante e cheio de luxos, e quem deve seguir o destino que lhe foi traçado, de acordo com suas doenças e malformações.

Desde que comecei a andar, meus pais já sabiam que eu não voltaria para casa, depois do dia dos exames. Qualquer um que me olhasse com o mínimo de atenção, perceberia que eu tinha uma perna mais curta do que a outra (dois centímetros, como foi identificado naquele dia) e esse fato nunca passou em branco, levando em conta a forma indiferente como sempre fui tratada. Desde que me lembro de existir, já sabia que não voltaria para casa. Por isso que esse lugar nunca me assustou.

A maioria das meninas que chegou aqui, estava chorando, pedindo para voltar para casa e para seus pais. Apesar de entender suas razões — e até me solidarizar com suas histórias —, nunca me senti dessa forma. No começo, cheguei a acreditar que o convento poderia ser um bom lugar para se viver, cheio de meninas que me entenderiam e compartilhariam de algo comigo, mas estava errada. Embora tenhamos muito em comum, bastou alguns dias para entender que eu não nasci para fazer parte daqui.

Acho que não nasci para fazer parte de lugar algum.

Meus pais , duas pessoas completas e bem jovens, que tinham todos os pré-requisitos para gerar filhos perfeitos, não conseguiram ser úteis para o seu país. Apenas os completos estão autorizados a gerar filhos, porque a intenção do governo é povoar o Brasil com o máximo de pessoas perfeitas e, quem sabe, no futuro, extinguir a existências de incompletos. Mas, infelizmente, eles não conseguiram cumprir suas funções.

Todos têm uma função.

Tudo tem seu devido lugar por aqui.

E esse é o meu.

Desde que entendi que ter uma perna menor do que a outra era a minha sentença, já sabia que passaria o resto dos meus dias presa neste convento. Cada destino é traçado pelo grau de incompletude de cada pessoa. O meu é considerado severo e, por esta razão, fui enfiada aqui, para apodrecer até a morte.

Aqueles que têm um pouco mais de sorte, têm direito a vidas menos desgraçadas. Quanto mais próximas da perfeição, mais privilégios. Problemas simples de visão, deformidades quase imperceptíveis... esses quase levam uma vida perfeita.

Quase, porque as verdadeiras regalias são guardadas para os completos, os sem defeitos, aqueles que têm o direito de fazer o que quiserem, casarem, ter filhos...

O mundo já teve pessoas demais, é o que eles dizem. Já esteve tão superlotado, que todos os líderes precisaram pensar em uma forma de combater esse problema. Já não havia mais comida para todos.

A nossa solução foi criar essa maldição.

Completos e incompletos.

Perfeitos e imperfeitos.

As técnicas para controle populacional funcionaram bem. Dizem que o planeta já teve mais de sete bilhões de habitantes, hoje não chega a um. Nosso país, tão grande, hoje não passa de um monte de terras inabitadas e abandonadas. No entanto, a promessa de extinguir a escassez nunca foi cumprida. Quer dizer, os completos vivem uma vida de luxos e desperdícios, mas nunca sequer cheguei perto disso. Na verdade, minha realidade é modesta demais.

— Eu não vou viver para sempre, querida. E eu tenho medo de pensar no que vai ser de você quando estiver sozinha aqui — explica ela, acariciando meus cabelos.

Eu também morro de medo de pensar nisso. Com a Irmã Adelaide intercedendo por mim, as coisas já são bem complicadas. Sem ela, a Madre vai pensar em um jeito de me matar antes que eu chegue aos trinta anos.

Estou deitada de bruços há tanto tempo que minha coluna dói. Meus músculos estão retesados, porque, se relaxarem, as dores nos machucados pioram. A Irmã Adelaide continua seu trabalho de limpar os ferimentos e trazer um pouquinho de alívio com as compressas de água fria.

A porta se abre, sem nenhuma batida ou aviso. Não há nenhuma privacidade por aqui.

— Adelaide, eu quero ter uma conversa com ela. — É a Madre e ela não parece querer se desculpar. — A sós.

A Irmã assente e deixa o quarto. Ela não fala nada, mas está esperando que eu me sente. Tenho dificuldade para levantar, cada pedaço de pele lacerada se estica com o movimento e preciso de muita força para não chorar. Pego o travesseiro e cubro meus seios, já que estou sem nenhuma roupa da cintura para cima.

— Você tem alguma noção de que estava lendo um livro proibido? — indaga-me, com a voz contida.

— Sim, senhora — devolvo, sem desviar meus olhos dos dela. — Eu tenho noção.

— Não estou falando só do convento. Não me refiro só aquela libertinagem... Estou dizendo que aquele livro é proibido para pessoas como você, Cecília. Estou dizendo que nenhum incompleto pode ler aquele tipo de livro e que eu poderia te entregar para o governo, se eu quisesse.

A curiosidade fala mais alto do que o meu orgulho.

— Por que ele é proibido para nós?

— É um romance entre um aleijado e uma completa. Isso é proibido. Temas proibidos não devem ser retratados em nossa literatura — explica, inabalável. — Já mandei destruir aquela porcaria.

A Madre não é uma mulher muito velha. Duvido que ela tenha mais do que quarenta e cinco anos. Embora vista sempre seu hábito, que a cobre quase completamente, ela é uma mulher bonita. Seus olhos negros e sobrancelhas escuras contrastam com a pele clara. O nariz e boca pequenos quase lhe fazem parecer uma pessoa normal, se não fosse o fato de que os olhos são opacos e os lábios nunca se curvaram em um sorriso, pelo menos, na minha frente. Apesar disso, sua beleza é invejável. O problema é que sua alma foi sugada em algum momento da sua vida. Ela é oca, não tem um coração batendo no seu peito. E o pior de tudo: ela é completa. Está aqui porque escolheu e isso só me faz odiá-la ainda mais.

Ninguém sabe nada sobre o seu passado, nem sequer especulações. A história dessa mulher é tão obscura, que tenho certeza que ela guarda um segredo e tanto.

— Por isso, vou perguntar mais uma vez, Cecília. De onde você conseguiu aquele livro?

— Eu não vou dizer — declaro, pausadamente. — Pode me açoitar quantas vezes quiser, mas eu não vou dizer.

Ela respira fundo. Posso notar que está fazendo um esforço sobre-humano para não perder a linha.

— Se antes, quando o problema era só a senhora, eu já não abriria a minha boca, agora, sabendo que existe o governo envolvido... — Balanço a cabeça para os lados, resoluta. — Eu não vou condenar ninguém à ruína, Madre.

Ninguém ousa desafiar as regras rígidas do nosso governo, porque ele faz questão de expor todas as punições severas a quem se mostrar valente. Não há pena de morte, porque ela é rápida demais. Eles fazem questão de torturar física e psicologicamente até que a pessoa não aguente mais. Dizem que uma pessoa conseguiu escapar, mas não sobreviveu nem 24 horas depois disso. Dizem... Tudo não passa de rumores, é claro. É por isso que há cada vez menos prisões, porque eles conseguiram enfiar o medo na vida da sociedade, goela abaixo. Medo não, pavor.

Todo incompleto é composto por 100% de pavor.

Os completos, 100% de orgulho.

Mas eu não. Não sinto pavor, nem, tampouco, orgulho. Eu só sinto raiva. Sou composta por 100% de raiva.

Raiva desse lugar, raiva dessas pessoas, raiva dessa realidade, raiva da minha vida, raiva de todas as possibilidades inexistentes, graças a minha condição física limitada.

Raiva de já viver minha prisão particular, com direito a punições severas a cada deslize, como se precisasse usar um cabresto para ter uma vida de merda.

— Acho que você não entendeu a gravidade da situação — continua.

É claro que eu entendo a gravidade da situação. Ela está ameaçando me entregar para o governo, mas só não abaixei a minha cabeça, porque sei que ela não vai fazer isso. Ela é orgulhosa, jamais daria o braço a torcer assumindo que uma das suas noviças está causando problemas. Ela prefere resolver esse tipo de problema longe dos holofotes e é o que vai fazer.

— Eu entendi muito bem, mas a minha resposta continua a mesma.

Desta vez, ela não diz nada. Apenas assente lentamente e me fuzila com seu olhar mais cruel. Mas isso não me abala. Quando se vive tanto tempo no inferno, o diabo já não lhe parece tão feio.

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Sejam bem-vindxs à essa nova aventura! Acho que já deu pra perceber que a Cecília não nasceu pra abaixar a cabeça e a gente até agradece, né? Mais tretas a caminho :P

Esse primeiro capítulo está sendo postado só para que vocês conheçam nossa protagonista afrontosa e já adicionem o livro da biblioteca, mas as postagens semanais só vão começar efetivamente quando terminar de postar O Trono (o que espero que aconteça ainda esse ano. Estou trabalhando para isso).

Então é isso, amores! Espero que tenham gostado dessa prévia e até breve <3

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