Capítulo 55
Jeff
Não rolou nada no banho (graças aos anjos protetores dos ânus semi-virgens)! André ficou de boa e se resignou a lavar meu cabelo, uma exigência que fiz para entrar no box com ele, e ficamos só curtindo uns amassos entre conversas bobas.
— Onde você colocou minhas coisas? — perguntei. André trouxe minhas roupas e pertences, mas não vi nenhuma caixa, mala ou sacola no apartamento. Perguntei se ele havia trazido mesmo.
— Você não vai se aborrecer?
Um alerta soou.
— Por que eu me aborreceria?
— Bem... é que, quando estávamos no hospital, pedi para minha faxineira guardar as roupas. Não quero que você fique aborrecido porque alguém mexeu nas suas coisas...
— Bem... Isso é um pouco estranho.
Não sabia como me sentir acerca disso. Sinceramente.
— Desculpe, Jeff. Não vai ficar num clima estranho comigo por isso, né?
Saí do box e peguei uma toalha. Enquanto me enxugava, pensava no assunto.
— Não sei, André. Você é meio sistemático com as coisas. Vou ter que me acostumar.
— Então... Com relação a isso... — Ele tinha um olhar esquisito, meio envergonhado.
— O que mais você fez?
Ele saiu do box e enrolou uma toalha na cintura. Pegou minha mão e me levou até o quarto. Entrei e não vi nada de diferente ali, o mesmo cheiro, mesmo clima, tudo igual. Ele me conduziu até o canto do aposento, onde ficava embutido um guarda-roupa com imensas portas em cedro. Abriu a última, e para minha surpresa, não era um guarda-roupa.
Havia um banheiro ali, com um pequeno ofurô e, separado por uma parede em drywall, havia um espaço anexo com inúmeras prateleiras cheias de roupas, sapatos e caixas. As prateleiras ocupavam as duas paredes laterais e, no fundo, havia araras com cabides enfileirados. Notei que um dos lados do espaço estava preenchido com minhas coisas. Só percebi isso quando reconheci um par de tênis na última divisória.
— Caralho, André... Eu... — Eu não sabia o que dizer. Peguei uma das minhas camisetas e levei ao rosto. Estava com o cheiro das roupas dele. — Você lavou minhas roupas?
Notei como ele pareceu constrangido. Se ele estava, imagine eu?
— Desculpa, Jeff. Não queria ser invasivo...
— Invasivo? Isso beira a psicopatia! O que foi? Minha roupa não tinha o cheiro adequado? — De repente, senti-me tão envergonhado que tive vontade de ir embora.
Só que dessa vez, não tinha para onde ir.
Ele ficou chateado. Eu fiquei dividido entre curtir todo o cuidado que ele teve com minhas coisas ou brigar porque ele me achava fedido!
— Eu... Eu não queria que você interpretasse mal — ele se aproximou e se ajoelhou aos meus pés. Para minha surpresa, ele puxou a toalha que eu ainda estava usando e colocou o nariz entre minhas pernas. Aquilo foi tão inesperado que dei um passo atrás, mas ele segurou minhas coxas e lambeu meu saco.
— André...?
— Amo o seu cheiro... — Ele começou a passear com o nariz por baixo das minhas bolas e isso me deixou aturdido. É certo que o cheiro ali é diferente de qualquer outro lugar, só não esperava que...
Ele ficou de pé e lambeu meu pescoço, depois enfiou o rosto debaixo da minha axila e cheirou ali também. Eu não sabia o que queria dizer tudo aquilo.
— Seu cheiro... É bom demais e o cheiro do cigarro nas suas roupas não me deixava senti-lo... — Ele murmurou, agora com o nariz na minha nuca.
— Você ficou cheirando minhas roupas?
— Cada peça... Enquanto você não saia daquela porra de hospital, eu queria sentir seu cheiro sem o derivado clorado daquele quarto asséptico.
Caralho! Fui pego totalmente de surpresa. Eu nunca iria imaginar que André curtia essas coisas. Vai ver, nem ele imaginaria. Eu mesmo passei por isso. Fiz o mesmo com as roupas dele, mas as dele tinham o melhor cheiro do mundo! Se bem que eu não saberia diferenciar se eram as roupas ou... Ele.
De repente, eu perdi todo o argumento para discutir.
— Tudo bem, André. Vou relevar, porque você deixou tudo aqui muito foda!
Ele sorriu e me beijou.
— Fica à vontade. A casa é sua.
Ele se afastou e pegou as roupas para se trocar. Ele tinha uma porrada de roupa, comparando com meu lado do espaço, e realmente tinha muitos conjuntos de moletom. Vesti uma cueca minha e peguei um agasalho meu. Não era exatamente o cheiro dele nas roupas, mas estavam bem macias e perfumadas, e o melhor, realmente não tinham o cheiro do cigarro.
Convivi tanto tempo com Doralice que meu nariz ficou provavelmente viciado, eu nem percebia mais aquele aroma de fumaça na roupa. Era óbvio que André não ia colocar nada de cheiro duvidoso no seu "santuário".
Fresco do caralho!
Quando saímos do closet, eu perguntei:
— Por que você não usa esse banheiro?
— Quando me mudei para cá, tinha um vazamento nesse chuveiro. Mandei fechar os registros desse banheiro pra consertar e fui adiando até deixar pra lá. Agora que você está aqui, vou mandar consertar, porque finalmente tenho alguém pra curtir o ofurô comigo.
Pensei no quanto isso parecia fora do comum para mim, mas... Quem era eu pra julgar? Seria bem interessante. André pegou na minha mão e me guiou pelo corredor.
— Quero te mostrar outra coisa.
Foi então que ele abriu a terceira porta do corredor, uma que eu nunca tinha visto aberta. Tratava-se de um outro quarto, e da porta pude ver uns equipamentos de ginástica e malas de viagem apoiadas contra uma parede. Dei um passo para dentro e meu coração quase saiu pela boca.
Havia um tapete felpudo colorido no chão, uma estante cheia de livros infantis, um móbile, um baú cheio de brinquedos, adesivos nas paredes e um berço-cama totalmente novo.
— Mas o quê...
— Antes de você surtar, não quero que pense que fui invasivo, atrevido ou algo do tipo. Eu fiz isso para que você saiba que eu acredito que você vai conseguir a guarda da Larah, e para que, quando você entrar aqui, essa esperança seja renovada. Montei esse quarto com o dinheiro que Hannah me pagou para te investigar, então, a meu ver, você merece isso. Eu havia tentado devolver o dinheiro a ela, mas ela recusou e disse para eu usar isso com a Larah, e foi o que fiz. Sinto que Hannah quis fazer a coisa certa, inclusive separou tudo o que era da Larah e me pediu para ir buscar. Só tenho que saber se você quer que eu faça isso.
— Ah, isso você resolveu me perguntar.
Eu não sabia o que pensar. Sério. Acho que nunca senti tanto medo na minha vida. Não bastava eu começar a dividir meu tempo com outro homem, ocupar o mesmo espaço, o mesmo closet, o mesmo maldito amaciante de roupas, agora ia dividir também a minha filha?
Era demais para digerir.
Mesmo assim, mesmo confuso, eu quis me abrir. Em outros tempos, eu me fechei e fugi. Eu era especialista nisso. Chegara a hora de deixar os grilhões e aceitar as adagas. Elas, às vezes, podem machucar, fazer sangrar, mas também dividem, abrem, rompem e libertam.
— Não sei se estou pronto a falar sobre a Hannah ou aceitar qualquer coisa que venha dela...
— Não precisa, Jeff. Escuta... — Ele parou na minha frente e segurou minhas mãos — eu sei que o que temos é recente, e se pararmos para pensar no fato de que somos o primeiro homem um do outro, é absurdamente prematuro pensar nesse lance todo que estamos começando aqui. Mesmo assim, você há de convir que o que vivemos nesses últimos tempos valeu por uma vida inteira.
— Eu ainda tenho medo, André. Principalmente de te decepcionar... Você sabe o quanto sou quebrado. Pode ser que amanhã eu acorde querendo não existir, pode ser que eu vá dormir querendo não acordar, e eu não quero mais machucar você; você já fez tanto, faz tanto por mim e eu... — senti minha voz quebrar. André tinha me transformado na porra de um frouxo!
Ele envolveu meu rosto com as duas mãos. Seus olhos negros me perfuraram. Acho que nunca me senti tão amado em toda a minha vida como nesse instante.
— Eu nunca quis ser pai — declarou —, nunca. Quando te vi com a Larah no colo, enxerguei o quanto eu queria isso bem no mais íntimo do meu ser. Nunca me interessei por homens, mas você me fez querer você independente de qualquer coisa, e não foi quando me tocou ou quando ficou nu na minha frente; foi quando estava sentado num banco de bar, sujo, coberto de sangue e completamente bêbado. Eu vi o seu vazio, sua angústia. Isso me atraiu de forma inexplicável. Dê o nome que quiser, eu não faço ideia do que é, mas quando te vi, soube que eu seria a pessoa que mergulharia no abismo pra te buscar. Hoje, ter você, ter a Larah, é minha única chance de ser feliz.
Porra! Poeta, filho de uma puta! Depois dessa, fodeu, porque eu estava chorando. Não tinha o que falar, e nem conseguiria. Dei um passo e o abracei. Ele me envolveu com todo o seu calor e ali, naquele quartinho fofo, entre um berço e equipamentos de ginástica, decidi que aceitaria ser salvo por esse homem.
— Não importa o buraco onde você se enfiar, eu vou te buscar, Jeff.
— Não importa o buraco em que eu esteja, vou ficar esperando por você, André.
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