Capítulo 22
André
A luz do corredor de acesso ao centro cirúrgico tremeluzia. O fato me distraía e irritava ao mesmo tempo. Não havia muito o que ver, apenas pares de pernas entrando e saindo, em suas vestimentas verdes ou cinzas, e a cada vaivém da porta, mais um pouco do derivado clorado e estéril invadia minhas narinas me lembrando que ainda não era hora de parar se sentir medo.
Já fazia duas horas que eu estava ali. Não queria me sentar numa das cadeiras duras da ala de espera porque não seria perto o suficiente. Onde eu estava era o mais perto que eu poderia estar, e como havia prometido, eu deveria estar ao lado dele.
Uma perfuração no pulmão, uma fissura no fígado, quatro costelas quebradas e lacerações de músculos e tecido mole em diversos pontos do abdômen e das costas. A perfuração no pulmão tinha sido a última e mais grave lesão, ocasionada pelo pontapé do capanga no segundo ataque. As demais mazelas não o levariam à morte se bem tratadas, mas a perfuração, se ele não tivesse sido socorrido a tempo, teria dado cabo dele.
Fui interrogado por um médico acerca do quadro. Tive que atribuir as lesões a um assalto. Fui questionado pela falta de um Boletim de Ocorrência, e fatalmente a polícia foi acionada. Tive que me manter imparcial e me apresentar como um amigo que o levara a uma clínica particular para avaliar o corte abdominal, clínica essa que uma súbita amnésia apagara de minhas lembranças.
Tive que responder uma porrada de perguntas e, conforme o tempo passava e eu não tinha notícias, mais preocupado eu ficava com o fato de estar em meio a tantas pessoas, e ele estar tão distante, em algum lugar em que eu não poderia ficar de olho nele.
Eu queria tirá-lo do hospital e levá-lo para casa, para estar em segurança, para que eu pudesse cuidar dele.
Eu queria cuidar dele.
Eu.
– Senhor André? – Uma enfermeira me abordou.
– Sim? – Levantei-me do chão num salto. Pois é, eu estava sentado no chão. Há poucos dias, eu jamais realizaria tal façanha.
– Acompanhe-me, por favor. O médico gostaria de lhe falar.
Eu não queria falar com a porra do médico. Queria falar com o Jeff. Quando o médico mandava chamar, boa coisa não era. A possibilidade de receber uma má notícia agora era de aproximadamente setenta porcento. Um número inaceitável, na minha opinião.
O médico me atualizou sobre o procedimento, detalhes que honestamente eu estava pouco me fodendo. Eu queria o diagnóstico, o "ele vai ficar bem", qualquer merda perto disso, mas ele estava demorando demais para chegar lá.
– ... e ele é muito jovem para estar com o fígado tão danificado.
– O quê?
Pois é, eu deveria estar prestando atenção.
– Ele tem um quadro de doença hepática. Ao que tudo indica, ocasionada pelo excesso de consumo de álcool.
– Ele tem cirrose? – perguntei, chocado.
– Não chegou a isso, ainda. Mas se ele não parar de ingerir bebidas alcoólicas, fatalmente este será o desfecho.
Fiquei profundamente triste. Tudo relacionado a esse homem parecia intenso demais para mim. Eu só queria um tempo para pensar e absorver o que significava tê-lo em minha vida, mas algo me dizia que eu não teria muito tempo para pensar.
– O doutor me disse que a cirurgia correu como o esperado. Quanto tempo para ele ter alta?
– Ele está muito ferido. O ideal é que fique no mínimo uma semana sob cuidados médicos.
– Se ele tiver uma enfermeira em casa, ele pode sair antes?
– Precisamos avaliar as próximas 48 horas, depois saberemos melhor como proceder.
– Eu posso vê-lo?
– Ele está desacordado. Sugiro que espere até que o efeito da anestesia se dissipe. Creio que no máximo em duas horas, ele poderá reagir.
Voltei para a recepção, com os olhos para todos os lados. Quando cheguei, Ângela me procurava entre os acompanhantes.
– André! – Ela correu em minha direção e me deu um abraço. Confesso que quase chorei, mas me contive.
– Ele vai ficar bem. Gostaria de levá-lo para casa, mas não será possível, ao menos por dois dias. Você conhece alguém que poderia ficar na minha casa como enfermeira por uns dias, caso eu consiga levá-lo para lá?
– É muito melhor mantê-lo aqui. Por que quer tirá-lo do hospital?
– Ele não pode... Não quer ficar aqui.
Havia um zilhão de perguntas nos olhos dela, e eu gostaria de responder ao menos uma. Quando abri a boca para falar alguma coisa, uma presença nefasta deslizou entre os demais acompanhantes e se aproximou, altiva.
– Então, você sabia onde ele estava esse tempo todo? Agi mal contratando você, detetive.
Eu fulminava Hannah com os olhos. Ângela captou a animosidade e se colocou do meu lado. Eu precisava ter essa conversa, e precisava fazer isso com os olhos nas costas. Nesse momento, pedi aos céus que pudesse tirar Jeff com vida do hospital.
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