Capítulo 8
Já passou das sete e um quarto e a Nina e a Eleanora ainda não voltaram. De qualquer forma, mesmo se tivessem não poderia jantar com elas, pois teria que esperar pela refeição que o Pietro me prometeu.
Por falar nisso, não faço ideia de quais sejam as intenções dele. Como é que se pode ser tão simpático com alguém que nos tentou matar na noite anterior? Para mim não faz sentido e leva-me a desconfiar dele.
Enquanto desço as escadas em direção ao frigorífico para pegar uma peça de fruta, deparo-me com um homem vestido de terno, de cabelo grisalho e provavelmente com mais alguns anos que o meu pai.
— Menina Natália?
— Sim, sou eu — murmuro.
— O cavalheiro Pietro está à sua espera. Faça o favor de me acompanhar.
— Assim o farei, obrigada. Posso saber quem é o senhor?
— Sou o mordomo da família, Erminio.
— Prazer — digo lançando-lhe a mão para um cumprimento.
Ele olha para mim desconfiado e com a mesma cara séria com que sempre esteve e de seguida continua andar.
— Não é preciso formalismos — diz após recusar me cumprimentar.
Decido não lhe dizer mais nada, e atravessamos o pátio até à entrada traseira da mansão.
Ao entrarmos, deparo-me com um nível de riqueza muito superior ao exterior do edifício. As estátuas de mármore e os enormes quadros de pintores famosos italianos fazem com que me sinta num palácio, e Erminio estranha a minha reação de admiração.
— É bonito, não é?
— É... é algo de outro mundo — murmuro ainda encantada.
Para quem passou a vida em hotéis, alguns de cinco estrelas, o luxo não devia ser algo deslumbrante, porém neste caso é impossível evitar.
A primeira divisão que passamos é uma espécie de lounge ou salão de convívio, cheio de mesas, cadeiras, vasos de plantas tropicais e candeeiros.
Ao avançarmos passamos por uma sala de estar também requintada e coberta por papéis de parede dourados e pedras decorativas, até chegarmos a uma sala de escritório com mobílias e paredes brancas, juntamente a um chão de madeira e a várias decorações florais.
— Esta é provavelmente a divisão mais simples da mansão principal — diz Erminio ao analisar o meu comportamento.
— Ainda assim é melhor que todos os quartos onde já dormi.
Ao virar-me novamente para a porta deparo-me com Pietro, agora com uma camisa branca dobrada pelos cotovelos e umas calças pretas justas, com o olhar fixando em nós.
— Não me diga que acabou de ouvir o que eu disse — digo ao notar a forma como ele olha para mim, quase como se estivesse admirado.
Ele ri-se sem responder e avança até ao mordomo para o dispensar.
— Espero que se sinta como em casa — diz quando ficamos finalmente os dois sozinhos.
"Não tenho casa" penso em responder-lhe.
— Vamos? — pergunta ao voltar para a porta.
Sigo-o por vários lances de escadas sem nenhum dos dois falar até chegarmos a um terraço com alguns sofás e mesas.
Ele avança até ao parapeito, e fico mais uma vez maravilhada ao apreciar a vista que nos permite ver toda a capital romana ao fundo, juntamente a um pinhal e várias outras mansões em redor.
— Não vai dizer nada? — pergunta-me após eu retirar os olhos do horizonte e os virar para ele.
— Vou ficar com esta roupa por quanto mais tempo?
Merda.
Arrependo-me imediatamente da minha falta de treino para realizar comentários oportunos.
Ele ri-se como se eu tivesse acabado de fazer uma piada e responde-me:
— Se quiser posso tratar disso imediatamente.
— Talvez seja melhor só depois do jantar.
Uma das aulas que tivemos na escola de assassinos envolvia estudar as reações de alguém de forma a compreender a forma como se sente. Ao olhar para Pietro, noto que quando está nervoso ajeita várias vezes os óculos e o relógio que tem no pulso, algo que está a fazer neste momento.
— Assim será — responde-me e dirige-se a uma das mesas.
Sigo-o, e sentamo-nos os dois numa mesa para dois, frente a frente.
— Qual é o verdadeiro motivo para eu estar aqui? — pergunto imediatamente.
— Onde é que preferia estar?
Preferia estar com os meus pais e o meu irmão, mas não lhe posso responder isso.
— Não sei.
Falho ao evitar ficar triste por pensar na minha família, e ele ao perceber dá-me alguns minutos para me recompor.
— As nossas refeições devem chegar dentro de alguns minutos — diz ao quebrar o silêncio e para mudar de assunto.
— O que iremos comer?
— Para a menina será o prometido.
— Sushi? — pergunto de tal forma que os meus olhos brilham. Provei pela primeira vez sushi num daqueles meses em que estivemos em Moscovo e acabei por nunca mais ter tido nenhuma oportunidade de voltar a experimentar.
— Para si, sim. Para mim será uma maravilhosa pizza napolitana.
— Nunca experimentei, mas deve ser boa.
— Nunca? Ah, não acredito!
— Sim, é verdade. Já comi pizza, sim, mas nunca em Itália e muito menos napolitana.
— Pode até já ter comido, só que não sabia que era esse o nome.
— Sim, também pode ser isso.
— Devo confessar que nunca vi ninguém que fosse tanto contra o ditado "Em Roma, sê romano".
— Respondi sushi porque não acreditei que fosse mesmo capaz de me trazer qualquer comida que pedisse.
— Para um Santoro nada é impossível — responde com um sorriso orgulhoso.
— Estou a ver que sim.
Ele olha para mim durante alguns segundos, deixando-me desconfortável.
— Os seus olhos... são diferentes. — Olho para baixo para evitar o contacto visual, mas ele continua: — E isso torna-os ainda mais bonitos.
— Obrigada. — Agradeço com um sorriso honesto. Até agora nunca me tinham dito isso, e os meus pais sempre me fizeram pensar que esta condição era algo mau por me tornar diferente e fácil de identificar.
Nesse momento algo começa a vibrar dentro do bolso dele, e percebo que é o telefone.
— Com licença, tenho mesmo que atender — diz ao levantar-se.
Vejo-o a afastar-se até ao outro lado do terraço e a regressar rapidamente com uma expressão séria.
— Tenho que ir andando.
— Aconteceu alguma coisa? — pergunto.
— Ainda não sei, mas é importante.
— Devo esperar para jantar?
— Se daqui a vinte minutos não tiver regressado pode começar sem mim — diz a correr em direção às escadas.
Enquanto ele não volta, sento-me num dos sofás a apreciar a vista para a cidade.
Pergunto-me onde estará o meu irmão neste momento. Ainda me lembro do quanto ele ficou triste quando lhe disseram que não poderia regressar ao Dubai.
Será que algum dia regressarei para juntos da minha família e também ficarei com saudades de Itália?
Ou será que nunca regressarei?
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