Capítulo 32
Natália POV
O tiro acerta no ombro do Pietro, e um arrepio profundo atravessa todo o meu corpo.
— Com o trabalho que tive para a capturar, seria um desperdício matá-la já — diz de uma forma prazerosa.
— Então, o que foi que fez? O que quer de mim, han? — grito na direção do Epifanio, louca e despreocupadamente, enquanto ignoro a arma apontada para o meu peito.
— Por onde começar?... A missão de me matar, o gelo com droga na bebida... — diz, e uma chama de ódio invade-me. — A menina estava tão feliz com a possibilidade de ter a sua primeira missão, que nem se deu ao cuidado de recusar o gelo na bebida.
— E mais, han? E MAIS?
— A missão do seu irmão, a morte dos seus avós... É tudo obra minha. Sou um génio, não? — Apenas a dois metros de mim, continua a apontar para o meu peito.
Agora tão próxima, consigo olhar bem dentro dos olhos dele. Os olhos do meu inimigo. Os olhos de quem quero matar. Sei que não irá premir o gatilho, pois seria fácil de mais. Os psicopatas pensam dessa forma. É repugnante, mas previsível.
— Você é um PORCO — digo e sorrio de lado. Atrás de mim tenho o altar. O altar de Deus, que acredito que me irá proteger. No entanto, junto a ele está o Pietro, que continua a esvair-se em sangue. E eu, sem nenhuma ideia de como sair daqui e salvá-lo.
E se ele morrer?
Caso isso aconteça, parte de mim morrerá também. A nossa filha, que ainda está no meu ventre, não terá pai. E jamais serei capaz de lhe contar que a culpa disso foi em parte minha.
— A Natália está grávida.
A voz do Pietro, grave e doce, ecoa por todos os cantos da igreja. Como é que ele sabe? Mais ninguém sabe para além de mim. A não ser que...
— Estou grávida, sim, é verdade — digo confiantemente, e vejo os olhos do Epifanio encherem-se de espanto. A primeira vez que vejo tal reação no rosto dele, que, mesmo com as operações plásticas, ainda tem alguma expressão.
Ele não me pode matar. Foi a regra que ele mesmo criou enquanto presidia a Sociedade; jamais ter como alvo uma mulher grávida. Os rumores do motivo podem ser apenas boatos, mas eu acredito serem reais. Estes dizem que a mãe dele foi morta enquanto estava grávida. Grávida do único irmão do Epifanio; o tio do Pietro, se fosse mesmo pai dele. E eu, apesar do homem que mais amo acreditar que está a mentir, também estou grávida.
O Epifanio olha para mim, usando todos os seus conhecimentos de assassino para descobrir se estou a tentar enganá-lo. Mas não estou; e, por isso, não é capaz de disparar. Nos olhos dele, vejo que se está a recordar da mãe. Da mãe, do irmão perdido, da filha.
Sem nenhum dos dois estar à espera, um tiro ecoa pela igreja. Não acertou em mim, nem no Pietro, que me apresso a confirmar se está bem ao virar rapidamente a cara na direção dele. O tiro acerta no Epifanio.
No centro do crânio, o sangue salta e salpica nas minhas roupas, junto a um som de explosão que se repete e volta a repetir na minha cabeça. Limpo o sangue à pressa, mas parece que quanto mais limpo mais suja fico.
O corpo do Epifanio no chão é repugnante. Os ossos da cabeça expostos, os bocados de cérebro no chão. Será que ele sentiu a própria morte?
Ele está morto. Uma morte tão rápida, tão banal.
Nunca ouvirei da boca dele os motivos para odiar a minha família. Nunca saberei como foi capaz de prever que eu entraria nesta exata igreja. Estaria a vigiar-nos? Teria realmente decidido tornar-se padre? Quem era, afinal, o Epifanio? O que sentia, para além do desejo de morte? Sentiria empatia? Amor? Saudade? O que gostava de fazer nos tempos livres, para além de planear mortes? Gostaria de ler? De ver televisão? Quem é este homem que me quis matar? O que foi que o colocou nesta vida de caos?
— Tiveste uma epifania, Epifanio? — pronuncio a frase que guardei para a hora da morte dele, mas não me dá tanto prazer dizê-la como pensei, pois não foram as minhas mãos que o mataram.
Quando saio do meu transe e paro de olhar para o corpo morto no chão, percebo que um rapaz está a ajudar a ferida do Pietro a estancar.
Lorenzo.
— Foste... tu? — pergunto, sem resposta, já que é óbvio que sim.
Não sou capaz de dizer mais nada, por isso sento-me num dos bancos e aguardo pelas ambulâncias.
O Pietro seguiu-me com o Lorenzo. Ele sabia que eu ia tomar uma decisão péssima e deixar-me influenciar pelo meu instinto. O Pietro conhece-me. Ele percebeu que eu estava em perigo e veio para me proteger.
Acompanho-o até ao hospital na ambulância com o Lorenzo, ainda sem dizer nada. Estou em choque. Apesar da ferida estar estancada, não consigo falar. O Pietro em perigo. O cérebro no chão, o corpo sem vida.
Já no hospital e enquanto eu e o Lorenzo aguardamos em silêncio pela operação para retirar a bala do ombro dele, a Maria e a mãe aparecem no corredor em pânico.
— O Pietro, o Pietro, o que aconteceu ao meu filho?! — grita a Nini bastante nervosa, e a Maria vem abraçar-me.
O abraço dura longos minutos, e sinto que com ele consigo responder a todas as perguntas que ambas têm para me fazer. Depois, deixo essa tarefa com o Lorenzo, que lhes conta a parte dele, como o momento em que o Pietro o avisou que a Natália tinha desaparecido e levado as chaves do carro com ela, enquanto eu oiço tudo como se tratasse de um filme e não tivesse acabado de acontecer comigo.
Após uma hora de longa e penosa espera, o Pietro sai da sala de cirurgias e corremos os quatro na direção dele.
Imediatamente decido interromper todas as perguntas da Nini e da Maria para anunciar:
— Estou grávida, Pietro. — A mãe dele olha para mim com algum espanto, enquanto a Maria me abraça imediatamente a barriga. — É uma menina.
Assim como os meus olhos se enchem de lágrimas por ver o Pietro deitado na cama de hospital, os dele enchem-se de brilho e esplendor, corrigindo-me depois:
— É a nossa menina.
— Uma sobrinha! — diz a Maria ao tentar não chorar.
— Parabéns, Natália e Pietro — murmura o Lorenzo ao abraçar desajeitadamente o Pietro por este estar deitado.
A Nini dá-me um enorme beijo na bochecha e um abraço apertado, tirando de seguida um lenço do casaco para se assoar e limpar as lágrimas. Enquanto isso acontece, o Pietro levanta-se ligeiramente e sobe o tronco para ficar sentado.
— Natália, eu já te queria dizer algo há uns dias... — O esforço que faz para não se emocionar é imenso, contudo consegue manter-se sério. Enquanto diz isto, pega na minha mão e fixa os olhos escuros e sem óculos em mim. Apesar de ligeiramente despenteado, o cabelo preto continua impecável. E, ao dizer as seguintes palavras, faz o sorriso mais belo do mundo: — Natália Alexandra Rendhal, aceitas casar comigo?
Os quatro fixam-se na minha reação, os outros três tão surpreendidos como eu, e levo as mãos à cara para tentar esconder a minha felicidade.
— Sim, eu aceito! — Beijo-o com todo o cuidado possível e sorrio. Um sorriso honesto e cheio de esperança. O sorriso de alguém realmente feliz. — Amo-te, Pietro. — Abraço-o com toda a minha força.
— Também te amo, minha querida.
— Bem-vinda à família! — diz a Nini, ainda com o lenço na mão. — E para quando será o casamento? — pergunta, e caímos os cinco na gargalhada.
— Será depois de a menina nascer — respondo.
— E qual será o nome da nossa bebé? — pergunta-me o Pietro.
— Ainda não escolhi... Mas já tenho uma ideia.
— Vais ser uma Santoro? — interrompe a Maria com algum entusiasmo.
Agora que ela toca neste assunto, percebo que será verdade. Que, ao casar-me com o Pietro, ganharei o nome de família dele. E, assim, nascerá um laço entre mim e o homem que me destruiu parte da vida.
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