Capítulo Dois
Sinto um alívio tão grande que é inevitável não externar esse sentimento, relaxando os ombros e levantando a cabeça, as vozes na minha mente param, me deixando livre.
A humana tenta parar de chorar, provavelmente está relembrando tudo que fizeram nos tempos em que ficou presa aqui, e antes, na outra base. Ela se recompõe depois de alguns minutos, após Mark desligar a máquina. Só então a menina se permite prestar atenção em mim.
– Mas... Como... O que aconteceu? – Pergunta, ficando depois com a boca semi aberta.
– Temos que ir – é tudo que digo.
– O que é todo esse sangue? – Alex insiste em continuar estudando todo meu corpo agora quase que completamente pintado de vermelho. – Cuide das feridas dele! – Agora se dirige ao humano do meu lado.
– Eu não...Ele...
– Esse sangue não é meu – Interrompo, arrancando todo o restante das estrutura para finalmente libertar a criança, que encara fixamente um corte feio que vai do meu peito até quase o umbigo, olho também. – A maior parte dele.
Os meus braços estão ardendo em dor, e o corpo já dá os sinais de esgotamento, não foi fácil lidar com aqueles humanos lá fora, alguns deles também possuíam poderes, mesmo assim, consegui.
– O que você fez?
– Matei todos, cada um deles – puxo a garota para fora com certa violência, meus músculos ainda estão ativos, preparados para o combate, e ainda não consigo controlar a força física direito, e a cabeça parece que vai explodir de dor. – Faça a pesquisa – ordeno o homem.
– Mas, se eles descobrirem sobre a gente, podem nos localizar e nos atacar.
Desvio o olhar para Mark e fecho meu punho com força na frente do rosto, o que torna impossível sua respiração. O homem arregala os olhos como um peixe morto, e tenta buscar na atmosfera uma partícula, que seja, de ar para respirar, porém não permito. O cientista enterra uma mão no pescoço, se sufocando enquanto cai de joelhos.
– Para! Você vai matar ele! – Alex chama a minha atenção com suas mãozinhas apertando meu pulso.
– É isso mesmo que eu quero! – Respondo, mantendo os dedos bem apertados na mão.
– Eu... fa... Faço – Mark balbucia, sua voz sai seca como areia do deserto e seu rosto está tão azul quanto o céu.
Só então libero a pressão que exercia na palma da mão, concedendo o oxigênio que os pulmões do homem tanto precisam. Entre várias arquejadas e tossidas, ele se levanta com dificuldade.
– Por que tá fazendo isso? Você não é assim! – Alex tenta buscar empatia nos meus olhos através do seu olhar que mistura confusão e medo.
– Cada vez que deixamos um deles vivo, muitos dos nossos padecem – falo, puxando para frente e devagar a máscara preta cravada numa parte específica do meu rosto, ela se rompe no meio do caminho e arranha minhas bochechas. Esfrego os dedos no local, apenas para constatar que o meu sangue escorre. – Muitos dos meus – corrijo.
O doutor olha para mim ainda amedrontado, mas mesmo assim entende que não pode deixar esse sentimento congelá-lo, ou me desobedecer, então pede para que o acompanhemos até outra sala. Nós o seguimos de perto, o lugar, embora bem iluminado, está todo sujo, marcado com o sacrifício humano que fiz, agora penso em invadir o sistema para saber onde tem mais bases exatamente, e se possível, quem está lá.
– Eu... Ainda não entendi – Alex rompe o silêncio, andando de costas na minha frente enquanto caminho. – Por que você tá desse jeito? Você... Tá muito... Diferente. Não é o mesmo que me visitava todos os dias quando estava com a Heather.
Fico surpreso ao saber que ela ainda lembra de nossa estadia na base, pensei que como, ora estava consciente, ora xingando palavrões e desejando conseguir usar seus poderes para nos matar, a criança não se lembraria dessa fase.
– Seu povo fez isso comigo, quando decidiram confiar mais nesses... Monstros que chegaram do espaço.
– Vocês também vieram do espaço, mas são bons!
– Quantos anos você tem?
A garota corta suas falas por um instante para pensar.
– Nove.
– Antes de você nascer ou mesmo eu e qualquer um nesse planeta, meu povo já sofria nas mãos da humanidade, então não venha querer me dar lições! – Rosno. – E agradeça por ter te salvado! Eu poderia simplesmente mandar esse lugar para os ares com o meu poder, e você morreria junto.
– Você não faria isso – ela, apesar de deixar claro que está decepcionada com a minha atitude, balança a cabeça negativamente.
– O que você sabe sobre mim?
– Sei que é uma boa pessoa, a Heat me falou muito sobre você.
– Eu ERA bom, agora sou diferente, sou exatamente o que deveria ter sido desde o começo: um soldado.
– Tenho certeza que ainda é bonzinho! – Faz bico e mostra a língua para mim, o que não faz o menor sentido. – Se não, teria me matado, não me salvado.
– Fiz porque seus poderes podem ser úteis, não porque sou legal!
– E como tinha tanta certeza que eu ia ajudar? Ainda mais agora que tá sendo um chato!
Permaneço em silêncio, não só por não ter uma resposta, mas também por perceber que ela é só uma criança, embora seja inteligente, ainda é só isso. Não devo explicações para Alex.
– Tá vendo? Eu sabiaaaa! – A menina dá um pulinho e sorri para mim, mas eu não correspondo, apenas a ignoro novamente, o que a faz protestar fechando os punhos e colocando-os nos quadris.
Nós finalmente entramos na sala, e o homem vai direto para os computadores, dando uma olhada por cima do ombro antes de continuar. Ando até o telão principal, posicionado acima de todos os monitores.
Mark leva algum tempo digitando senhas e liberando acessos até que algo surja na tela maior. Num instante, um mapa aparece lá, e existem vários pontos piscando em vermelho em torno de todo o globo.
– São todas as bases – o homem arranha a garganta. – A nossa está aqui – ele dá um zoom na apresentação, mostrando a cidade australiana batizada de New Hope.
– Tem como acessar alguma informação visual de qual dos meus estão nas bases?
– Bem – o doutor olha para a minha mão sobre a mesa e engole seco. – Eu sei que temos fotos de todos que foram coletados, porém não sei se consigo saber a localização exata.
– Pegue todas as fotografias que puder de todos que estão nesse país.
– São muitos! Vai levar muito tempo e ...
– Pegue! – Exalto a voz o suficiente para assustá-lo.
Alex surge do meu lado, ela continua me fitando com certa dúvida, seus olhos coloridos estão cintilantes, tentando ler o que a minha mente processa.
– O que é?
– Você não vai nem tomar um banho, ou colocar uma roupa? – Faz uma varredura completa em mim com o olhar, de cima até embaixo. – Você tá praticamente pelado – debocha.
– Não acho que tenha roupas aqui.
– Na verdade, deve ter sim, todos os funcionários das bases moram nela, na maior parte do tempo – Mark interrompe, me fazendo olhar para seu rosto quadrado.
Quando volto para onde a criança estava, ela sumiu, viro as costas e a vejo quase fora da sala.
– Vou trazer roupas pra você, mesmo que não mereça minha ajuda! Seu chato!
– Você não vai não! – Vou andando na direção dela, mas a garota vai se afastando a cada passo que dou, com um sorriso bobo estampado, como se tudo não passasse de uma brincadeira.
Dou um salto que me permite alcançá-la num segundo, o que a pega totalmente desprevenida, assustando-a bastante. Seguro a garota pela gola com muita agressividade e a ergo no ar, sacudindo seu corpo com os meus dentes cerrados. Aquele sorriso infantil desaparece, dando lugar a um olhar que a cada instante vai ficando mais triste, aos poucos, os cantos de sua boca vão se voltando para baixo.
– Quem é você? – A criança finalmente resmunga, com os olhos fixados nos meus.
Embora a cena toque o fundo do meu coração, sei que não devo fraquejar de novo diante de humanos, independente da idade.
– Eu sou a fúria de todos os Zedar – respondo com a voz firme. – Estou te dando a última oportunidade de obedecer, caso contrário, te mato aqui mesmo.
Alex pisca devagar antes de me encarar.
– Então mata – a garota quase sussurra, sem sequer tentar se soltar. – O que você acha que vão fazer comigo se me pegarem de novo? Mais lavagem cerebral, mais experiências, mais dores. Se eu fugir daqui, não tenho pra onde ir de qualquer jeito! Não tem ninguém me esperando! – Ela explode em uma fúria temporária, então decide fazer uma pausa para se recompor. – Vai me fazer um favor se me matar.
– Então por que você quer me ajudar mesmo assim?
– Porque vocês me ajudaram, se é pra ficar viva, que seja com vocês. Quando abri os olhos e vi que era você, ficou melhor ainda.
Abaixo a garota, até que seus pés toquem o chão, e a empurro para trás.
– Traga as roupas rápido, não temos muito tempo.
O som de um "bip" me faz olhar para trás, para que possa ver o que o doutor está tramando, e quando olho para frente novamente, Alex já se foi.
Volto a me aproximar do cara, que agora abre muitos arquivos fotográficos na tela, vejo o máximo de rostos que meus olhos possam ver, na tentativa de reconhecer um deles. São tantos que quase não tenho tempo de identificar as características, pressiono os lábios, confesso que tenho medo de Rachel e os outros não terem sido encapsulados dentro do tempo estipulado, o que significaria a morte deles. E mesmo se estiverem em uma base, nada garante que ainda estejam vivos.
– Imprima tudo!
Rapidamente, o homem digita alguns comandos no computador e a impressora enorme no canto da sala começa a executar.
Nesse meio tempo, a tela gigante parece falhar, porém tudo se revela quando uma logo com o nome "North" escrito no meio toma o espaço. Fomos descobertos. Na verdade, eu já imaginava, provavelmente os humanos que estavam aqui devem ter avisado, porém preciso de ao menos de alguma informação de como está lá fora. Não adiantaria nada sair por aí sem rumo. Além disso, Mark disse conhecer a saída subterrânea da base, o que já ajudará bastante na fuga.
– Olá, Zedar – North anuncia. – Deve saber que já estamos cientes de sua fuga, mas ela não durará muito.
– Blá, blá, blá, diz logo o que você quer! Vai explodir o computador ou o quê?
– Tenho alguém que quer falar com você, seu mal educado – A voz da inteligência muda o tom, tirando completamente o ar artificial dela.
A tela muda para uma transmissão ao vivo, levo apenas um segundo para identificar a pessoa, suas roupas agora são muito mais formais e robustas, dignas de um militar, até mesmo o aspecto visual, como a trança única que compõe seu cabelo.
– Onde está a princesa? – A garota vai direto ao ponto. – Diga, que eu garanto que você e todos que escolher não serão afetados.
– Me diga você – levanto os braços. – Nem se eu soubesse eu contaria, humana!
Jack abre um sorriso desdenhoso, é algo raro de ver de sua parte.
– Vai mesmo abrir mão desse benefício por ela? Estou literalmente te oferecendo paz.
– Eu abriria mão de qualquer coisa pela Natalie – respondo. – Se você é tão forte quanto diz, por que não vai atrás dela? Ou é tudo mentira também, como fez desde sempre? – Olho mais uma vez para seus olhos castanhos, desprezando cada centímetro da imagem que vejo.
– Como tentei explicar, só fingir ser fraca e entrei no papel para me aproximar de você, e consequentemente, da princesa – Jackeline fala, olhando para os lados.
– Então foi tudo armação mesmo? Desde o atropelamento com a bicicleta. Não sei por que não estou surpreso – concluo para mim, com sarcasmo.
– Sim – Confessa. – Sei tudo sobre vocês dois, tudo mesmo, até mesmo do seu relacionamento amoroso com Natalie, antes mesmo de vir para a Terra.
– Você só poderia supor essas coisas – replico.
– Sempre tive todas as informações a respeito. Depois que o Líder descobriu que sou Singular, fui criada e treinada apenas para matar a princesa.
– Podia tê-la matado quando teve a chance, e não foram poucas, agora será impossível – sorrio, contente com o fato de eu ter razão.
A adrenalina no meu corpo começa a me deixar, então sinto o peso do esforço que fiz, além da dor do corte no peito que agora volta com tudo.
– Já disse, não matei porque queria me aliar a vocês – Revira os olhos. – Bem, não importa mais, diga a princesa que quando cruzarmos nossos caminhos novamente, ela estará morta.
– Boa sorte – respondo, provocando, já com a mão no corte.
A ligação é cortada, e tudo volta ao normal.
Nessa hora, o doutor se levanta e se aproxima de mim, ao ver que me inclinei um pouco para tentar me recuperar.
– Não se aproxime mais! – Alerto, erguendo uma mão na frente do corpo. – Pegue todos os papéis, vamos sair daqui.
O homem imediatamente dá a volta, indo até a impressora, e pegando o que pedi. Caminho devagar, o peito arde a cada movimento, parece que o ferimento foi mais profundo do que eu imaginava. Sinto que estou ficando tonto, e lento.
Quando a visão fica turva, balanço a cabeça, meus cabelos úmidos entram na frente do rosto apenas para atrapalhar ainda mais, estou perdendo as forças, dou mais um passo às cegas, porém meu braço é posto sobre alguma coisa. Mark me oferece seu ombro, mesmo receoso enquanto vamos para fora da sala. Tudo que penso é no que vou fazer, caso ele tente alguma coisa, juro que vou tirar forças do mais profundo do meu ser e arrancar fora seu coração, mas não dá tempo de fazer mais do que ameaças mentais, apago.
Escuto o som de algo sendo arrastado no chão, é o som de rodinhas, num segundo, todo meu corpo é afetado por um chacoalhar após um baque seco, abro os olhos, estamos avançando por um corredor bem claro e com o teto arqueado, a frieza do ar me faz acreditar que estamos na saída subterrânea que Mark mencionou, olho para cima da minha cabeça e vejo o doutor empurrando a maca, Alex anda ao meu lado, sempre atenta aos movimentos do homem, nós dobramos a enorme passagem, pegando o próximo corredor.
– Já cuidamos do seu ferimento – a criança diz, quando percebe que já estou acordado. – Ele não vai te machucar, já mostrei do que sou capaz – toca sua própria testa com o dedo.
A dor latejante na cabeça me incomoda cada vez que a movimento, é uma sensação horrível, olho para a minha própria mão, fecho o punho, mas não sinto tanta firmeza como antes.
– Você vai ficar bem, é só o efeito das drogas que injetamos no seu corpo – o homem explica.
– Onde fica a saída? – Pergunto.
– Temos duas opções: a primeira é como uma garagem, e vamos sair num lugar nada discreto. A segunda é uma escotilha automatizada que deve dar em alguma parte da floresta.
– Vamos pela segunda, não queremos chamar mais atenção.
– Você não vai querer mesmo – o homem pigarreia. – Agora com os novos humanos, as ruas são vigiadas por inteligências artificiais, soldados, tudo para caçar a resistência, o mundo virou um caos.
– É assim que eles trabalham – explico, virando o rosto.
– Eu sei que não é uma boa hora para perguntas, mas... Como é que funciona lá fora?
– Bem, existem basicamente duas raças colonizadoras: os humanos e nós. Os planetas que são nossos geralmente tendem a ser mais tranquilos, muito por conta de nossas leis e ideologias. Já os planetas humanos quase sempre são palcos de guerras civis, caos e morte. Ao menos foi assim em praticamente todos que visitei – olho para Alex, com o canto do olho, a garota está devorando cada palavra minha. – Porém, os humanos sempre resolvem seus problemas da mesma forma: com chacina e escravidão.
– Soube que somos bem desenvolvidos – o doutor fala um pouco mais baixo, com os olhos fugitivos.
– São sim, tecnologicamente, mesmo que isso tenha custado a vida de milhões de inocentes, principalmente do seu próprio povo. Não viu como atacaram esse país sem o menor pudor?
– A humanidade é horrível – Alex comenta, olhando para Mark. – Por causa de pessoas como você!
– Eu sou um humano terrestre, eu só... Estava fazendo meu trabalho – abaixa a cabeça. – Nos disseram que raças alienígenas hostis viriam aqui para tentar nos exterminar, que estávamos apenas nos defendendo. Nós, cientistas dessa área, sempre tivemos o conhecimento que existe vida inteligente fora da Terra, porém, mentiam sobre tudo, nos fazendo acreditar que vocês eram o problema. Agora vejo que não são.
– Não seja idiota, como pôde acreditar numa coisa dessas? Os experimentos que fazem não te dizem nada a respeito do que realmente são?
– Precisamos de soldados para a sobrevivência da raça humana, ou os aliens virão aqui e vão acabar com tudo, eles diziam – esfrega o rosto cabisbaixo. – Parece que enquanto fazíamos lavagem cerebral nas crianças, eles faziam em nós.
Aos poucos sinto que estou melhorando, o corpo já reage melhor aos movimentos, os músculos já estão mais relaxados, embora ainda doloridos.
Alex encara o homem com certo desprezo, e bem, ela está correta, já que também foi vítima dos experimentos. Na verdade, não entendo como a garota está tão tranquila mesmo estando diante de uma pessoa que lhe fez tanto mal, talvez esteja mais preocupada em escapar.
– Não se faça de vítima, doutor, mesmo que não soubesse da verdade, isso não justifica tirar crianças de suas famílias para torná-las soldados à força – faço um sinal para que parem a maca, para que eu possa me levantar.
– Acha que tive escolha?
– Claro que teve, você teve a chance de escolher entre sua liberdade moral e a física, você escolheu a física – encaro o homem com desdém, ele apenas concorda em silêncio, não ousando responder.
Coloco os pés no chão devagar e respiro fundo, meu peito arde, a dor é quase sufocante e limita certos movimentos. Nós finalmente chegamos ao que parece ser a saída, uma enorme porta que é semelhante a um cofre, e deve ser tão pesada quanto uma. O doutor é quem vai na frente e digita alguns códigos no teclado, depois aproxima o rosto de uma espécie de leitor. Em seguida um sinal sonoro é emitido, indicando que a passagem está aberta.
Mesmo não me sentindo cem por cento, me levanto, Alex me auxilia no processo, embora eu não precise, olho para meu tórax e ele está todo enfaixado, um curativo grande muito bem feito. A garota me entrega uma jaqueta de couro, que é o que falta para que eu não esteja mais sem roupas, já que estou trajando uma calça jeans e tênis. Pego-a e coloco devagar.
A porta finalmente se abre de fato, revelando uma escada discreta de metal, que vai até o teto.
Antes que eu possa dizer algo, escutamos um enorme estrondo vindo de cima, que faz toda a terra tremer como nunca, olho para cima, as luzes fraquejam mediante ao tremor, e as paredes parecem ceder parte de seu material na forma de poeira.
– Estão atacando a base – Mark explica. – Temos que sair daqui, eles não vão parar enquanto tudo não desmoronar.
O homem nos incentiva a ir, entregando uma pequena bolsa para Alex, que corre para subir a estreita escada de mão.
– Temos que nos apressar – o doutor pigarreia, abrindo espaço para que eu possa passar primeiro.
– Para onde vamos? – Me aproximo dele, e novamente, o teto e toda estrutura acima de nós treme, o que nos faz avançar até o pé da escada. Olho para cima e vejo que Alex continua escalando firme cada degrau.
– Seguiremos floresta adentro sempre para o oeste, depois vamos estar livres.
Sinto um formigamento na mão direita, o que me faz erguê-la um pouco e fechá-la e abri-la várias vezes, o que faz com que o doutor imediatamente se afaste com os olhos arregalados. Quando o encaro, ele sorri, desajeitado.
– Desculpe, é que...Toda vez que você fecha o punho eu acho que vou morrer.
– Vamos! – Alex grita do final da escada, que deve ter pelo menos uns dois metros de altura.
– O que você prefere que eu faça então? Prefere que eu feche o punho ou estale os dedos? – Me aproximo de fato dos primeiros degraus, ao levantar o braço para tocar o metal dela, sinto uma fincada de dor, mesmo assim mantenho-o no alto.
– Definitivamente prefiro um estalar de dedos – responde, bem-humorado.
– Ótimo – respondo com um gesto. Em seguida, ergo a mão na frente do meu rosto e estalo os dedos, retirando novamente todo o seu ar. – Fique com o seu estalar de dedos, doutor – viro as costas e começo a subir os degraus da escada embutida na parede enquanto ouço o homem de sufocar desesperado, mas não faço nem questão de olhar para trás, foco em olhar para a luz acima, Alex usa seus poderes para empurrar o alçapão.
Ela opta por não esperar que o meu corpo ferido faça o trabalho e me leva para fora com a telecinésia.
– Cadê o doutor? – Diz, depois que meus pés tocam a grama. A garota se abaixa para tentar enxergar algo lá embaixo.
– Já deve estar morto – dou de ombros.
– Você matou ele??? – Alex grita, com os olhos saltados.
– Sim, vamos – toco o ombro dela, para que se levante, mas como resposta, recebo um soco no estômago. – O que... Pensa que tá fazendo!? – Exalto a voz, com o grunhindo preso entre os dentes.
O som de duas naves rasgando o ar nos faz olhar para o céu todo preenchido pelo cinza em silêncio. Permanecemos imóveis e abaixados, elas vão e voltam várias vezes, atacando a base que deixamos, sem hesitar, exatamente como me lembro dos humanos de fora. Depois da construção desaparecer, os caças prateados vão embora, me permitindo respirar.
– Você tá sendo um idiota – Alex rompe o silêncio, reiniciando o assunto.
– Então ele não merecia morrer? – Me ergo com dificuldade, soltando um gemido abafado.
– Claro que merecia, mas não era pra ter matado, seu bobão, cabeçudo! – Seus punhos se fecham com força.
– Você ouviu o que disse? – Largo as palavras no ar e olho ao redor, estamos expostos, a céu aberto, achei que seríamos vistos aqui.
Mesmo com a sorte ao nosso favor, não pretendo contar com ela, pois sei que logo tropas terrestres devem varrer as redondezas para procurar nossos corpos, vivos ou não.
Começo a caminhar pela elevada planície acidentada em direção ao próximo conjunto de árvores, escuto o som dos passos pequenos da criança logo atrás de mim, eles vão ficando mais próximos até que um certo ponto, olho por cima do ombro, ela está um passo atrasada, porém, Alex parece querer manter essa distância, julgando pela sua expressão insatisfeita.
Lanço um olhar rápido para o horizonte à minha direita e finalmente entendo o motivo do sol estar sendo coberto pelo céu cinza: um conjunto de edificações enormes estão ardendo em chamas visíveis daqui, o laranja e amarelo do fogo toma conta de quase tudo. Existe um anel gigante prata que paira no ar, como se a gravidade não o afetasse, a estrutura tecnológica permanece intacta próxima ao topo dos prédios.
Faço o restante desse percurso de cabeça baixa, essa guerra está longe de acabar, sei que teremos que dar tudo de nós se quisermos vencer.
Natalie, eu e Rachel, se ainda estiver viva, estamos à frente da nova resistência que ressurgirá, nós somos o império dos três, como a princesa disse uma vez, e essa guerra na Terra será decisiva, será o capítulo final.
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