vinte e quatro | j a n t a r
Acordo com um barulho de água e olho pela janela para confirmar se ainda está chovendo.
Não está.
A cama vazia de Tyler me faz concluir que ele está no banho.
Me espreguiço e estalo meu pescoço, dolorido pela forma com que dormi na poltrona. Me levanto, prendo meus cabelos em um coque e começo a dobrar minha coberta. Nem percebo quando Tyler desliga o chuveiro.
— Acordou, Bela Adormecida?
Dou um pequeno pulo de susto e me viro, dando de cara com Tyler apenas de toalha.
— Acordei. — Fixo meu olhar em sua toalha, e quando me dou conta disso, me sinto ruborizar.
Ele sorri.
— Como você está se sentindo? — Pigarreio, desviando meu olhar, dobrando agora, a coberta de Tyler.
— Melhor. Só dói um pouco. — Ele se refere ao corte em sua barriga.
— Que bom.
— Elisa, posso te perguntar uma coisa?
Dou de ombros, confirmando.
— O que está rolando entre você e o Dan?
— Entre mim e o Dan? — Reflito por alguns segundos. — Bem... Nada. Ainda.
— Ainda?
— É. — Pego as cobertas dobradas e vou até o armário, guardá-las.
— Certo.
Fecho o armário e me viro. Tyler está parado à minha frente, me olhando intensamente.
— O que foi? — Dou um sorriso nervoso.
— Você não imagina o quanto me segurei para não beijar você esta noite, Elisa.
Engulo em seco.
Tyler praticamente zera o espaço entre nós.
Sinto sua respiração lenta e profunda e luto para não perder o ritmo da minha.
Ele roça seu nariz no meu.
— Tyler, por favor, não. — Peço, de olhos fechados.
Sinto-o se afastar.
Abro os olhos e o vejo me olhando em um misto de confusão e frustração.
— Eu não sou um jogo, Tyler.
— Eu sei disso.
— Então, por favor, pare de jogar comigo.
Tyler trava o maxilar e desvia seus olhos dos meus.
— Com licença. — Uma enfermeira jovem e bonita para à porta. — Vim refazer seu curativo.
— Ah, claro. — Ele sorri para ela, parecendo não se importar nem um pouco em estar apenas de toalha.
— Sente-se na cama, por favor.
Tyler sorri torto e se senta.
Assisto a tudo em silêncio e de braços cruzados.
A enfermeira tira a bandagem e aplica uma solução salina e sabão neutro com a ajuda de uma gaze em seus pontos.
Tyler morde o lábio, fazendo uma pequena careta.
— Está doendo? — Ela o olha.
— Só um pouco.
A enfermeira sorri e continua com o processo. Seca os pontos com outra gaze e aplica um remédio de cor alaranjada. Em seguida, refaz a bandagem, com um cuidado excessivo, em minha opinião.
— Prontinho.
— Muito obrigado...
— Susan.
— Susan. — Tyler sorri. — Nome bonito. Combina com você.
— Ah, obrigada. — Ela também sorri, ruborizando.
Reviro meus olhos e vou para o banheiro.
Presenciar os flertes de Tyler logo pela manhã é demais para o meu estômago.
Lavo meu rosto e escovo os dentes, agradecida por ele não ter me beijado. Convenhamos, ninguém acorda com o hálito apto para um beijo.
Fito meu reflexo no espelho por alguns segundos, torcendo mentalmente para que Tyler já tenha parado de flertar com a enfermeira, e abro a porta.
— A enfermeira bonitinha já foi? — Olho em volta.
— Já.
— Hum.
Encaro o pedaço de papel em sua mão.
Tyler percebe e sorri torto, dobrando-o em um pequeno quadrado.
Em seguida, ele se desfaz da toalha, sem pudor algum.
— Meu Deus! — Me viro de costas, tampando os olhos.
— O que foi?
— Você... — Me embaraço. — Será que dá para você colocar uma roupa?
— Você subestima o número de mulheres que se matariam para me ver assim, Elisa.
Reviro os olhos, ainda de costas.
E tenho certeza que Tyler sorri.
— Eu... Eu vou ficar ali no banheiro, até você se trocar.
Fecho a porta, sem me virar.
Ouço Tyler rir.
Solto um assobio baixo.
— É, Quinn, agora eu entendo o porquê dessa sua obsessão. Quanto potencial, Tyler Abrams!
— Prontinho, querida. — Ele avisa, pouco depois. — Estou vestido.
Abro a porta e o encaro, agora completamente vestido. Calça de moletom preta e camiseta de mangas longas cinza, de tecido fino, que evidencia seus músculos.
— Bem melhor.
— Há quem discorde. — Sorri torto.
Dou uma risada e reviro os olhos.
Tyler se senta na cama.
— Você não deveria estar vestindo as roupas do hospital?
— Deveria, se eu fosse permanecer aqui. O que não é o caso.
— E quem disse que você não vai?
— Victoria. Lembra?
— Você sabe que não é assim que funciona, não sabe?
— Pare de ser estraga prazeres, Elisa.
Ergo as mãos, calando-me.
Tyler sorri.
E mesmo sem notar, acabo retribuindo.
— Tyler!
David adentra o quarto, com um semblante extremamente preocupado.
— Pai, o que você faz aqui?
— Sou eu quem devo lhe perguntar isso. O que houve com você?
— Nada novo. — Ele dá de ombros. — Me meti em uma briga.
— Não trate isso de forma tão banal. Você poderia ter morrido, sabia?
— É, mas não morri. Pode guardar o sentimento de culpa para uma próxima ocasião.
David suspira.
— Eu... Vou deixar vocês à sós. — Aviso, antes de me encaminhar para a porta.
— Não é necessário, Elisa. — David me impede. — Aqui não é lugar para debatermos sobre nossas divergências. Nós vamos para casa.
— Qual casa? A que você me expulsou?
— Tyler, por favor... Eu disse aquelas coisas sem pensar. Não torne nossa situação mais difícil do que já é.
Ele me olha.
Faço um gesto afirmativo com a cabeça.
— Está bem. Vamos colocar uma pedra nisso. Eu também disse coisas por impulso.
David sorri fraco.
— Venha, vamos para casa.
David apoia a mão nas costas de Tyler e o guia para fora do quarto.
Observo a cena por alguns segundos, até me dar conta do que está acontecendo e correr a colocar as coisas de volta à bolsa que Victoria trouxe no dia anterior e os seguir.
— Ei, rapaz. Onde você pensa que vai? — O médico que atendeu Tyler nos barra no corredor.
— Vou levá-lo para casa. — David responde.
— Ele não pode sair antes de receber alta.
— Dê alta a ele então, doutor.
— Não é assim que funciona, senhor...
— Abrams, David Abrams.
— Senhor Abrams. Há um protocolo a ser seguido.
— Depois de tudo o que meu filho passou, a única coisa que eu desejo é levá-lo para casa e cuidar dele, doutor. Ele terá toda a assistência necessária, eu lhe asseguro disso.
— Certo. — O médico reflete por um instante. — Ok... Tyler, como você se sente?
— Estou ótimo.
— Sente náuseas, dor ou tonturas?
— Não. Nada.
— Certo. — O médico folheia algumas páginas em sua prancheta e começa a escrever algo. — Sua pressão está boa e a sutura também. Muito bem, Tyler. Você está de alta.
Os dois trocam um aperto de mão.
— Obrigado, doutor.
— Se cuide, rapaz.
Tyler consente com um pequeno sorriso.
— Doutor Lodge, muito obrigado. — David também troca um aperto de mão com o médico. — Vocês salvaram a vida do meu filho.
— Esse é o nosso trabalho. E seu filho também teve muita sorte.
— Realmente. — David troca um breve olhar com Tyler. — Muita sorte.
— Eu lhe prescrevi um antibiótico e também analgésicos e antitérmicos, caso sinta dor ou febre. — O médico novamente se volta para Tyler, entregando-lhe uma receita. — Aqui também tem toda a medicação necessária para a manutenção de seu curativo. Siga tudo a risca e se hidrate bem, que logo você estará cem por cento recuperado.
— Eu seguirei, com toda a certeza.
— Ótimo.
— Mais uma vez, obrigado doutor. — David dá dois tapinhas amigo em seu ombro.
— Não há de quê.
O médico se vai, corredor adentro, enquanto nós três nos encaminhamos para fora em silêncio.
Logo na porta do hospital, vejo o imponente Tesla X preto de David estacionado.
— Que merda! Meu carro! — Tyler finalmente dá falta de seu automóvel. — O que aconteceu com ele?
— A polícia já está investigando, filho.
— Aqueles filhos da puta devem ter roubado ele. Meu celular e minha carteira também.
— Isso é o que menos importa agora. — David faz um gesto para Tyler e eu entrarmos no carro. — Vamos.
Coloco a bolsa no banco traseiro, onde me sento. Tyler vai no banco do passageiro, ao lado de seu pai.
No caminho, David faz uma ligação para um cara chamado Franklyn e pede para que ele transfira "uma boa quantia" para a conta do hospital que atendeu Tyler.
Sorrio com sua atitude.
Seguimos o restante do caminho em silêncio, e somente quando chegamos na mansão, é que David me chama para conversar:
— Elisa, você teria um minuto?
— É claro.
— Vou para o quarto. — Tyler avisa, sendo logo acolhido e ajudado por Victoria.
— Elisa, Victoria me contou tudo o que você e seu amigo fizeram por meu filho. E eu gostaria de lhes agradecer. Não fosse por vocês, Tyler não estaria aqui conosco hoje.
— O senhor não tem nada o que agradecer. Qualquer um no nosso lugar teria a mesma atitude.
David sorri.
— Seu amigo, Alex. Você acha que ele aceitaria jantar conosco?
— Ah... É claro.
— E você, aceita?
Sorrio.
— Com certeza.
— Ótimo. Vocês dois serão os convidados de honra. Amanhã, às oito. — David sorri, cordialmente. — Ah, e você está de folga.
— Obrigada!
David se despede com um aceno de cabeça, enquanto eu me encaminho para a cozinha, ainda assimilando todas as informações.
— Eleanor? — Sorrio, surpresa, logo que a vejo.
— Elisa! — Ela retribui. — Como você está?
— Estou bem e você? Como passou seus dias de folga?
— Maravilhosamente bem!
— Dá mesmo para notar. — Observo seu semblante feliz e descansado.
— E você? Como se saiu no comando da cozinha?
— Melhor do que eu imaginava. Mas você fez falta. Muita falta.
Eleanor sorri.
— Soube que você passou a noite com Tyler no hospital. Como isso aconteceu?
— Longa história. Está com tempo?
— De sobra.
Cruzo o gramado dos Abrams, após um longo e ótimo papo com Eleanor.
Destranco a porta de casa e entro com cuidado para não assustar Mike outra vez.
— Ei, Mike. Cheguei.
— Elisa? Finalmente! — Mike vem do banheiro. — Pensei que você tinha deixado a casa só para mim.
— Não tão fácil, meu caro. — Sorrio. — E então, tudo certo por aqui?
— Tudo sob controle. Fiz muito bem meu papel de fingir que não existo.
— Ótimo.
— E o imprevisto grave?
— Está tudo bem agora.
— Que bom. — Ele sorri. — Ah, um cara veio aqui. Chamou por você.
— Cara? — Pergunto do quarto, onde pego uma lingerie, camiseta preta e jeans rasgado. — Que cara?
— Se eu não me engano, ele se chama Daniel. É um dos fiéis escudeiros do Tyler. Loiro, fortão, cara de mau.
— Dan esteve aqui? — Aponto minha cabeça na porta. — Que horas?
— Ontem à noite. — Mike responde da sala.
— Merda.
— Ele não era o imprevisto, pelo visto. — Mike comenta, em tom ácido.
— Cuida da sua vida, garoto! — Semicerro meus olhos em sua direção e entro no banheiro.
— Não está mais aqui quem falou.
— Acho bom.
Mike ri.
Entro no chuveiro e após um bom banho para tirar o cheiro de hospital, saio, já vestida, e vou para o meu quarto.
Nesse minuto, uma mensagem de Dan chega em meu celular:
"Ei Elisa, estive aí na sua casa ontem, mas você não estava. Você deve estar sabendo do que houve com o Tyler, certo? Para comemorar sua volta para casa, seu pai vai dar um jantar amanhã. E eu vou. Então, se quiser me ver, estarei aí. Um beijo."
— O jantar do Tyler. E o Dan vai estar. E eu sou a convidada de honra. — Me sento na cama. — Ótimo. Vai ser um jantar e tanto.
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