trinta e um | g o s t a r
Acordo com uma dor de cabeça chata e a boca seca.
Espreguiço e acabo esbarrando meu braço em algo, que resmunga.
— Mas que merda...?
Abro os olhos e franzo o cenho.
— Mike?
Ele se mexe ao meu lado na cama, mas não acorda.
— Por que Mike está dormindo na minha cama? — Pergunto à mim mesma, esfregando os olhos.
Demora alguns segundos para minha ficha cair.
Dan está dormindo na sala.
— Puta merda! — Exclamo, me sentando.
— O que houve? — Mike pergunta, sonolento.
— Nada, nada. — Me apresso em responder. — Durma aí.
Ele resmunga algo inaudível e se enrosca no edredom.
Levanto e vou na ponta dos pés até a sala, onde me encosto no batente e observo Dan dormir tranquilamente no sofá.
Nem de longe se parece com o furacão da noite passada.
Suspiro, pensando na confusão em que me meti.
Fui o motivo de uma briga sanguinária, levei uma cotovelada no rosto que doeu como o inferno, dei uns amasso em Tyler e agora tenho Dan dormindo em meu sofá.
— Quanta merda para uma só noite.
Balançando a cabeça em negação, entro no banheiro.
Enquanto a água quente cai sobre meu corpo, escovo os dentes e penso no que fazer quando Dan acordar.
Nada me vem em mente.
Não faço ideia de como agir ou o que falar.
Desligo o chuveiro, me enrolo na toalha e torço mentalmente para que Dan ainda esteja dormindo.
Abro a porta e espio.
Ele está na mesma posição, ferrado no sono.
Suspiro, aliviada, e entro no quarto.
Mike também dorme, mas agora abraçado ao meu travesseiro.
Pego no guarda roupas um suéter cinza, jeans e meu par de coturnos pretos. Com o barulho, Mike acorda.
— O que está havendo aqui?
— Bom dia para você também.
Ele se espreguiça, antes de retrucar:
— Seria um bom dia se eu acordasse só daqui a duas horas.
— Onde está seu espírito esportista?
— Dormindo.
Reviro os olhos rindo e me encaminho de volta para o banheiro. Me visto e volto para o quarto, sustentando o olhar de Mike.
— O que foi?
— O que você vai fazer quando ele acordar?
Suspiro.
— Não faço ideia. Mas fugir é uma das opções.
Ele me encara de cenho franzido.
Dou de ombros e prendo meus cabelos em um rabo de cavalo. Segundos mais tarde, ouço Dan resmungar algo sobre seu pescoço.
Minhas mãos gelam.
Olho para Mike, como que pedindo por ajuda.
Ele cerra os lábios, com as sobrancelhas arqueadas.
Não ajuda muito.
Permaneço imóvel por mais alguns segundos, decidindo se devo ou não ir falar com Dan.
Decido pelo sim.
— Bom dia. — Cruzo meus braços, parando a poucos passos de distância dele.
— Bom dia. — Dan me responde com uma pequena careta. Seus ferimentos estão mais visíveis e com certeza, mais doloridos também, assim como o meu.
— Como você está?
— Tremendamente arrependido.
Dou um pequeno e rápido suspiro.
— Se sente melhor?
— Como poderia?
Desvio meus olhos para o tapete.
Dessa vez é Dan que suspira.
— Obrigado por ter me deixado ficar.
— Você não estava em condições de ir para lugar algum.
Ele ri fraco, talvez concordando.
— Me desculpe, Elisa. Por tudo.
Consinto em silêncio.
— Eu realmente sinto muito. — Ele sussurra, antes de se levantar.
Sua camisa está ainda mais amarrotada, seus punhos machucados e seu cheiro de álcool ainda mais acentuado.
Meu coração se aperta ao vê-lo nesse estado deplorável, mas não vacilo. Acompanho-o em silêncio até a porta e sustento seu olhar.
— Se eu pudesse voltar no tempo...
— Não pode. O que está feito, está feito. — Essa frase serve mais para mim, do que para ele, no final das contas.
Ele morde o lábio inferior.
— Eu realmente gosto de você, Elisa.
Suspiro. Sinto a ponta da culpa que estava me assombrando dobrar de tamanho.
— Eu também gosto de você, Dan. Mas aprendi com minha mãe que o amor próprio vem primeiro. Sua atitude ontem me surpreendeu muito, mas de forma negativa. E também me fez cogitar quem poderia ser o próximo a provar de sua ira. Não quero que seja eu. Então... Me desculpe. Mas acabou.
Ele trava a mandíbula e engole em seco.
— Eu jamais encostaria um dedo em você, Elisa.
Sem dizer mais nada, ele se vira e caminha a passos firmes pelo gramado dos Abrams.
Uma lágrima escorre inconscientemente de meu olho.
Enxugo-a rápido e fecho a porta.
— Ei, — Mike se encosta no batente — está tudo bem?
— Está. — Respiro fundo, espantando as lágrimas que ameaçam cair, e dou um sorriso rápido.
Mike vem até mim e deposita um beijo em minha têmpora.
— Foi melhor assim.
— É, eu sei.
Sem dizer mais nada, pego um copo de água na cozinha e o bebo em um só gole.
Vejo Mike entrar no banheiro e, após alguns segundos paralisada, resolvo preparar nosso café da manhã.
— Puta merda, Mike!
— O que foi que eu fiz? — Ele pergunta, do chuveiro.
— Comeu tudo o que tinha no armário e na geladeira!
— Eu preciso me alimentar bem. Estou em fase de crescimento. — Ele se defende, me fazendo rir.
— A única coisa que vai crescer se você continuar assim, é sua barriga.
Sem outra opção, pego meu cartão de crédito dentro da bolsa e paro à porta do banheiro, avisando Mike que vou ao supermercado.
— Compra sorvete de creme?
— Vai sonhando.
Ouço seu muxoxo e deixo a casa, rindo.
Vou caminhando até o supermercado próximo da mansão e quando chego, vejo quem eu menos gostaria.
Quinn Daves.
Ela caminha com elegância, empurrando seu carrinho repleto de itens saudáveis e caros.
Respiro fundo, antes de iniciar minhas compras, torcendo mentalmente para que não nos cruzemos nos corredores.
Compro torradas, ovos, salsichas, bacon, cereal, steaks e batatas. Leite, suco de laranja e refrigerante também.
Enquanto escolho distraidamente alguns legumes e verduras, alguém esbarra em mim.
— Ai, me desculpe... — Quinn pede, fingindo não me reconhecer à primeira vista. — Ah, Marisa! Não imaginava te encontrar por aqui.
— Pois é. — Sorrio rápido, voltando logo minha atenção aos tomates. — Nem eu.
— Ei, o que houve com seu rosto?
— Não é da sua conta, Quinn.
— Nossa, quanta grosseria. — Ela se faz de ofendida. — Só estou perguntando, numa boa.
— Quinn, não tem ninguém por perto. Não precisa se fingir de boa moça.
Ela me encara, cheia de arrogância. Depois sorri.
— Você até que é espertinha.
Sorrio ironicamente.
— Quem fez isso em você?
— Ninguém fez. Foi um acidente.
Quinn ri.
— Essa é a desculpa de noventa por cento das mulheres agredidas. Qual é? Fale a verdade. Não vá me dizer que foi seu namoradinho, Daniel Ozera?
— Você não tem nada melhor para fazer, não?
Ela finge pensar por um segundo.
— Não.
— Que pena, porque eu tenho. Com licença.
Saio empurrando meu carrinho, deixando Quinn para trás.
— Que ódio dessa ruiva de farmácia!
Após pegar um pote de sorvete de creme no refrigerador, vou até o caixa, passar minhas compras.
Pago-as e saio com as sacolas, de volta à mansão.
No portão, me encontro com David saindo com seu carro. Ele está de óculos escuros e camiseta, informal como jamais o vi antes.
— Oi, Elisa. — Ele para e me dá passagem.
— Oi, senhor Abrams.
— Como você está?
— Estou bem. —Sorrio fraco. — E o senhor?
— Bem também, obrigado. Precisa de ajuda? — Ele se refere às sacolas.
— Ah, imagina. Obrigada. Eu dou conta.
David sorri.
— Elisa, desculpe perguntar, mas... O que houve com seu rosto?
— Eu... Bati. Jogando vôlei... Levei uma bolada. Enfim. — Gesticulo.
— Certo. Bem, desejo melhoras.
— Obrigada, senhor Abrams.
— Até mais, Elisa.
— Até.
Ele sai com o carro e eu respiro aliviada.
— Meu rosto está tão estragado assim? — Questiono, enquanto caminho até minha casa.
— É impressão minha ou você estava falando sozinha?
— Deve ser impressão sua. — Respondo, pousando as sacolas sobre a mesa.
— Sorvete de creme! — Mike o desembala e me beija no rosto. — Você é a melhor! Nunca me deixe dizer o contrário!
— Pode ter certeza que não deixarei.
Ele ri.
Vou até o espelho e analiso meu reflexo.
A pele em volta de meu curativo está arroxeada e levemente inchada.
— Droga, Dan... A gente podia ter evitado tudo isso.
Suspiro e volto à cozinha.
Nesse minuto, alguém bate à porta.
Mike vai para o quarto e eu abro-a. Automaticamente sorrio.
— Alex!
— Ei, pequena. — Ele me abraça. — Como você está?
— Estou bem. — Dou de ombros.
— Bem merda nenhuma! Olhe o que aquele filho da puta fez com seu rosto! — Ele passa os dedos cuidadosamente sobre minha maçã.
— Vai sarar.
— Vocês não deveriam ter me impedido de quebrar a cara daquele babaca. — Alex entra, dirigindo-se à Mike, que percebe que é seguro aparecer e se junta a nós.
— Ainda bem que eles o impediram. Violência só gera mais violência. E já tivemos o bastante por ontem.
Ele suspira com as mãos na cintura, enquanto Mike aponta, concordando com minhas palavras.
— Tudo bem, rainha da sensatez. Você tem razão.
— E quando é que eu não tenho?
— Noventa e nove por cento das vezes.
Reviro os olhos.
— Fiquei preocupado com você. — Ele beija o topo de minha cabeça.
— Ai de você se não tivesse ficado.
Alex ri.
— Você realmente está bem.
Sorrio.
— Sorvete? — Mike oferece, com uma colher na mão.
— Cara, são dez da manhã!
— Desde quando tem hora para tomar sorvete? — Ele dá de ombros, com a boca cheia do gelado de creme.
— Você tem lombriga, só pode. — Encaro-o, inconformada.
Mike me responde com uma careta, o que faz Alex rir.
— Bem, agora posso ir tranquilo.
— Por que já vai? Você acabou de chegar.
— Eu só passei para ver como você estava. Hoje vou entrar mais cedo na lanchonete, preciso ajudar Bill a fazer a contagem do estoque e a lista de compras.
— Que droga. — Faço um bico.
— Pois é. — Alex me imita. — Mas eu volto. Não sei se ainda hoje, mas volto.
— Está bem.
— Até mais, Lisa. E Mike, cuide dela enquanto eu não estiver por perto.
— Pode deixar. — Ele bate uma continência.
— Se cuida. — Abraço-o.
— Diga à Izzy que mandei um beijo.
— Direi.
— Tchau para vocês.
— Tchau. — Respondemos em uníssono.
— Ele parece ser legal. — Mike comenta, logo que Alex se vai.
— Ele é incrível. — Sorrio. — Mas nunca conte a ele que eu disse isso.
Mike ri, concordando.
— Agora larga esse sorvete, vamos tomar nosso café.
— Esse filme é horrível. Não estou entendendo nada.
— Talvez não funcione com burros. — Dou de ombros, comendo pipoca.
Mike franze o cenho.
Não me contenho e caio na risada.
Novamente, alguém bate à porta. Tampo minha boca, automaticamente.
Mike e eu nos olhamos.
— Quem será? — Sussurro.
Ele encolhe os ombros.
— Vai para o quarto.
Mike obedece, enquanto eu espio pela janela.
Vou até a porta e a abro.
— Passei para ver se você está bem, mas a julgar pelas gargalhadas... Está ótima.
— Oi para você também, Tyler.
Ele sorri.
— Oi.
— Eu estou bem, sim. Aliás, obrigada. De novo.
— Tudo bem.
Ele toca meu rosto machucado com carinho.
— Dormiu bem?
— Apaguei, na verdade.
— Eu realmente suspeitei disso. Você abusou da cerveja ontem.
— Nem me lembre. — Fecho os olhos e sinto-me ruborizar. — Tyler, o que aconteceu ontem...
— Foi um erro?
Abro a boca para responder, mas desisto.
Ele sorri fraco.
— Você vai gostar de mim, Elisa Hattaway.
Meus olhos encontram os seus.
— Ou melhor... — Cruza as mãos nas costas. — Vou deixar você fingir mais um pouco que ainda não gosta.
Ele se aproxima e beija minha testa.
— Até breve, amor.
Permaneço estática, vendo Tyler se afastar a passos lentos e confiantes.
— Eu ouvi o que acho que ouvi?
Me viro e encaro Mike e seu olhar condenador.
— Você... E o Tyler? — Ele sorri, maliciosamente.
— Cala a boca, Mike.
Meu celular toca, salvando minha pele.
— Ei, Kim.
— Lisa, — ela chora — pelo amor de Deus, me ajuda!
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro