trinta e dois | r e f é n s
— O que está acontecendo? Kim!
Ouço um barulho seco e forte ao fundo. Choro de criança também.
— Meu pai... — Ela sussurra. — Ele está completamente descontrolado! Por favor, me ajuda!
— Vou ligar para a polícia! — Faço um sinal para Mike pegar o celular, notoriamente desesperada.
— Eu já liguei, Lisa. Ninguém aparece.
Outra pancada.
— Meu Deus!
— Lisa, ele vai matar a gente! — Kim chora.
— Não vai, não. Me escuta, ok? Bloqueie a porta, coloque tudo o que conseguir na frente. Ganhe tempo. Estou indo e levando reforço. Aguenta firme.
Desligo e disco o número da polícia.
— Que merda está havendo? — Mike me encara, sem entender nada.
— O pai da Kim. Aquele filho da puta está surtado, ameaçando matar todo mundo. Vem comigo.
Puxo Mike pela mão, guiando-o a passos rápidos até a mansão.
— Departamento de Polícia de Nova York.
— Oi, eu preciso de uma viatura, urgente! Meu vizinho está completamente descontrolado e ameaçando matar a mulher e os filhos!
— Certo. Me passe o endereço.
— Ralph Ave, no Bedford-Stuyvesant. Apartamento sobre a "Glass&Mirror".
— Ok. Disponibilizando viatura. Seu nome por favor, senhora.
— Marta... Marta Parker. — Dou de ombros. — Por favor, sejam rápidos. Há crianças no local.
— Seremos.
— O que você está fazendo? — Mike para a poucos passos da mansão. — Eu não posso ser visto aqui, esqueceu?
— Situação de emergência, Mike. Anda logo!
Adentro a cozinha dos Abrams, ainda o puxando pela mão. Por sorte, ou não, dou de cara com Victoria e David no maior chamego. Eles parecem tão ou mais surpresos do que eu.
— Elisa? — Victoria se afasta rapidamente de David, ruborizada.
— Ah, meu Deus. — Paro. — Eu atrapalhei, não é? Ah, droga. Me desculpem, eu juro... Juro que não vi nada!
— Elisa, — ela pigarreia — hoje não é seu dia de folga?
— Na verdade, é. Mas eu preciso muito falar com o Tyler, muito mesmo. É urgente.
— Tyler? — Mike sussurra para mim. E quando o faz, David finalmente o nota.
— Ei, você não é o garoto com quem meu filho se desentendeu no jantar de caridade? O filho dos Baizen?
— É... Dizem que sim. — Ele sorri rápido, notoriamente constrangido.
— O que você faz aqui em minha casa e com a Elisa?
— Eu...
— Elisa? — Tyler surge milagrosamente na cozinha. — O que está havendo aqui?
— Ah, graças a Deus, Tyler! Nós precisamos conversar. Eu preciso de sua ajuda.
— Ok. O Baizen faz parte disso?
Meneio a cabeça.
— Faz.
— Certo, vamos subir.
— Com licença senhor Abrams, Victoria.
— Toda, Elisa.
Mike faz um aceno com a cabeça para os dois, antes de nos seguir.
— Tyler, nós não temos tempo. — Detenho-o antes que ele suba o primeiro degrau. — Kim está em apuros. Eu preciso ajudá-la.
— O que houve com ela?
— O pai. Está totalmente descontrolado e ameaçando matar ela, a mãe e os irmãos.
— Mas que merda! Vamos logo, então!
Tyler rapidamente pega as chaves de seu novo carro e caminha a passos firmes até a garagem.
Me sento no carona e Mike se ajeita no banco de trás.
— Para onde nós vamos?
— Bed-Stuy.
— Ai, caralho. Ok.
Cerro meus lábios. O bairro de Kim realmente não tem uma boa fama.
Tyler dá partida no carro, sem fazer mais nenhuma pergunta.
Quarenta e cinco agonizantes minutos mais tarde, chegamos à casa de Kim.
— Ai, meu Deus. Ai, meu Deus! — Desço com urgência ao ver carros da polícia e dos bombeiros parados à sua porta.
Uma fita isolando toda a área me impede de chegar mais perto.
— O que está acontecendo? —Pergunto a um bombeiro.
— Estamos em uma negociação de reféns, moça. Por favor, se afaste da fita.
— Como é? Reféns?
— Moça, por favor. Se acalme e afaste-se da fita.
— É minha amiga que está lá dentro correndo risco de vida, senhor! Não me peça calma em um momento desses!
— Ei, Lisa. — Tyler envolve minha cintura, me afastando poucos centímetros do local. — Eu compreendo seu desespero, mas você só está atrapalhando o trabalho deles. Kim vai ficar bem. Todos vão.
Encaro Tyler nos olhos. Lágrimas escapam dos meus e correm por meu rosto apavorado.
— Vem. Por favor.
Cedo ao seu pedido e me afasto do local.
Da esquina, observo os policiais tentarem, sem muito sucesso, negociar a soltura de Kim e sua família.
— Lisa! — Alex corre em minha direção logo que me vê.
— Alex! — Abraço-o apertado. — Você sabe o que está acontecendo lá dentro?
— O filho da puta está fazendo os próprios filhos e a mulher de reféns. — Alex trava o maxilar. — Ele tem uma arma, Lisa. E a toda hora aparece na janela com ela apontada para a cabeça da Joanne.
— Ah, meu Deus! — Cubro minha boca, apavorada.
— Eu devia ter quebrado as duas pernas desse desgraçado quando tive chance.
— Ei, está acontecendo algo ali. — Mike aponta para o apartamento.
Da janela, visualizo Joanne, mãe de Kim, chorando silenciosamente enquanto é segurada com violência pelo pescoço por seu marido. Ele grita a plenos pulmões para que os policiais o deixem em paz para se resolver com sua mulher, enquanto chacoalha, sem pudor algum, a arma na outra mão.
Sigo cobrindo minha boca, apavorada demais para fazer qualquer outra coisa.
Sinto a mão de Tyler pousar gentilmente em meu ombro e, mesmo que por apenas poucos segundos, me sinto acalentada.
Quase duas horas de apreensão, medo e tensão.
Nada de acordo.
Vários veículos de imprensa cobrem a negociação, que virou o centro das atenções do bairro e de todas as imediações.
Alex, Tyler e Mike permanecem em silêncio ao meu lado, observando cada movimento dos policiais.
Ouço uma ponderação sobre invasão e um atirador de elite. Meu coração quase para. As chances de algo dar errado me apavoram.
Rezo mentalmente para que nada de mau aconteça.
Só paro quando um som seco e alto corta o ar.
Um tiro. Rápido e certeiro.
Joanne chora compulsivamente ajoelhada no chão, ao lado do corpo inerte do marido.
Bombeiros adentram o apartamento e resgatam Kim e seus irmãos, enquanto dois policiais checam os sinais vitais do homem baleado e cobrem seu corpo. A última a sair do apartamento é Joanne. Ela está machucada, assustada e confusa, caminhando com dificuldade e com auxílio de uma socorrista.
Corro até a ambulância em que Kim e seus irmãos estão sendo atendidos, mas novamente sou barrada.
— Perdão, querida. Eles precisam de cuidados.
— Eu sou amiga deles. Por favor.
A socorrista resiste por alguns segundos, mas acaba deixando eu me aproximar.
— Ei, pequenos.
Os dois irmãozinhos de Kim me abraçam, ainda muito assustados.
— Por que o papai não acordou, Lisa? — Benjamin, o caçula, me pergunta.
— O papai... Ele estava muito cansado. Não se preocupe com isso, ok? Está tudo bem agora.
— Ele queria machucar a mamãe. Isso está errado, não está? — Josh, dois anos mais velho, me encara.
— Está sim, Josh. Muito errado.
A socorrista faz um gesto afirmativo com a cabeça para mim, do tipo: "eu assumo daqui". Consinto e a deixo conversar com os meninos.
— Kim, — corro para abraçá-la — como você está?
Ela não responde. Simplesmente chora. Chora copiosamente.
— Está tudo bem agora. Acabou.
Sigo a consolando por alguns minutos, até que a socorrista se aproxima.
— Preciso levá-la para o hospital. — Apoia a mão gentilmente em meu ombro. — Ela está em estado de choque, precisa de cuidados.
— Tudo bem.
Dou um último abraço em Kim, antes de me afastar.
— Logo estarei lá, ok?
Ela apenas consente.
Observo a ambulância sair com as sirenes ligadas, até os rapazes me alcançarem.
— Para qual hospital estão os levando? — Pergunto.
— O mesmo que atendeu Tyler. — Alex responde.
— Eles estarão em boas mãos. — Tyler me acalma.
— Kim vai ficar bem. O pior já passou. — Mike afirma.
Consinto em silêncio.
— Eu preciso ir até lá. Será que podemos?
— É claro. Vamos.
Tyler estende sua mão. Eu a seguro e sou guiada até seu carro.
— Vem comigo, Mike. De moto é bem mais divertido.
Alex estende um capacete a ele, que aceita, subindo no veículo.
— Tyler, obrigada. — Agradeço depois de me sentar no banco do carona.
— De nada.
— Dan me disse uma vez que você era um amigo incrível. Eu não acreditei.
Ele ri fraco.
— Agora vejo que ele estava coberto de razão.
Seus olhos encontram os meus.
Ele sorri.
— O que posso dizer? Não sou de todo ruim.
É a minha vez de sorrir.
— Não mesmo.
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