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dezoito | e s c o l h a

— Já que estamos oficialmente em um encontro agora, — Dan sorri — me conte mais sobre você.

— O que você quer saber?

— Quero saber tudo sobre você, Elisa.

Encaro-o, com uma sobrancelha erguida.

— Isso soou um pouco psicótico, sabia?

Dan ri, baixando a cabeça.

— Ok... Vamos lá. — Tomo fôlego. — Sou filha única, amo pizza e dias de chuva, tenho medo de palhaços, falo sozinha e não confio em pessoas que não gostam de cachorros.

Dan sorri largo.

— O que foi? — Pergunto.

— Você é incrível.

Me sinto corar.

— Certo. Sua vez, olhos bicolores. — Tomo um gole do café.

— Ok, vejamos... Para começar, esse detalhe super charmoso — ele aponta para seu olho — já me rendeu bons momentos de bullying na época do colégio.

— Jura?

— Difícil de acreditar, não é? — Ele sorri fraco. — Já fui chamado de E.T., aberração, esquisito...

— Que cambada de idiotas!

— Pois é. Felizmente, tudo mudou quando conheci a academia e me tornei co-capitão do time de futebol. O garoto antes magricela e rejeitado, passou a ser popular e a andar com os caras mais legais. Milagrosamente, minha heterocromia se tornou sexy. — Pisca.

— E os caras que praticavam bullying contra você?

— Não passaram nos testes para o time. — Faz um biquinho.

Wow, vingativo!

— Não é minha culpa a falta de talento deles. — Dan dá de ombros.

— E quanto aos "caras legais"? Não me diga que se referia a Tyler e Theo.

— Não direi, então.

Sorrio.

— Os dois podem ter milhares de defeitos, mas como amigos, são incríveis. — Dan defende. — Eles já me apoiaram e acolheram em situações que você nem conseguiria imaginar. Quando todos me viraram as costas, eles se mantiveram ao meu lado. Tyler, principalmente.

— Estamos realmente falando das mesmas pessoas? Do mesmo Tyler?

— Estamos. Por mais estranho que isso possa parecer.

— Então, quer dizer que Tyler não é o egocêntrico, manipulador e insensível que aparenta ser?

— Isso aí.

Consinto em silêncio.

Acabo de ser pega de surpresa.

Tyler realmente tem um coração.

Segundos depois, meu celular toca.

— É o meu amigo. — Aviso a Dan, olhando para a tela de meu aparelho. — Já volto, ok?

— Claro.

Me levanto e vou até um local mais silencioso.

— Ei, Alex. Onde é que vocês se meteram?

— Oi Elisa, eu estou bem sim, obrigado por perguntar.

Reviro os olhos.

— Estou esperando vocês há horas, sabia?

— Quanto exagero. — Alex ri. — E se você fosse um pouquinho mais esperta, deduziria que ainda estávamos trabalhando.

— Mas a lanchonete fecha às nove.

— Não mais. Bill decidiu estender o expediente, agora fechamos às dez.

Desde quando isso?

— Desde hoje. 

— E o que deu nele para estender o horário?

— O fluxo de clientes. Praticamente dobrou de uns dias para cá.

— Jura? E o que vocês fizeram para isso acontecer?

— Não posso te contar. Sabe como é, você não faz mais parte da nossa equipe, é antiético.

Vá se foder, Alex.

Ele ri, do outro lado da linha.

— Estamos no lugar combinado e você não está aqui. Onde te encontramos?

— Aqui no Hartley's.

Estamos chegando.

— Ok!

— Beijo, pequena.

— Outro!

Desligo e volto para a mesa, onde Dan me aguarda.

— Estão chegando.

— Certo. E o que nós vamos fazer?

— É uma boa pergunta.

Ele sorri.

— Poderíamos ir a alguma balada...

Faço uma careta.

— Ou não. — Ele completa rapidamente.

Dou uma risada.

— Eu gosto de festas, mas... Não sei se você já percebeu, não tenho muita sorte com elas.

— Definitivamente, não. — Cerra os dentes. — Foi uma péssima ideia.

Consinto, sorrindo em seguida.

— Olá! — A voz de Alex cumprimenta às minhas costas, poucos minutos depois.

Me viro e o vejo abraçado à Kim, com uma expressão bem conhecida no rosto.

— Dan, estes são meus amigos, Alex e Kim. — Apresento-os.

— Oi. — Kim acena.

— Olá, como vai? — Dan se levanta e a cumprimenta com um beijo na bochecha.

— Bem e você?

— Ótimo.

Alex me fita pelo canto dos olhos e Kim me lança um sorriso cheio de malícia.

Reviro meus olhos.

— E aí, cara. — Alex estende a mão para Dan, que a aperta sorrindo.

— Sentem, estávamos esperando por vocês.

Alex e Kim sentam-se de frente um para o outro, estrategicamente.

— E então, o que nós perdemos? — Alex se ajeita na cadeira.

— Nada. — Respondo. — Viemos para cá esperar por vocês.

— E o que vamos fazer? — Kim pergunta. — Ficar por aqui mesmo?

— Ou a gente pode ir lá para casa... — Alex sugere. — Jogar alguma coisa, tomar uma tequila.

— Eu topo. — Dan se encosta na cadeira.

— Troco a tequila por pizza. — Kim se manifesta.

Aponto para ela, concordando.

— Também voto na pizza.

— Ok. — Alex revira os olhos. — Pizza então, suas chatas.

Ele faz menção de se levantar, mas é impedido por Dan.

— Pode deixar, parceiro. Essa é por minha conta.

Alex ergue as mãos, concordando.

— Onde você o arranjou, Lisa? — Ele pergunta segundos mais tarde, analisando Dan.

— "Arranjou". Isso lá é jeito de falar?

Ele dá de ombros.

— Conheci-o na mansão. Dan é amigo do Tyler.

— O playboy folgado?

— É.

— Hum.

— Não começa. Ele é legal.

— É o que veremos.

Reviro os olhos, sorrindo, e vou até o balcão, na intenção de dividir a conta.

Quando faço menção de pagar, Dan me impede:

— Ei, nem pensar! Você não vai pagar a conta no nosso primeiro encontro.

— E por que não? — Franzo o cenho.

— Porque são apenas dois cafés e uma pizza. Você vai pagar quando formos a algum restaurante bem caro.

— Ah, que espertinho!

Dan ri.

— Tudo bem, talvez eu pague de novo.

— Espere... Você está me convidando para um segundo encontro?

Ele finge pensar por alguns segundos.

— É, eu estou.

Sorrio.

— Ei, deixem para flertar mais tarde. — Alex se levanta, sorrindo torto. — A pizza vai esfriar.

— Ninguém está flertando aqui.

— Fale por si. — Dan sussurra, próximo ao meu ouvido.

Dou um pequeno sorriso envergonhado e o sigo para fora.

Alex destranca a porta e nos dá passagem.

Bienvenidos, chicos.

— Onde está o Sean? — Kim entra, procurando com os olhos.

— Se não estiver trancado no quarto, está em algum encontro de nerds.

— Ainda nutrindo a paixão platônica, Cooper? — Pergunto com um sorriso.

— Sean é um gato. — Ela dá de ombros.

— Certo, o que vão querer jogar? — Alex pergunta, com a caixa de pizza nas mãos.

— Imagem e ação!

— Ah, não Kim! Eu sou péssima nesse jogo.

— E essa é a graça.

— Ei, bonitão. — Alex chama Dan. — Tem cerveja na geladeira. Sirva-se.

Dan consente, indo até a cozinha e pegando duas long necks. Logo depois, ele volta e se senta ao nosso lado, no sofá.

Pouco depois, Alex retorna ao cômodo com um cavalete nas mãos e uma caneta na boca.

— Certo. — Ele se ajeita. — Quem começa?

— Eu. — Kim se levanta.

Alex se senta e aceita a cerveja da mão de Dan.

Kim inicia o desenho, completamente incompreensível para mim.

— "Mad Max?" Alex arrisca.

Kim nega e inicia outro desenho, ainda pior que o anterior.

— "Deadpool". Arrisco, com a boca cheia de pizza.

— Não!

— "Transformers". — Dan afirma, dando um gole em sua cerveja.

— Sim! — Kim comemora.

— Ah, não é possível! — Reclamo. — Aquilo é um robô?

— É claro! — Kim se volta para a folha. — Aqui está o carro, — ela circula — ele se transformando... E voilá, o Bumblebee!

— Isso está mais para uma lata de lixo amassada. — Resmungo. — Como você adivinhou?

— Sou ótimo em Imagem e Ação. — Dan sorri.

— Eu que sou uma ótima desenhista!

— Kim, não exagere. — Alex se serve de um segundo pedaço de pizza. — Seu Bumblebee parece ter saído de um triturador de sucatas.

Ela se faz de ofendida e pega um pedaço de pizza também.

— Vocês não compreendem minha arte.

Sua irritação nos faz rir.

— Certo, minha vez.

Dan se levanta e vai até o cavalete.

Ele desenha uma interrogação, um X,  uma flecha e uma mulher de palitinhos.

— "X-men"? — Alex chuta, com a boca cheia de pizza.

— Passou longe.

— "Arquivo X"? — Arrisco.

— Nossa, vocês são tão ruins! — Dan ri, incluindo alguns corações ao desenho.

— Ah! Eu sei, eu sei! — Kim dá pulinhos no sofá. — "Como não perder essa mulher"!

— Boa! — Dan comemora e sorri em minha direção.

— Para bom entendendor, um título de filme basta. — Kim cochicha em meu ouvido.

— Cala a boca. — Solto uma risada baixa.

A brincadeira segue por mais algum tempo, até que nossa cartela de filmes se esgota, fazendo os rapazes engatarem uma animada discussão sobre a Liga de Basquete.

— Parece que eles estão se entendendo. — Kim comenta, indo até a cozinha comigo.

— Ainda bem.

— E já passou da hora de você me contar o que está rolando.

— Como assim?

Kim semicerra os olhos.

— Não se faça de boba!

Dou uma risada.

— Dan é um cara legal. Eu gosto da companhia dele.

— Certo. E ele beija bem?

— O quê? — Arregalo os olhos, rindo em seguida. — Não!

— Não? Ele beija mal?

— Não, eu não quis dizer que ele beija mal. — Balanço a cabeça negativamente. — É que ainda não nos beijamos.

— E por que não?

— Eu não sei... Não pintou clima para isso ainda.

— Lisa, o cara mandou um "Como não perder essa mulher"! Quer clima melhor?

Observo Dan por cima do ombro.

Ele é bonito.

Muito bonito.

E gentil, educado, divertido.

Mas falta algo.

Algo que não consigo explicar ou identificar.

Apenas falta.

— Qual é o problema?

— Eu realmente não sei, Kim. — Suspiro. — Mas já chega de falar de mim. — Me viro de frente para ela. — Como você está?

— Eu? Estou bem.

— Bem mesmo?

Ela consente.

— Fico tão preocupada com você. E com sua mãe, seus irmãos.

Kim sorri fraco.

— Meu pai jurou que vai parar de beber.

— Sério? Isso é bom!

— É, realmente seria se ele cumprisse.

— Ele não está cumprindo?

— Está. Tem três dias.

— Já é um bom começo, não?

Ela encolhe os ombros.

— Ele já quebrou tantas promessas que desisti de acreditar.

Fico em silêncio.

Nunca sei o que dizer nesses momentos e Kim sabe disso.

Mas ela parece preferir assim.

Talvez seja menos doloroso.

— O que as garotas tanto conversam aí? — Alex pergunta, da sala.

— Com certeza, não é sobre a Liga Mundial de Basquete. — Respondo.

Kim sorri, encerrando nosso assunto.

Voltamos para a companhia dos rapazes e iniciamos uma conversa realmente séria sobre Michael Jordan ser ou não o maior jogador da história.

O relógio nos avisa que já passa de uma da manhã, quando nos despedimos de Alex e levamos Kim até sua casa.

— Se cuide, está bem? E me ligue se estiver com problemas, sejam eles importantes ou não.

— Pode deixar, Lisa. — Kim segura minha mão. — E obrigada pela carona, Dan.

— Não tem de quê. — Dan sorri. — Foi muito bom te conhecer, Kim.

— O sentimento é recíproco. — Ela retribui. — Bem, até logo.

Esperamos Kim entrar em casa para partirmos.

— Então, o que achou do nosso primeiro não encontro?

— Épico! — Dan sorri. — Eu nunca conheci alguém como você, Elisa.

— Devo considerar um elogio?

— Com certeza.

Sorrio.

Dan liga o rádio e uma música romântica e lenta começa a tocar.

Permanecemos em silêncio, escutando-a, até que Dan se manifesta.

— Não foi proposital, eu juro.

Sorrio.

— Acredito em você.

— Acreditaria se eu dissesse que quero muito te beijar nesse exato momento?

Ruborizo.

— Mas não farei isso.

Olho-o, com curiosidade.

— Nosso beijo acontecerá quando você quiser.

— Acho justo. — Sorrio.

Seguimos o restante do caminho conversando.

Infância, adolescência, burradas da vida.

Só paramos quando Dan estaciona à frente da mansão.

— Obrigada pela noite.

— Me diga quando a repetiremos.

— No próximo sábado?

— Marcado!

— Boa noite, Dan.

— Boa noite, Elisa.

Aplico um beijo em sua bochecha e desço do carro.

Os seguranças liberam minha entrada e, antes de ir, aceno em despedida.

Caminho pelo gramado, com o vento frio queimando minha pele quente.

Cruzo os braços na frente de meu corpo e aperto o passo.

Porém, uma risada do outro lado do gramado me faz parar.

Tyler está dentro do ofurô abraçado à garota loira, incrivelmente entretido com o que quer que ela esteja falando.

Meu estômago embrulha.

Aquilo não deveria me afetar.

Mas afeta.

E como afeta.

Volto a caminhar a passos largos, torcendo para que Tyler não note minha presença.

Tarde demais.

— Elisa!

Respiro fundo, antes de me virar.

— Chegando agora?

— Pois é.

— E onde está o Dan?

— Já foi.

— Ah, que pena. — Ele finge chateação, nitidamente bêbado.

A garota sorri. Patética.

— Não quer se juntar a nós, Elisa? A água está ótima.

— Obrigada, mas eu passo.

Tyler sorri de canto e vira sua bebida de um só gole.

Reviro os olhos e volto a caminhar.

Antes de alcançar a porta de minha casa, lanço um último olhar para o ofurô.

— Idiota.

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