dezenove | a j u d a
Domingo é o dia oficial da preguiça.
E por esse motivo, ainda estou trajando meu velho e confortável pijama de ursinhos, jogada no sofá e devorando uma caixa inteira de donuts.
Permaneço em meu ritual de engorda, até ser interrompida por batidas em minha porta.
— Já vou! — Aviso, de boca cheia.
Levanto de um pulo e vou atendê-la, limpando com as costas da mão minha boca suja de creme.
— Oi. Voltei!
Isabelle sorri, ainda trajando seu pesado casaco de viagem.
— Isabelle! Há quanto tempo você chegou?
— Há menos de cinco minutos. — Com os ombros baixos, completa: — Eu vi o blog, Elisa. O que foi que aconteceu?
Suspiro.
— Entre, vou te contar tudo.
Dou-lhe passagem e a observo despir o casaco preto.
— O que meu irmão aprontou?
— Tecnicamente, nada. Ele deu uma festa e me convidou. — Pego a caixa e ofereço: — Donuts?
— Não, obrigada. E você foi à festa?
— Fui. — Suspiro.
Isabelle me ouve com atenção.
— Tyler, Dan e Theo foram bem legais comigo, eu até estava me divertindo. Mas então, Quinn Daves apareceu, derramou seu copo todo de cerveja em meu vestido e batizou minha bebida.
— Quinn fez o quê?!
— Me dopou. Eu simplesmente apaguei no meio da festa e acordei horas depois, na cama do seu irmão.
Isabelle arregala os olhos.
— Não, não aconteceu nada do que você está imaginando. Tyler só cuidou de mim. — Faço uma pausa. — Nossa, soa até estranho.
— Então, se vocês não... Sabe, "ficaram juntos", por que você está na lista?
Encolho os ombros.
— Seu irmão jura inocência. Mas se não foi ele, quem pode ter sido? Quem tem acesso àquele blog idiota?
Isabelle reflete por alguns segundos.
— Quinn, talvez? Se ela te dopou, pode muito bem ter incluído seu nome na lista.
— Não faz sentido. — Me sento no sofá e aponto o assento do lado para Isabelle. — Ela parece ser louca por Tyler. Por que iria querer que todos achassem que nós transamos?
— Para te prejudicar. As notícias aqui em Manhattan voam. E você trabalhando em nossa casa e transando com meu irmão, é péssimo para sua imagem. Imagine se isso chega até Victoria? Você pode até ser despedida!
— Tem razão... Que droga! O que eu fiz para essa garota?
— Ela está encarando você como uma ameaça. Mas, em todo o caso, vou investigar. Não podemos esquecer que Tyler apostou que te levaria para a cama. Talvez ele não seja tão inocente quanto estamos achando.
Consinto.
— Acho que preciso de mais um donut.
Estico meu braço até a caixa e pego o primeiro que vejo. Depois, estendo-a à Isabelle, que finalmente aceita e escolhe um coberto de chocolate.
— Mudando de assunto, como foi a viagem?
— Não fiquei trancada em um quarto de hotel, como imaginei que ficaria, e papai estava bem menos tenso do que de costume. Então, foi uma boa viagem.
Sorrio, vendo-a dar uma grande mordida no donut.
— Isabelle...
— Hum?
— O que você acha do Dan?
— Do Dan? Como assim?
— Ele é... Bem, — pigarreio — um cara legal?
— É sim. Dan passou por uma fase obscura há alguns anos atrás, mas superou. Hoje em dia, do círculo de amigos de Tyler, ele é o melhor.
— Fase obscura?
— É. Tyler parecia um mocinho de filme romântico comparado a ele.
Solto um assobio longo e baixo.
— Espere aí. Elisa, você está interessada no Dan? — Isabelle sorri.
— Não. Ele é quem está interessado em mim. — Dou de ombros.
— Uau, poderosa!
Dou uma risada.
— E ah! Falando em interesse, Alex te mandou um beijo.
Ela ruboriza.
— Como a conversa virou para mim dessa forma?
Dou de ombros, fazendo um biquinho.
— O que está rolando, heim? — Cutuco-a na costela.
— Nada! Não está rolando... Nada. Somos amigos.
— Aham. Vou fingir que acredito.
Isabelle revira os olhos sorrindo e enfia o donut todo na boca.
Já é noite quando Isabelle deixa minha casa e vai para a mansão.
Ela é uma ótima companhia, exceto quando resolve pegar no meu pé ou fazer perguntas embaraçosas.
Depois de um bom banho quente, me jogo no sofá com meu edredom e coloco um filme para assistir.
— Elisa!
Alguém chama em voz baixa, batendo na porta em seguida.
Abaixo o volume da televisão.
— Elisa!
— Parece a voz do Cody. O que ele está fazendo aqui a essa hora?
Me levanto do sofá e vou até a porta.
— Elisa, oi. — Cody sorri fraco, logo que me vê.
— Cody, o que aconteceu? Isabelle... Ela está bem?
— Está, está sim. Na verdade, sou eu que preciso de ajuda.
Encaro-o, confusa.
— Ajuda? Com o quê?
— Com quem. — Cody cerra os lábios e puxa um rapaz, até o momento invisível, pela camisa e o coloca em minha frente.
— Wow! — Dou um pequeno pulo para trás de susto. — O que...? Ei, espera. Eu conheço você!
— Esse é Mike Baizen...
— O cara que massacrou sua cara?!
— Isso aí. — Mike sorri rápido. — Olá.
— Não foi bem assim, ok? — Cody se defende. — E o caso não é esse. Será que podemos entrar, Elisa? Vou te explicar tudo.
— Ok. Entrem.
— Valeu.
Cody entra, seguido por Mike, que ajeita sua mochila no ombro e corre os olhos por minha sala.
— Sentem.
Os dois obedecem e se sentam.
— Então...? — Me ajeito no braço do sofá, esperando uma explicação.
— Vai, você começa. — Cody cutuca Mike.
Ele suspira.
— Bom... Meu pai é um viciado. Viciado, sonegador de impostos e agora, falido. Nossa casa foi embargada, e os outros bens, perdidos em uma mesa de pôquer por ele.
— Encontrei Mike dormindo dentro do carro, a algumas ruas daqui. — Cody comenta.
— Caramba. Que barra! E onde estão seus pais, Mike?
— Minha mãe foi para Washington, passar uma temporada com minha avó, até a poeira abaixar. Já meu pai fugiu, Deus sabe para onde. Se ele ficasse, seria preso. Preso ou morto, já que está devendo até as calças.
— E por que você ficou?
— Eu não fiz nada. Não tenho culpa de nada. Por que eu deveria abandonar minha vida por um erro que eu não cometi?
Troco um olhar com Cody.
— Há quanto tempo você tem dormido em um carro?
— Uma semana, eu acho. Não fico contando.
— Ele precisa de um lugar para ficar, Elisa. A polícia já avisou que se o vir dormindo por aqui mais uma vez, o levará. Eu não posso levá-lo para casa agora, então pensei que... Talvez... Ele pudesse ficar aqui.
— Ficar aqui? Está maluco? Eu não posso deixá-lo ficar aqui, Cody. Se Victoria ou seu pai descobrem, eu estou ferrada!
— Eu não estou afim de causar problemas a ninguém aqui, então...
Mike se levanta, mas é impedido por Cody de sair.
— Eles não vão descobrir. Eu não vou contar, ele não vai contar... Você vai?
Mordo meu lábio.
— Será só por alguns dias. Só até eu conversar com meu pai e explicar tudo à ele.
Me lembro de quando eu estava na mesma situação de Mike e em como eu desejei que alguém me abrigasse.
— Ok, está bem. — Dou-me por vencida. — Ele pode ficar.
Cody sorri grandemente.
— Mas primeiro, me expliquem uma coisa: por que vocês brigaram no jantar beneficente?
— Longa história. — Cody desconversa.
— Nós nunca nos demos muito bem. — Mike conta. — Eu sempre o provoquei e, naquele jantar, consegui fazê-lo chegar ao limite. Ganhei um nariz quebrado por isso.
— Hum, achei pouco. — Desdenho.
Cody sorri.
— É, eu sei. E até agora estou me perguntando o porquê de você me ajudar. — Mike se vira para encarar Cody.
— Se eu estivesse no seu lugar, iria querer que alguém me ajudasse. — Ele se levanta. — Agora preciso ir, antes que alguém desconfie de alguma coisa. Obrigado pela ajuda, Elisa. Sabia que podia contar com você.
— Não tem de quê.
— Se ele fizer ou disser algo que te aborreça, me avise. Quebro o nariz dele outra vez.
— Ok.
Sorrio, enquanto Mike o encara, indignado.
Acompanho Cody até a porta.
— Tchau.
Ele acena, indo para a mansão.
Fecho a porta e vou até Mike, que segue sentado no sofá.
— Ahn... Você está com fome? Eu posso preparar algo... Uma lasanha ou algo assim.
— Seria bom. Valeu.
— Tudo bem. Se quiser tomar um banho, fique à vontade. O banheiro é logo ali. — Aponto à minha frente. — Vou pegar uma toalha para você.
— Certo.
Busco a toalha e entrego a ele. Em seguida, tiro a lasanha do congelador e a coloco no microondas.
Ela está quase pronta quando Mike surge na cozinha, trajando apenas uma calça de moletom e secando os cabelos na toalha. Seu abdômen absurdamente definido me chama a atenção, mas desvio o olhar antes que ele perceba.
— Nossa, que saudades eu estava de tomar um banho de verdade.
— Como você estava se virando?
— Estava usando o chuveiro do posto de gasolina. Mas não é a mesma coisa, sabe?
— Imagino.
O microondas apita.
— Nossa lasanha está pronta.
— Vou colocar uma camiseta. Onde eu deixo a toalha?
— Me dê aqui, eu penduro ali fora.
Vou até a pequena varanda de minha casa e penduro a toalha molhada no varal.
— Oi.
Me viro e dou de cara com Dan.
— Oi. Que surpresa!
— Estava com Tyler, aí decidi passar aqui para te ver, já que você não respondeu nenhuma das minhas mensagens.
— Ah, meu Deus, desculpe. Isabelle passou a tarde toda aqui, até esqueci de olhar meu celular.
— Não tem problema. — Dan sorri. — Como você está?
— Bem. E você?
— Também. — Ele afasta uma mecha de cabelo de meu rosto. — Seria muito piegas se eu dissesse que senti saudades?
— Seria. — Dou uma risada. — Mas seria bem fofo, também.
Dan ri, baixando a cabeça. Depois, se aproxima lentamente, segurando meu rosto com a mão.
No mesmo instante, o som de algo quebrando dentro de minha casa, seguido de um xingamento alto, nos chama a atenção.
— Está com visita?
— Eu... Ah, estou. Meu amigo... Sean, veio me visitar. — Sorrio, nervosa.
— Ah, claro. — Sua feição se torna mais séria e sua mão deixa meu rosto. — Eu não quero te atrapalhar, então... Acho que já vou indo.
— Ei, você não atrapalha.
Dan sorri fraco e aplica um beijo em minha testa.
— Até mais, Elisa.
Observo-o se afastar, estranhando seu comportamento.
Quando volto para dentro, encontro Mike agachado, juntando os cacos de um copo do chão.
— O que houve?
— Escorregou. Desculpe.
— Tá, depois você limpa isso. Vem comer.
Me sento à mesa com ele e nos sirvo.
— Quantos anos você tem, Mike?
— Dezessete.
— Nossa. Você é bem... — Procuro por uma palavra diferente de "gostoso" para me expressar. — Desenvolvido para dezessete anos.
— Obrigado. — Ele ri fraco. — Eu pratico lacrosse, então...
— Entendi. É um atleta.
Mike meneia a cabeça.
— E você, tem quantos anos?
— Vinte.
— Bem nova para trabalhar com os Abrams.
— O que posso dizer? Sou um prodígio.
Ele sorri e em pouco tempo, devora a lasanha toda de seu prato.
Logo que terminamos de jantar, Mike limpa a sujeira do copo quebrado, enquanto eu lavo as louças.
Pouco depois, anuncio que é hora de dormir.
— Não tenho nenhum colchão extra, então você vai ter que se ajeitar aqui pelo sofá mesmo.
— Seu sofá é mil vezes melhor do que o banco do meu carro, vai por mim.
Consinto, antes de buscar um travesseiro e um cobertor e entregá-los a ele.
— Boa noite, Mike.
— Boa noite, Elisa. E obrigado.
— Agradeça ao Cody.
Pisco e vou para meu quarto.
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