dez | f u g a
— IDIOTA! Você é uma tremenda idiota, Elisa!
Me jogo na cama e encaro o teto.
Como eu pude ceder?
Como eu pude deixar Tyler vencer tão facilmente?
Ele ganhou a aposta.
O que, afinal, era apenas o que ele desejava, não é? Ganhar uma maldita aposta.
Mas então, por que seu coração batia tão acelerado quanto o meu?
Por que ele me beijou com tanta urgência, como se precisasse daquilo para viver?
Sinto minha cabeça girar.
Estou exausta.
Decepcionada.
Tiro o uniforme e vou direto para o chuveiro.
A água quente cai sobre minha pele, salpicando-a de pequenas manchas vermelhas.
Em pouco tempo, o vapor invade todo o box, e por um instante, posso jurar que o rosto de Tyler está do lado de fora, me encarando com aquele sorriso presunçoso.
Desembaço o vidro com a mão.
Não há ninguém, apenas eu. Com o mesmo olhar fracassado de algumas noites atrás.
Desligo o chuveiro e me enrolo na toalha. Arrasto os pés até o guarda-roupas, onde reviro uma gaveta à procura de um pijama confortável, e acabo encontrando uma camiseta de Alex.
— O que você faz aqui? — Analiso-a por um instante, dou de ombros e a visto.
Me jogo novamente na cama.
Minutos depois, uma mensagem chega em meu celular:
▪ Kim: LISA! Está acordada?
▪ Lisa: Estou, Kimberly. O que você precisa?
▪ Kim: Jogar conversa fora. Estou entediada.
▪ Lisa: Me usando descaradamente. Tsc tsc.
▪ Kim: Não seja dramática. Isso não combina com você.
▪ Lisa: Tem razão. Falha minha.
▪ Kim: Está animada para amanhã?
▪ Lisa: SIM!
▪ Lisa: E nossa, que bom que você me lembrou. Vou precisar de sua ajuda!
▪ Kim: Minha ajuda? Para quê?
▪ Lisa: Para tirarmos a princesa do castelo.
▪ Kim: Que princesa?
▪ Kim: Espere... Não me diga que está se referindo à filha do seu patrão.
▪ Lisa: Touché! Vou levá-la para conhecer o Brooklyn!
▪ Kim: Você enlouqueceu?! Eles te demitem na mesma hora!
▪ Lisa: Só se souberem da fuga, o que não acontecerá!
— ELISA! ELISA!
Acordo assustada, com gritos próximos à minha porta.
— Meu Deus! O que é isso? — Me levanto, ainda zonza de sono, e vou até a janela.
Tyler está sobre os degraus que separam minha casa da mansão, gritando meu nome a plenos pulmões, visivelmente bêbado.
— Cara, o que você acha que está fazendo? — Dan corre em sua direção. — Vai acordar a vizinhança toda com essa gritaria!
— Eu quero vê-la! — Tyler responde com simplicidade. — ELISA!
— A garota deve estar dormindo. — Theo se junta à eles, com uma garrafa de uísque debaixo do braço. — Vamos embora.
— Não. Eu só saio daqui depois de vê-la. ELISA! ELISA!
Percebendo que Tyler não desistirá e que essa gritaria poderá me render muitos problemas, visto um robe de cetim preto apressadamente por cima da camiseta de Alex e abro a porta.
— O que está acontecendo aqui? — Pergunto em tom aborrecido.
Minha pele quente recebe sopros de ar gelado, me fazendo tremer.
— Elisa. — Tyler sorri, descendo os degraus e parando à minha frente. Posso sentir o cheiro de álcool que emana de seus poros.
— Que gritaria é essa, Tyler? Você faz ideia de que horas são?
— Shh, shh... — Ele sorri, tocando meus lábios com seu indicador. — Menos perguntas e mais ação, querida.
Tyler avança sobre mim, tentando me beijar à força. Uma de suas mãos segura firmemente minha nuca, enquanto a outra se enrosca em minha cintura.
Reunindo forças que eu nem imaginava possuir, me desvencilho de seu abraço, empurro seu corpo para longe do meu e lhe acerto um tapa no rosto.
Tyler cambaleia dois passos para trás e pousa sua mão sobre a face marcada, notoriamente furioso.
— O que você pensa que está fazendo, cara? — Dan o censura, segurando-o pelos ombros. — Ficou maluco?
— Eu avisei para você pegar leve com a bebida, Ty. — Theo dá um longo gole no uísque, diretamente da garrafa. — Olhe a merda que você está fazendo.
— Calem a boca, porra! — Ele se desvencilha das mãos de Dan. Em seguida, seus olhos azuis cheios de raiva se voltam para mim. — Você ficou louca? Como ousa me bater, Elisa?
— Como você ousa aprontar esse berreiro na minha porta e me beijar a força? — Rebato, firme. — Fique longe de mim, Tyler!
— Ou o quê? — Ele se aproxima, me olhando profundamente nos olhos.
— Ei, já chega! — Dan intervém novamente, detendo Tyler com uma mão firme em seu peito. — Vamos embora, Ty.
— Eu estou na minha casa! Se eu quiser dormir bem aqui, — ele sorri, apontando para o chão — eu dormirei.
— Ótimo! Que seja! Durma no chão gelado, então! Ouvi dizer que é mesmo ótimo para curar bebedeiras!
Volto para dentro de casa, fechando a porta com uma forte batida.
— Porra! Essa tem personalidade! — Reconheço a voz de Theo. — Eu gosto.
— Cala a boca, Theo! — Dan rosna.
Respiro fundo apoiada à parede, tentando me acalmar.
Depois, vou até a janela e espio. Dan e Theo tentam carregar Tyler à contragosto para dentro da mansão.
— A culpa é toda sua! — Tyler empurra Theo, que cambaleia.
— Minha culpa? Você apronta um berreiro às quatro horas da manhã na porta da garota, beija ela à força e o culpado sou eu? — Theo revida o empurrão. — Não fode, Ty!
— Você é culpado, sim! Quem inventou aquela maldita aposta? — Tyler avança para Theo.
— Aposta? — Dan questiona, enquanto fica entre os dois, contendo-os.
— A aposta era você levá-la para a cama com o consentimento dela, e não agarrar a garota feito um selvagem! O que você esperava que ela fizesse? Se enroscasse no seu pescoço e o convidasse para entrar? Parece que você está perdendo a prática, cara!
— Quer saber? Vocês são dois merdas! — Dan os larga e sai pisando forte, deixando os amigos para trás.
— Está se doendo pela empregadinha, Dan? — Tyler debocha. — Qual é!
Me afasto da janela, tentando controlar a imensa vontade de socar cada centímetro do corpo de Tyler.
— IDIOTA! — Grito, arremessando um travesseiro para longe.
— Você está meio aérea hoje ou é impressão minha?
Eleanor me fita por cima dos ombros, enquanto preparo uma salada Caesar.
— Eu? Não... É só que... Não dormi muito bem à noite.
— Ah, nem me fale. Venho dormindo mal à dias!
— Sério? Algum problema?
— Só há coisas demais em minha cabeça.
— Ah, entendo. Na minha também.
— Ainda bem que amanhã é nosso dia de folga. Tem algum plano?
— Vou para o Brooklyn, passar o dia com meus amigos.
— Que ótimo! Vai fazer bem à você.
— Vai sim. — Sorrio e volto minha atenção à salada.
Meia hora mais tarde, anuncio que o almoço está pronto.
E mais uma vez, Tyler não aparece para almoçar, o que me deixa extremamente aliviada. As lembranças da madrugada ainda estão muito vivas em minha mente.
— Com licença. — Sirvo David.
— Obrigado, Elisa. — Ele agradece com um breve sorriso. — Onde está o Tyler?
— Eu o chamei, mas sequer obtive resposta. Deve estar dormindo. — Victoria responde.
— Tyler não dormiu em casa. — Cody comenta com simplicidade. — Obrigado, Elisa.
Sorrio em resposta.
— Não? — David questiona. — Mas o carro dele está na garagem.
— É, mas o meu, não.
— Ele saiu com seu carro?
— E ainda mandou uma mensagem escrota às quatro da manhã dizendo que meu gosto musical é péssimo.
Isabelle troca um breve olhar comigo.
Sem ter como me demorar mais sem parecer uma fuxiqueira de marca maior, peço licença e volto para a cozinha.
— A ausência de Tyler no almoço está cada vez maior. — Eleanor observa seu lugar vago à mesa.
— Ele não me parece muito apegado à família.
— E não é. — Ela suspira, encerrando o assunto.
A tarde parece voar.
Já são 17h30min quando Eleanor surge na cozinha sem uniforme e com a bolsa no ombro.
— Eleanor, você já vai?
— Já. Victoria me liberou mais cedo. Vou aproveitar e visitar minha irmã. Ela está com uma gripe danada, coitadinha.
— Deseje melhoras à ela por mim.
— Desejarei. Até amanhã, Elisa.
Ela se vira para ir.
— Espere... Eleanor.
— Sim?
— Eu vou ficar aqui, sozinha? Quero dizer, eu... Eu não sei se sou capaz de preparar todo o jantar e...
— Ah, fique tranquila, querida. David e Cody irão para o jantar beneficente e Tyler pelo visto não voltará tão cedo. Ficarão apenas Isabelle e Victoria. Prepare um lanche leve, está de ótimo tamanho.
Ela sorri e me aplica um beijo na têmpora.
— Tchau.
— Tchau.
Suspiro e continuo a limpar os armários da cozinha, até que Isabelle aparece, extremamente animada.
— O plano está de pé, certo?
— Shh... Fale baixo! — Repreendo-a, em um sussurro. — Quer que nos escutem?
— Desculpe. — Ela baixa consideravelmente o tom de voz. — É que estou tão animada!
Sorrio.
— Seu pai e irmãos ficarão fora por quanto tempo?
— Papai e Cody, no mínimo, quatro horas. Eles são convidados de honra.
— Ótimo. Mas e Tyler?
— Pode ser que chegue agora ou só amanhã. Nunca se sabe.
— Isso pode ser um problema.
— Ah, não. Tyler não é de bancar a babá e para ele, quanto mais tempo eu ficar fora do seu caminho, melhor.
— Excelente, então. — Dou de ombros. — Precisamos nos preocupar apenas com Victoria.
— Já pensei em uma boa desculpa para mantê-la longe.
— E qual é?
— Vou dizer que terei uma avaliação de alemão segunda-feira e vou aproveitar a oportunidade para estudar. Ela nunca interrompe quando estou estudando.
— Perfeito! — Sorrio. — Ei... Espere aí. Você fala alemão?
— Tecnicamente. — Meneia a cabeça. — Ainda estou em fase de aprendizagem.
— Aos dezessete anos?
Isabelle sorri, concordando.
Encaro-a, boquiaberta.
— E por que tenho a impressão de que esse não é o único idioma que você fala?
— Bom, fluentemente... — Ela enumera nos dedos. — Espanhol e francês. E é claro, o nosso idioma.
— Você é humana?
— Até onde eu sei, sim.
— Genial! — Sorrio, animada.
— O que é genial? — Victoria surge na cozinha.
— Isabelle!
— Ah, pare com isso, Elisa. — Ela ruboriza.
— Elisa tem toda a razão. Você é uma garota genial mesmo. — Victoria sorri, quase maternal.
— Então, vou aproveitar essa genialidade toda e estudar para minha prova de alemão.
— Prova de alemão?
— Sim, segunda-feira.
— E você só vai estudar agora?
Isabelle encolhe os ombros.
— Pelo menos, é o que pretendo. Se Cody colaborar... Você sabe como ele odeia esses jantares. Aposto o que você quiser que, assim que eu chegar lá em cima, ele vai despejar toda sua frustração em cima de mim.
— Então deixe para estudar quando ele sair com seu pai. Assim você foca nos estudos sem nenhuma frustração despejada sobre você.
— É uma boa ideia, Vic. Obrigada.
— De nada.
— Vou aproveitar para ouvir as frustrações agora, então. Até logo.
— Até. — Aceno em despedida.
— Izzy é uma ótima garota. — Victoria comenta, olhando para o lugar em que Isabelle acabara de estar.
— É mesmo.
— E eu me esqueci completamente o que vim fazer aqui. — Ela ri, baixando os ombros.
— Acontece sempre comigo.
— Quando eu me lembrar, volto.
— Ok. — Sorrio.
Retomo minha atividade sorrindo, encantada.
— Isabelle é realmente genial!
— Pode deixar! Até mais tarde, papai. E Cody, não se esqueça de sorrir!
Ouço Isabelle se despedir e rapidamente pego meu celular, digitando uma mensagem para Kim:
"Barra limpa"
A resposta não demora.
"Estamos chegando."
Pego os sanduíches e o chá gelado e vou até a sala de estar, onde Victoria responde a um email.
— Com licença.
— Ah, Elisa, que gentil! — Ela sorri, logo que me vê com a bandeja nas mãos.
— Espero que você goste. É de atum com cream cheese.
— Eu adoro. Obrigada.
— Por nada. — Sorrio. — Eu preparei para Isabelle também, será que posso...?
— Claro, ela acabou de ir para o quarto estudar. E depois você está liberada, Elisa. Vá aproveitar seu sábado.
— Muito obrigada, Victoria. Com licença, então.
— Toda.
Victoria volta sua atenção para o notebook.
Subo as escadas e bato apressada à porta do quarto de Isabelle.
Ela não demora a abrir.
— Estou pronta. — Sussurra. — Seus amigos já chegaram?
— Estão vindo. — Meus olhos correm até a janela. — O que é aquilo?
— Meu modo de fugir sem ser vista.
Uma corrente de lençóis balança janela afora.
— Não é muito discreto.
— Foi a ideia que me ocorreu.
— E quando os seguranças virem isso?
— Pensei que seu amigo talvez pudesse desprendê-la depois que eu descesse.
— E se os seguranças virem ele?
— Droga, tem razão. Vou pensar em outra coisa.
Uma nova mensagem chega em meu celular.
"Chegamos"
— Eles chegaram.
— Ótimo. Desça e peça para eles se apresentarem na guarita. Do resto, eu cuido.
— Ok. Boa sorte.
— Para nós.
Sorrio e fecho a porta do quarto.
Desço com a bandeja vazia.
Victoria se vira.
— Isabelle está bem?
— Está sim. E cercada por livros com títulos ilegíveis.
— Em alemão. — Ela sorri.
— Ela leva mesmo a sério os estudos, não é?
— Leva sim. Isabelle é muito aplicada em tudo o que faz.
— Eu percebi mesmo. — Sorrio. — Você precisa de mais alguma coisa, Victoria?
— Não, Elisa. Muito obrigada. Você já pode ir.
— Ok. Com licença.
Giro nos calcanhares, mas logo volto.
— Ah, Victoria...
— Sim?
— Meus amigos, aqueles que lhe passei os nomes...
— Eles virão visitá-la?
— Sim.
— Ok, eu aviso na guarita.
— Obrigada. Boa noite, Victoria.
— Boa noite, Elisa.
Saio a passos rápidos até minha casa, tiro o uniforme e visto um suéter preto e jeans escuro. Solto meus cabelos e mando um "OK" para Kim.
Enquanto os espero, torço para que Isabelle tenha escondido sua corrente de lençóis.
— Lisa!
Abro a porta e sorrindo, puxo Alex e Kim para um abraço apertado.
— Isso tudo é saudade? — Kim pergunta, enquanto é amassada por mim.
— E um pouco de desespero.
— Onde ela está? — Alex pergunta, olhando em volta.
— No quarto. Está dando um jeito de despistar Victoria.
— Lisa... Ela é gata?
— Estava demorando. — Kim revira os olhos.
— Você nem pense em se engraçar para o lado dela. Estamos levando Isabelle para se divertir e não para ser seduzida por você.
— Eu posso ser muito divertido. — Alex se defende, dando de ombros.
— É ela ali? — Kim aponta para o jardim.
Isabelle vem correndo com a corrente de lençóis nas mãos.
— A própria.
— Olá. — Ela nos alcança, ofegante.
— Oi. — Kim sorri.
Alex, por sua vez, não responde, parecendo hipnotizado.
Kim percebe e o cutuca na costela, rindo.
— Não usou sua bela corrente? — Aponto para suas mãos.
— Não achei muito seguro, nem muito discreto.
— E não é mesmo. Como você saiu então?
— Tenho meus meios. — Responde com simplicidade. — Agora vamos logo, antes que alguém me veja aqui.
— Certo. Jogue isso dentro da máquina de lavar para irmos, então.
Isabelle obedece.
— Por onde vamos sair? — Kim pergunta.
— Pelo mesmo lugar que vocês entraram. — Respondo.
— Mas os seguranças verão a Isabelle!
— Nós temos um plano, esqueceu?
— Encontro vocês do lado de fora. — Isabelle afirma.
Consinto e sigo com Alex e Kim até a guarita, onde nos despedimos dos seguranças e nos encaminhamos para o táxi com que os dois vieram.
Corro os olhos a nossa volta, até que um assobio vindo debaixo de uma árvore na esquina me chama a atenção.
— Ela conseguiu. — Cochicho para os dois, apontando com os olhos para onde Isabelle nos aguarda.
— Por onde ela saiu? — Kim pergunta.
— Por uma porta que todos pensam estar bloqueada. Isabelle é a única que tem acesso à ela.
— Genial!
Entramos no táxi e a pegamos em seguida, longe das câmeras e dos seguranças da mansão dos Abrams.
— Como você está se sentindo?
— Maravilhosamente bem! — Ela sorri, radiante.
O táxi começa a andar.
Isabelle mal consegue conter sua felicidade, sorrindo de orelha a orelha.
Alex a observa pelo retrovisor e sorri.
Algum tempo depois, finamente anuncio:
— Isabelle, seja bem vinda ao Brooklyn!
Capítulo grande para compensar minha demora! Hahaha
Peço milhões de desculpas pela demora na atualização. Final de ano é sempre uma correria e acabei ficando quase sem tempo nenhum para escrever. Prometo que isso não acontecerá mais.
Aproveitando, quero desejar à todos vocês um 2018 repleto de saúde, paz, bênçãos e muita leitura!
Agora, me contem: o que vocês acharam do último capítulo do ano?
Um enorme beijo,
De sua autora, Bru. ♡
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