catorze | f e s t a
Os Abrams viajaram.
A essa hora devem estar desfrutando de todo o charme do amanhecer europeu.
Mas o fato de a mansão estar mais vazia do que de costume não diminuiu em nada minha tensão.
Há uma festa vindo por aí, e com ela, um pressentimento cada vez maior de que algo ruim vai acontecer.
Afinal, qual a probabilidade de uma festa organizada por Tyler correr dentro dos padrões?
Pois é, quase nula.
— Olá.
Dou um sobressalto e me viro para a porta, onde Tyler se encontra apoiado ao batente.
— Você adora fazer isso, não é?
— Isso o quê?
— Aparecer do nada e me assustar.
Tyler ri pelo nariz.
— O que você está fazendo?
— Victoria me pediu para guardar os livros novos que chegaram.
— E o que temos de bom por aqui? — Tyler se aproxima, olhando por cima de meu ombro a pilha de livros recém comprados.
— Bom... Temos poesia, romance, suspense, alguns clássicos.
— Você gosta de ler, Elisa?
— Gosto.
— E qual seu gênero favorito?
— Hum... Romance policial, fantasia, — meneio a cabeça — um pouco de ficção científica.
— Uau.
— O que foi? — Me viro, olhando-o. — Pensou que eu responderia "poesias"?
— Não. Você não parece ser o tipo de garota que gosta de poesias.
— Qual tipo de garota eu pareço ser, então? — Sorrio, organizando os livros nas devidas prateleiras.
— O tipo que me atrai.
Congelo.
Quando finalmente recupero o controle de meu corpo, encaro os lindos olhos azuis de Tyler.
— Vou dar uma festa hoje à noite. E você está intimada a comparecer, senhorita Hattaway.
Tyler pisca e sai, me deixando com cara de boba no meio da biblioteca.
— Elisa.
— Sim, Victoria?
— Pare o que estiver fazendo.
— O que houve? — Deixo de limpar a bancada da cozinha e a encaro, preocupada.
— Estamos oficialmente liberadas.
— Liberadas?
— Ordens do Tyler. Devemos encerrar o expediente imediatamente.
— E por quê?
— Eu não sei. Mas pelo visto, ele quer me manter longe daqui essa noite. Até me comprou um ingresso para o Concerto de Mozart.
— Nossa. E você vai?
— É claro que sim. Eu adoro Mozart.
— Mas Victoria... Você não tem receio de que Tyler se aproveite de sua ausência para... Não sei, aprontar algo?
— Tyler é maior de idade e totalmente responsável por seus atos. Além disso, se o próprio pai confiou nele, quem sou eu para não fazê-lo? — Victoria encolhe os ombros, apoiando sua mão em meu ombro. — Bom descanso, Elisa. Nos vemos amanhã.
— Até amanhã, Victoria. E divirta-se.
— Obrigada.
Ela me lança um último sorriso antes de sair.
Suspiro e mordendo meu lábio, deixo a mansão.
Cruzo o gramado dos Abrams até minha casa, onde encontro uma bela caixa disposta no chão me esperando.
Me abaixo e puxo o cartão pregado nela.
"Use isto. Vai ficar lindo em você."
Abro a caixa e me deparo com um belíssimo vestido branco.
— Tyler.
Dou um meio sorriso e entro em casa com a caixa nas mãos.
A música do lado de fora anuncia o início da festa, enquanto eu, do lado de dentro, enfrento o dilema de ir ou não a ela.
— Tyler só está querendo me incluir naquela lista ridícula. — Ando de um lado a outro do quarto. — Ou pior, querendo me humilhar em frente a todos dessa festa como forma de vingança pelo tapa. Quer saber? Eu não vou. Isso é suicídio social!
Paro em frente ao espelho e miro meu reflexo pela décima vez.
O vestido se adequou perfeitamente ao meu corpo. Parece que foi feito exclusivamente para mim. Alças ombro a ombro, tecido branco texturizado, pouco acima da metade de minhas coxas.
— Que merda. O que eu faço?
Após alguns segundos de uma verdadeira batalha em meu subconsciente, tiro o vestido e visto uma camisola azul marinho.
Minutos depois, alguém bate à porta.
— Ah, merda.
Visto um robe e abro-a.
— Não sabia que a festa era temática.
— Dan?
Ele sorri, parado à porta, vestindo uma camisa manga longa preta de tecido fino, jeans escuros e coturno. De tirar o fôlego!
— Por que ainda não está pronta? A festa já começou.
— Ah, Dan... Eu não vou.
— Por que não?
— Porque... Eu não conheço ninguém.
— Justificativa inválida. Você me conhece, conhece o Theo e também o Tyler...
— Que é meu patrão.
— E o dono da festa, que a convidou pessoalmente. Vamos, Elisa. — Ele sorri. — Manhattan precisa conhecer essa beleza.
— Não precisa, não.
— Precisa, sim. E eu não vou sair daqui desacompanhado, então...
Dan se senta no chão.
— Isso é sério?
Ele consente.
Reviro os olhos.
— Está bem, está bem. Levanta daí.
Dan sorri e agilmente se põe de pé.
— Vou só colocar uma roupa.
— Tudo bem, eu espero.
Suspiro e vou até o quarto, onde recoloco o vestido e jogo sobre os ombros um blazer alongado vermelho, combinando com minhas sandálias de salto.
Dou uma ajeitada em meus cabelos com as mãos mesmo e volto até Dan.
— Estou à altura de uma festa em Manhattan?
Ele sussurra um "uau", me olhando de baixo a cima.
— Está bem acima.
Agradeço com um sorriso tímido, sentindo minhas bochechas corarem.
— Vamos?
Aceitando o braço que ele estende, caminhamos até a festa.
— Você veio.
Tyler também me olha de cima a baixo, logo que nos aproximamos.
— É. Não tive muita escolha.
— Admita, eu sei ser convincente. — Dan sorri.
— Com certeza, sabe.
— E qual foi o argumento que você utilizou, Dan?
— Sinto muito, Ty. Não posso revelar. — Dan pisca.
Neste mesmo segundo, uma ruiva se pendura no pescoço de Tyler e me encara.
— Adorei o vestido. Comprou onde?
— Eu... Ah, ganhei. De presente.
— É claro que ganhou. — Ela me olha com desprezo. — Você deve ser a nova empregada... Marisa?
— Elisa. Me chamo Elisa.
— Elisa, exatamente. — Ela se dirige à Tyler. — Você não me disse que ela viria.
— Eu não tenho que lhe dar satisfações, Quinn. — Tyler dá um gole em sua cerveja.
— Wow, rude. — Dan cerra os dentes.
— Idiotas. — A ruiva, Quinn, semicerra os olhos e sai pisando forte.
— Quem é ela?
— Quinn Daves, a "peguete" titular do Tyler. — Theo chega, apresentando-a. — Você está linda, Elisa.
— Obrigada, Theo.
Ele sorri e toma um gole de sua bebida.
— Quem lhe deu esse vestido tem extremo bom gosto, Elisa. — Tyler sorri torto. — Aproveite a festa.
Tyler bebe sua cerveja de um só gole e vai conversar com um grupo de garotas que só faltam se jogar em seus braços.
— Vou pegar uma bebida para nós. — Dan avisa em meu ouvido.
— Ok.
Observo-o se afastar e ser chamado por duas garotas.
— Vocês são bem famosos por aqui, não?
— Tudo culpa de nosso charme. — Theo pisca, cumprimentando três garotas, logo em seguida.
— É claro. — Sorrio, olhando em volta.
— Caralho, que gata! — Um rapaz vem caminhando em minha direção, mas é barrado por Theo antes de me alcançar.
— Cai fora. Não é para o teu bico.
O rapaz ergue as mãos e se afasta, me mandando antes, um beijo.
— É um babaca. — Theo explica.
— E qual seria sua definição de babaca?
Ele baixa a cabeça e solta um riso abafado.
— Certo. Isso doeu.
Cerro os dentes.
— Não foi minha intenção.
— Foi, sim. — Ele sorri. — E eu mereci.
— Mereceu o quê? — Dan volta e me entrega um copo de cerveja.
— Aquele sorriso. — Theo pisca para mim e sai atrás de uma garota.
— Do que vocês estavam falando?
— Da popularidade de vocês. — Desconverso, bebendo um gole de minha cerveja.
— Não somos populares.
Ergo uma sobrancelha.
— Tyler e Theo são mais.
Sorrio torto.
— Ah, de que isso importa? Vem, vamos dar uma volta.
Dan me pega pela mão e sai me apresentando às pessoas.
— O que está acontecendo ali? — Aponto com os olhos para uma aglomeração a poucos passos de nós.
— Ah, é uma brincadeira. Vamos chegar mais perto.
Nos aproximamos até conseguirmos ver o que está acontecendo.
Todos os participantes, na maioria homens sem camisetas, estão unidos em duplas, amarrados pelo pulso com um pano vermelho.
— Como isso funciona?
— Cada dupla fica a frente de uma mesa cheia de copos com cerveja. Ganha quem conseguir montar primeiro uma pirâmide com os copos vazios.
— Quanta criatividade. E daqui, quantos saem em coma alcoólico?
— Alguns. — Dan ri. — Quer participar?
— Eu passo, obrigada.
— Dan vai ficar fora de uma disputa? — Tyler para ao nosso lado. — Isso é novidade.
— Vou deixar outra pessoa vencer hoje. Estou caridoso.
— Você está ao lado do cara mais competitivo de Manhattan, Elisa.
— O segundo. Você continua na liderança.
— É, eu fiquei sabendo mesmo que vocês adoram uma competição. — Viro minha cerveja de um só gole.
Tyler me olha pelo canto do olho.
— Minha cerveja acabou. — Chacoalho o copo vermelho de plástico vazio. — Vou buscar mais.
Deixo Dan e Tyler assistindo à disputa e vou encher meu copo.
No meio do caminho, Quinn esbarra em mim, derramando seu copo todo em meu vestido.
— Ah, meu Deus! Marisa, me desculpe. Eu não te vi. Ai, molhei você toda, que desastrada.
— Está tudo bem. — Recuso sua ajuda, afastando suas mãos de mim. — Pode deixar.
— Me perdoe. Deixe eu pegar uma cerveja para você.
Antes que eu diga algo, Quinn vai até um barril e enche um copo.
— Aceite como meu pedido de desculpas. — Ela me estende o copo cheio.
Forço um sorriso e o aceito, saindo de perto dela o mais rápido que consigo.
— Garota louca, eu heim?
Analisando o estrago da cerveja em meu vestido, caminho apressada até minha casa. Quando estou na metade do trajeto, Tyler me chama:
— Elisa!
Me viro e o espero me alcançar.
— Já está indo embora? O que houve?
— Estou indo trocar esse vestido. Sua namorada fez questão de encharcá-lo de cerveja.
— Namorada?
— Quinn Daves.
Tyler revira os olhos.
— É a cara dela fazer isso.
— É, eu percebi. Bom, — suspiro, olhando para meu vestido — já volto.
— Ok.
Sorrio fraco e volto a andar.
Alguns passos depois, olho para trás e vejo Tyler se afastando vagarosamente.
— Ei, Tyler.
Ele se volta para mim.
— Obrigada.
— Ficou exatamente como imaginei.
Sorrio e dou um generoso gole na cerveja.
— Ei! Vocês dois, — aponto o dedo para um casal no maior amasso em minha área de serviço — fora!
O rapaz tira a garota de cima da minha máquina de lavar e saem aos tropeços e risadas.
— Que desaforo!
Entro em casa e tiro o vestido molhado.
Depois, me frusto ao descobrir que não tenho nada que se iguale à ele.
Por fim, visto um vestido preto simples, de mangas longas, curto e colado ao corpo.
Volto à festa e falho na tentativa de encontrar algum dos três rapazes.
Minha vista fica turva por um momento, me fazendo cambalear.
— Opa! Cuidado, moça.
Tento focar minha visão no rosto do cara que me segura, mas não consigo. Me recomponho e vou até o barril, encher outro copo. Sinto minha boca extremamente seca.
— Você está bem?
— Estou ótima.
Tudo parece girar a minha volta.
A música parece mais lenta do que o normal.
— Elisa!
A voz de Tyler ecoa ao longe em minha mente.
— Ei, está tudo bem?
— Estou...
Tudo some.
Apago.
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