Ô, Sol
Enfim chegou o último dia de acampamento de treino, e com ele o terror do grupo Fuyumi.
A trilha da montanha.
Enquanto os treinadores chegavam até o topo por uma curta estrada asfaltada, nós, as alunas, tínhamos que nos embrenhar em meio, árvores, terra e o que mais aparecesse em nossa frente.
— Você tem certeza que nós precisamos subir?
— Sim Keiko, é obrigatório — respondi de braços cruzados olhando atentamente o começo da trilha.
— Mas assim, hipoteticamente-
— Não — Sora interrompeu —, somos o último time a precisar subir. Não podemos ser chamadas de espartanas se não aceitar o desafio.
— Eu não ligo de abandonar esse título e ser chamada de fracote — Kei levantou a mão e se virou para o restante do time —, mais alguém comigo?
Hana respirou fundo e empurrou a meio de rede maior que ela para frente — Vou levar o primeiro grupo, Sora e capitã levam os outros, anda sua medrosa comece a subir.
— Hana-chan... — Kei choramingou enquanto era arrastada.
— Quem está comigo, vamos subir em 10 minutos — Sora esticou os braços — para as novatas se precisarem descansar, avisem. Não se forcem só porque é a primeira vez, a estamina de vocês ainda é baixa comparada com o restante.
Olhei para a vice-capitã — O jeito que você consegue montar uma estrutura de frase com preocupação e, ao mesmo tempo, soando ofensiva é impressionante. Não se preocupem filhotes, Sora não está chamando vocês de fracas nem nada.
Abaixei já desviando da reação espontânea de agressão, o que fez Sora ficar ainda mais brava.
Sorri para as jogadoras do primeiro ano, enquanto mantinha as mãos da meio de rede longe do meu pescoço — O tempo de treinamento faz diferença quando estamos num ambiente diferente, então a qualquer sinal de estafa nos avisem. Isso vale para todas.
— Sim!
Responderam em uníssono.
Me desvencilhei das mãos da minha amiga e pedi para que ela e seu grupo começasse a se alongar.
Eu levaria o último grupo, e do terceiro ano ficou apenas Aki me fazendo companhia. Então as gêmeas, Yumi das segundanistas, e o restante do primeiro ano.
A montanha é nos terrenos da escola, pessoas de fora que desejam fazer a trilha precisam fazer um agendamento prévio e aguardar autorização. Porém, como já é nossa tradição durante toda semana fica crescendo uma pequena antecipação. Uma vez que era possível ver o topo de todos os lugares e todas sabemos ser a última tarefa da agenda oficial.
No topo existe algo como um alojamento, e depois de subir o que nos aguarda é uma refeição para recuperar as energias. Depois disso descemos pela estrada de asfalto e então as malas começariam a ser feitas para retornar a Tóquio.
— Pelo menos a parte boa de sermos as últimas é que qualquer bicho que tenha, já vai ser espantado por quem subiu na frente — Aki comentou se colocando do meu lado.
— Sobre isso está certa. O que achou do acampamento dessa vez? — questionei querendo saber sua opinião.
Os olhos da garota miraram o céu — Acho que por saber ser a última vez meio que deixou um sentimento estranho, pareceu passar bem rápido. Apesar de termos treinado como nunca.
Ela estava certa sobre isso, treinar, estar com as mesmas pessoas todos os dias, levar a mesma rotina por quase três anos, inconscientemente parece que tudo aquilo que já estamos acostumadas a fazer, recebeu um peso diferente por ser a última vez. Ao menos a última vez, desta maneira.
— Você já parou para pensar no que vem depois? Às vezes eu me pergunto o que vai acontecer depois que tudo acabar, passei três anos esperando para realizar um sonho e agora que é a última chance, o que vou fazer depois dele? Ganhando o nacional, ou não.
— Arrumar um novo sonho? Fazer todas as coisas que você não fez enquanto correr atrás da competição? — Aki ponderou e sorriu — Ser a namorada oficial do meu primo, apesar de que vocês já agem dessa forma.
A empurrei de leve, causando um riso.
— Talvez você fique confusa no começo, mas... Bem, quem sabe o que o futuro te reserva, talvez te convoquem para a seleção e então você vai atrás de conquistar o mundo, e não só o Japão.
O que ela disse me fez parar por um momento, nunca pensei que isso fosse possível. Quando começamos minha motivação era passar por cima de Mahiru, e então junto com o time esse objetivo foi mudando levemente e se tornou ganhar um campeonato nacional. Sei que as pessoas olham para a Fukurodani, com olhos diferentes. Quando as jogadoras foram convocadas para o acampamento, não pude ignorar o leve gosto amargo que ficou na minha boca e os mais diversos questionamentos invadiram a minha mente. Contudo, foi superado, e essa chateação momentânea virou orgulho por serem minhas companheiras de equipe a receber reconhecimento.
— Se essa chance chegar para mim, eu... Honestamente não sei o que fazer.
Aki se virou surpresa — Como assim? Você têm que aceitar! Quero dizer, não te forçando a nada, mas não vai saber se não tentar não é?
Dei risada — Entendi o que você quis dizer, mas... Não sei, só não sei.
Girei os ombros e decidi mudar de assunto — Deu nossa hora, todas prontas?
— Sim, capitã!
— Então vamos, vocês vão andando na frente, é só seguir as marcações com fitas amarelas, eu vou no fim para garantir que ninguém fique para trás. Aki pode liderar?
— Deixa comigo — a garota prestou continência e ergueu a mão começando a falar como uma guia de turismo.
A trilha da montanha parece ser diferente toda vez que precisamos passar por ela, às vezes é acolhedora e clara, com os raios de sol passando entre as folhas enquanto o som das ondas embalam a caminhada. Outras vezes é incômoda, repleta de sombras onde a brisa que canta chega fria e com cheiro de sal. Hoje ela se apresentou para nós como um caminho incerto. Nem completamente escura, nem completamente iluminada. Repleta de nuances, confusa como meus próprios pensamentos.
Não é sempre que paro para pensar na incerteza do futuro, medo ocasionalmente sussurra dúvidas e nesse caso os sonhos que tenho parecem distantes e inalcançáveis. Apesar de todo o treino, todo investimento de tempo, eu como ser humano também questiono os meus sonhos e perco o vislumbre da vitória.
Essa ansiedade do futuro é uma batalha comum, e a chama que perde o brilho pode ser reavivada com um pouco de atenção e paciência. No momento em que nos perdemos, descobrimos novos sonhos e oportunidades surgem como o sol no horizonte. O sopro de vida que te força a dar um passo para frente e encontrar um novo significado.
Parei na trilha por um momento, dentre as árvores num vão presenteado pela própria natureza consegui observar o profundo azul do mar cintilando sob o som, suas ondas quebravam na praia e as pessoas andavam aproveitando uma manhã tranquila.
As ondas quebram uma depois da outra, e assim deve ser também o jeito que eu levo a minha vida. Uma preocupação depois da outra, um sonho depois do outro.
Um grito me chamou a atenção fazendo esquecer o momentâneo monólogo interno e voltar a atenção para minhas garotas. Chizue estava caída no chão com uma expressão de dor, e Chiasa estava ao seu lado.
— O que aconteceu? — as meninas abriram o caminho para mim.
— Tinha um declive na trilha — disse a levantadora — Chiu-neesan não viu e acabou machucando o tornozelo.
Me agachei perto da segundanista, e no momento que segurei seu calcanhar para tentar olhar melhor ela soltou um sibilo de dor. Fechei o rosto por um momento, ou era uma torção, ou ela havia quebrado.
Olhei o relógio, devíamos ter passado da metade da trilha.
— Chiu, vou tirar seu tênis, tudo bem? — pedi a permissão e ela balançou a cabeça, cerrando os dentes para não deixar escapar nenhuma reação que preocupasse mais as meninas.
Imediatamente vi o inchaço — Consegue mexer o pé? Acha que quebrou?
— Não, consigo mexer. Mas acho que torci — sua voz soou baixa e embargada.
— Falta pouco para chegarmos no topo, Dan vai conseguir olhar melhor — entreguei o tênis para Chiasa que estava visivelmente preocupada com a irmã.
— Mas como vamos chegar até lá? — Aki perguntou — Até uma de nós chegar e voltar para buscar vocês vai demorar.
— Vamos diminuir o passo, eu levo Chizue — respondi, auxiliando a mais nova também a se levantar, ela manteve a perna levantada.
— Capitã, eu... Eu consigo andar — ela disse, sem conseguir nem colocar o pé no chão.
— Sem chance — me abaixei em sua frente —, sobe.
Com incerteza, seus braços se apoiaram nos meus ombros e as pernas na minha cintura, passei as mãos pelas pernas e a ajeitei.
— Vamos seguir devagar — pedi — mais cuidado com o chão.
A pior parte da trilha tinha passado, e o que restava era o caminho íngreme. Levar apenas meu peso era uma coisa, levar comigo uma segunda garota era algo completamente diferente. Dan não poderia reclamar que eu não me dediquei ao meu treino de cardio.
— Capitã, eu estou melhor — Chizue disse, tentando me convencer.
Respirei fundo — Chiu, ser forte não é, não demonstrar seus sentimentos para ninguém. Ser forte é se manter centrado apesar das dores, dificuldades, ter coragem para continuar mesmo com adversidades.
Olhei para a trilha seguindo com cuidado — Sei melhor do que ninguém da vontade de não ser um incômodo, o desejo de continuar. Afinal, foi o que me tirou do nosso primeiro intercolegial, já cometi esse erro uma vez. Não vou deixar uma jogadora minha fazer o mesmo.
Senti seus braços tremerem, Chiu sempre era uma pessoa centrada, séria e dedicada, a ponto de esquecer de si mesma.
— Você pode chorar se estiver doendo, isso não te faz fraca, te faz humana.
A segundanista abraçou meu pescoço e logo escutei os soluços, as outras que andavam na nossa frente não escutaram. Mas o choro de Chizue talvez tivesse muitos outros motivos além da torção.
Minhas pernas estavam queimando, e meus passos já estavam quase cambaleantes quando chegamos ao topo. Respirar pelo nariz já não era uma opção, sentia o meu corpo queimar pelo esforço e também pelo sol que já estava forte. Assim que Sora nos viu chegando, correu para buscar Dan e os outros treinadores, coloquei Chiu sentada numa das mesas, seu rosto provavelmente estava tão vermelho quanto o meu.
— Coloquei a mão em sua cabeça, obrigada pela companhia.
— Vá descansar você também — Dan ordenou — lave o rosto.
Não precisei de uma segunda chamada, deitei na sombra do alojamento na primeira chance que tive. Apesar da preocupação, Dan disse que realmente parecia ser uma torção, algum tempo com gelo e Chizue já estava muito melhor.
— Bem — Hibiki-sensei disse chamando a atenção —, parece que foi ainda ontem que as recebi para mais acampamento do grupo. E agora, tão rapidamente, chega a hora de nos despedirmos, meus sinceros agradecimentos aos professores, e treinadores pela dedicação mostrada nessa semana. Apesar dos sustos.
Ele encarou a mesa da Fukurodani por cima dos óculos, e as garotas brincaram com Chizue.
— Peço licença aos colegas e outros times para ser um pouco egoísta — ele disse —, Fukurodani. Entre esse fim do encontro e o começo de um novo, vocês serão o time com as maiores mudanças, eu primeiro contactei as escolas tentando reviver o grupo de treinamento inspirado em vocês.
— Não só a vocês, mas todas que usaram esse acampamento para crescer, das mais variadas formas, obrigado pela dedicação — o mais velho se curvou noventa graus causando um alvoroço, até mesmo Dan ficou constrangido e pediu para o professor se ajeitar.
Dessa maneira o almoço foi aproveitado sem outros grandes eventos, depois de uma finalização repleta de comida e conversa. Os times se dividiram para se preparar e retornarem as suas respectivas cidades.
— Não se esqueça do nosso acordo — Kaede estendeu a mão para mim — vamos nos encontrar na final do nacional e então ter uma revanche daquele primeiro jogo.
Apertei sua mão — É uma promessa.
Também nos despedimos das outras capitãs e times, entrando no ônibus e enfim voltando para casa. Normalmente costumo ficar acordada, dormir em lugares aleatórios não é uma habilidade minha, mas o cansaço ganhou dessa vez e quando percebi Dan estava me balançando avisando que chegamos.
Quando fechei os olhos ainda tinha sol, agora aparentemente já estava de noite. Hibiki-sensei e Chie iriam levar as gêmeas para casa e garantir que estava tudo certo, avisar os parentes e tudo mais. Enquanto isso, o restante estava dispensado e voltaríamos a nos encontrar na escola em dois dias para fazer uma reunião e começar a estudar nossas possíveis adversárias para as eliminatórias de Tóquio.
Apertei o pescoço reclamando de dor, na verdade, meu corpo inteiro estava dolorido.
— Parece que fui atropelada — comentei.
— Não só você — Sora girou os ombros —, não sentimos durante o treinamento porque estávamos sempre nos mexendo, mas agora que paramos um pouco... Acho que vou dormir os dois dias de folga direto.
Enquanto o velho Shin tirava as malas do ônibus, um segundo veículo entrou na escola.
— Se os times tivessem combinado, não tinha dado certo — Misa comentou.
Peguei minha mochila e coloquei nas costas andando para frente do veículo, esperando Dan nos dispensar oficialmente.
— Sei que estão exaustas, então não vou as segurar por muito tempo. Voltem para casa, avisem quando o fizerem, descansem e vamos nos falar em dois dias — treinador Esparta sorriu —, bom trabalho com o acampamento de treino.
Agradeci o treinador em voz alta, sendo seguida pelo resto do grupo. As meninas começaram a acenar e se despedir, nisso o time masculino que também foi dispensado se aproximou.
— Geh! — Konoha exclamou — O que aconteceu com vocês? Estão bem?
— Depende do seu conceito de bem — Sora respondeu —, estamos vivas.
— Não parece Sora-chan — Saru apontou —, até mesmo a capitã parece seca.
— Deve ser a maresia — Kei comentou alheia de tudo.
Dei risada — E o acampamento de vocês como foi? Apesar que Kou me contou um pouco.
Komi cruzou os braços — Interessante, ganhamos muitas partidas graças a você. Obrigado.
-Hey hey hey! Time feminino! — Kou se aproximou, mesmo depois de dois dias de treino ele ainda com a energia praticamente estourando. O capitão parou quando viu nosso estado.
— Aki? Sora? [Nome]! — ele se perdeu por um momento com que ele se preocupava mais — Vocês precisam de um hospital? Akaashi!
Ele pediu por ajuda do levantador que também parecia surpreso.
— Não grite capitão coruja — Sora colocou a mão na cabeça — sabemos que estamos péssimas, mas só foi um acampamento de treino não precisamos de hospital. Só de uma cama.
Suas mãos seguraram meu rosto, apertando minhas bochechas — De verdade?
— Sim — fechei os olhos aproveitando seu toque aproveitando para abraçar sua cintura, Kou ficou sem jeito pelo gesto na frente dos dois times. Mas no momento não liguei muito, só de estar com ele já sentia minha energia retornando. O garoto afagou meus ombros e seguida meus cabelos. Estava de volta para os braços do meu sol, aquele que surge pela manhã, e dá um novo sopro de vida.
— Bem-vinda de volta.
N/A: Ô, sol, vê se não esquece e me ilumina preciso de você aqui 🎵 (...)
Música: O Sol, Vitor Kley só quem é antigo lembra.
Obrigada por ler até aqui!
Jogos vão começar em breve então se segurem! Não desistam das espartanas e nem de mim!
Até mais, Xx!
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