Capítulo 8
Bushido (武士道) literalmente, "caminho do guerreiro", é um manual e modo de vida para os Samurai. Ele possui 7 grandes virtudes; dentre elas:
誠
[Makoto: Sinceridade, veracidade total]
Aurora bateu a mão contra o monumento. Esbaforida, curvou-se para tomar um pouco de ar, ignorando as brincadeiras entre uma respiração e outra de Klaus:
—Ainda bem... que você não estava... correndo por sua vida!
Aurora não era uma boa atleta, e talvez por isso tivesse sido a última a alcançar o ponto de chegada. Cansada demais para retrucar, apenas ergueu o dedo indicador na direção do austríaco, como se dissesse "você está marcado".
O Arco Do Triunfo parecia o centro do mundo com ruas para todos os lados e com pessoas o rodeando por todas as direções. Os caminhos a seguir pareciam tantos, pareciam tantas escolhas as possíveis.
Ela voltou o olhar para Tadashi, encontrando-o fitando as pessoas em movimento rápido por aqui e ali, com a respiração controlada. Perguntou-se se ele estava pensando no que deixou para trás no Japão; se ele estava com saudades da movimentação de casa; ou se ele sequer tinha uma casa para voltar.
— Esperem aqui — Madeleine anunciou. — Preciso tomar água.
— Não se esqueça de mim — Klaus a seguiu, tentando não parecer muito cansado.
Tadashi pareceu sentir o peso do olhar de Aurora sobre ele, pois falou, assim que os outros dois se afastaram:
— Quer falar algo?
— Eu sou permitida a te fazer perguntas?
— Depende da pergunta — voltou o olhar para ela.
— Pessoal — ela respondeu um tanto quanto insegura. Assim que o outro assentiu com um maneio de cabeça enquanto franzia o cenho, ela prosseguiu: — Você... tem família?
A expressão de até então concentração ou preocupação se transformou em uma expressão leve. Um pequeno sorriso nasceu em seus lábios ao passo em que ele desviou o olhar, parecendo arrastado a uma boa memória com a pergunta.
— Sim. Minha irmã mais velha, Yuri, que luta ao meu lado. E meu pai. Minha mãe lutava, como Yuri. Ela morreu defendendo-nos de ladrões em épocas difíceis na região. Não me lembro muito dela, mas Yuri diz que ela era muito bonita e forte. Acredito nela. — Ele pausou por um instante, antes de voltar o olhar para ela e completar com um sorriso orgulhoso e mais largo: — Yuri está na vila, protegendo os que lá ficaram contra um possível ataque.
— Eu também acredito em Yuri — Aurora devolveu um sorriso. — E Yuri deve ser uma ótima guerreira.
— Exemplar, mas um pouco petulante — ele concordou.
Assim que o silêncio reinou, Aurora olhou para outra direção qualquer: sabia que a conversa havia acabado ali.
— E você? — ele continuou, fazendo-a erguer a cabeça assustada. Primeiro, ela ficou estagnada e processando se ele estava realmente continuando uma conversa. Contudo, se recompôs rapidamente, respondendo:
— Somos eu, meu pai, Lou e minhas irmãs Marie Claire e Marie Louise. Claro, tem a tia Océane, irmã do meu pai. Temos mais alguns parentes espalhados por aí... vemos a maioria somente em datas festivas — foi sucinta, sustentando um sorriso que rapidamente desmanchou quando se lembrou de completar: — não vejo a minha mãe há anos. Ela precisou... imagino — Aurora deu uma breve pausa. — Tudo que me lembro é ela de costas, marchando pela terra batida afora... porque meu pai bateu a porta para que eu não visse mais do que isso.
— Lou? — Tadashi estreitou os olhos.
— É a minha madrasta — forçou-se a voltar a sorrir com uma boa notícia, tentando varrer a memória ruim de sua mente. — Ela é mãe de Claire e Louise. Sou irmã delas apenas por parte de pai, mas saiba desde já que meu sentimento por elas não diminui por isso. — Aurora tomou fôlego novamente: — Louciene é enfermeira, ela está no front de batalha cuidando dos soldados feridos. Ela é uma pessoa maravilhosa, eu espero que um dia você a possa conhecer. Foi muito difícil no início... quando a mente de uma criança estava a mil tentando aceitar o novo relacionamento do pai, pensando todo tipo de coisa que as histórias dizem sobre madrastas. Mas ela foi tão paciente comigo... ela me aceitou, mesmo quando tudo que eu fiz foi dificultar e bancar a Cinderela, porque eu não conseguia acreditar no amor, naquele momento — terminou em um fio de voz, dando um último suspiro antes de se calar, encarando o chão.
— Eu fico feliz em ouvir isso... — ele deu um passo em sua direção. Tadashi pensou em fazer algum elogio a Louciene, dizer que sentia muito sobre a mãe da garota ou confortá-la, mas todas as opções pareciam inapropriadas para uma missão.
Mas naquele momento, mais do que em todos os outros, foi-lhe difícil lembrar que estava em missão. Dos vários momentos em que poderia se deixar falar sobre sentimentos e laços, aquele não era um, aquela não era uma pessoa para tal. Ele havia cruzado uma linha e havia acabado de tornar sua missão mais difícil. Praguejou mentalmente antes de desejar ter contido a garota em sua primeira pergunta.
De repente, o treinamento de anos não foi suficiente. Ele sabia o que era resistir à dor, ao cansaço, à pressão... mas não havia sido treinado para controlar o aparente aumento de temperatura que tomava seu interior naquela circunstância. De repente, seu peito se inflava mais do que deveria durante a respiração. O samurai que se gabava por ter experiência farta em batalha em pouca idade acabara de descobrir algo que lhe era completamente novo: aquela (esquisita) sensação.
Deu mais um passo em sua direção, coisa que ela não percebeu. Parecia presa em seus pensamentos fúnebres enquanto encarava o chão, e parecia ser aquilo que agarrava o ar dele. Talvez, se ele a ajudasse, aquele sentimento passaria. Daquele tipo de dor ele entendia, aquele tipo de ausência ele sentira. Talvez...
Em um segundo de coragem desenfreada e súbita falta de bom senso, segurou o pulso da garota enquanto falou:
—Kanashi nde wa ikenai — ela respondeu apertando os olhos, como se estivesse sem paciência e revirou o rosto para outra direção.
— Eu não entendo quando você fala japonês — abriu novamente os olhos, voltando o rosto na direção dele, mas mantendo o olhar baixo para evitar que cruzasse com o dele. Em imediata resposta, ele deu mais um passo para perto, falando próximo à sua pele, para que somente ela ouvisse:
—Não fique triste — o sopro quente das palavras a atingiram próximo ao rosto em uma onda de calor. — Por favor — as últimas palavras, adicionadas com leve tom de súplica, sopradas ainda mais baixas, fizeram um arrepio correr de seus quadris até sua nuca, chegando ao cérebro com uma descarga de energia.
Por fim, ela ergueu o olhar. Tadashi estava em agonia e clara confusão. Não conseguia ter dimensão perfeita do que Aurora sentia, tampouco sabia o que fazer para tirá-la de tal situação. Restava-lhe apenas pedir para que ela não se torturasse.
—Moça! — Um rapaz interrompeu, fazendo com que ambos pulassem dentro de si, separando-se imediatamente. — Você é Aurora? — Assim que ela concordou com uma sacolejada nervosa de cabeça, ele continuou: — Uma Madeleine está perguntando se você não vai querer água. Ela disse que tem dinheiro suficiente.
—Não — ela falou soprado, ainda tentando se recompor. — Não vou querer -— falou mais alto, para que fosse ouvida.
— Certo — o rapaz jogou um pano por cima do ombro e, dando uma leve olhada para Tadashi, deu meia-volta, regressando para (certamente) seu local de trabalho.
—Espere! — Ela chamou após um ou dois segundos de pensamentos desenfreados, fazendo-o se virar. — Diga para ela que Tadashi e eu fomos embora, diga para não se preocupar. Está tudo bem.
Aurora se voltou para Tadashi, que a observava austero. Não parecia, mais, padecer junto a ela em parte alguma de sua confusão. O olhar estava fixado, a postura rígida, a respiração duramente controlada. Contudo, não parecia raivoso ou análogos; parecia concentrado... contido dentro de si mesmo.
— Vamos — ela soltou e disparou na direção de que haviam vindo, não olhando para trás em momento algum.
Convenceu-se de que não o fitara mais naquela noite por pressa, mas sabia, em seu íntimo, que temia olhar para trás e ver aquele conjunto em Tadashi: aquela expressão junto com aquele ar. Jamais o havia visto de tal modo, e não saberia o que pensar ou de que forma agir se ele ainda estivesse com a mesma expressão. Talvez a pobre tivesse um choque anafilático, quem sabe.
Soube que ele a seguia apenas pelo som de seus passos rápidos logo atrás da garota que quase correu até em casa. Assim que Aurora bateu a porta de vidro da loja atrás de si, ele pausou o caminhar.
Precisava tirar aquela corrente de energia de dentro de si. Aquela corrente estranha, desconhecida, descontrolada. Praguejou novamente por ter pensado que se aproximar tanto da moça o traria algum alívio. Que ideia infeliz — aquilo havia sido como jogar uma floresta inteira de lenha em uma fogueira.
Em um pico da tal energia, voltou-se para a parede turquesa que enfeitava a loja de Océane e, próximo de onde começava a pintura do vizinho, ergueu o punho cerrado e socou a parede. Manteve a pele unida à construção enquanto soltava o ar pesadamente, e só então percebeu que estava prendendo o fôlego. Puxou a mão trêmula, permitindo-se ver uma quase imperceptível rachadura na até então perfeita parede.
—Saia de dentro da minha cabeça — murmurou na rua escura. — Saia de dentro da minha cabeça, Aurora.
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