Capítulo 5
Bushido (武士道) literalmente, "caminho do guerreiro", é um manual e modo de vida para os Samurai. Ele possui 7 grandes virtudes; dentre elas:
義
[Gi: Justiça e moralidade, decidir sem hesitar]
"Extra! Extra! França declara guerra à Prússia!"
Aquele jornal datava de 20 de julho 1870, uma semana antes. Aurora releu a antiga manchete com pesar. Ela nunca havia vivido uma guerra e, quando a cidade se alvoroçou, ela ingenuamente continuou sua vida, sem se preocupar com o amanhã. Esperto havia sido Napoleão III, que chamara o reforço japonês antes de oficializar o conflito.
Desviando os olhos do jornal velho dobrado sobre a mesinha de centro, foi até a cozinha, encostando a vassoura que segurava em um canto. Era sábado e, como de costume, a cidade estava quieta. Por um segundo ou dois não lembrou que o silêncio também era produto das vidas que foram perdidas. A moça abriu a porta, saindo de casa. Não havia o que Marie Louise ou Marie Claire fossem precisar, pois o almoço já havia passado. Frederic havia ido se encontrar com o pai de Joana para discutir coisas que Aurora não perguntou. E ela precisava sair.
Caminhou pelos paralelepípedos até finalmente começar a pisar as folhas da floresta. Inspirou com um sorriso o frio vento que soprava por entre as árvores. Finalmente poderia pensar, ouvir e ver o que queria. Com esse pensamento em mente, partiu rumo às árvores.
E era a folga dele. O samurai que havia sido designado para proteger os Fontaine não estava usando as vestes de batalha, como usual. Usava um quimono totalmente preto e o cabelo estava meio preso. Parado no meio da clareira em que havia visto Aurora alguns dias antes, procurava entender o que havia acontecido ali. Estava esperando, pensando, procurando: mas nada acontecia.
Aconteceria apenas se Aurora estivesse ali? Aconteceria somente se ela quisesse? Por acaso, ela seria filha de algum Deus?
Ele já estava para desistir quando ouviu as folhas e galhos estalando à sua direita. Imediatamente virou-se para onde o ruído vinha, levando a mão à katana em sua cintura em um reflexo, até se lembrar da outra pessoa que também sabia da existência daquele lugar.
Moveu-se o mais rápido que pôde para o meio da vegetação, de modo a deixar a clareira vazia novamente. Encostou as costas em uma árvore, fechando os olhos e controlando a respiração quase ao mesmo tempo em que os pés dela tocaram a grama livre de árvores.
Ela caminhou até o meio do lugar, ajoelhando-se bem ali, e erguendo o rosto com os olhos fechados para o céu. Em sinal de alívio e conforto — sentimentos raros naqueles dias — deu um leve sorriso e jogou o corpo para trás, deitando-se na relva.
Ele pôs o rosto para o lado da árvore, ainda segurando a katana — não conseguia parar de sentir que estava em constante perigo. Não queria observar ou qualquer coisa análoga, apenas queria ter certeza de que ela não estava olhando naquela direção: então ele poderia sair dali sem ser notado, sem incomodá-la, como se jamais tivesse estado presente.
O longo vestido rosa claro era o mesmo do dia que ele a vira no porto. Aquela roupa a cobria totalmente até os pulsos e o colo, como um véu que esconde peças raras. A moça afundada na grama, que chegava até perto de seu nariz quando deitada, abrira os braços para tocar a vegetação selvagem um pouco mais.
Seus dedos brincavam com as longas folhas verdes como os dedos dele brincaram com aquela fita branca de cetim que estava guardada ao lado da katana — para devolver à dona quando tivesse a oportunidade, claro. Ou era isso que ele queria pensar.
Os dentes-de-leão, aquelas flores que sempre lhe pareceram tão delicadas, já não eram tão bonitas quando tão perto do rosto que lhe chamava mais atenção. A pele que lhe parecia de porcelana brilhava ao sol com o viço natural mais bonito que ele um dia vira.
Aos olhos dele, ela parecia tão pura como uma criança e tão frágil quanto cristal. Contudo, ele havia visto quanta força existia dentro dela, quanta coragem ainda não descoberta pela imaturidade e inexperiência, quanto vigor conjugados com gentileza e compaixão.
Ele não pôde evitar dar um leve sorriso ao se lembrar de quando ela se jogou para dentro de uma casa desmoronando para salvar alguém. Que ato impensado, impulsivo, mal calculado... e amoroso. Nunca havia agradecido tanto por ter carregado quilos e mais quilos pelas escadas nos treinamentos como quando conseguiu segurar a viga do telhado, evitando que ela e a garota que salvara se machucassem.
Como alguém poderia ser tão sublime e tão forte?
Seus pensamentos foram interrompidos. Seu coração pareceu parar por um segundo quando seus sentidos foram acionados como que por um choque: viu movimento em meio às árvores do outro lado da clareira.
Levou a mão à katana novamente, flexionando os joelhos e preparando o ataque para o que quer que simbolizasse perigo para a moça que continuava deitada em meio ao verde.
Ele finalmente percebeu que era mais de uma ameaça quando os pontos de barulho se tornaram dois. Depois três. Finalmente saíram de trás das árvores: soldados prussianos, armados com seus longos mosquetes.
— Boa tarde, schöne Frau! — o do meio disse, enquanto os outros dois riram do péssimo francês misturado ao alemão.
Eram três e carregavam armas de fogo, enquanto ele só tinha a katana. Não poderia errar, caso contrário, ambos morreriam ali mesmo. Ele tinha apenas uma coisa a seu favor: a surpresa; ninguém sabia que ele estava ali.
Com um grito agudo, Aurora se levantou e começou a correr em direção à cidade. Ele não precisava entender alemão para saber quando o do meio mandou que os outros dois a fossem buscar, ficando parado bem ali.
Poderiam ter atirado nela dali mesmo, mas ele sabia exatamente porque a queriam viva... aqueles porcos.
Desembainhou a katana e, em um único movimento, deu a volta por trás da árvore, chegando às nove horas, para o homem. Não queria encarar-lhe o rosto, por isso quando o homem de bigode olhou para a sua esquerda, já em alerta, o samurai ergueu a katana na altura do próprio pescoço e, segurando-a com ambas as mãos, fez um meio-círculo ao passar por suas costas. O golpe lateral não havia sido suficiente para decepar, mas não havia linha nem médico no universo que pudessem consertar aquele estrago.
Partiu na direção que ela havia ido, embrenhando-se na mata. Tentou controlar a própria respiração para que ouvisse para onde os passos estavam indo, então partiu naquela direção.
Ao longe, avistou um homem correndo. Acelerou os passos o máximo que pôde, vendo o último alcançando Aurora ao fundo. Assim que o soldado que estava mais próximo dele percebeu sua presença, puxou o mosquete das costas, preparando-se para atirar.
O tempo que o homem gastou parando e puxando a arma das costas foi o tempo que o samurai usou para chegar até ele com a katana em posição de estocada, atacando-lhe em seguida.
Aurora sentiu seu braço ser agarrado e ser puxada. Forçada a encarar o prussiano, ergueu sua mão livre e passou-lhe as unhas no rosto, fazendo-o virar a face com dor e, logo em seguida, deu-lhe uma joelhada na virilha. Ele se curvou, mas continuou sem soltá-la.
Sacudiu os braços com força, procurando desvencilhar-se, mas ele só a segurou com mais força. O soldado ergueu o rosto com os dentes cerrados e os olhos vermelhos, marejados pela dor da joelhada. Os olhos dele tinham agora descomunal ira, o suficiente para transbordar.
Quando ele se ergueu novamente, ela tentou atacar-lhe com as pernas, mas ele desviou. Usou a única parte do corpo que tinha livre e, então, jogou a cabeça para trás e logo em seguida para a frente, dando-lhe uma cabeçada. Quando ambas as testas bateram, ele deu um ou dois passos para trás.
Ela se soltou, mas também estava tonta pela pancada. Deu alguns passos para trás até se virar e começar a correr, mas o longo vestido foi puxado para trás, trazendo-a junto. Virou-se parcialmente para chutá-lo, mas não foi necessário.
A pressão sumiu em um segundo e, ao se virar, pôde ver o homem caindo ao chão com o uniforme ensanguentado. Ela ergueu os olhos cheios de lágrimas para quem a havia salvado. Ele não expressava nada além de repulsa, embainhando a katana pingando sangue sob o quimono preto.
—Obrigada — ela falou quase que inaudível. — Obrigada... — não queria falar "Designado". O nome pelo qual ela o havia chamado em tom descontraído não conseguia lhe passar a garganta.
—Tadashi — ele falou sem pensar muito. — Tadashi Sakurai.
— Obrigada, Tadashi — respondeu abaixando o olhar.
— Precisamos ir para a cidade agora. Estou só com a katana e eles não deveriam estar sozinhos por aqui.
Ela concordou silenciosamente, virando-se para a direção da cidade, dando apressados e nervosos passos, controlando-se o máximo que poderia naquele momento. Ele a seguiu em silêncio, tomando cuidado com cada movimento, até as construções aglomeradas.
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