ATO 40
Na vingança e no amor a mulher é mais bárbara do que o homem.
— A filha pródiga a casa torna — disse Pompoo ao me ver. Não me saiu palavras. Nenhuma resolveria algo.
A diretora estava na minha frente com um vestido longo, vermelho. Seus cabelos presos num coque perfeito. Seu ruivo brilhava mais com os raios de sol e seu rosto macio, jovial, o mesmo de sempre. Estava mais bonita do que antes. Um ar fresco saía dos diversos buracos nas paredes do pátio principal, movendo aquele grande vestido exagerado e meus cabelos bagunçados.
Éramos só eu e ela.
Tirei de minha cintura o bastão preto que Edgar me dera exclusivamente para este momento. Apertei um botão na parte de cima que o dobrou de tamanho. Pompoo apertou a vista.
— Aonde... conseguiu isso? — questionou sem desprender os olhos da arma.
Ela não teve uma resposta.
A sola de meus pés esquentaram quando naquele momento avancei.
Rasguei o vento de passos pesados e pulso firme. Segurava o bastão como se fosse a coisa mais importante da minha vida, e era. Pompoo rapidamente tirou sua arma do meião que vestira e a deixou amostra também. Seu bastão duplicou o tamanho da mesma forma que o meu. Quando me aproximei, ambas chocamos as armas uma na outra em um estalo que ecoou por todo o pátio. Borboletas coloridas saíram assustadas de diversos cantos dali. Voavam em todas as direções.
Pompoo me fitava assustadoramente.
— O que significa isso? Vingança?
Uma pequena mexa de sua franja caíra em seu rosto devido ao impacto. Retribuí o olhar. Retirei o bastão do seu e dei um passo para trás. Pompoo também afastou sua arma e juntas, em sincronia, desbravamos golpes em grandes sequencias. Seus ataques eram ágeis, cada um poderia me matar se não soubesse como defende-los. Um para cima, outro para baixo. Um para cima, outro para o lado. Precisei segurar o bastão com as duas mãos. Pompoo girou em um perfeito trezentos e sessenta e deu uma investida com mais força, batendo em minha arma, e desequilibrando-me. Não esperou muito ao destruir minha defesa. Me atingiu com um tapa no rosto, quase deslocando meu pescoço, e depois apunhalou minha barriga com um soco, me deixando sem ar.
Ela poderia ter me matado ali, fincando seu bastão em minhas entranhas.
Mas não fez. Estava brincando comigo. Três dias de treinamento não eram o suficiente para uma mulher experiente como ela.
Usei toda força em meus braços e a desferi com golpes precisos, mas ela defendera todos em sequencia. Se continuasse assim, morreria vergonhosamente como tinha dito Edgar. Lembrei de algumas táticas que treinei naquelas noites. Seria tudo em vão? Pompoo não me atacava. Esperava meus golpes previsíveis terminarem, para depois, começar os seus. Pensei em Brok, em Meggie, em tia Betty. Eles eram tudo o que eu tinha naquela vida miserável de sofrimento.
Pensei em Luna.
Foi o que Feen queria desde sempre. Que eu enfrentasse meus demônios. Mas eu poderia falhar miseravelmente e perder as únicas pessoas que eu tinha. Não dava para voltar atrás. Ou morro, ou mato. Não dei mais nenhum golpe na diretora. Tive outra ideia. Peguei meu bastão e o joguei para cima, o mais alto que pude. Eu precisava tirar sua atenção de mim.
"Se quiser supera-la, não seja igual a ela"
Usei os poucos segundos de vantagem, enquanto Pompoo olhava minha arma acima e a puxei pelo ombro para perto de mim, golpeando-a na barriga com meu joelho esquerdo. A mulher cambaleou para trás. Antes que minha arma caísse no chão, a apanhei no ar e atingi diretamente seu rosto com ela. A ponta da arma deixou em sua maça, um corte fino e cumprido. Foi uma ação imprevista.
Pompoo parou de imediato.
Colocou a mão no local ferido e sentiu um liquido vermelho sair de sua pele. Seus olhos arregalaram ao ver as gotas de sangue em seus dedos.
Dei um breve sorriso de lado.
— Como... você ousa, sua vadiazinha... — Vociferou a diretora. Pompoo pegou seu bastão e avançou. Seu ataque não mirou em minha arma, mas sim, em meus braços. Ágil como era, ela me desarmou, fazendo com que meu bastão voasse alguns metros.
Meu corpo gelou.
Pompoo largara sua arma no chão. Sua franja ia para lá e para cá com o vento que escapava lá fora. A mulher pegou a ponta de seu vestido e o rasgou com força para uma locomoção melhor. De punhos fechados, avançamos uma na outra. No primeiro golpe, desviei para o lado e com meu cotovelo, bati em seu rosto novamente. O coque da diretora se desprendeu e a ponta de seu salto quebrou, quase a derrubando.
Avistei o disco que caíra da vitrola. Estava próximo de nós. Agachei para pega-lo e segurando-o firme o despedacei em seu rosto macio, fazendo-a dar mais alguns passos para trás. Larguei os restos do disco, e com o punho direito atingi seu nariz. Houve um pequeno estralo. Os ossos de minhas mãos doíam como nunca, mas os do rosto dela, com certeza doeram mais. Seus longos cabelos agitavam-se. Antes que pudesse cair, segurei em seu braço e a trouxe para mais perto de mim, quando por fim sussurrei em seu ouvido:
— Sua irmã está morta — Pompoo, já com a face ensanguentada, olhou para mim, com olhos estupefatos, sem brilho. Sua expressão, ficou ainda mais assustadora.
— O que... você disse...? — questionou.
As mãos de Pompoo começaram a tremer. Uma boa parte de seus cabelos cobriam seu rosto. Ela usou ambos os braços para tentar desferir golpes em mim, mas desde o começo parecia muito cansada. Agora então, mal sabia o que estava fazendo.
Naquele momento, me afastei brevemente.
Girei meu corpo, foquei a energia nas pernas e atingi seu maxilar com meu calcanhar direito em um impacto brutal, fazendo a diretora sair do chão e deitar no ar. Alguns dentes voaram de sua boca da mesma forma que voaram os de Audrey. Pompoo, de cabelos esvoaçados, de sangue espirrado, de roupa rasgada e com os braços para frente, caía lentamente até o piso de concreto.
No próximo piscar, ela se estatelou de barriga para cima, aos soluços. Já não sabia o que eram lagrimas e o que era sangue. Passou bons segundos tossindo e cuspindo saliva, até voltar a falar:
— Você... matou... ela...?
— Que diferença isso faz? — fui até ela, onde estava deitava e subi em cima de seu corpo, apoiada em sua barriga. Peguei em seus cabelos e os puxei para cima, levantando sua cabeça — que diferença isso faz, sua desgraçada? QUE DIFERENÇA ISSO FAZ? — bradei. Aproximei seu rosto do meu. Um de seus olhos estava fechado e inchado. Soltei seu cabelo, batendo sua cabeça no chão. Prendi seus braços com minhas pernas e meu rosto ficou muito próximo do dela — Onde está o drenador mestre? — questionei segurando seu maxilar com força. Pompoo me olhava com desprezo.
Desferi um forte tapa em seu rosto com a palma da mão. Pompoo cuspiu mais sangue ao virar a cabeça para o lado. Não esperei que se recuperasse. A golpeei mais uma vez.
— Onde ele está? — perguntei, desferindo outro golpe. Pompoo parecia ter perdido os sentidos. Um dos olhos continuava bem aberto, olhando para o teto do pátio. Peguei um tufo de seu cabelo alaranjado e o puxei com tanta força que ele se desprendeu de seu coro cabeludo.
Pompoo urrou de dor.
Coloquei os cabelos arrancados em sua boca enquanto gritava. Ela tossiu e engasgou. Seu vestido vermelho agora estava repleto de gorfo e sangue. Chorava como uma criança, não por meus ataques, mas pela perca recém anunciada. Agora, sua irmã estava nas profundezas do oceano, com um furo na testa, de fato, enquanto ela, dançava ao som de uma vitrola velha, no pátio principal de um orfanato abandonado.
Dei outro tapa. Seu rosto virou para direita. Outro tapa, agora para a esquerda. Mais um dente escorreu de sua boca para o chão.
— É a ultima vez que vou perguntar... — avisei. Mas antes de acontecer, a diretora desprendeu seu corpo do meu, me jogando para o lado. Levantou rapidamente dali aos tropeços, deixando seu par de salto quebrado no chão e correndo para fora do pátio. A segui, com o coração disparado — VOLTE AQUI SUA VADIA! — Pompoo era veloz. Mesmo ferida ainda conseguia esticar suas pernas o suficiente para correr. Atravessou o corredor que dava para a entrada do orfanato e virou para esquerda, onde ficava seu escritório.
Que diabos ela estava fazendo?
Chegando ali, quase sem folego, não a encontrei. O cômodo permanecia o mesmo de sempre. Uma escrivania, poltronas de couro preta um quadro enorme do falecido diretor em cima da lareira e paredes escuras, de um sangue coagulado, podre. Pompoo não estava em nenhum canto dali.
Analisei o local.
Os rastros de sangue denunciaram seu paradeiro. Dava ao fim do escritório, onde o grande quadro ficava. Desencadeei uma breve lembrança: Existia uma passagem secreta exatamente nesta parede da lareira. Ela dava para um quarto apertado, escuro, usado para fazer o furo nas nucas dos órfãos recém chegados. Mas, como ela entrou? Passei a mão pela parede, e um pouco abaixo do quadro existia um buraco em forma de Lua minguante. E mais uma lembrança veio a tona.
Seu brinco era a chave para isso.
O drenador mestre não podia estar em outro lugar, mas não seria possível sem este acessório.
— SAIA DAÍ, SUA COVARDE! — gritei a ela. Mas ninguém respondeu. Esmurrei a parede, bufando de ódio. Não existia nada que pudesse fazer. Uma hora ela teria que sair. E eu estaria aqui, aguardando-a. O quadro, devido á força que pus no golpe, se desprendeu da parede, agora sustentado apenas por um prego. Ao retira-lo dali, um fio muito familiar ficou a mostra, ao lado de uma tela embutida na parede com apenas um botão. Era o mesmo esquema do escritório de seu falecido irmão, Rumpel, que deixava uma parte do drenador amostra, escondido em um quadro para ter facilidade no acesso das lembranças dos órfãos.
Um esquema padronizado.
Seria uma armadilha? Receio que não, afinal, Pompoo fora pega de surpresa. Não teria como prever tudo isso. Liguei o sistema. O computador informou que uma segunda pessoa estava conectada a ele. Pompoo se afugentou no mundo dos sonhos, para que? O que pretendia com isso?
Eu já não tinha mais nada a perder. Peguei o fio e o estiquei até meu pescoço, plugando-o em minha nuca. Toda minha espinha arrepiou. Senti medo por um curto momento. Estava em vantagem demais para morrer na praia. Eu não podia perder desta vez, ou não haveria uma próxima. O que seria pior do que os monstros que encarei naquela ilha? O risco da vida real, as mortes reais? O que poderia ser pior naquele mundo de sonhos do que o mundo de verdade?
Apertei o botão e tudo se apagou.
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