ATO 20
Um vício custa mais caro que manter uma família unida.
"Feen e eu saímos do Insanity Asylum juntos, mas ele omitiu uma coisa muito importante nessa historia. Nós tivemos ajuda de um terceiro sobrevivente"
— PETÚNIA! PETÚNIA! Eu vou te tirar daí, não se mova e nem fale nada! — Dante, debilitado e cheio de hematomas pelo corpo, correra em direção de uma pilha de escombros, onde meu corpo estava. Chegando lá, o garoto tirou todas as pedras e madeiras que soterravam-me ate deixar meu corpo completamente visível — Você consegue respirar direito? — perguntou ele, limpando meu rosto da fuligem.
Acenei positivamente.
— Brok... ele está ali. Por favor... — pedi.
— Claro, claro! — Respondeu Dante ofegante e feliz por ter escutado minha voz. Eu não queria ter sobrevivido ao lado deste psicopata, mas se o destino quis assim, então assim deveria ser. O garoto foi ate Brok que estava inconsciente e o reanimou pressionando seu peito. Assim que Brok despertou, Dante o levantou com uma certa grosseria e o trouxe até mim segurando seu braço.
— Fujam daqui, vocês dois — ordenou Dante.
— E você?
— No momento eu vou ficar aqui. Tenho alguns assuntos para resolver agora que não existem mais funcionários e nem crianças chatas para me aborrecerem. Eu só Preciso apenas de um favor seu. Me deve isto por ter salvado sua vida e a do ceguinho aí — Dante olhava para mim com um sorriso maquiavélico.
— Fale.
— Não conte nada sobre o que aconteceu nesse lugar para ninguém lá de fora. Independente de onde vocês vão, mantenham a boca fechada. Logo mais eu vou te procurar e conto o que pretendo fazer.
— Certo, também tenho algo a dizer... — com meu braço esquerdo, atingi seu rosto em um soco certeiro, quebrando seu nariz e jogando-o junto com os escombros no chão. Dante não reagiu, permaneceu parado, surpreso por tal atitude — ...quero deixar claro que não vou esquecer o que fez com Lola. Isso é imperdoável, mesmo você salvando minha vida.
— Justo, justo. Nos vemos em breve, Petúnia, eu te amo! — dizia Dante enquanto limpava o sangue que escorria de seu nariz com as mãos. Ele mantinha seu sorriso enquanto encarava-me.
— É Petrus. Meu nome é Petrus Feen. Vamos Brok. — adverti segurando sua mão e dando largos passos para fora dali.
"Quando eu e Feen saímos do orfanato, vagamos em uma estrada longa, até sermos encontrados por um casal. Eles nos encaminharam para um abrigo no centro de Londres e vivemos nossas vidas ali, tentando esquecer de todas as coisas ruins que nos afetaram. Nos tornamos grandes amigos, ou melhor, irmãos."
— Minha mãe sempre cuidou de mim de uma forma doentia. Queria me vestir com roupas femininas e mudava minha voz com medicamentos. Sofri muito nas escolas por ser obrigado a sair de casa usando peruca e saia. Enquanto meu pai... bom, ele sempre foi muito ausente na nossa vida. Além de ser um dos fundadores do Insanity Asylum, foi ele que me colocou lá depois que decapitei a cabeça da mamãe.
— Espere, seu pai era um dos fundadores?
— Sim, infelizmente. Pompoo só virou diretora na época porque ele fora assassinado por alguém.
— Então, realmente, o destino se superou aqui — disse Brok erguendo uma de suas grossas sobrancelhas.
— Porque? — perguntei intrigado. O garoto começara a usar óculos escuros para não chamar atenção das outras crianças que tinham medo de seus olhos brancos.
— Qual o nome do seu pai? — questionou Brok.
— David Corrigan.
— Pois saiba que o canalha do seu pai, também é o meu. Ele fazia jogo duplo! Tinha um caso com Pompoo e ao mesmo tempo com sua mãe. Agora isso faz muito mais sentido para mim!
— O que?! Nós somos irmãos de mães diferentes?
— Pelo visto, somos sim.
"Juntos, descobrimos muitas coisas sobre nós, revelamos segredos um para o outro e nos tornamos inseparáveis. No entanto, Feen manteve a promessa que fez para Dante, e não revelou nada sobre o Insanity Asylum para ninguém. Em um dia muito incomum, recebemos a primeira visita de Dante, cinco anos após a fuga."
— Como... como nos encontrou nesse abrigo, Dante?
— Não há nada nesse mundo que eu não encontre. Você está lindo, Petrus — exclamou ele, pegando em minhas mãos. Impulsivamente as afastei do garoto com um olhar de extrema desaprovação — Ficou maluco? Caia fora daqui.
— Eu estou trabalhando para Pompoo.
— Como assim? — perguntei surpreso.
— Vamos tomar um café?
"Havia um bom motivo para Dante ter ficado sozinho no Insanity Asylum naquela época. Ele foi até o escritório de Pompoo, revirou seus documentos e conseguiu seu contato. Apesar de surpresa, Pompoo admirou a proposta que Dante fez a ela."
— "Quero mostrar que serei útil para seus negócios. Não precisa mandar uma equipe grande para limpar as evidencias e os cadáveres daqui, mande apenas um. Eu darei conta de todo o resto."
— E ela aceitou essa proposta absurda? — perguntei segurando a xícara de café com as duas mãos. Dante estava com um ar muito mais tranquilo do que da ultima vez. Cinco anos e seu rosto continuava o mesmo, tirando algumas cicatrizes e um cavanhaque mal feito.
— Aceitou de bom grado. Passei cinco dias e cinco noites para queimar todos os documentos que a incriminavam e todos os corpos perdidos no Insanity. No entanto, se eu falhasse nesse período, o agente que ela mandou para me ajudar na tarefa, me mataria. Essa foi sua condição.
— Porque você quis trabalhar com ela? O que pretende com isso?
— Eu pretendo tomar a MindPlace, empresa em que Pompoo e sua equipe trabalham.
— MindPlace?
— É uma empresa que mexe com consultoria, optimização de recursos humano, avaliação psicológica,e acompanhamento psicoterapêutico. Resumindo, eles trabalham com a mente humana. Mas por trás dos panos fazem experimentos com crianças e com os drenadores. Existe um setor focado apenas nisso, onde Pompoo e Audrey lideram uma equipe de pesquisadores.
— Isso tudo é muito diabólico. Não sei quem é mais perigoso, você ou a própria Pompoo. E porque essa desgraçada continua mexendo com os drenadores? O que elas estão fazendo com as crianças?
— Drenam as energias delas. Agora, eu não sei para que, exatamente. Não tenho acesso a essas informações, meu trabalho é apenas limpar evidencias externas. Mas isso não vem ao caso. Quero que você lidere a empresa comigo quando ela cair — Dante aproximava-se cada vez mais de meu rosto.
— Aí já foi longe demais, o tempo não fez bem para o seu cérebro — debochei, afastando-o com a mão.
— Muito pelo contrario, meu querido Petrus Feen. O tempo foi muito generoso comigo. Mas será que ele causou o mesmo efeito em você? Derrubar Pompoo é de estremo interesse para você também. Pelo que descobri naqueles documentos que agora não existem mais, a megera possui uma herança muito farta que te pertence. Você estaria em um lugar muito melhor do que este se ela não tivesse assassinado seu pai e passado a herança para o nome dela. Além de rica, ela ainda assumiu o Insanity Asylum no lugar dele!
— Ela pode ter pegado tal herança, de fato. Mas não foi Pompoo que assassinou meu pai, Dante — no entanto, antes que o rapaz perguntasse alguma coisa a respeito disso, desviei o assunto — Qual o seu plano mirabolante da vez?
— Por hora, meu plano é tirar você desse lugar — respondeu sorrindo.
"Dante passou a desviar dinheiro da empresa de Pompoo para uma conta que criou para Feen. Com tamanho investimento, saímos do abrigo aos dezoito anos e compramos um apartamento no centro da cidade. De qualquer forma, o dinheiro que estávamos gastando era da herança que nos fora roubada."
"Seguimos nossos sonhos por um tempo, como pessoas normais. Apesar do farto dinheiro que tínhamos na conta, trabalhamos duro em muitos lugares e Feen pôde realizar o desejo dele de ser psicólogo. Feen saía com Dante uma vez por mês para falarem sobre o tal plano contra Pompoo. Na época eu sabia de pouquíssimas coisas a respeito. Eles mantinham sigilo. Até que um belo dia, Feen encontrara você, no super mercado em que trabalhava."
— Tem certeza que era ela, Feen?
— Absoluta, Brok! Eu reconheceria a pancada de longe, finalmente a encontrei! — disse ofegante — Ela nem se quer olhou na minha cara, acredita? Pandora, quem diria que o destino iria aprontar mais essa. Vou avisar Dante sobre isso.
"A informação de que você finalmente foi encontrada repercutiu na semana seguinte. Feen ficou obcecado em saber tudo sobre você, e por fim, Dante revelou para mim o plano."
— O local em que trabalho é localizado em uma ilha no meio do oceano atlântico. Ela é composta por três lugares. Um sitio chamado Goldem Asylum, uma cidade um pouco além dele e o laboratório principal da equipe de Pompoo. Essa ilha é impenetrável. Só entra nela pessoas autorizadas, e eu, funcionário deles a muitos anos, sou uma dessas pessoas.
— Golden Asylum? — Perguntou Brok.
— É um casarão com crianças deficientes. Pompoo usa esse lugar como fachada para a mídia. Aos olhos das pessoas, a MindPlace financia esse lugar para ajudar essas crianças. Mas ninguém sabe onde o tal Golden Asylum fica. As pessoas apenas sabem que existem. Eles ficaram temerosos quando Insanity Asylum foi por agua abaixo. Então para abafar o caso, construiram esse lugar. Pompoo fornece um bom dinheiro para o governo não investigar a fundo seus planos malucos.
— E como iremos nos infiltrar nessa fortaleza? — questionei.
— Simples, Doutor Feen. Pompoo não sabe que todos vocês estão vivos. Vai soar muito suspeito se eu disser para ela que encontrei vocês por acaso. Então você chamara a atenção dela — sugeriu o rapaz.
— Como..? — questionei aflito.
— Use seu talento como psicólogo. Crie um livro sobre a farsa do Insanity Asylum. Aproveite que encontraram Pandora e peça a ela que conte todas as experiências que passou por lá. Pegue depoimentos do Brok e até mesmo os seus, compile tudo. Isso vai chamar a atenção da megera e com certeza ela me mandara aqui para dar um sumiço em vocês, antes que publiquem o livro. Feito o sequestro, estarão dentro da fortaleza.
Dante nos dava novas informações todos os meses que se sucederam. Feen conseguiu seu contato, te chamou para as consultas e começou a escrever o livro. Nas horas em que não te consultava, ele investigava seu passado em sua antiga casa. Estávamos muito determinados em te ajudar.
— Meu Deus, que loucura! — exclamou Brok, passando as mãos na cabeça.
— Loucura é o que está por vir agora, ceguinho — disse Dante sorrindo — Quando entrarem na ilha, se dividirão em equipes. Brok e Pandora irão para o Goldem Asylum. Nesse lugar existem documentos confidenciais que vão destruir o reinado de Pompoo. Enquanto eu e Feen iremos direto para o laboratório das vadias.
— Pandora não vai aceitar tudo isso. Pelas consultas que tive com ela, a mulher está totalmente desanimada e frustrada com a vida. Minha ultima cartada é mostrar o passado sombrio que descobri em sua antiga casa. Se mesmo assim não despertar aquele sentimento de vingança que ela tinha, então não sei mais o que fazer.
— Fácil de resolver, rapazes. Nós simularemos esse sequestro aqui em seu apartamento mesmo. Assim a levamos de qualquer forma.
— Acho melhor deixar Pan fora desse plano, pessoal — sugeriu Brok.
— E deixa-la apodrecer naquela casa em cima de um bar? Eu quero nossa Pan de volta. Aquela mulher não é a Pandora que conhecíamos a dezesseis anos atrás. Eu vou salvar a Pan dela mesma, portanto, eu concordo com Dante. Traremos ela a força porque essa causa também a pertence — finalizei.
Mas... como pode ver, algo deu muito errado nesse plano, pois além de não encontrarmos nada sobre a empresa, acabei em uma maca, preso em um drenador, e ainda nos deparamos com caminhantes e criaturas estranhas que Dante não nos informou que existiam. Pompoo acessou minhas memórias enquanto eu estava naquele celeiro, porém alguém bloqueou as memórias em que Dante aparecia nas nossas vidas. Ela sabe que estamos aqui, mas não sabe sobre o plano e nem que nos aliamos a Dante.
— Espere um pouco. Você esta me dizendo que planejaram tudo isso sem o meu consentimento? — mais uma vez, negociei forças com meu corpo para poder levantar. Uma onda de ódio dominou meu esqueleto. Fiquei de frente para Brok. Empurrei o rapaz com tamanha brutalidade que o mesmo caiu de costas no gramado.
— Sabe o que eu percebi, além de não confiar mais em vocês? Que tanto você quanto o Feen acham que vivem em uma serie de televisão. Sabem mesmo como funciona a vida de verdade? Pagar contas, sustentar uma casa, passar apertos? Ou gastaram esse tempo brincando de agentes secretos e justiceiros do amanhã? Cansei dessa merda toda! Quero que vão para o inferno com essa maldita causa!
— Era muita informação para digerir! Você iria explodir!
— EU JÁ ESTOU EXPLODINDO! PARA DE FALAR! CHEGA! Se minha tia morrer naquele hospital, esperando pela minha volta, eu juro que acabo com vocês! Pode apostar! Eu acabo com vocês!
Brok, mesmo não tendo visão, encarava-me como se tivesse uma. Meggie, mesmo confusa, não desprendia o olhar para nós. E eu, descontrolada, me senti uma completa idiota. Usada até o ultimo momento por pessoas que eu considerava minha segunda família. Eu pensei no fundo do meu coração que encontrar Brok e Petúnia poderia dar um sentido a mais para a minha vida, mas o efeito foi o contrario. A vontade de partir deste mundo só aumentava.
— Só queríamos te ajudar.
— Me forçando a tudo isso?!! Tem certeza que queriam mesmo?!! Quais as chances de Dante ter usados todos nós para algo maior?! Confiaram em um psicopata, seu idiota!!
— Não é a Pandora que conhecíamos.
— NÃO SOU! EU NÃO SOU ESSA PESSOA QUE IDEALIZARAM! PORRA! — gritava aos quatro ventos enquanto eu ajoelhava no gramado — EU SÓ QUERIA QUE VOCÊS SUMISSEM DE NOVO! — as lágrimas que saíam, limpavam a fuligem de minhas bochechas e escorriam como uma maquiagem borrada — INFERNO! Se acha que isso iria me convencer a continuar nessa merda toda, saiba que esse plano absurdo foi realmente um fracasso e agora, você tem a vida de uma criança nas suas costas!! Meggie, levante e vá embora com ele! Eu vou ficar aqui e ver se consigo morrer em paz.
— Não irei a lugar nenhum. Só vou se os dois forem juntos — respondeu Meggie se levantando também — não importa mais quem está certo ou não. Se a gente não ficar juntos, todos morreremos. Não imaginava que ser adulto era tão ruim assim, pessoal.
— É uma merda, garota. Ser adulto é uma merda — respondi engolindo o choro — vá embora com ele! Eu não vou continuar isso.
— Não, eu não vou. Fico aqui.
— Sua tia Betty foi transferida para um hospital particular, Pan. Feen está pagando toda a estadia dela, está em boas mãos se essa for a sua preocupação.
Aquela conversa não se estendeu muito.
O Tigre-Guaxinim começou a andar em minha direção e nossa atenção voltara para ele. Continuei parada, estiquei a perna para frente. A dor vinha sorrateira, queimava meus músculos, meus tendões. Quando a fúria se foi, a dor sucumbira. Ele caminhava e mantinha a visão para mim. Não era um possível ataque. Talvez, um contato. Brok afastara alguns passos ao sentir a presença da criatura e Meggie, assustada também recuou. Ele parou e sentou perto de minha perna.
Eu já não tinha mais nada a perder. Se eu fosse devorada até seria melhor mas não foi isso que aconteceu. O tigre abriu sua bocarra e começou a lamber as feridas de minha perna. Alguns segundos depois, a dor se ausentara.
— Pan... o que ele está fazendo? — exclamou Brok, distante.
— Saliva de tigres guaxinins tem poder curativo... — respondi passando a mão em sua cabeça peluda. As lágrimas saíam de meu rosto como uma enxurrada. Meggie se aproximara de mim e tocara minha face com suas mãos pequenas e macias. Seus olhos expressivos mostravam-me a vontade que ela tinha de viver. Talvez ela, uma criança, esteja certa. Se não ficarmos todos juntos, morreríamos.
Mesmo com uma imensa vontade de encerrar a vida ali, deitada, eu não poderia tirar a vontade de viver dos demais, seria muito egoísta da minha parte. Ao me levantar mais uma vez, nada mais em meu corpo incomodava-me. Minhas pernas estavam novas em folha. O tigre também lambeu os machucados da perna de Brok e do corpo de Meggie.
— Não tenham medo dele, se fosse para sermos devorados, já seriamos a muito tempo — disse a Meggie, forçando um sorriso e secando meu rosto com minha camiseta.
Talvez, muito talvez...
Eu quisesse que algo de extraordinário acontecesse na minha vida.
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