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Capítulo 8

Música do capítulo: Blindsided - The Backfires 


Max dá um passo incerto em frente e o cheiro a álcool atinge-me como uma onda. Os olhos dele estão raiados de vermelhos e há deceção a brilhar-lhe nos olhos. Talvez um pouco de raiva também, enquanto os olhos dele dançam entre mim e o Harry. Tem o cabelo loiro numa confusão rebelde e os lábios grossos estão vermelhos, a condizer com as bochechas.

-Passa-se alguma coisa? – Para além da bebedeira, claro.

Ele nunca gostou de vir ao dormitório, se cá veio duas, uma é mentira e a outra é uma alucinação.

-Vim ver se era verdade...- Max aponta para o Harry com um desdém aparente. Fico confusa.

-O que é que era verdade?

Max engole em seco. 

-Que andas com este merdoso.- Aponta para Harry, com o queixo.

-Merdoso, não. Harry. - Harry estende-lhe a mão.- E tu deves ser o ex.

-É um amigo.- Repito.- E tu, estás bem?

-Agora que descobri que me andaste a meter os cornos, não, não estou.- Max exalta-se e esfrego as têmporas. São três da manhã e isto só pode ser um pesadelo.

-Max, o Harry não é meu namorado e eu não te trai.

-Não? Então o que é que ele está a fazer aqui? A esta hora? Vieram beber chá?

O Harry dá um passo em frente, é subtil, mas coloca-se entre mim e Max.

-Vim trazê-la a casa. Fomos sair.

Max olha para mim, incrédula.

-Não me traíste, mas já me substituíste? - Ele chega-se à frente e o cheiro azedo do que acho ser vómito sobe-me ao nariz.

-Max, tu estás bêbado, vai-te embora. A sério.

Viro-me para abrir a porta e oiço um movimento subtil atrás de mim. Max deu uns passos e está mesmo perto de mim.

-Eu sei que tens saudades minhas, podemos falar?

Enquanto ele olha para mim, percebo que não tive saudades dele. O meu corpo não sente nada, não há formigueiros e borboletas, nem uma centelha de excitação. Em vez disso, as palavras dele sobre a traição do meu pai veem-me à mente e causam-me um nó no estômago, que é agravado pelo cheiro horrível dele. Reparo pelo canto do olho que o Harry também está incomodado.

-Vá lá, valentão, vamos deixá-la dormir, ok?- Harry tenta afastá-lo de mim, mas Max empurra-o com força.

-Não me toques! Deixa-a em paz!- Max grita, desesperado.

-Isso é má ideia, meu.- Harry sussurra-lhe de olhos fechados. – Hoje não estou num dia bom para perder a cabeça.

Farta da situação guarda as chaves e viro-me para o Harry.

-Podes ir, eu falo com ele.

-Ele está bêbado. - Harry diz, como se os meus instintos de sobrevivência estivessem avariados. Não estão. O Max é um bêbado chorão. – Desequilibrado...

-E o quê?- Max grita e oiço uma pancada numa porta. Estão claramente a avisar-nos que é muito tarde para lavar roupa suja nas escadas.

-Cala-te, por favor. Eu vou.- Viro-me para o Harry.- Eu depois ligo-te, ok? Obrigada.

Harry inspira profundamente, e assente. Consigo ver que está chateado, mas só consigo lidar com um homem zangado de cada vez.

Harry assente e desço as escadas, com Max atrás de mim num passo cambaleante. Abro a porta da rua com o ombro e fico à espera que ele passe por mim, o que ele faz, com um olhar desconfiado.

-Andas a fodê-lo?- A voz dele é um fio e oiço as lágrimas.

-Não. Mas se estivesse....

-Mas não estás?- O desespero dele é quase palpável.

-Não.

-Porque ele é um tipo perigoso. Tu sabes.

-É só trabalho.

-Trabalho?

-Max, por favor, não temos de continuar a fazer isto.

Olho para ele. Está claramente drogado.

-Mas eu quero continuar. Quero-te.

E num impulso que já vi acontecer demasiadas vezes, ajoelha-se à minha frente.

-Max, levanta-te, por favor!- Tento puxá-lo para cima, mas ele é muito mais pesado.

-Desculpa. Perdoa-me. Volta para mim.- Os olhos dele quase desaparecem, debaixo da corrente de lágrimas que lhe escorrem pela cara e lembro-me de todas as vezes que ele me pediu desculpa assim. Ele chora. Eu desculpo. Lembro-me de ter ficado uma semana sem falar com ele, quando percebi, a meio de uma viagem de carro que ele ele tinha parado o carro para cheirar. Quis acabar com ele, literalmente, quis bater-lhe, mas depois, quando lhe disse que nunca mais o queria ver, ele chorou. E talvez, uma parte de mim não tenha conseguido deixá-lo durante tanto tempo, porque, tal como eu, ele está preso a uma família e a um pai que o faz sentir miserável. Um pai que, ao fim de todos estes anos, ainda trabalha para o meu pai, e ainda acha que a melhor coisa que aconteceu ao filho, fui eu.

-Max eu estou farta. Nós não gostamos um do outro, ou pelo menos já não gostamos.

-Isso não é verdade... eu amo-te!

-Para de dizer. Tu não sabes quem és, como é que podes saber se me amas? Tu amas a aprovação das pessoas, amas a ideia daquilo que eu te posso dar. Mas não posso dar nada.

O olhar apavorado dele desvia-se do meu e ele puxa o cabelo de forma errática.

-Eu preciso de ti Cammy, o meu futuro depende de ti.- O desespero na voz dele é palpável e magoa-me.

Ele não tem saudades minhas, isto é provavelmente pressão. Ele trabalha com o meu pai. Pai esse com o qual discuti. Ele foi claramente encostado à parede.

-Se foi o meu pai que te pedir para vires aqui...

Os olhos dele alargam-se de terror.

-Não.

-Sim. Não mintas. Eu gritei com ele, não lhe atendo as chamadas e ele fez-te a cabeça.

Max abana a cabeça, freneticamente, quase como se fosse pior eu descobrir que o meu pai falou com ele, do que o ver neste estado, em que está completamente drogado e bêbado. A mão dele toca-me no antebraço e cubro a mão dele com a minha.

-Max, larga-os. Larga o teu pai, larga o meu... tu não tens de ser médico. Nem sequer queres ser médico, se não, não estavas assim.

Max arregaça as mangas da camisa Ralph Lauren e vira-me as costas.

-Eu não vou ser como tu.

-Devias. Desistir de medicina foi a melhor coisa que fiz... O meu pai sabe que andas a consumir?

Max vira-se para mim como um chicote, quase furioso com a ideia de eu saber que ele não fumou só um charro.

-Eu não consumi.

-Não? - Lanço a mão na direção do bolso das calças dele, de onde vejo a ponta de um minúsculo saco de plástico.

No impulso que nos surpreende aos dois, ele empurra-me com força para longe dele, fazendo-me tropeçar. Antes que saiba o que está acontecer o Harry passa por mim e correr e agarra Max pela gola da camisa.

-Eu mato-te. Estás a ouvir? Toca nela outra vez...

Engulo em seco e precipito-me para cima deles.

-Larga-me!- Max grita, quando Harry o vira e lhe empurra a cara contra a parede. Eles sussurram qualquer coisa um ao outro, antes que eu os apanhe.

-Larga-o.- Peço a Harry.- Ele não está bem.

Harry olha para mim e depois para a nuca de Max, que empurra com mais força contra a parede.

-Aggghh!- Max geme de dor e Harry solta-o.

-Desaparece.- Cospe Harry.- Antes que eu te apanhe e desta vez não saias a andar pelo teu próprio pé.

Max leva a mão à bochecha que está ensanguentada e o meu estomago embrulha-se.

-Tu...- Max olha para mim, e depois para Harry, antes de dar um passo atrás.- Desculpa, Cammy.

Max dá a volta e caminha meio cambaleante em direção à estrada. Será que veio de carro? Antes que possa continuar o raciocínio e perceber se é melhor chamar-lhe um uber, o Harry baixa-me o ombro da camisola onde Max me tocou.

-Está vermelho. - Sussurra, enquanto os dedos gélidos dele percorrem a minha pele quente. O toque faz o meu estomago dar outra cambalhota e antes que possa fazer alguma uma náusea atravessa-me o corpo.

-Harry...- Digo, enquanto tento dar um passo atrás.

-Eu sabia que era má ideia falares com aquele tipo. - A voz dele é dura, os olhos estão especados na marca vermelha no meu ombro e tento desfazer-me do toque dele.

-Harry...- Aviso, mas ele não me deixa ir para longe.

Outra guinada violenta no meu estomago e vomito. Estou a suar frio e sinto-me o cheiro do tabaco, do suor, da droga, está tudo à minha volta e leva-me para um sítio frio e estéril, enquanto despejo o conteúdo do estomago nos sapatos e na t-shirt dele.

-Larga-me!- Ordeno-lhe, mas em vez de me deixar ir ele vira-me ao contrário e apanha-me o cabelo. Outro vómito e baixo-me, desta vez para um canteiro de flores.- Merda.

Os espasmos no meu estomago continuam durante o que parecem horas e só sinto um ligeiro alivio quando a mão do Harry me começa a desenhar círculos na parte debaixo das costas.

-Melhor?- A voz dele, rouca e preocupada é pontapé na minha dignidade, já mais que morta. Tal como as flores que acabei de matar.

Fecho os olhos e ergo-lhe um polegar.

-Achas que consegues subir as escadas sem vomitar? Não que eu me importe de voltar para trás e limpar, mas não queremos que alguém acorde ao som dos teus...

-Cala-te.- Murmuro, e endireito-me.

Ficamos a olhar um para o outro, enquanto ele tenta não sorrir e eu tento não olhar para a t-shirt vomitada dele.

-Odeio a minha vida.- Digo-lhe e viro costas.

Enquanto subo as escadas, exausta de sono e completamente humilhada, sinto qualquer coisa nas costas e quando levo a mão ao cós das calças, descubro que ele tem o dedo enganchado na presilha do cinto.

-O que é que está a fazer?- Guincho.

Só falta dois degraus.

-Estou a segurar-te desde que entrámos, estás meio cambaleante, miúda.

O desafio do último degrau é ultrapassado com sucesso e agarro na mão dele, para que me solte.

-Eu consigo andar.

Ele ri-se e espera que eu abra a porta de casa. Quando o faço e me viro para o mandar embora ele está mesmo atrás de mim.

-Não estás mesmo a pensar que vou sair daqui neste estado, pois não?

Harry aponta para a t-shirt vomitada e olho para trás, há espera que Marisa tenha acordado com a confusão. No entanto, não há Marisa, ela está a dormir em casa de Jake. Quando me volto a virar o Harry ele está a tirar a camisola e naquilo que me parece um clichê de comédia romântica, tenho quase a certeza de que isto está a acontecer em câmara lenta. 

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