
➤ É assim que nós acabamos?
WEASLEY
Eu engulo os espinhos, porque eu estou prestes a dar um passo para mais perto do inferno. Preciso ser forte, preciso que... alguém tome o controle de mim mais uma vez e faça o que tem que ser feito sem que eu tenha que olhar. Antes eu do que os outros, eu penso mais uma vez nessas palavras. Eu amo muito todos nesta casa para simplesmente deixar que eles se queimem por mim. Não importa se eles são mais fortes ou não, é minha responsabilidade. Foi minha ideia, é minha mulher. Não tem nada mais meu aqui do que isto.
Todo o tronco dela está envolto por cordas, sentada no chão ao lado da minha cama. Sophia ergue a cabeça ofegante quando me ouve bater a porta. Os cabelos bagunçados como se ela tivesse brigado com um gato, pálida como uma vampira e suando. Seus olhos estão escuros como Fred me avisou e ela os arregala demonstrando desespero, olheiras profundas debaixo dos mesmos como se tivesse ficado dias desperta. Fico hesitante. Quase fraquejo, por muito pouco eu não saio de novo para o corredor e grito rendição.
— George!— ela arfa, esboçando certo alívio como se soubesse que eu vim libertá-la, mal consegue se mexer, as cordas invocadas do papai são antimagia e a casa toda a impede de desaparatar, então para conseguir fazer qualquer coisa, ela precisa se livrar das cordas primeiro— Por favor, amor, me solta, eu estou bem, juro! Eu não consigo me mexer com essas cordas, por favor!
— Eu quero falar com ela— digo colocando as mãos nos bolsos. A cacheada me olha incrédula.
— Ela quem? George, uma mãozinha?
— Eu quero falar com minha namorada— exijo.
— Eu estou bem aqui!— ela diz, ofendida— Me solta, George, eu não vou conseguir fazer nada aqui, eu preciso ir no banheiro alguma hora!
— Cala a boca. A barganha é uma tentativa medíocre, Sophia não faria isso entendendo a situação. Me deixa falar com ela— digo entredentes, furioso. Sophia pisca algumas vezes e a máscara cai aos poucos, seu rosto fica neutro, apático e ela se recosta na cama revirando os olhos, meramente entediada.
— Vocês são bem teimosinhos, hein?— diz já parando de fingimento— Quantas versões sua tem nessa casa? Quantas delas teriam piedade de mim?— ela faz bico, dissimulada, cerro os dentes.
— Eu quero falar com a Sophia!
Ela ri, até a risada é falsa.
— Acha mesmo que ela ainda está aqui? Eles nunca estão no controle, garotinho— ela debocha— Se bruxos poderosos antes dela não aguentaram, imagine uma sangue ruim tão comum! A primeira que me toca, vocês deviam se sentir honrados por eu não ter acabado com a vida medíocre dessa ladra!— diz entre dentes.
— Anda, Rita, eu não tenho o dia todo— cruzo os braços demonstrando impaciência.
— Rita?— ela repete com repugnância.
— Te dei um nome. Você nunca deu a graça de falar o seu— levanto a sobrancelha e me mantenho frio. Espero conseguir falar com a real Sophia antes... de fazer o que tenho que fazer. Quero que ela me diga que está tudo bem por mais que não esteja nada bem.
— Oh, eu tenho muitos nomes— ela sorri um tanto sádica.
— Dentre eles está Satã?— reviro os olhos e ela gargalha.
— Essa... essa foi boa!— elogia— Mas tenho uma sutil diferença do cara lá de baixo, eu não vou embora se você começar a rezar— sussurra inclinando-se na minha direção.
— Eu não vou rezar, fique tranquila— observo as faixas nas minhas mãos distraidamente. Sei que tenho que me prevenir com Oclumência para que ela não ache meus pontos fracos e persista neles. A desgraçada é esperta e faz o mesmo. Nós nos encaramos sérios por um momento longo, ambos olhando para um desafio em questão— Eu vou matar você— digo quebrando o gelo. Eu estou olhando nos olhos da Sophia, mas não estou falando com ela, isso é bizarro.
— Não tem como você me matar, eu não tenho alma— ela diz, sorrindo completamente descrente.
— E nem corpo— cruzo os braços, a morena franze a testa.
— Eu vou ter.
— Quando o ciclo estiver concretizado?— pergunto.
— Fez a lição de casa— ela é cínica, levanta as sobrancelhas esboçando surpresa como se eu fosse o ser mais burro do mundo aprendendo um gesto muito simples— Se conhece o ciclo conhece a finalidade dele, por que está sendo tão ingrato? O corpo da sua namorada seria imortal, talvez eu até arranje um espaço para você na minha vida— eu ignoro sua última fala.
— Mas ele nunca vai chegar ao fim, não é mesmo? Você acumula poder, mas só consegue usá-lo a toda com o receptáculo perfeito— fico pensativo ainda tentando ver como ela joga.
— Não acha que eu sou burra para te falar dos meus planos, não é mesmo?— fala a estúpida com um sorriso ladino e malicioso.
— Justo— dou de ombros— Mas eu sinceramente não me importo com ele agora, porque eu vou quebrar seu ciclo com a minha namorada, então vê se faz as malas, Rita.
— Que nome ridículo...
— Combina com você— faço ela rir de novo.
— Sabe que não tem como me separar do meu receptáculo— levanta uma sobrancelha, eu ando até ficar um metro dela e me agacho na sua frente— uma vez que ela oferece seu sangue ao livro, nós duas seremos eternamente ligadas.
— Ah, tem sim um meio de cortar esses fios entre vocês— balanço a cabeça, meu estômago dá um nó, espero que ela não repare na minha respiração descompassada, em todo meu nervosismo.
Sophia cerra os olhos, umedece os lábios sem falar nada, apenas desconfiada.
— Só tem um jeito, e eu vou matar você hoje a noite— eu falo. Ela sorri de lado olhando meus olhos, procurando a mentira.
— Não teria coragem— diz, descrente, mas pode ver que eu não estou blefando— Você não fará nenhum mal á essa garota de propósito.
— Se eu fosse você não duvidaria de mim. Eu quero a Sophia de volta e eu vou fazer isso hoje. Quando acabarmos, independentemente do resultado, eu vou pegar seu corpinho de prata, meter num saco cheio de pedras e te jogar na porra do fundo do mar— seguro seu rosto com firmeza— Quero ver você conseguir arranjar alguém lá, sua filha da puta— sorrio com dureza. Rita fica colérica e um velho boneco de madeira do Fred voa na minha direção. Eu desvio. Ela não consegue fazer muito além de arremessar objetos com essas cordas suprimindo sua magia.
Ela começa a me xingar em outra língua e eu aperto mais seu rosto fazendo com que ela se cale.
— Deixa eu falar com ela!— repito elevando o tom— Seu joguinho vai acabar essa noite, não banca a fodona para meu lado.
— Você ama essa garota— ela ri— Não vai conseguir ir até o fim, ela vai morrer, mas eu não, faça ameaça que quiser, gracinha, mas sempre vai ter alguém procurando por mim, e eu sempre vou chamar por eles como mariposas para a luz!— cospe entre dentes.
— É exatamente porque eu a amo que eu vou libertá-la o mais rápido possível de você!— olho em seus olhos. Ela ainda não acredita— Não me testa, Rita, eu não sou tão paciente com quem eu não gosto.
— E se ela não quiser?— Rita fala, é meio difícil fazer o que eu penso com ela sendo que seria o corpo de Sophia sentindo tudo. Não vou conseguir bater nela, odeio quem fala, mas o corpo ainda é de Sophia.
Eu não queria ouvir isso. A desgraçada é certeira em usar logo essa pergunta como arma. E se Sophia não quiser? E se ela não aceitar correr o risco? Mesmo que não me entre na cabeça que ela fosse escolher tirar a vida de inocentes para salvar a própria pele, eu tenho que falar com ela.
Como caralho ela poderia escolher melhor afinal de contas?! Ela jamais teria controle de seu corpo uma vez que o ciclo se completasse... Eu acho.
— Está pesando na balança, criança?— ela pergunta numa voz que não é de Sophia— Vinte e duas vidas por uma, você seria o herói ou o vilão? Eu quero ter um corpo, você quer ter sua namorada, talvez a gente possa criar um acordo.
— Que acordo?— pergunto.
— Me dê seu corpo como receptáculo— a respiração dela vai ficando irregular, e ela vai abaixando e balançando a cabeça, como uma negação, acho que a verdadeira Sophia me mandando um sinal— ...e eu deixo Sophia, e quando você terminar, podemos fazê-la imortal conosco.
A opção me parece tentadora, mas ela está blefando. Não tem como ter tanta certeza assim do futuro. Não tem como saber se eu aguentaria. Rita começa a passar mal, mas eu hesito sem certeza se ela está apenas atuando. Só para ter certeza eu reforço as cordas com magia. De algum jeito, ela consegue ficar ainda mais pálida, é muito estranho vê-la assim, quase doentio já que Sophia é parda, o olhar perdido fica se revirando e ela cai deitada de lado, seguro sua cabeça antes que ela bata no chão.
— Ruivo.... ela.... mentirosa.... faça.... Faça, George.— ela diz com dificuldade uma lágrima solitária escorre pelo seu rosto, eu sei que é Sophia. Ela também está lutando com um monstro interno— Sangue ruim— murmura. Ela e Rita parecem estar numa briga acirrada pelo poder de falar. A morena geme e estremece chutando o vazio, luta contra fantasmas e eu espero que minha namorada esteja ganhando.
Sophia está tentando, por isso ela parece tão desgastada. Elas estão numa disputa, talvez o que Rita esteja falando em outra língua seja para manter Sophia afastada, e não eu. Passo a mão pela sua bochecha, ela está suando frio.
— Acaba com ela, moranguinho— murmuro e não há respostas, apenas grunhidos de dor e esforço— Ei, eu amo você. Você pode fazer isso.
Por trás da careta de dor, ela sorri sofrega.
— Amo você— diz de uma vez como se arrancasse um curativo. Seus olhos ficam brancos um momento— Você não tem o dia todo, ruivo— Sophia sussurra, alerta, o rosto virado para mim, mas não ver suas íris é bem assustador. Que Fred apague esse dia da minha mente e que faça o melhor trabalho de sua vida. Só confio nele para tal— Faça... agora!— Sophia arqueia a coluna e geme alto— Faça o que tem que fazer agora!
De onde eu vou tirar essa coragem nem eu mesmo sei. Pego Sophia no colo, ela está falando agora, e isso me preocupa, não consigo entrar na sua mente agora e duvido que eu poderia ajudá-la em qualquer coisa. Paro de respirar quando a levo para fora do quarto. Tudo é muito grotesco. Eu estou levando meu amor para o sacrifício, eu vou oferecê-la aos deuses e pedirei de volta. Espero que eles não a amem tanto quanto eu para quererem ficar com ela. Ando em direção ao banheiro sentindo meu corpo endurecer a cada passo.
E se for assim que nós acabamos? Eu a mato e fico louco? Ou recorro a Fred e me esqueço de tudo o que passamos? Se esse for o final, aposto que vai ser meu primeiro pensamento apagar toda a história da minha mente. Eu estou passando mal, mas ainda conjuro água para encher a banheira e eu não paro de me mover. Estou no modo automático, quando tenho algo em mente é quase impossível me fazer parar, ainda mais quando estou cheio de convicção. Sophia murmura palavras desconexas e não parece nem se importar quando eu a coloco na água. Eu hesito, o pânico domina meu peito por um momento e eu fico de joelhos com a testa colada na banheira tentando me lembrar como se respira. Longos minutos se passam e eu não consigo passar do ataque de pânico. Sophia sussurrando, os olhos brancos. Eu só quero que ela volte, e para isso, tenho que mandá-la para longe.
Tudo bem, tudo bem, eu posso fazer isso. Eu fungo e ergo o rosto observando minha namorada. Ela já passou por tanta coisa. O que seria mais isso? Dando errado para mim, daria certo para ela? Ela teria paz? Ela me perdoaria por não conseguir achar nenhum plano melhor?
E é me torturando com as dúvidas que eu a afundo na água da banheira murmurando para ela o quanto a amo e a seguro pelo pescoço para que ela permaneça embaixo. Sinto vontade de vomitar, meu estômago se revira de forma nauseante e eu olho para o teto sentindo lágrimas escorrerem pelo meu rosto. Sophia/Rita não demora a começar se debater, o desespero sobe minha garganta e a água se agita saindo pelas bordas, me molhando junto com a garota amarrada.
Toda minha família sabe o que eu estou fazendo. Estou rezando para que ao menos algum deles grite para que eu pare me falando que tem outro jeito, mas o grito de ninguém vem e os minutos se arrastam.
E então, ela para de lutar. Está feito, muito mais fácil do que eu tinha imaginado. Eu matei Sophia.
Nota da autora:
E aí, o que estão achando?
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