02 | O CASACO DE INVERNO DA MINHA MÃE
CAPÍTULO DOIS | HOT PINK ICE CUBE
❝O CASACO DE INVERNO DA MINHA MÃE❞
❝eu não quero desistir de você. bem, nós duas temos noites acordando em camas de estranhos. eu não quero desistir ainda❞ ⸺ DON'T WANNA; haim
LEAH SENTOU-SE PESADAMENTE À MESA, PUXANDO A BAINHA DE SUA BLUSA DE TREINO DO ARSENAL, AINDA ÚMIDA DA SESSÃO. O resto da equipe a seguiu, suas conversas se misturando ao barulho fraco da máquina de café no canto e a equipe circulando. A garota de Milton Keynes olhou ao redor, seu olhar finalmente pousando em Lia Walti, que estava sentada ao lado dela, seu polegar rolando preguiçosamente em seu celular.
Segundos antes, Lia mal olhou para o lado quando Leah caiu no assento à sua direita, muito absorta no que quer que estivesse vendo. Elas tinham acabado de terminar uma rodada de exercícios, do tipo que deixa suas pernas queimando, mas rende tempo de descanso suficiente para sentar enquanto finge que não está muito cansado. As outras garotas estavam espalhadas no refeitório. Algumas estavam na fila para tomar café, outras esparramadas em cadeiras. Leah esticou as pernas na frente dela, sentindo a tensão diminuir. Lia ainda estava em seu celular, e elas ficaram em silêncio por um tempo. Mas então Lia fez uma pausa. Seu dedo parou em uma foto, e seu polegar pairou sobre a tela como se ela não tivesse certeza se deveria continuar ou dar uma segunda olhada.
A imagem era muito clara. Misha e Son. Eles estavam de mãos dadas, saindo de um teatro no West End, e a legenda na postagem da conta do DailyMail dizia algo sobre a nova peça ou musical que tinha acabado de estrear e que eles tinham ido ver. A velha e bonita rua da cidade os enquadrava, e Son estava rindo, seu rosto virado para Misha, que estava usando o sobretudo longo que ela quase sempre usava. O estômago de Leah se revirou, embora ela não conseguisse identificar o que era. Lia inclinou o celular levemente, o suficiente para que Leah pudesse fingir não ver a foto enquanto ainda dava uma boa olhada. Leah percebeu que Lia estava a observando pelo canto do olho, talvez esperando algum tipo de reação, mas Leah apenas se mexeu na cadeira, endireitando-se.
— Então, você viu isso? — Wally finalmente perguntou, sua voz tão neutra como sempre. Ela não precisava explicar sobre o que estava falando.
Leah se recostou na cadeira e deu de ombros indiferentemente, seus olhos finalmente encontrando os de Lia.
— É, acho que ela mencionou algo sobre ver uma nova peça no Almeida.
A mentira veio facilmente, embora ela não tivesse certeza do porquê. Misha não mencionou nada sobre ir a uma peça. Os planos com Son eram apenas um jantar - que aconteceu dois dias atrás. Mas, por outro lado, Misha não comentou muito depois que Leah melhorou e ela se sentiu confiante o suficiente para não ficar checando como ela estava a cada cinco minutos. Bem, ainda havia mensagens ocasionais e planos vagos entre elas. Mas do dia no apartamento de Leah, quando ela estava realmente doente, até ali, duas semanas se passaram. Misha estava um pouco mais distante. Leah também não perguntou sobre o motivo. Ela sentiu que não era seu lugar.
Lia levantou uma sobrancelha, mas não insistiu em tentar entender o que estava acontecendo, embora soubesse em parte. Ela conhecia Misha através de Leah, e sabia sobre as duas, assim como sabia que supostamente não havia nada entre elas além de um arranjo casual. As coisas deveriam ficar bem então, ou assim Lia queria imaginar.
— Ok... — Lia continuou — Deve ter sido uma boa noite.
Leah queria ser indiferente sobre isso, queria ser uma daquelas pessoas que não se importam que uma ex - ou o que quer que Misha fosse - tivesse seguido em frente, principalmente porque foi ela quem encorajou isso.
— Sim, parece que sim.
Ela pegou sua garrafa de água, desenroscando a tampa de uma forma que parecia estar exigindo toda a sua atenção, então tomou um longo gole que não fez nada para aliviar seu desconforto. Não que ela se importasse com algumas fotos e alguns encontros. Ela se importava um pouco. Mas ela e Misha não tinham nada, não realmente. Apenas algumas noites, algumas manhãs, alguns toques persistentes que nunca se transformaram em algo mais permanente.
Lia se mexeu na cadeira, colocando seu celular com a tela desligada na mesa e pegando sua xícara de café antes de tomar um gole.
— Vocês duas ainda estão conversando?
— Sim, às vezes. Nós somos... amigas. Você sabe.
Lia sorriu levemente, quase com simpatia, como se soubesse exatamente o que estava acontecendo ali de onde estavam.
— Amigas... claro — Lia repetiu. Ela cruzou os braços e recostou-se na cadeira antes de olhar diretamente para Leah — Bem, se você me perguntar, provavelmente é para o melhor isso. As coisas se complicam muito rápido quando passa do casual.
— É o que eu digo.
*
O céu sobre o Regent's Park estava nublado, mas apesar disso não havia nenhuma ameaça real de chuva, apenas uma cúpula cinza que fazia as árvores e a grama parecerem mais vívidas em contraste, mesmo que não estivessem tão verdes. Misha estava caminhando entre Jonathan e Claudia. Jonathan estava do lado direito de Misha e tinha o braço em volta dos ombros dela, enquanto Claudia estava de seu lado esquerdo. Misha estava bebendo um café gelado, sentindo a condensação fria escorrer pelos dedos conforme as gotas de água iam escorrendo pelo plástico do copo com tampa, enquanto Claudia bebia algo à base de aveia, porque apesar de uma escorregada ou outra quando ia para restaurantes na cidade, a garota era vegana. Jonathan optou por café preto puro, sem açúcar, mas já tinha bebido tudo e estava apenas segurando o copo, esperando para ver uma lixeira em algum canto.
— Então, seu grande encontro com o Son na quarta passada... — Jonathan disse, depois que Claudia terminou de contar algo sobre o tempo deles em Bath. Os dois estavam gravando juntos eventualmente, e iam voltar a trabalhar pouco depois das festas de fim de ano. Eles estavam indo para Bath, quase que permanentemente por pelo menos seis meses — Bom o bastante?
Misha deu de ombros quanto à pergunta de Jonathan. Ela não estava muito pronta para se comprometer com grandes conclusões sobre o que poderia ter sido todo aquele tempo com Son.
— Foi divertido — ela disse, tirando o cabelo do rosto enquanto o vento soprava um pouco —Fomos naquele restaurante perto do Tâmisa, aquele com a vista no alto... você sabe, todo de vidro e com pratos pequenos e caros, com drinks estranhos e fracos.
— Claro — Claudia murmurou — Aposto que ele adorou.
— O garoto praticamente vive em filtros do Instagram — Jonathan comentou.
— Ok, para — Misha riu — Ele é legal. Não foi ruim. E ele não vive de filtros de Instagram.
Misha entendeu um pouco da implicância de Jonny. Son sempre foi autoconsciente de sua imagem, isso era claro. Ele era polido, mas havia mais do que apenas parecer bem para as câmeras. Ser sul-coreano acrescentava uma camada de complexidade à forma como sua equipe lidava com ele; era um tipo diferente de escrutínio, um nível diferente de cuidado em como ele se apresentava. E sim, Jonathan brincava que Son vivia de filtros do Instagram, mas honestamente, o cara era bem pé no chão quando o conhecia. Mesmo depois que ele e Misha foram fotografados saindo do teatro em seu segundo encontro - de mãos dadas, nada menos - ele não fez barulho. Para alguém tão consciente de sua imagem, ele parecia estranhamente bem com isso. Como se ele soubesse como andar na linha entre a pessoa pública e quem ele realmente era, sem perder nenhum dos dois. Era quase reconfortante, se Misha estava realmente pensando em tentar algo sério com ele.
— Mas foi mesmo bom? Tipo, muito bom? — Claudia perguntou.
Misha levou um tempo para elaborar sua resposta por um momento, tomando seu café gelado e observando um grupo de crianças correndo mais a frente, que logo se tornou estranhamente interessante para ela ao invés de falar sobre o assunto que envolvia seus dois encontros com Son.
— É, acho que sim. Nos divertimos. Saímos para ver Jersey Boys. E... Bem, ele me convidou para vê-lo jogar no domingo. O Tottenham vai encontrar o Arsenal no Emirates.
Jonathan soltou um gemido exagerado, puxando a amiga para mais perto.
— Meu Deus, isso parece horrível. Futebol já é ruim o suficiente na TV. Você realmente vai assistir pessoalmente?
— Ela não vai apenas assistir, Jonny. Ela vai estar apoiando o homem dela. Não é, Misha?
— Meu Deus, essa foi a coisa mais hétero que você poderia dizer — Misha revirou os olhos, mas riu um pouco — De qualquer maneira, eu estou inclinada a aceitar, sim. Quer dizer, é um grande negócio, certo? Ele está jogando o clássico.
— Certo, certo. O Derby do Norte de Londres. Eu sou de Birmingham, mas sei tudo sobre isso. Eu fui educada sobre isso por gente suficientemente maluca por futebol na minha vida para saber que é basicamente uma guerra.
— É tipo o Old Firm? — Jonny perguntou.
— Como você sabe o que é o Old Firm e não tem ideia de como é um Derby do Norte da Cidade?
— Eu passei mais tempo em Glasgow do que estou aqui — ele deu de ombros a pergunta de Claudia.
— É meio que um grande negócio — Misha interrompeu os amigos quando reparou que Claudia ira discutir o que Jonny tinha dito — E os filhos da minha madrasta também vão. Robbie é um grande fã do Spurs, obviamente, e Henry... bem, ele sangra Arsenal até o fim. Então... — ela intercalou o olhar entre os amigos.
— Não, não, não — Jonny balançou a cabeça negativamente, mas ele continuou, brincando — Não vem puxar a gente para o seu colapso familiar só porque a Gigi não pode vir para cá para te fazer companhia.
— Na verdade... — Claudia começou — Eu me animo em ir.
— E é por isso que eu te amo Clauds — Misha sorriu.
— De que lado você está afinal? — Jonathan perguntou — Spurs ou Arsenal?
— Eu estou como a Suíça, completamente neutra diante disso.
— Deus... Não é tão profundo, Mish — Jonathan disse — É só fingir que está torcendo para o time do seu namorado.
— Ele não é meu namorado — ela falou, sentindo um puxão familiar e incômodo dentro de si. Son era ótimo, mas chamá-lo de namorado parecia dar algo mais do que ela estava pronta para assumir — Mas enfim, vocês dois deveriam ir mesmo comigo. Tornar isso menos doloroso para mim.
— Estaremos lá — Jonathan disse, e o silêncio entre os três apenas apareceu.
Eles andaram assim por um minuto, e a falta de barulho fez Misha pensar sobre o domingo. Logo ela parecia estranhamente incomodada com o pensamento, e estava abrindo a boca, tentando se convencer de qualquer coisa.
— Eu acho que vai ser divertido — ela disse, mais para si mesma do que para os amigos — Vai ser divertido, certo?
— Sim, Mish — Jonny acenou — Vai ser divertido.
*
— Que caralho... — Misha murmurou baixinho quando seus olhos se fixaram na figura que estava se acomodando à distância alguns assentos mais à frente, junto de rostos conhecidos, com uma camisa vintage do Arsenal, o nome e o número de Thierry Henry estampados nas costas.
— O que foi? — Jonathan disse, inclinando-se mais perto, tomando um gole de sua cerveja. Ele estava com um sorriso no canto dos lábios, e Misha balançou a cabeça dizendo que não era nada, ajeitando seu casaco azul marinho. O casaco de sua mãe, o que ela tinha há anos, da Carhartt, que de alguma forma tinha se tornado seu favorito para todas as situações. Robbie, que estava a apenas alguns assentos de distância, fez um sinal de positivo, sorrindo para a irmã quando correu o olhar até ela.
— É melhor você torcer pelo lado certo hoje, Mish — ele aumentou a voz.
Misha se mexeu na cadeira, de repente desconfortável. Tentando não pensar que seu caso casual recém terminado estava logo ali. Aquilo nem deveria a incomodar tanto. Ela tinha tentado se convencer disso, mas não via Leah desde os dias em seu apartamento, com ela mal o bastante para se deixar ser cuidada. Quase três semanas no escuro observando isso. Ninguém parecia realmente interessada em dar o primeiro passo e acenar dizendo o que a outra achava de uma saída ou apenas uma conversa em um café.
— Você está bem? — Claudia a empurrou suavemente pelos ombros do outro lado.
— Sim, bem. Só... — ela se interrompeu e acenou para frente — Eu não achei que a veria aqui.
Claudia demorou um segundo para entender de quem Misha falava, mas Leah estava de pé, e não era realmente difícil achar a garota de camisa amarela ali na frente.
— Ah — Claudia murmurou — Claro.
Antes que Claudia pudesse continuar dizendo qualquer outra coisa, Leah virou o rosto e viu Misha, e então a mais velha apenas se perdeu do que a amiga estava falando. Seu olhar caiu em Leah e, por uma fração de segundo, ela se perguntou o que deveria fazer. Mas então o rosto de Leah se abriu em um sorriso, um sorriso genuíno, e ela levantou a mão em um aceno.
O jogo começou não muito depois disso, e Leah já tinha se virado de volta, de frente para o campo, sua atenção absorvida pela partida. Misha a observou por mais um momento, mas também voltou sua atenção para o jogo - ou pelo menos tentou. A coisa era que o futebol não era realmente o esporte que ela mais gostava. E logo o jogo pareceu também muito previsível. O Arsenal era o melhor e o Spurs estava se esforçando, claro, mas nada realmente funcionou. Cada jogada parecia fracassar, em passes desanimados que nunca chegavam a dar em nada. O Arsenal, por outro lado, parecia sólido. Como se soubessem o que estavam fazendo. O que, para o desânimo de Misha, eles sabiam mesmo.
No intervalo, a diferença de três gols refletia o desequilíbrio em campo. O Arsenal fortaleceu sua liderança na partida, e o Spurs estava lutando para acompanhar. Misha decidiu ir buscar bebidas durante o intervalo, qualquer coisa para quebrar a energia de assistir ao Spurs sendo completamente amassado. Ela deu uma tapinha no ombro de Jonathan e disse se alguém queria alguma coisa. Robbie acenou para ela, focado demais nas falhas de seu time para se importar com mais um copo de cerveja, mas Henry comentou para que ela comprasse três copos, enquanto Claudia pediu por água. Misha assentiu, abrindo caminho pelas fileiras de assentos.
Quando ela voltou, fazendo o melhor para não cair com bebidas nas duas mãos, Misha viu Leah exatamente onde ela estava antes, conversando com Robbie e Henry. Eles estavam rindo de alguma coisa, com Leah gesticulando animadamente, claramente no seu melhor momento. Misha se aproximou com cuidado, e estendeu a garrafa com água na direção de Claudia, e então chamou a atenção de Henry, estendendo a base de papelão com os três copos de cerveja depois de tirar dali seu copo com coca-cola e muito gelo. Assim ela estava disposta a se acomodar em seu assento quando Claudia se levantou de repente, dando a Misha um pequeno sorriso, e Leah deslizou para o assento vago ao lado dela. Misha quase pensou que elas tinham combinado aquilo.
— Ei — disse Leah, dando um sorriso para Misha, sua camisa do Arsenal quase brilhando nas luzes de onde elas estavam — Como você está?
— Bem — ela respondeu simples — Você?
— Sim, bem, bem... Tem sido bom até agora — disse Leah, recostando-se em seu assento, parecendo muito mais relaxada do que Misha se sentia — Quero dizer, o Spurs está tendo um dia meio difícil, mas o Arsenal... É para isso que eu vim.
Misha acenou sem jeito, sem saber muito bem como responder. A conversa começou um pouco tensa, de um jeito que era quase como se elas estivessem pisando na ponta dos pés em torno de algo que nenhuma das duas queria abordar. Leah estava sendo educada, amigável até, mas Misha meio que não queria dizer nada.
Então o segundo tempo começou, e a intensidade do jogo aumentou novamente. O Arsenal pressionou para frente, dominando o posse de bola, e Leah, claramente ainda envolvida na animação por conta do que estava acontecendo em campo, começou a comentar cada jogada. No início, Misha não sabia como responder - ela não era exatamente versada em táticas de futebol. Apesar de sua suposta lealdade ao Chelsea, seu conhecimento do jogo se limitava a lembranças de seu pai gritando com a TV durante as partidas da Premier League. Leah, por outro lado, estava completamente absorta. Misha assentiu algumas vezes, tentando parecer comprometida, embora a maior parte disso passasse despercebida. Até que ela começou a se animar.
No meio do segundo tempo, as duas estavam de pé. Misha ficou encostada na grade que dividia aquela seção, de frente para o campo, enquanto Leah estava logo atrás dela, com os braços apoiados na grade também, efetivamente prendendo Misha entre ela e o apoio da frente. Misha podia sentir a presença da garota, próxima, quente, com sua respiração quase roçando sua nuca.
— Então, o que eles estão fazendo aqui... — Leah começou, sua voz baixa e focada enquanto apontava outra jogada se desenrolando no campo — Eles estão tentando seguir para o lado esquerdo, mas você vê como o Spurs continua ficando muito esticado? — Misha assentiu, ainda que no meio disso ela tenha se perdido — Veja isso — Leah disse suavemente, enquanto o Arsenal se aproximou para outro ataque.
Mas Misha não estava mais assistindo ao jogo. Ela virou a cabeça para o lado, seus olhos indo para o rosto de Leah em vez disso. O foco de Leah ainda estava no campo, seus lábios se separaram em concentração, mas então - talvez sentindo o olhar de Misha - ela desviou o olhar também, e seus olhos se encontraram. Por um segundo, todo o resto sumiu de vez. Leah não disse nada. Nem Misha. Elas apenas se entreolharam, até que Leah abaixou o olhar, quase sem querer, e encarou os lábios da mais velha.
— Você não está assistindo ao jogo — Leah provocou, sua voz ainda baixa, tentando fingir que não tinha corrido o olhar para onde talvez não devesse.
Ela se mexeu um pouco, seu braço encostando ainda mais na garota a sua frente, e de repente Misha viu o quão perto elas estavam - Leah praticamente se inclinando sobre ela, ambas as mãos contra o corrimão atrás dela.
— Eu estava — Misha discutiu, embora nem ela parecesse convencida.
— Você estava mesmo?
— Você realmente se importa com essas coisas, não é? — ela tentou desviar o assunto, e Leah inclinou a cabeça, seus olhos se estreitando um pouco, mas ela foi gentil o bastante para seguir com aquilo.
— Sim. O Arsenal... bem, está no sangue, sabia?
Misha acenou, mas ela realmente não sabia. O futebol não era algo com que ela se importava profundamente - seu apego ao Chelsea era quase acidental, algo que seu pai havia passado sem pensar muito e ela meio que fingia ligar. Fazia parte da rotina deles quando costumavam assistir aos jogos juntos, voltando aos gritos na frente da TV, mas nunca era sobre o esporte em si. Para Leah, no entanto, isso não era apenas algo que ela fazia nos fins de semana. Era a paixão, e então o trabalho, mas muito mais que isso.
— Por que o Arsenal? — Misha perguntou, mais por curiosidade do que qualquer outra coisa. Ela não tinha certeza se já tinha feito aquele questionamento antes.
— Thierry Henry — ela disse simplesmente — Meu pai era obcecado pelo Spurs. Minha mãe obcecada pelo Arsenal. Meu pai tentou de tudo para me levar para o lado dele. Na temporada 2002-03, eu era muito jovem para realmente entender o que estava acontecendo, mas lembro dele me arrastando para o estádio e me comprando uma camisa do Spurs, e então uma semana depois minha mãe fez o mesmo, mas me levando para Highbury, e ela estava falando sobre o Arsenal como se fosse uma questão de vida ou morte — ela riu, quase envergonhada pela lembrança — Eu vi o Thierry em campo e fiquei viciada. E acho que isso se envolveu em mim completamente.
Misha concordou, embora o nome fosse apenas vagamente familiar para ela. Henry era uma lenda, disso ela sabia, mas além disso, tudo sobre ele eram apenas números e anos que não tinham muito significado para ela. Ainda assim, da maneira como Leah falou sobre isso, com aquela intensidade silenciosa, Misha quis entender melhor.
O silêncio entre elas caiu ali. Nenhuma das duas quis quebrar também. Toda vez que o Arsenal avançava, Leah ficava tensa, seu corpo se inclinava para o de Misha como se estivesse se preparando para o impacto da bola com o fundo da rede. Toda vez que um jogador do Spurs conseguia tirar uma bola boa, Leah soltava um suspiro mais exasperado, revirando os olhos ou murmurando algo baixinho. Então, por volta dos trinta do segundo tempo, Saka quase fez seu segundo gol e o estádio ficou a ponto de cair, com cachecóis vermelhos e brancos balançando no ar.
Misha não conseguiu deixar de rir de como Leah estava genuinamente animada. Mas depois ela estava mais focada em como uma das mãos de Leah estavam coladas em seu braço por todo aquele tempo enquanto o outro estava em sua cintura, numa intimidade antiga, mas repentina, entre elas que parecia ter voltado do nada. Enquanto a torcida se acalmava, Leah não se afastou. Ela ficou perto, encostada em Misha.
— Você é realmente fã do Chelsea ou isso é algo que você diz para me irritar? — Leah disse depois de alguns momentos de silêncio, puxando aquilo outra vez.
— Sinceramente? É mais para te irritar do que qualquer outra coisa — Misha brincou — Mas acho que eu deveria ser fã deles mesmo, então eu sou. Meu pai é.
— Eu imaginei — Leah revirou os olhos, mas mais como uma brincadeira do que outra coisa — Você realmente não me parece como alguém que se importa tanto assim.
— Eu gosto mais da atmosfera do que do jogo em si. O barulho, a torcida. É meio divertido, mas é só isso.
— Você está perdendo um pouco a melhor coisa disso aqui, sabia? — Leah disse, seus olhos voltando para o campo — Cada partida é uma história diferente.
— Talvez. Quero dizer, eu entendo por que você ama isso. Eu só não sinto o mesmo.
Leah olhou para ela então, realmente olhou para ela, e por um segundo, não era mais sobre Arsenal ou Spurs. Não era nem sobre futebol. O sorriso de Leah se suavizou em algo mais pensativo, seus olhos procurando o rosto de Misha como se ela estivesse a vendo sob uma luz diferente.
— Você não deveria sentir o mesmo sobre isso apenas porque outra pessoa sente — Leah disse calmamente — Você deveria se sentir do seu jeito.
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