4 - Realidade cruel
Presente para vocês: mais um capítulo! Fiquem atentos que o capítulo 3 foi postado mais cedo hoje ♥
Um raio gentil de sol se esgueirou para dentro do quarto, roçando no rosto de Cauã. Ele acordou bem devagar, envolvido em uma sensação agradável, cálida, feito um abraço reconfortante.
A primeira coisa que seus sentidos captaram foi um perfume suave e delicado, muito feminino. Um murmúrio baixo e satisfeito saiu dos lábios dele. Gostava daquela essência. Tinha algo familiar nela. Algo que o fazia desejar não despertar daquele sonho.
Cauã se mexeu um pouquinho, tentando aliviar a pressão rígida que se formava em sua calça por causa das sensações trazidas pelo sonho. Puxou a moça que habitava aquele devaneio para mais perto, inspirando seu perfume, deliciando-se com a maciez de sua pele, e então...
Despertou.
E viu que não estava sonhando.
E teve certeza de que o coração sairia pela boca.
Minha nossa!
Quem estava em seus braços não era nenhuma moça imaginária, e sim a caçula dos Bodini — Elisa.
O coração dele bateu mais rápido.
Seu braço estava preso embaixo de Elisa, e ela havia se virado para ela, aninhada em seu peito. Sentia a carícia da respiração dela em seu rosto. Seus cabelos ruivos se espalhavam pelo travesseiro e exalavam aquele perfume delicado. O vestido de Elisa tinha subido durante a noite, revelando suas pernas bem desenhadas e suas coxas atraentes.
Como aquilo tinha acontecido? Por que eles estavam dormindo na mesma cama? Tinha bebido além da conta na balada? Será que...?
Não, não, não, não, não.
Se havia algo que Cauã respeitava, era o código de honra dos homens — um desses tópicos era jamais se envolver com as irmãs mais novas de seus melhores amigos. Principalmente dos amigos que o haviam acolhido e o consideravam como um irmão.
Mas ali estava Elisa.
Na cama com ele.
Prestes a ter uma parada cardíaca, as memórias de Cauã voltaram.
E a realidade foi muito mais cruel do que os sonhos efêmeros.
Foi só se lembrar de tudo o que tinha acontecido — da polícia, do irmão, da cunhada, da situação dos sobrinhos — que a rigidez incômoda nas calças foi, aos poucos, diminuindo.
Cauã engoliu em seco, puxando o braço com cuidado, temendo acordá-la. Elisa havia ficado ali com ele depois de ajudá-lo com os sobrinhos; ao certo, ambos tinham pegado no sono enquanto conversavam.
Mesmo assim, acordar com ela era um tanto constrangedor.
Embora fosse uma visão muito agradável e...
Ele piscou, repreendendo o pensamento. Se seguisse por aquele caminho, voltaria a ficar rijo outra vez. E tinha uma tempestade gigantesca aguardando por ele assim que se levantasse da cama.
Assim que conseguiu se soltar completamente de Elisa, ele levantou e saiu do antigo quarto de André, seguindo para o quarto dela. Deu uma espiada na porta entreaberta. Luca e Helena ainda dormiam de um jeito tão profundo, como se não fizessem um sono daquele tipo há muito tempo.
Cauã suspirou.
Ver os sobrinhos ali era como ser tragado pelo tempo.
Porque, durante toda sua adolescência, só havia dormido bem quando passava a noite na casa da família Bodini, com André e Thiago.
Ele encostou a porta. Helena e Luca mereciam dormir o quanto precisassem. Quando acordassem, precisaria contar a verdade para eles.
Ao descer as escadas, com a sensação de que ainda estava perdido em um pesadelo, Cauã seguiu o rastro deixado pelo cheiro do café e pela mistura de várias vozes falando ao mesmo tempo.
— Você também está aqui? — Liliana bradou assim que o viu. Renan estava perto dela, com o sorriso de quem tinha acabado de fazer alguma provocação. — Vocês dois sabem que o Thiago e o André já se mudaram há vários meses, não sabem?
Se ele ainda não estivesse tão absorto, teria devolvido uma piadinha.
Mas era como se barras de chumbo pesassem em seus ombros.
— Pelo jeito, sua noite foi insana, cara — Renan riu. — Nem te vi indo embora da balada. A pergunta que não quer calar é: como você veio parar aqui?
Cauã puxou uma cadeira e se sentou ao lado de nonna Carmine, o estômago ainda enjoado demais. Além de Liliana, Renan e da nonna, Dora e Carlos também estavam lá na cozinha; Dora tirava pãezinhos do forno enquanto Carlos consertava a pia.
— Elisa já acordou ou você a deixou dormindo sozinha na cama? — nonna Carmine perguntou em um tom que fez os olhares de Liliana e Renan se voltarem para ele.
— Você dormiu com a minha irmã?! — Liliana bradou.
— Não é nada disso que você está pensando. — Ele esfregou as têmporas. Raramente tinha dor de cabeça, mas sentia uma enxaqueca se aproximando. — Céus, acho que preciso de um café.
Tinha tantas coisas para resolver. E nem sabia por onde começar.
— Quem são aquelas crianças dormindo no quarto da Elisa? — Dora perguntou com gentileza, servindo uma xícara de café para ele.
— Meus sobrinhos.
Cauã imaginou que aquela resposta já dava à família Bodini uma boa ideia do que havia acontecido. Não era segredo — na verdade, não havia segredos entre os Bodini — o que se passava com seu irmão.
— Bem, tenho que ir agora — Liliana falou e se levantou.
— Vou com você. — Cauã observou Renan se levantar também e segui-la para fora de casa, a porta se abrindo e se fechando.
Inspirou fundo, tentando ordenar os pensamentos, incapaz de contar quantos minutos haviam se passado.
— Espero que ainda tenha café e pão nessa casa. Acabei de cruzar com a Liliana e o Renan lá fora.
A porta de entrada principal se abriu outra vez; Cauã olhou por cima do ombro ao reconhecer a voz de André.
— Tem sim! — Elisa gritou do segundo andar; um sinal de que já estava em pé. Cauã piscou. A audição daquela garota era um mistério para ele. — Thiago ainda não passou por aqui hoje!
— Maravilha!
— Meu bambino! — Dora abriu os braços, a alegria resplandecendo ao ver André entrando com Eloá. — E trouxe minha querida bambina!
— Vovó!
— Vai lá com a sua nonna, minha princesa.
André colocou Eloá no chão, que correu para o colo de Dora.
— Você está maior a cada dia que passa, bambina. — Ela encheu o rosto da neta de beijinhos. — E Sueli?
— Cada dia mais grávida. Está em casa compondo. — André se virou e apanhou um dos pãezinhos do cesto, fitando Cauã com curiosidade. — O que você está fazendo aqui tão cedo, cara?
Nonna Carmine bebericou um gole do café.
— Cauã dormiu aqui com a Elisa. Abraçadinhos.
— O quê?!
— Eu mesma vi com esses olhos que a terra um dia há de devorar.
Se um olhar pudesse soltar raio laser, Cauã tinha certeza de que dois feixes vermelhos teriam saído das íris de André.
— Calma, calma! Não é bem assim!
E antes que tivesse o couro arrancado por algo que não havia feito, Cauã narrou todos os acontecimentos da última noite para André e os demais Bodini presentes.
Ao fim do relato, lágrimas já se acumulavam em seus olhos de novo.
— Cauã... — André se inclinou na direção da cadeira onde ele estava, abraçando-o. — Meus pêsames, irmão. Sabe que pode contar comigo para qualquer coisa.
— Com todos nós — Dora reforçou, indo para o outro lado dele. O toque dela em seu ombro foi afetuoso e maternal.
Cauã tentou encontrar forças para agradecer; todo o peso das últimas horas desabou junto das lágrimas que ele não conseguiu mais segurar.
Seu irmão estava morto.
Morto.
Sua cunhada também.
E, por causa do vício maldito, tinham deixado duas crianças órfãs.
— Cauã? — Aquela era a voz de Elisa.
Ele ergueu o rosto e limpou as lágrimas. Viu que ela trazia seus dois sobrinhos. Helena, já penteada e com roupas limpas — imaginou que aquilo também era obra de Elisa — olhava em sua direção.
— Onde está a minha mãe? E meu pai?
Cauã inspirou fundo e esticou a mão para ela.
— Venha aqui com o titio, Helena. Precisamos conversar.
Receosa por estar no meio de tantos estranhos, Helena não se moveu. Cauã optou por se levantar e ir até ela, agachando-se para ficar na altura de seus olhos.
— Algo aconteceu com a mamãe e o papai. Por isso a polícia estava na sua casa ontem. O papai e a mamãe... Algo aconteceu e... — Cauã apertou os olhos; céus, aquilo era horrível. — E eles não estão mais aqui para cuidar de você e do Luca. Mas o titio está.
Os olhos de Helena se encheram de lágrimas e uma compreensão dolorosa demais para sua idade.
— Eles... Morreram?
Cauã assentiu.
Ao seu lado, Dora soluçou, apertando Eloá com mais força.
— Estão... No céu?
— Com certeza — Cauã respondeu, ofegante, envolvendo a sobrinha em seus braços enquanto fitava Elisa, que carregava Luca no colo. — Mas o titio está aqui. E eu não deixarei que nada aconteça com vocês.
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