O BORRIFO DE SANGUE MISTUROU-SE À NÉVOA BAIXA.

Montado firmemente em seu garanhão castanho, cujo galope já atingiu uma velocidade razoável, girou a espada bastarda de cima, pondo toda a força na melhor mão. Foi prazeroso ouvir o metal cortando a carne, um "vuash" sonoro destacando-se dos gritos e tilintares no campo devastado.

A ponta recém-afiada penetrou no pescoço de um dos rebeldes e rasgou-o lateralmente, fazendo uma mancha vermelha escorrer pelo gume prateado. A nódoa percorreu a brigantina tachonada que vestia, espalhando sua ruína como um aviso.

— Morram, traidores! — bradou Wybert Eagerhall, um dos cavaleiros ungidos mais célebres a compor as forças do Duque da Província de Gatesby, atiçando sua montaria a cada homem atropelado.

A fronte do equino lançava os combatentes desavisados para longe. Escudos se partiam, espalhando lascas de madeira. Os cascos pisoteavam corpos, às vezes esmagavam crânios. Flechas estilhaçavam ao se chocarem com a armadura maciça do cavaleiro errante, sendo assim, pequenas lascas invadiam a viseira estreita. Sentia pontadas na altura do gorjal, dos espaldares e das placas de peito, porém não se importou com os arqueiros.

Estas setas possuem sequer pontas de ferro, não me fazem cócegas, notou Wybert, despreocupado, rindo por dentro. Por mais que uma chuva de flechas, que acabara de cair sobre ele e seu esquadrão, tivesse exterminado praticamente toda a infantaria e tombado cavalos para o lamaçal, o cavaleiro não podia se deixar levar pelo medo.

Não agora.

Apreciava o cheiro e o som da morte.

Uma turba de rebeldes espumosos, trajados em camisões de cota-de-malha oleadas e exibindo a palheta dos insurgentes em mantos puídos, apearam de suas montarias e saltaram em sua frente, levantando os instrumentos sanguinários e urrando feito animais. Nuvens pálidas escaparam das frestas de seus capacetes lustrosos quando respiraram.

Eram liderados por um sujeito de expressão endurecida e pele negra, curiosamente bonito demais para um homem de violência, enfiado em um tabardo encardido, que agasalhava uma pesada camisa de malha anelada e o camal que lhe cobria a cabeça e parte dos ombros esguios, feito uma cascata metálica. Deve ser o maldito Capitão da Companhia. De uma delas, ao menos... Tivemos sorte de sermos atacados por duas no mesmo dia. E que dia.

O cavaleiro segurou o fôlego e agiu conforme o instinto.

Deu rédea curta, parando subitamente, fato que fez o cavalo soltar um relincho desesperado. Os pés do animal afundaram na lama ensanguentada.

Os homens-de-armas aproximaram-se perigosamente.

Rápido.

Wybert virou o animal na direção contrária e esporeou a virilha.

O castanho deu um coice para trás e disparou mais uma vez através da multidão de combatentes imundos. O cavaleiro soube que a patada acertara um deles, pois notou um ganido de dor antes de deixá-los. Rodou novamente a espada, sem ver ou mirar. Não tenho tempo para precisão, pensou, lembrando-se de outras ocasiões como aquela. Preciso matar.

Pelo ruído grotesco que encheu seus ouvidos, a lâmina decepou algo grande.

Na linha de sua visão, uma cabeça voou em parábola, sumindo em meio a um aglomerado de sujeitos, vestindo trajes com duas possíveis cores e símbolos heráldicos: ou ostentavam a víbora negra em fundo gris e carmim dos DuGuerr, a estirpe nobre que governava a Província; ou uma torre branca sobre um xadrez preto e amarelo, pertencentes aos Newcastle revoltosos. Contudo, a lama sangrenta impediu que Wybert discernisse seus aliados dos inimigos.

A batalha se transformou em uma completa confusão de sangue, odores asquerosos, pilhas de cadáveres e um chiado estridente de metal atingindo o metal. O Descampado da Bruma não mostra qualquer vestígio do que era antes desse Inferno eclodir aqui. Está mais para a Ruína da Bruma.

De relance, usando o canto do olho, viu aquele Capitão lançar algo cinzento em sua direção, do tamanho de sua cabeça.

Filho de uma rameira.

Wybert sentiu o coração falhar uma batida.

Vou empiná-lo, é o único jeito.

Antes mesmo de puxar as rédeas para trás, um solavanco derrubou o castanho de lado e arrancou seu elmo. O cavaleiro foi arremessado por cima do cavalo, se esborrachando no lodo sujo. Um borrão cinza e vermelho ofuscou sua visão conforme rolava sem rumo entre os corpos frios.

Bateu com a cabeça e perdeu a consciência.