XVII - Segredos das Artes das Trevas (Parte 2)
Afastei o cobertor e pendurei as pernas para fora da cama. O colchão ruiu baixinho e, por cima dos ombros, vi Loreynne resmungar e revirar-se. Eu solto o ar preso nos pulmões e piso o chão frígido com as pontas dos pés. Coloquei a tiara, e peguei a varinha e um espelho na gaveta do criado-mudo e os sapatos e a túnica que estavam na cômoda. Vesti-a por cima da camisola e segui até a porta. A maçaneta corrupiou lentamente, mas o trinco se recolheu num solavanco. As meninas, no entanto, nada pareceram incomodadas. Deviam estar demasiado cansadas depois de uma noite toda sem dormi. Escapuli para as escadas e subi-as até a sala de convivência. Os castiçais estavam apagados e as cortinas fechadas. A luz que se infiltravam através destas, porém, foram o suficiente para guiar-me até a saída.
Calceias sapatilhas e corri as escadas em espiral que me levariam para longe datorre. Antesde cada curva, apertava as costas na parede e checava o corredor com ominúsculo espelho que cabia na palma das mãos. Não havia a mínima fonte de luzno corredor dos retratos, então, mesmo que um pouco incerta, balancei a varinha.
— Lumos!
Ossolados tilintavam no piso e eu tinha medo que isso chamasse pela atenção dealgum professor fazendo ronda por perto. Apressei-me até as escadariasque mudam, e atirei-me na passagem para as masmorras onde Tom me levara uma vez.Não sabia a exata localização ou mesmo como entrar, mas eu daria um jeito —qualquer um — de fazê-lo vir até mim.
Umbramido enfurecido veio a me deter, no saguão. O rosto se virou de supetão e avarinha trocou de mão para iluminar a passagem seguinte. Eu mordo o lábioinferior. Os olhos revezam os dois caminhos e, dando para trás, decido seguirpara a voz irritadiça.
Umaporção de degraus abaixo e deparo-me com o que presumo ser a sala de Poções. Aporta está razoavelmente aberta, mas nenhum archote estava aceso. Empurro-a comuma das mãos e a outra mete a varinha para dentro.
— Olá? — Mas não há ninguém aqui, tampouco, por perto.
Afasto-mee encontro-me perdida no corredor. Deste lado, mais à frente, há o Clube deDuelos, do outro, entretanto, o absoluto nada.
Cerroo punho, confusa de para onde seguir, quando um berro preenche o corredor. Oestômago premiu e eu estico a varinha nesta direção. Um estalido compulsivo meassusta, tendendo a se aproximar, e, trêmula, aperto-me na parede. Os olhos — noespelho — e a luz da varinha procuravam pela fonte, quando algo puxa o meu pé, derrubando-mede costas ao chão e partindo o espelho ao meio. Encolho o pescoço e aponto avarinha para frente. A luz reflete em uma porção de pedrinhas de sílex,que venho a identificar como olhos muito negros, e a criatura — que não consigodistinguir o que é — agarra-me pelo calcanhar com seu par de pinças, retirando-mede seu caminho.
A varinha driblou os meus dedos e se apagou, mas pude ouvir o tilintar das patas dacriatura escapulindo para longe. Tateio o chão a procura da varinha e, assimque a encontro, mais a frente, ouço um clamor absurdo que, prontamente,tirou-me do chão e colocou-me a correr. Eu reconheço essa voz. Era a voz do meu sonho
Na caligem,quase camuflado, posso ver uma silhueta em pé. A varinha na mão, apontada parao garoto no chão. Ele diz algo e parece soluçar em seguida. O braço se arqueia,ameaçador, e o garoto que está no chão se agita de medo.
— NÃO FOI! — Bradou.
— Expelliarmus! — Intervi, atingindo o garoto em pé, e este lançou-se para trás.
Avarinha ricocheteou pelo ar até as minhas mãos. Eu a aponto para o garotodebruçado ao chão, assim que o percebo alcançar sua varinha com o braço trêmuloque o sustenta — o outro, por sua vez, está ao redor do tronco —. O garotoatingido, aponto-o com a minha e basta agitá-la e acendê-la para me dar contade quem é.
— Rúbeo!
Opeito está agitado, mas não creio que o golpe o tenha ferido. Os olhos quasecobertos pelas grandes sobrancelhas estão chorando, empapando os cabelos e abarba desgrenhada. De quatro, porém, ilumino os olhos jabuticaba de TomRiddle. A sobrancelha sangrando goteja o chão. Os lábios estão roxeados e umpouco inchados, e os dentes estão trincados, mas não sei dizer se era de dor oude raiva. Ele vira o rosto.
*****
Das muitas feras e monstros medonhos que vagam pela nossa terra, não há nenhum mais curioso ou mortal do que o basilisco, também conhecido como rei das serpentes. Esta cobra, que pode alcançar um tamanho gigantesco e viver centenas de anos, nasce de um ovo de galinha, chocado por uma rã. Seus métodos de matar são os mais espantosos, pois além das presas letais e venenosas, o basilisco tem um olhar mortífero, e todos que são fixados pelos seus olhos sofrem morte instantânea. As aranhas fogem do basilisco, pois é seu inimigo mortal, e o basilisco foge apenas do canto do galo, que lhe é fatal.
Estou sentada por cima da colcha, com as pernas encolhidas e os braços acorrentados ao redor delas. Os olhos águam o rosto sem cessar. Arfei quando o corpo protestou a falta de ar e suspirei, voltando a chorar. Meus ombros estremeceram de repente e eu funguei com dificuldade. Ao meu lado, o livro velho e amarelado de páginas emaranhadas e soltas — O ovo e a Criatura. A página aberta exibia como título "O Basilisco", mas eu não consigo mais ler. Refuto-o de todas as formas. Uma dor absurda ameaçando partir-me no peito.
Nenhuma noite jamais se arrastara tanto quanto essa, nem tampouco a Torre da Corvinal esteve tão cheia e, no entanto, tão silente. O céu estava estrelado, o lago negro estava azul como nunca e a lua buscara refúgio entre algumas poucas nuvens. Tudo isso, e nada mais era do que uma noite patife e atroz.
Eu queria gritar. A garganta formigava, o coração batia forte e uma excitação circulando veloz nos pulmões fazendo-os se encher de fôlego. Agarrei o lábio entre os dentes, entretanto e o engoli. O grito esgoelou-se dentro de mim e as lágrimas tornaram-se mais rápidas. Ouço passos às escadarias. Passos ligeiros que, quando próximos, tornam-se leves e cautelosos. Alguém bate à porta e não espera resposta para abri-la.
— Anne? — Chamou-me com sua voz esganiçada. Eu, porém, permaneci imóvel, olhando para a parte negrume do quarto, onde a penumbra da lua não conseguia tocar. — V-você não prefere ficar lá em cima com a gente?
Eu balanço a cabeça.
— Não é bom ficar sozinha. — Fungou. — Fiquemos todos juntos?
— Vá embora, Loreynne!
Ela arfou e respirou bem fundo. A cabeça assentiu, eu vi pela sombra do castiçal do corredor, e a porta se fechou ruidosamente devolvendo o quarto ao escuro.
Estiquei as pernas, bagunçando a cama e passei as mãos no rosto. Um segundo fora o suficiente para as lágrimas voltarem a embebê-lo. Com tamanha raiva, bati os dedos no livro e este deslizou para o chão e se fechou. Uma nuvem de poeira amarela esvoaçou e eu suspiro. Sentia-me traída. Uma fisga horrenda ardendo no meio do peito, enquanto eu me torturara questionando o porquê.
Seria assim, então? Mil anos e ainda estávamos fadados a viver o que nossos ancestrais nos impusera? O herdeiro iria livrar Hogwarts dos nascidos trouxas e vingar a expulsão de Slytherin. Eu, então, o que deveria fazer? Fugir para bem longe e aguardar para ser caçada? Morta? Eu arfo.
Aperto os punhos e sinto um gosto agro na boca. Se eu tivesse sido um pouco mais rápida, eu poderia impedi-lo? Se eu não tivesse deixado o Grande Salão, eu poderia impedi-lo? Se eu tivesse contado todas as minhas suspeitas ao professor Dippet, eu poderia impedi-lo? Se eu tivesse a chance de voltar atrás e fazer de novo, entretanto, eu conseguiria impedi-lo?
— Alguma voz do além, por favor, diga-me que sim! — Eu imploro ao silêncio, com medo de ele significar que não.
Deixei a cama apenas quando o sol se destacou no céu. As pernas formigavam recusando-se a me sustentar e tenho de apoiar-me às paredes e nos móveis para alcançar o banheiro. Lavei o rosto na água gelada e um longo suspiro me escapou. Os dedos agarram a pia e meu corpo tremelica de nervoso.
O espelho me encarou e senti-me envergonhada. Os olhos minúsculos marcados de escuro e o branco sumira dando lugar ao vermelho. Nem mesmo a íris parecia azul. Tornara-se negra como a cor de seus cabelos. Eu mordo o lábio e viro o rosto. Tom Riddle. Eu não quero vê-lo. Não quero pensar em seus cabelos negros, ou mesmo estar na mira de seus olhos devassos. Não consigo detestá-lo completamente e isto está me ruindo. Não consigo absolvê-lo, entretanto, e isto assola igualmente. Ele me machucou, ele mentiu — e tudo isso é perdoável. O ocorrido de ontem, porém, não era. Como poderia, afinal?
Liguei a torneira e tornei a lavar o rosto. As mãos trêmulas quase não conseguem reter a água. Estou desesperada de ódio. Não faço ideia de como as coisas serão de agora em diante, e só o que desejo é que tudo não passe de um terrível pesadelo.
Alguém bate à porta do quarto e eu suspiro antes de abrir. Era Guilia, desta vez. Olhos miúdos e ombros caídos. Ela pigarreia.
— Estamos indo para o café, Anne. — Informou. — Peter e Melissa não querem que fique aqui sozinha. Venha conosco?
Guilia esticou-me a mão e eu a aceito, seguindo-a pelas escadarias. As pernas bambas recusando-se a subir. Faço-o mesmo assim e encontro os demais ali, na área de convivência. Murchos como flores no inverno. Virando-me para o globo, porém, quase consigo imaginar Murta, sorridente, enquanto agarra-me para descer. Essa ilusão faz meu peito premir. Eu me viro imediatamente.
Cruzei os braços e tomei a frente. O sol espalha-se pelos corredores, alumiando com força as molduras de Hogwarts. Estamos muito silenciosos. Os solados são os únicos que não podem ser calados. Do outro lado do saguão, quando o alcançamos, próximos ao Grande Salão, Riddle e o restante dos Sonserinos. Meu peito se contorce como se fosse atingido por uma lâmina demasiado afiada e desvio meus olhos. O foco foge para qualquer parte onde ele não esteja. A contraponto, uma brisa abraçou-me; arrepiou-me com seu sopro frígido, seguido de uma sensação estranha que se instalou em meu corpo. Uma sensação de acorrentamento e eu o culpo instantaneamente. Refutou-me, porém, e adentrou o salão. Minhas sobrancelhas se franzem enquanto sigo-o com os olhos e eu não tenho controle sobre isto.
Meus alunos espalham-se pela única mesa ainda vazia. As costas curvadas e os olhos grudados na mesa. Loreynne agarra-me pelo pulso e me leva com ela. Os dedos magrelos e pálidos quase mascarando o roxo que ainda não desapareceu. Ela e Guilia se sentam e eu permaneço em pé. Na verdade, estou encarando Tom Riddle que, discretamente, pareceu-me sorrir. Eu cerro os dentes. Os olhos ameaçando voltar a chorar.
Guilia foi quem me lembrou de ocupar meu lugar. Assim que meus pés passaram para o interior do banco, os professores adentram o Salão e professor Dippet toma a frente. Seu discurso é talhante. O timbre é reconfortante, há compaixão em seu jeito, mas as palavras machucam, mesmo sem a intenção. Guilia abraçou-me e suas unhas afundaram em meu agasalho. As ombreiras estão umedecendo, em papando-se com suas lágrimas, eu sinto, e aperto as mãos tentando me conter.
Viro-me para o outro lado do salão e o encaro amargamente. Tranquilo como um Hipogrifo a desfrutar o céu. Como conseguia? Como pudera não demonstrar qualquer compaixão ou remorso? Como seus olhos permaneciam tão sérios e singelos? Porque não está se revirando de angustia? Male mar, desesperado de culpa? Eu engulo seco e arfo. O infeliz toque das lágrimas voltara a deslizar por meu rosto.
— ...conto com a colaboração de todos e, para o bem-pessoal, espero não encontrar nenhum aluno pelos corredores. Mais do que restritos, estão absolutamente proibidos. É só! — Acrescentou Dippet e foi-se para seu lugar.
— Se já tivesse tomado uma providência antes, isso não teria acontecido! — Diz Guk e eu o repreendo com os olhos.
Loreynne cutuca o café com a ponta do talher e Guilia mal tenta comer, mantendo-se deitada em meu ombro. De cabeça baixa, cravejo o garfo nas salsichas e as trago até mim. O gosto salgado das lágrimas misturando-se com o tempero. É quase torturante.
Madame Vitally fora quem se apresentara para nos acompanhar de volta à Comunal. Os dedos agarrados ao avental e os olhos tristonhos tentando passar algum tipo de confiança que ela mesma não parece ter. Sorriu-nos tristemente e juntou-se a fila da Corvinal. Nem a primeira, nem a última, apenas alguém que se infiltrara ali.
"Como a morte, não tenho calor,
Vivo, mas sem respirar;
Sem sede, sempre a beber,
Encouraçado, sem tilintar."
A aldrava mandara e minha voz enroscou a garganta. "Não insista, pois nada vou dizer", gritou dentro de minha mente. Madame Vitally deslocou-se até aqui e uma de suas mãos apertara-me confortavelmente o ombro.
— És um sereiano! — Afirmou ela e a parede deslocou-se.
Os alunos passaram por nós, adentrando ao salão circular. As pernas automáticas, pois nenhum, exatamente, parecera ter direção. Seguiam até um estofado qualquer e derramavam-se por lá. Quando os lugares se esgotaram, amontoaram-se sobre o tapete e não levantaram mais.
— Senhorita Antares, se tiver qualquer trabalho para entregar ou livros da biblioteca, por favor, tenho de os levar ainda hoje. — Informou-me, Madame Vitally.
— Cuidarei de tudo até o almoço, no mais tardar. — Respondo-a sem muito ânimo. A mão repousa em meu ombro e aperta, acolhedora.
— Eu lamento muito!
Cerro os punhos em tamanho desespero. Eu tinha esperança de conseguir ter essa conversa com professor Lancaster. Ele não aparecera, contudo. Fitei-a demoradamente nos olhos, antes de suspirar. Eu subo uma das mãos para afastar a sua. As sobrancelhas grossas e achocolatadas se franzem levemente.
— Madame Vitally, poderíamos conversar em particular?
Desconfiada, Madame Vitally assentiu depressa. Arredei-me dali e encaminhei-me até as escadarias, com ela em meus calcanhares. Abri a porta de meu dormitório e a deixei entrar, antes de fazer o mesmo. Madame Vitally se dirigiu até a cômoda e cruzou os braços. Eu aperto as costas contra a porta e engulo seco. Ela semicerrou os olhos.
— Sabe, essa noite eu mal preguei os olhos. Nem um segundo sequer... — iniciei. — Estive pensando muito no meu diário de sonhos que professora Trelawney confiscou e, —Madame Vitally franze o cenho e encara o chão. — Eu tenho certeza de que tudo isso está lá.
— Como assim?
— Os petrificados, a tragédia e... até mesmo o culpado! — Afirmo. Os olhos ardendo com as lágrimas que insistem em voltar. — Tudo!
— Senhorita Antares, explique-se!
— Naquela noite, eu sonhei com Hogwarts. Estávamos reunidos no Grande Salão, como há pouco, e algo terrível havia acontecido. Lembro-me de ouvir alguém gritando. Um garoto. Depois de ler isso, professora Trelawney teve uma visão. Eu sei que teve.
Madame Vitally entrelaçou os dedos e deu alguns passos perdidos pelo cômodo. Parou de frente com a janela e, após um breve minuto, virou-se sobre os ombros.
— Que ela previu?
— O perigo, peregrina através das paredes. Os olhos do mal atraem a morte. Está faminto e morrendo de sede. Será derramado sangue-de-cobre.
"Eu conversei sobre isso com o professor Scales. Estávamos convencidos de que há alguma coisa à solta, em Hogwarts, atacando nascidos trouxas".
A testa se envergou.
— Por que, especificamente, nascidos-trouxas?
— Todos os que estão na ala hospitalar, e — balanço a cabeça, — também... —inesperadamente, eis que os meus lábios crisparam e eu senti a minha língua enrolando. Uma agonia sem igual me tomando, e eu aperto o palmo contra a boca, desnorteada.
— Elizabeth Warren... claro! — Madame Vitally respondeu rigorosa. — Eu compreendo.
A língua desenrolara bem lentamente e eu arfei. O coração estava agitado, pois, por um segundo, tive a sensação de que a traqueia não mais desobstruiria para que pudesse respirar. Eu tento retomar a postura.
— E... o que seria essa coisa? — Refuto-a.
— Eu, hum... — mordo o lábio inferior. — Não tenho certeza, senhora. — Madame Vitally arqueou uma das sobrancelhas, desconfiada.
Ao lado de minha cama, caído ao chão, lá estava o livro velho e amarelado. Peguei-o e comecei a folear.
— Ontem, antes de ir ver a professora Trelawney, eu achei uma criatura chamada Górgona no livro Monstruoso dos Monstros. Na hora, pensei "olhos do mal atraem a morte", mas Trelawney não me ajudou muito quanto a isto.
"Passei a noite procurando em todos os livros que pude, porque sabia que algo não estava certo. Quer dizer, os olhos de uma Górgona petrificam aqueles que ousarem o olhar. Não faria sentido quanto..." a boca se franziu novamente. O ar preso em meus pulmões faz tanta pressão em meu peito, que temo que vá explodir. Eu solto o livro, com certo desespero, irrompendo as mãos para a boca.
— Está certo, senhorita Antares! Acalme-se! — Sobressaltou-se, agarrando-me pelos ombros.— Respire e fique calma. Prossiga devagar. Sei que são muitos sentimentos, muita agonia e ansiedade, mas... precisa manter a calma. Conte-me!
Tossi e tomei fôlego. O coração pulsando em tamanha aflição. Eu suspiro, antes de afirmar com a cabeça e recolho o livro. Pigarreei e engoli seco.
— Madame Vitally, Septima, ela estava de frente para a janela. Katty olhava para o espelho... Andrew, por algum motivo, acabou virando-se para o quadro do Sr. Endorvalho e, eu pensei, o que todos eles têm em comum? — Madame Vitally não me pareceu muito confiante, embora intrigada. O rosto suavizou e eu a entreguei o livro. —Aqui, veja, diz que o Basilisco tem um olhar realmente fatal. Eu o encontrei durante a noite. Faz sentido, a senhora não concorda? Quer dizer... ele não pode me matar se eu não o olhar. Um contato direto, eu digo.
Os lábios entreabriram e o queixo pareceu cair ligeiramente. Madame Vitally seguiu até a cama e sentou-se a beira desta, sem retirar os olhos das páginas, porém.
— Não, Annellyze! — Sussurrou. — Isso não é possível!
— Mas, Madame, eu estou certa que sim! — Insisti.
— Uma cobra deste tamanho? — Olhou-me com indignação. — Qualquer um já teria visto. Como isto iria saber quem é nascido-trouxa e quem não?
— Saberia, se controlada por alguém!
De um ímpeto, Madame Vitally levantou-se e fechou o livro. Uma pequena cortina de poeira ergueu-se em frente do rosto sério e rigoroso.
— Senhorita Antares, eu lhe asseguro, nenhum aluno ou professor jamais conseguiria entrar em Hogwarts com algo deste tipo.
Os dentes agarraram o lábio inferior e os olhos desviam para o chão. Cerrei os punhos e abaixei a cabeça.
— Madame Vitally... e se ele não foi trazido agora? E se já estiver aqui há muito tempo?
Ela gargalhou graciosamente. Eu franzi o cenho.
— Senhorita Antares, não estamos falando de uma suposta Câmara Secreta, estamos? —Tomei fôlego, mas ela prontamente me cortou. — A lenda sobre o herdeiro de Salazar Slytherin? Por favor! É apenas isto, uma lenda! Histórias criadas por Sonserinos para assustar Grifinórios na hora de dormir, e nós não somos Grifinórios, somos? — Eu balanço a cabeça. — Exatamente. Isso não existe!
— Mas, Madame — ela abriu a boca para argumentar. Eu a peço um minuto e ela se contém. — Independente do que seja, a senhora sabe que não é um feitiço comum. Também, não é um aluno, ao menos, não sozinho. Eu estou certa de que alguém está usando uma criatura mágica para fazer isso, e se professor Dippet puder olhar o diário junto de professora Trelawney, eu sei que eles podem descobrir alguma coisa!
Madame Vitally virou o rosto e apertou o livro nas mãos. Remediou, em silêncio, por longos e demorados segundos.
— Conte-me de novo sobre o seu sonho? — Pediu.
— Estávamos no Salão Comunal e alguém gritou. — Dou de ombros.
— Só isso, Annellyze? — Pressionou. — É assim que deseja salvar seus amigos?
— Eu não consigo reconhecer de quem era aquele grito. Já faz muito tempo!
— E então?
— Os alunos estavam muito aflitos e... — engulo seco.
Estavam aflitos e encurralavam Rúbeo Hagrid, eu me lembro. O mesmo Rúbeo que Marcos afirmou conversar — até demais — com Riddle. Eu cerro os dentes.
— E, o que, senhorita Antares? — Os meus olhos encontram os de Madame Vitally. Ela me transparece curiosidade, enquanto o tronco se inclina suavemente na minha direção.
— Hagrid... — sussurrei. — As duas vezes que sonhei com isso, ele estava por lá.
— O grandão da Grifinória? — Eu aceno com a cabeça. — Hum... não foi ele quem o professor Scales pegou escondendo filhotes de lobos em baixo da cama? — Pareceu pensar alto, olhando para o nada.
— Sim, mas não só ele. Também... — o ar não mais entrou, pois, a língua enrolou-se dentro da boca e tapou a passagem. Eu arfei, arfei e arfei, até simplesmente afugentar o nome e desistir de tentar pronunciá-lo.
— Não diga mais nada, senhorita Antares! — Disse e seguiu até a porta. Uma das mãos agarrara a maçaneta, a outra, por sua vez, sustentava o livro que ela não me devolvera. — Vou conversar com professora Trelawney e apenas isto. Não espalhe o assunto para mais ninguém. Se Cassandra tiver algo a revelar amanhã, ao Ministério, ela o fará. Caso o contrário — bem! Vamos deixá-los investigar. Eu duvido que alguma coisa esteja por aqui, em Hogwarts. Como eu disse, alguém teria visto. Você só precisa de descanso. A noite em claro não lhe fez bem. Procure não pensar em nada disto e relaxar. — Abriu a porta e passou por esta. Grudou um dos olhos na pequena fenda e continuou:
"Antes, é claro, não se esqueça de separar os outros livros e os trabalhos de seus alunos para entregar. Venho buscar mais tarde".
Fechou a porta e o salto alto repercutiu nos degraus, enquanto ela se afastara.
Lancei-me de costas na cama e fechei os olhos. A preguiça ameaçando se aconchegar, acanhadamente. Abro-os abruptamente e levanto o tronco. O rosto franzido até o cenho e uma indignação imensurável engasgando-me. Respirei fundo e cerrei a mão até a raiva passar.
— Eu não sei como ainda caio nesse seu sorriso cruel. — Sorri sarcasticamente.— É claro que não iria deixar como está, não é? Foi isso o que aconteceu no almoço. Você me enfeitiçou e eu nem percebi. — Bato com as mãos no colchão. —Isso não vai ficar assim! Você vai ver só!
Deixei o quarto e fui até a sala de convivência. Mandei que organizassem o material para ser entregue, e o fizeram. Madame Vitally, Brandon, Guk e Peter trataram de carregar os caixotes até a biblioteca. Após isso, tivemos o almoço e nenhuma outra advertência fora nos dada.
— Anne, pode apagar o abajur? — Pediu-me Loreynne.
Mal voltamos do jantar e toda a comunal refugiou-se nos dormitórios. Eu não os culpava, estando igualmente exausta. Tomei minha cama e esgueirei-me para debaixo da colcha. Virei-me para as janelas e lutei contra o sono, arduamente, até que Loreynne e Guilia estivessem dormindo. Eu não poderia me dar ao luxo, entretanto. Havia assuntos pendentes. Não fecharia os meus olhos enquanto não os resolvesse.
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