Volume 2 - Capítulo 5.2
Dava para ver bem o rosto da vadia agora que ela estava mais perto. Ainda parecia a mesma jovem tola cheia de ambições idiotas. Ressumbrando seus horríveis olhos amarelos e dentes afiados por aí. Era mesmo uma idiota.
- Você não mudou nada...
- Mesmo? – Ela levou as unhas ao queixo da maneira repugnante como fazia – Já você parece bem mais velho.
- Então você está trabalhando para o Verde?
Ela deu um risinho abafado.
- Parece que sim... Pode isso? Decaí a uma mercenária...
Ela prosseguia avançando lentamente. Usava um salto daqueles caros, que realçava a lasciva cena de suas pernas. Escolhia usar daqueles durante lutas apenas para provocar o alvo. Para mostrar que conseguia lutar mesmo com eles. Certamente era uma idiota.
- Will. – Joguei o bloco de vidro para trás – Cuide disso.
Aquela vadia deu mais um risinho calamitoso.
- Sem mais palavras. Venha Wilkinson... Me deixe sentir seus punhos mais uma vez.
Foi o tempo de ela sair da grama e encostar na calçada. Ela estava perto o suficiente. Não sou tão bonzinho que consiga ignorar a chance. Se meu alvo está tão perto não tenho escolha se não atacar.
Foi um ataque que eu já estava premeditando. Tinha treinado esse movimento diversas vezes. Eu alcanço algo que esteja à mão e uso esta alguma coisa com o taiar para aumentar meu alcance. Por causa de minha força exagerada não importa que o objeto seja muito pesado. Não haverá perda de momento. E então direciono aquilo que carrego em ângulo ligeiramente baixo, mirando mais na barriga e nas pernas de meu alvo. Se eu mirar muito em cima e ele desviar eu perco o ataque, mas se eu mirar no chão posso terminar por acertar o chão "por engano", e o impacto moldará o terreno fazendo com que o alvo se desequilibre e me dê um segundo de vantagem para seguir com um segundo ataque, que será letal. Quando uso essa técnica já uso-a esperando que o alvo consiga desviar a primeira investida e já me preparo para a segunda. Mesmo que oitenta por cento das vezes eu acerte o alvo na primeira por causa da velocidade.
No caso foi a porta do carro. Arranquei-a com a mão direita e saltei com o máximo de impulso para frente, usando mais indarra no braço que no corpo, para que a porta fosse arremessada para a frente primeiro, fazendo assim com que o ataque alcançasse o chão muito mais rápido que o previsto.
Mas a vadia estava esperando por isso. Ela sabia como eu lutava. Já tínhamos trocado golpes antes. O único jeito de desviar é antecipar a minha intenção e usar a indarra para saltar para trás, de modo a não ser pega pelo buraco cavado no chão. Foi exatamente o que ela fez. Usou a indarra combinando com o impulso das suas asas saltando de costas de modo a voltar ao gramado. Bem do feitio daquela perrengue frouxa.
"Agora ela vai usar a indarra dela na asa, impulsionar-se de modo a me atacar com o mesmo pulo com que estilhaçou o bloco de vidro agora há pouco, usando suas garras transversalmente de cima para baixo, de modo a maximizar sua chance de acerto. Será impossível desviar então terei que bloquear. Terei que bloquear numa instância cruzada apenas no último instante pois caso contrário ela mudará de ideia durante a investida e fará um golpe imprevisível que aproveita minha mudança de instância. Após isso usarei indarra nas minhas pernas tentando atacá-la novamente, e é certeza que ela, prevendo isso, saltará para trás novamente do modo covarde como ela sempre faz" Pensei.
Foi exatamente o quer aconteceu. Timtim por timtim.
- Você realmente não mudou nada. Fazer sempre a mesma coisa e esperar resultado...
- ...É loucura? Hehehe. A verdade é... Estou um pouco nostálgica, Wilkinson. Quero lutar como antes. Relembrar os velhos tempos. Você não tem saudades dos velhos tempos?
- Certamente não.
- Gostaria de ficar e trocar mais ataques, mas tenho um trabalho de mercenária a fazer.
Cayme usou a indarra nos calcanhares e saltou, mas com uma pirueta virou seu corpo antes de o impulso fazer efeito, o que a jogou para trás ao invés de para a frente. Após isso foi correndo na maior velocidade que pôde na direção da rua de trás do parque.
- Devo segui-la? – Indagou Carlyle.
- Se conseguir. Mas não entre em luta direta. Essa coisa é perigosa.
Ele partiu correndo usando a indarra nos calcanhares do modo como todo agente paranormal minimamente decente é capaz de fazer.
Eu me encontrava parado entre a calçada e a grama. No chão, a meu lado, estava caída a porta do carro afundada no buraco de agora há pouco.
"Mas Carlyle não consegue. É impossível bater uma vampira na indarra pura. Ela será mais rápida. Que seja. Não estamos aqui para persegui-la. Ela veio apenas com o intuito de tomar de minhas mãos as balas e o convite. Ambos ainda estão em minhas mãos e agora Walter Gunman está morto e aqueles dois quase que também... Exceto aquela barata-parasita." Pensei comigo.
Olhei na direção dos três corpos jogados na rua daquele jeito. Devíamos pegá-los e colocar no carro ou deixar ali? Deixar um político de renome morto na rua com ferimento causado por botão seria no mínimo imprudente. Era bom levá-los a algum lugar longe dali e enterrar. Mesmo que a polícia provavelmente os encontrasse pelo menos seria com atraso.
- Will...
- Sim, senhor?
"Espere." Pensei comigo mesmo antes de dar a ordem. "Algo está errado nessa conclusão dos fatos. Se Cayme veio aqui justamente para tomar de mim os pacotes de balas e o convite, tomando o cuidado inclusive de sacrificar Gunman para isso... Por que estaria correndo daqui sem tê-las conseguido? Está certo que o plano original dela falhou, mas não é da índole daquela doida desistir tão facilmente. Teria ela mudado com esses anos e se tornado mais cautelosa? Não... Aquela vigarista jamais seria cautelosa de graça. Ela é uma cadela inocente que acha que não tem medo de nada. Desconhece o medo. O ignora. Não porque tenha superado o medo por um crescimento virtuoso de espírito mas simplesmente porque nunca chegou a crescer mentalmente o suficiente para conhecê-lo. O que me deixa com apenas uma possibilidade: naquelas circunstâncias seu objetivo original já tinha sido alcançado. Qual seria seu objetivo? Matar Gunman? Ela não estava trabalhando com ele? Mas se fosse isso ela poderia ter feito em outro momento. Matar Gunman e me fazer levar a culpa? Mas ela deve ter previsto que eu e Wilson tiraremos os corpos daqui. Então só pode ser que..."
- Will! Onde está o convite?
- Coloquei no banco traseiro, senhor.
- Pegue e traga aqui!
Ele começou a caminhar até o carro.
- Rápido!
Só depois daquele último grito que Wilson usou movimentos ligeiramente mais apressados. Merda. Quando mais preciso que as ordens sejam cumpridas rapidamente! Por que não consigo achar agentes que cumprem ordens que não entendem sem hesitar? Não tenho tempo de ficar explicando tudo.
- Quebre!
Senhor?
- Quebre!!
Ele usou a indarra no bloco de vidro e este rachou apenas um pouco. Não é de surpreender. Nem Cayme tinha conseguido cavar um buraco fundo naquela coisa. Eu disse que era um bloco de vidro maciço temperado, mas isso era um eufemismo. Já viu aqueles filmes de agentes onde um artefato super-importante está preso numa sala de vidro tal que nem um lança-mísseis é capaz de quebrar? Aquela coisa era de uma fabricação capaz de similar feito.
Ele usou de novo e de novo, mas a porcaria do bloco não cedia.
- Tsc. "Eu" vou ter que fazer!? Me dê essa droga aqui!
Tomei das mãos dele e coloquei aquela imundície no chão. Tive o cuidado de tirar meu sapato do pé direito para não estragá-lo no processo. Era um Cole Kleinman preto recém-comprado.
Juntei forças na minha perna direita na técnica milenar de unir toda a indarra num ponto só do corpo e então dei um pisão. Unir toda a força num ponto só é praticado por entusiastas de artes marciais. Mas fica ainda mais efetivo quando se usa a indarra junto com a força, no caso de um paranormal. Nem todos conseguem usar essa técnica. Mas há alguns poucos que conseguem. É algo como uma finesse standard, uma técnica desenvolvida há pouco mais de trezentos anos conhecida como opari. Mais cedo eu tinha também usado opari na ponta dos dedos para aquele arremesso de botão. Mas não na luta contra Cayme. Usar essa técnica requer esforço físico e mental. Não pode ser usada em qualquer celerada troca de golpes, caso contrário eu me desgastaria em vinte segundos.
Aquela imundície afundou com o chão após o pisar. Mas o bloco pelo menos rachou, dispersando a força da liga do material. Agora quebrar e tirar o convite estava muito mais fácil.
- Pronto. Termine o resto. – Entreguei a Wilson.
Usando indarra e com um pouco de força ele destacou os pedaços e tomou o papel. Como esperado não era o convite para Uahmyr. Era apenas um pedaço de papel em branco.
- Me dê aqui esse vidro.
Examinando os cacos ainda dava para constatar que havia um fino corte no aparato. De espessura pouco mais grossa que uma folha de papel. Uma alma muito proficiente poderia usar aquela fina abertura para tirar e colocar folhas de papel no bloco de vidro. Aquilo foi feito com a finesse de alguém. Algum ser com destreza sobrenatural que treinou anos e anos até aperfeiçoar a técnica. Seria aquela barata-parasita que me atacou agora há pouco? Teria feito um movimento brusco imitando uma tentativa de golpe, mas na realidade almejava fazer o buraco no bloco desde o princípio? Mas então isso significava que o papel estava nas mãos daquele hospedeiro caído à minha frente. A barata saiu sem carregar nada. E ele não teria passado o papel para Cayme sem que eu tivesse percebido.
Não. Aquilo era finesse da própria Cayme
Vaca velha!
Antes ela não tinha isso. Aprendeu a fazer em tão pouco tempo? Foram quantos anos desde a última vez que lutamos? Quatro? Cinco?
O primeiro ataque no qual ela passou de raspão transversalmente me jogando vidro na cara daquela maneira sórdida visava na verdade fazer a troca de papeis, abrindo aquela pequena fissura retangular e aplicando sua irritante recém-obtida finesse.
Mas se isso acabasse por ali e ela saísse correndo eu teria a perseguido, e com o apoio de meus guarda-costas teria conseguido pegá-la. É difícil alcançar uma vampira usando apenas da velocidade. Mas se estivermos em três contra um podíamos contar com mais recursos e com nossas habilidades naturais para fazer acontecer.
Por isso houve aquele ataque feito pela barata-parasita após a distração premeditada com o ductu. Era para fazer parecer que ambos ainda não tinham o convite em mãos e estavam criando oportunidades para tomá-lo de nós. Para causar uma falsa sensação de segurança. Me fazer acreditar que ainda tinha a vantagem.
A vagabunda me enganou!
Eu achei que estava com a vantagem e deixei-a escapar porque decidi erroneamente que seguir aquela energúmena não valia a pena.
Os males da idade estão mesmo me deixando enferrujado.
Não demorou muito para Carlyle me ligar. Atendi com uma pergunta para a qual já sabia a resposta:
- Conseguiu?
Houve um momento de silêncio seguido de um tímido:
- Não, senhor.
- Volte para o parque. Vamos dar um jeito nos corpos.
O Citrine, que era uma ameba apertada, tinha só cinco lugares. Tivemos que empilhar Gunman e o corpo da barata-parasita no banco de trás, junto com Wilson, que ia na janela, e deitar o corpo restante no porta-malas. Os vidros eram fumê, logo não fazia muita diferença. Eu que tive que dirigir desta vez pois o motorista precisava ficar segurando a porta com uma mão para fazer parecer que estava boa, já que ela estava quebrada. Fomos até a rodovia que atravessa a cidade transversalmente e vai no sentido contrário do porto. Uma vez chegando a um local cheio de barro, em que dava para entrar de carro (isto é, mais ou menos) paramos e tratamos de cavar ali mesmo os buracos. Não demorou muito para quem sabe usar a indarra no chão para quebrá-lo e usar da mesma para cobrir o estrago rapidamente.
Fui eu quem peguei meus dois funcionários no Bodongo, por isso não podia simplesmente deixá-los ali.
- O que vocês dois vão fazer agora? – Perguntei.
- Eu vou voltar para minha casa. A dona está esperando. – Disse Carlyle.
- Eu também tenho que voltar e me arrumar para a aula de golfe... Já faltei uma vez, não queria faltar de novo. – Mencionou Wilson.
- Querem que os deixe lá?
- Não precisa, senhor. Por mim pode me deixar em Cheawuld Garden de novo. Seria muita contramão.
- O mesmo por aqui.
Assim, seguimos como o combinado.
Não houve troca de palavras na viagem de volta. Podia notar o quanto meus funcionários estavam frustrados pela falha. Não estavam acostumados a perder daquele jeito. Durante o trajeto peguei-me pensando comigo mesmo:
"Tenho um trabalho de mercenária a fazer"? Cayme certamente não engana ninguém. Aliás... Ela sabe que não engana ninguém. Falou aquela mentira com um riso sádico naquele rosto dissimulado dela esperando que eu notasse. Cayme não trabalha para Verde coisa nenhuma. A última coisa que ela faria é aceitar as ordens. Tenho a prova que Cayme não trabalha para Verde. E não é só porque ela incluiu a morte de Gunman em seu plano aporrinhante. Mas sim por causa de Jim. E daquele McMiller. Tanto eu quanto Greta havíamos chegado à conclusão que foi obra de um vampiro. Vampiros são raros. Das dez raças abominadas pela polícia estão entre as piores. Nunca que a polícia deixaria acumularem diversos vampiros numa cidade como Sproustown sem fazer um estardalhaço frenético. A vampira que matou aqueles dois para se alimentar tem que ter sido aquela vadia. E veja que isso faz ainda mais sentido porque ambas mortes tiveram alguma relação com o tráfico de Deluxes. A primeira morte serviu para sacanear Verde. E a segunda morte foi para me sacanear. Merda. Jim... Aquilo me deu um trabalho desgraçado.
Isso... Cayme não trabalha para Verde, pois se assim fosse não teria matado Gerald McMiller durante o episódio de Sprohic.
Cayme deve ter se apresentado para Verde como mercenária e contratada como funcionária temporária apenas com o intuito de interceptar o convite desta vez. Mas ela não queria entregar o convite para ele. Queria tomá-lo para si. Por isso enganou também Gunman, dizendo que pegaria o convite antes de ele ser morto. Isso indica que Walter Gunman provavelmente estava trabalhando com Verde. A desgraçada devia também estar trabalhando junto com aquela barata-parasita. O fato de apenas um dos guarda-costas ter dado a vida para proteger Gunman e justo o outro que não o protegeu ser o parasita a me socar naquela imundícia de plano confirma ainda mais essa teoria: a barata também não estava trabalhando a favor de Verde.
Lembro que Greta tinha me falado de uma quarta força em Sproustown. Uma força que deseja jogar as três maiores uma contra a outra. Sendo assim a próxima vítima daquela oprobriosa criatura farsante visaria sabotar os negócios do Dragão. Eu já tive minha dose de inferno e também Verde. Agora ela iria se ver com o Dragão.
Adicionalmente, Cayme tentaria que ela fosse quem indicasse seu galo na briga de Uahmyr deste ano.
Mas outra possibilidade é que Cayme esteja trabalhando sob as ordens do Dragão, e por isso apresentou-se como mercenária para Verde para interceptar o convite e entregá-lo a seu chefe. Sairia ganhando não só o convite, mas a morte de Gunman. Isso também indicaria que Gunman estava envolvido com Verde.
Ainda, uma última possibilidade é que ela esteja trabalhando sozinha como a quarta força e Gunman esteja envolvido com o Dragão e não o Verde. Ela pode ter respondido que trabalha para Verde só por que eu perguntei. Na hora arrisquei o nome de Verde só para ver se ela se entregava. Por ser confiante demais ela de vez em quando acaba entregando suas intenções. Se fosse isso ela já enganou o Dragão, equilibrando assim sua distribuição de desgraça por Sproustown. Enganou todas as três partes uma vez com seus ignóbeis esquemas infantis.
Que seja.
Seja como for, esse pedaço de informação me será útil. Terei bastante tempo para pensar e confirmar minhas teorias por intermédio da capacidade de espionagem de Greta. E como eu disse: Para falar a verdade perder aquele pedaço inútil de papel nem importa tanto assim. No mês passado já fiz o que tinha que fazer com ele.
Hoje aquele inútilpedaço de papel imundo chega a seu fim e ponto final.
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