Volume 2 - Capítulo 10
I
Suspirei em frente à escadaria de cimento que dava para a porta da minha casa. Não tinha ouvido o agudo e enfastiante "Henry... Henry... É você? Porque não ligou?" característico de Jane. Não tinha ouvido nada.
Mas eu sabia que ela estava lá. Dentro de casa. Se contorcendo e gemendo em meio a soluços.
Não sou insensível, mas também não sou idiota. Sei diferenciar um choro real de um choro fingido que visa me manipular. O que Jane quer é forçar uma espécie de impasse oportuno em que me vejo obrigado a tentar uma reconciliação para evitar que ela morra desidratada derramando todo o líquido do corpo pelos olhos. Acontece que sei que é fingimento.
Ela me quer sob sua coleira.
Henry não passa do objeto no qual Jane desconta sua raiva.
Não há como negar que eu tenho sido forçado a dormir fora do quarto durante todos esses últimos meses e que não há interesse em reconciliação da parte dela, então não adianta fingir que tal interesse apareceu agora, justo quando eu dei partida na documentação para o divórcio iminente.
Tomei um fôlego profundo e entrei, abrindo a porta de maneira rápida e decidida, mas sem fazer barulho exagerado.
– Jane, temos que conversar. – Tentei soar o mais casual possível, mas sem comprometer o tom da seriedade.
Minhas coisas ainda estavam jogadas perante à base do sofá. Não ouvi resposta de Jane então pensei em ir à lavanderia e já tomar o SPP.
Procuro no bolso de meu casaco marrom o pote com as pílulas.
Elas não estão lá!
– Jane!? Você mexeu nas minhas coisas?
Revirei tudo freneticamente e procurei em toda a sala e na peça da cozinha por uns bons quinze minutos, mas sem sucesso.
Vou até o quarto.
– Jane?
Ela está deitada com o rosto virado como de costume.
– Porra, Jane! Já te disse para não mexer nas minhas coisas!
Ela não responde.
– O que você fez com elas?
– ...
– Jane isso é sério? Cadê?
– Cadê o que? Eu não mexi em nada.
Abri a boca e fechei. Queria dizer em voz mais agravada "cadê minhas drogas" ou "cadê o SPP" mas como Jane responderia a tal frase?
– O que você fez com minhas coisas? – Tentei ser mais genérico.
– Que coisas?
– Eu tinha um pote de... – Fiz o pote com as mãos. Jane virou o rosto para mim portando uma expressão irascível.
– Eu nem saí daqui hoje, Henry. Que horas acha que são? Esse é seu bom dia? Gritos? Me acusando de coisas que eu não fiz? É assim que pretende ganhar a causa não é? Me passando para trás, você...
Ah, vá a merda!
Saí e bati a porta atrás de mim.
Não tinha muito tempo pois Dunat Town era longe, mas se eu quisesse mais pílulas teria que ir até à central.
Sem pensar muito peguei o carro e sentei o pé no acelerador, estava lá em menos de quinze minutos. Enquanto descia do estacionamento me peguei esboçando a seguinte linha de pensamento:
"O que Jane teria feito com minhas pílulas? Escondeu? Jogou fora?"
"Não me diga que confundiu com antidepressivo e tomou???"
Se um humano normal toma aquela porcaria sem estar machucado... Droga, e agora? O que eu ia ter que fazer? Teria que voltar até em casa e tentar arrancar de Jane a verdade? Impossível, ela só vai mentir e começar de birra...E se ela começar a passar mal?
Começando a suar de leve, levei as mãos ao rosto.
Naquele momento Ewalyn estava saindo do prédio do DCAE. Ela cruzou comigo em frente ao elevador.
Ewalyn estava enfastiada e parecia aflita.
– Henry... A situação de Adam está piorando! O dano causado no pâncreas coagulou e formou um termo médico que eu não sei... O que vai acontecer? – Seus verdes olhos estavam esbugalhados. Ela não olhava diretamente para mim – Eu só dei um soco e um chute numa pessoa normal. Nunca pensei que fosse acontecer isso!
– ...E se ele morrer, Henry?
Eu queria ter dito algo como "relaxe... Tudo vai ficar bem" e tomá-la em meus braços, mas eu estava suando por debaixo da blusa, minha cor estava avermelhada e eu estava tremendo. Naquele momento nem conseguia raciocinar direito. Ewalyn percebeu que havia algo de errado:
– O que houve? Você está... Apreensivo.
– É a Jane. Ela...
– Ela o que?
– ...
– Ela o que, Henry?
– Eu acho que ela tomou SPP.
– O que!? Como? Ela está bem?
– Eu... Não sei. Ela andava num estado muito deprimente. E ela volta e meia mexe nas minhas coisas para procurar algum indício de que ando saindo com outra ou coisa dessa espécie.
– O que? E mesmo assim você guarda as drogas em casa? Como assim? O que acha que pode acontecer se ela tomar uma daquelas coisas por engano?
– Eu sei, Ewalyn... Eu sei, mas é que... – Suspirei e fechei os olhos. A última coisa que eu precisava era de um sermão de qualquer outra pessoa naquela hora.
– Esqueça... – Tornou Ewalyn – Apenas me conte o que aconteceu exatamente.
– Como eu lhe disse... Ela estava andando num estado miserável desde que tocamos no assunto do divórcio e... Encurtando a história eu dei falta delas hoje quando voltei para casa para ter "aquela" conversa com ela e pensei em usá-las antes de começar. Eu procurei, procurei e no fim perguntei para ela, mas Jane disse que não tinha visto nenhuma pílula. Entretanto eu não sei se é verdade porque ela costuma mentir bastante.
– Você... Você toma o SPP na sua própria casa? Na frente de Jane!?
Minha boca se abriu, mas não pronunciou som algum.
– Pelo amor do guarda, Henry! E você saiu e veio para a central e deixou ela em casa daquele jeito!? E se ela tiver tomado as pílulas?
– Foi isso que pensei, mas pensei só agora.
– Você deveria ter feito aquilo que eu falei desde o começo. Falado com o advogado. Ela só vai piorar propositalmente enquanto você não der um fim nisso.
– ...
– Você falou com o advogado, pelo menos?
– Eu... Eu não falei.
– Você saiu mais cedo do DCAE 'para' falar com ele!!
– Eu tive que ir falar com Sarah, ok!? Na casa dela! E depois eu tinha planejado falar com o advogado, mas aí aconteceu tudo isso. Urghh! Apenas se acalme, está bem?
– Me acalmar? Me acalmar como se todo mundo ao meu redor está para morrer!? Primeiro Adam e agora você vem falar de Jane. Argh... Como foi que você deixou ela ficar nesse jeito? Se tivesse feito o que eu falei não haveria espaço para mudança no estado dela.
– Ora? Eu quem fiz ela ficar depressiva da noite para o dia? Ela ficou assim é por sua causa! Se você não tivesse se intrometido em toda essa história e me feito procurar aquela porcaria de advo...
– Ah!! Claro! Agora o que acontece entre você e Jane é culpa minha!?
– É culpa sua porque você fica apressando as coisas!! Estamos juntos a o que? Nem um mês! E você já vem falando de programar divórcio e organizando todas essas coisas para nós!? Voc...
– Para nós!? O que...? Eu não estou fazendo isso por 'nós', Henry!
– ...
– Eu... Eu estou fazendo isso por 'você'!
Por um instante dava para prestar atenção no uivo silencioso do vento que atravessava aquele pátio.
– Ewalyn, eu...
– Quer saber? – Ela meneou enfaticamente de forma negativa – Esqueça! Apenas... Esqueça!
Ewalyn deu as costas e começou a sair.
– Ewalyn, espere!
Ela não esperou.
Cocei minha costeleta.
E assim... Tivemos nossa primeira briga...?
Passados minutos eu já tinha entrado no prédio, pego o pote de pílulas da enfermaria do DCAE e tomado minha dose. Cheguei a ligar para casa para ver se Jane estava bem, mas ela não atendeu. Isso não necessariamente significava que ela estava mal, visto que seria característico que ela não atendesse dadas as condições.
Ia ser difícil tirar aquilo da cabeça no resto do dia. Tem um nome para a sensação que fica quando você sabe que fez merda e quer consertar o mais rápido possível, mas não pode consertar agora por causa de como a situação está encaminhada? Não? Devia ter uma palavra para isso...
Eu estava me sentindo um merda. Era isso.
Teria que esperar até Ewalyn estar de boa vontade de novo antes de tentar me desculpar com ela. Naquele momento seria impossível. E depender da boa vontade dos outros para resolver uma situação que estava me incomodando e a qual eu desejaria resolver o mais rápido possível me deixava irritado. Era como seu eu estivesse incapacitado. Essa sensação de que existe algo que eu não posso resolver... É horrível.
E para piorar especulações alternativas como "eu não devia ter falado isso, devia ter feito aquilo" ou "naquela hora eu deveria ter feito isso" ficavam me atormentando de dentro de minha cabeça o tempo todo.
Muitos minutos tinham se passado, mas eu ainda não tinha esfriado a cabeça.
Olhei para mim mesmo no vidro do corredor das janelas grandes antes da sala de Sarah: eu ainda estava corado e meus cabelos estavam grudados no lado da cabeça como que lustrados com suor. Eu parecia um sujeito em meio à crise de meia-idade; moribundo, apreensivo, temeroso e derrotado. E por estar me vendo obrigado a lidar com sensação de desgosto que tinha sido causada por mim próprio, me encontrava não só exaurido como exasperado.
Em suma: era a hora e o estado de espírito perfeitos para lidar com Patrick Gray! Eu saberia ser um entrevistador deveras paciente. Especialmente quando se tratava de um gentleman como ele.
Antes que minha raiva se esvairasse eu entrei no Utopia preto e segui rumo à Dunat Town.
A estrada para Dunat em geral era lisa e vazia. Corria como sangue numa veia saudável. Mas naquele dia em especial; o dia em que eu precisava ir até lá; era certo que aconteceria alguma coisa que deixasse o trânsito engarrafado. Sabe lá o que foi. Um acidente? Óleo na pista? Obras? Só sei que desde o princípio até mais ou menos a metade do percurso tive que ficar andando naquele ritmo: primeira marcha, acelera, pé no freio, embreagem e acelera, freio, embreagem e acelera.
E para piorar parecia que estava fazendo calor em pleno fevereiro e eu com aquela blusa de lã. Queria tirar, mas não tinha nenhum momento de completo cessamento do tráfego que justificasse parar.
Após o que me pareceu uma infindável temporada no inferno, consegui chegar ao endereço do maldito.
II
A primeira visão que tive foi aquela cara ruiva debochada perdida em meio àquele faustuoso sorriso branco. A pele ao redor dos olhos de Gray ficava esticada e cheia de rugas, de tão forçado que era o sorriso. Mantive a compostura. Comecei com uma pergunta casual embora pertinente sobre o ambiente:
– O que é isso?
– 'Isso?' – ele apontou com ambas as mãos a seu redor – é a minha sala, senhor "tenente Dotson"... Gostou? Tenho um ótimo gosto para mobília, não?
– A maioria dos detentos da delegacia têm uma cela, e não uma sala! Por acaso trabalha aqui? Achei que estivesse preso!
Ainda sem levantar de sua cadeira giratória Gray soltou um riso difícil de saber se era forçado ou espontâneo.
Ouvi um latido agudo.
– Espectro! Quieto!
Um comprido e peludo animal se arrastou desengonçadamente pelo chão de tacos atravessando o recinto.
– Você tem um cachorro na cela!!
– Fique tranquilo, senhor tenente Dotson. No mais... Após acertarmos as contas sobre a delação eu não estarei mais sujeito à cela de qualquer forma, hheh?
– Humph.
Aquele desgraçado...
– Escute... – Comecei a tirar um dos últimos Tar Lights de cereja do bolso de minha camisa. Daquela vez não me dei o trabalho de perguntar se podia. – Se isso aqui é uma delegacia também... Por que me garante que conversar aqui é mais seguro que no DCAE?
Gray fez um *clack* irritante com a língua e o céu da boca.
– Bem pensado, senhor "tenente Dotson", porém sou obrigado a responder de forma desprovida da mesma perspicácia: não tenho certeza nenhuma! É mero processo de eliminação. Sei com certeza que o DCAE não é seguro, já sobre aqui não sei. Pode ser que seja... Pode ser que não. Então se for para preferir, prefiro aqui. Não troco o duvidoso pelo errado. O que me diz? É até melhor para mim porque não tenho que pedir para meu advogado me levar. Aquela estrada tem estado sempre cheia ultimamente, com todas aquelas obras.
– ...
– Por falar em meu advogado, fiz questão de não chamar mr. Williams aqui hoje. Em sua homenagem! Foi pensando em você! – Ele sorriu resplandecente – Não se dá muito bem com ele, correto?
– ...
– Ora, tenente Dotson! É uma delegaciazinha de porta de esquina, à beira da estrada da empoeirada Dunat Town! Acha mesmo que alguém vai vir colocar um grampo por aqui? Estou completamente aberto à sugestões alternativas de local de encontro, mas devo lembrar que estou detido e mesmo que consiga alguma exceção e por milagre consiga encontrá-lo noutro lugar estou sendo monitorado também por isso aqui – Ele apontou para a tornozeleira – o tempo todo. Então... Se avexe. Você não tem escolha.
Expeli fumaça de meu cigarro.
Puxei a cadeira do visitante que estava embaixo da escrivaninha de madeira de mogno para a frente e sentei na mesma.
– Ok. Me diga então... O que anda fazendo? Quais são as novas?
– Novas sobre Verde. Tudo que estamos fazendo se trata de colocar as mãos nele o mais rápido possível, não? Seria perfeito para meus camaradas em Silverbay e também perfeito para o DCAE. Bom... Vamos um passo de cada vez. Da última vez eu havia confirmado a visita de Pollo à cidade só que acabamos perdendo detalhes que foram reacertados em última hora, por isso desta vez deixarei os detalhes para a polícia e passarei só a informação básica: sabe que Verde andou perdendo bastante poder de fogo nesses últimos dias? Aquele restaurante em Helmsley que fechou... Seu agente conseguiu entrar em contato com os que trabalhavam lá? Garçons? Chefs? Funcionários de geral?
Naquele ponto eu estava apenas o observando, sem interromper. Quando ele me dirigiu a pergunta fiquei um tempo até processar que precisava abrir a boca para responder:
– Não...
– Deveriam. Investiguem o paradeiro dos funcionários daquele local. Devem ter deixado nomes pendurados em algum lugar quando tiveram que preencher documentos para cadastrar estabelecimento ou ofício... Qualquer um lá pode ter conexão com Verde, mas o ponto que quero chegar aqui é: depois que a verdade foi descoberta e o restaurante fechado... Verde andou perdendo um pessoal. Isso e também todos aqueles que foram presos no episódio de Dalilah. Aqueles que passaram à jurisdição do DEA, lembra? Sem contar que ele perdeu o poderoso zumbi Jeffrey Sprohic, que poderia dar um agente paranormal. É notável como ele anda perdendo bastante pessoal. Sabe o que um traficante faz quando perde pessoal?
– Hm?
– Arranja mais pessoal.
Inclinei a cabeça um pouco mais para a frente.
– E boatos correndo em Silverbay, meus camaradas acabaram por ouvir um nome de alguém que foi recém contratado: um tal de Hiro Hamasashi.
– Hiro... Hamasashi?
– Parece ser um mercenário de renome. Conhecido no submundo como "Yamada". Pelo que ouvi tem cara de ser um peixe grande. Se fosse você eu daria uma olhada.
Um nome daquele não devia ser difícil de ser detectado na database da central.
– Falando bem a verdade para o senhor, "tenente Dotson": quero deixar bem claro que minha pista aqui é o nome e a existência de Yamada e não o que vem a seguir, de modo que a decisão mais proveitosa para vosso departamento colocar as mãos em Verde é ir atrás de pistas deixadas pelos suspeitos em suas próprias casas e não se ajuntar aos mesmos durante as transações de Deluxes que ocorrem por aí, mas ainda assim... Se for estritamente necessário... Só se for para ser um last-resort de sua parte... Também estou sabendo de um encontro de novos integrantes que deveria acontecer agora no final desta semana. Tenho dois nomes: Yamada e um tal de Floss. Mas há ainda um terceiro envolvido segundo a informação que não sabemos o nome.
Ter um espião na prisão era realmente útil. Esse Gray bem poderia trabalhar para a polícia...
– ...Se tiver disposição... Posso te passar hora e local.
Confirmei com a cabeça.
Por acaso olhei em cima da mesa de tampa de pedra lisa na qual ele estava trabalhando antes de eu chegar: havia canetas, papeis, um laptop e outros materiais jogados por ali. Um deles em particular me chamou a atenção:
– Ei, seu maldito! O que está fazendo com isso aqui? – Meu corpo se estendeu e apareceu uma carranca na minha testa.
– Oh!? Ho-ho-ho! Isso? Sim, eu peguei lá do DCAE! Sua capitã parecia não estar usando e...
Meu ductu começou a expandir.
Me deu vontade de agarrar aquele pentelho pelo colarinho de novo, mas dessa vez afundar o focinho dele.
– Quer dizer que essa é sua função aqui na delegacia!? Roubar material confidencial da polícia enquanto estamos fora? O que está fazendo com isso? Vendendo informação para alguém, imagino?
– Espere, espere! – Ele fez um gesto com ambas palmas das mãos abertas na minha direção. O anti-ductu dele tinha coberto seu corpo todo pelo desconforto, como que em forma de defesa – eu posso explicar: nem tudo que consigo por aí é informação simples, senhor "tenente Dotson". Sei que é assim que faço parecer quando exponho a informação para vocês, mas toda a coisa exige um minucioso trabalho de nosso lado, coletando pequenos fragmentos de informações de todas as partes envolvidas e completando as lacunas com análise e conhecimento de finesses e indarra... Esse convite do torneio de Uahmyr é falso, eu sei. Mas ele apresenta pistas importantes... – A voz dele começava a tremer – Eu... Não terminei de analisar ainda, mas...
– Importantes? – Fumei – Me diga então, o que são importantes? É bom você esclarecer tudo muito bem, senão...
– Veja: essas digitais! – Ele apontou com o dedo para a borda inferior média direita – tem marcas de gente que pegou esse papel! Está muito difícil de ver daí, eu sei. Mas elas estão ali! Esse papel foi encontrado no bolso daquele lutador paranormal do bastão invisível que vocês mataram durante o evento de Dalilah-
– Não matamos. Ele morreu na explosão.
– ...Exato! Mas você sabia que esse mesmo papel fez uma interessante viagem nas mãos de diversos figurões do submundo do assassinato de aluguel? Aquele com o qual você lutou tomou esse convite de mais alguém, sabe.
Meu cigarro estava quase chegando no toco.
– Me dê isso de novo. – Disse, estendendo a mão – Vamos levar para análise de digitais.
– Não será necessário. Eu... – Ele tremeu mais ainda a voz ao proferir aquelas palavras, de modo mirrado e culposo – ...Eu tenho o software aqui... Uma cópia ilegal do analisador do DC... E essa máquina que se conecta ao meu lap daqui.
Depois que ele mencionou eu notei que tinha um aparelho igual ao do Nimble, o garoto da perícia, ali na sala dele. Estava conectada via porta usb e disposta ao pé da mesa.
Assisti enquanto Gray passava o pó na área da digital e a organizava, colocava a mesma na máquina de captura biométrica, e então abria o software e fazia a análise em seu laptop da cela:
– Veja: essa digital é conectada a Hiro Hamasashi, o mesmo nome que eu mencionei. Então... Isso indica que ele pode ser o autor da finesse que monitora o prédio? Eu não sei. – Ele soltou um risinho nervoso – É o que eu estava tentando descobrir.
Era verdade que a digital que ele passou no scanner batia com a digital descoberta no envelope. Eu já tinha assistido Nimble fazer o mesmo e o procedimento era exatamente daquela maneira.
– Por que descargas você tem internet na sua cela? E de onde tirou um desse?
Ele sorriu sem mostrar os dentes dessa vez.
Hunf. Não podia negar que embora a motivação dele fosse egoísta ele estava fazendo um bom trabalho com tudo aquilo, entretanto.
– Me diga uma coisa, Gray: Sarah Harmon te autorizou a pegar esse convite falso da central? Pegou da sala dela, não? Ela sempre mantém a porta trancada...
– S...Sim. Ela deixou. Pode perguntar para ela, se quiser confirmar.
Coloquei o resto de meu cigarro sobre a mesa da tampa de pedra e o amassei. Gray me encarava energicamente e com o olhar arregalado.
– Não precisa. Se considere com sorte, Gray. Hoje não me sinto tão heroico que queira prestar atenção em detalhes legais. Apenas continue fazendo seu trabalho e me passe o evento combinado com Yamada. Passarei a investigar esse cara... E também tenho que dar um jeito na questão de Parker que foi interrompida. Eu ia esperar o sniper acordar, mas pelo que andei ouvindo...
Parece que ia demorar para acontecer.
– Ótimo! Ótimo... Então vamos fazer assim. Se eu e meus camaradas descobrirmos mais alguma coisa combinamos mais um encontro de delação. Eu sei que em geral você espera que o delator já tenha a história na ponta da língua, mas é difícil manter uma história inteira viva quando se trata de paranormais a menos que seja tudo criado em tempo real, não concorda?
– Você é um bosta, Gray. É isso que você é.
Ia me preparando para terminar minha visita. Mesmo que a delegacia de subúrbio de Dunat Town fosse pequena e pacata ainda havia regras de visitação.
– Espere! Só mais uma coisa, senhor "tenente Dotson": gostaria de frisar, mesmo: er... Como eu digo isso sem parecer arrogante? É sério: não pense com uma provocação, mas como um aviso. Um aviso de amigo. Somos amigos, certo? Amigos compartilhando um interesse.
– Desembuche.
Gray respondeu pausadamente:
– Não estrague o encontro dessa vez se possível, tenente... Pode ser o último que consigo interceptar.
Cerrei a porta e fiz o sinal para o guardinha que estava cuidando de tudo antes de sair da delegacia.
Uma vez fora do recinto senti vontade de fumar de novo, mas me controlei.
Podia jurar que Gray alterou o tom de voz para algo mais intimidador no final. Um 'conselho', hm? E ele não fez a piadinha desagradável do "senhor tenente Dotson", ao invés me chamou só pelo título.
Estaria ele fazendo mesmo tudo isso apenas para conseguir uma porcaria de uma condicional?
Tá... É indubitável que uma criatura como Gray não seja flor que se cheire. Não adiantava queimar neurônios com isso agora.
O próximo passo era tratar de Flinn Parker e daquele tal de Hamasashi.
A hora da caça estava para começar.
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