• DESTRUA TUDO POR ELA • [cap. 12]
Desde criança, eu sabia que minha vida seria ditada por outras pessoas. Essa é a ordem natural dentro da Máfia. Nos últimos anos, porém, com sangue em minhas mãos, consegui moldar a vida que foi entregue a mim. Para honrar os meus pais, em lealdade aos meus iguais, por devoção a ela...
Eu nasci na vingança e por conta disso, morreria. Eu só não sabia que a dor em vida seria tão grande. Eu só não sabia que vinga-los seria como costurar uma bala em meu peito.
Algo havia mudado e isso não era sobre retaliação. Era sobre tortura, dia após dia. Era sobre não saber o que aconteceria. E mesmo já tendo punido tantas pessoas, de tantas maneiras, o meu ódio não equivale a angustia que eu carregava aqui dentro. Por que algo havia mudado para que Leonel a trancasse dentro de casa, eu só não sabia o porquê.
Eu me perguntava quantos dias eram precisos pra deixar um homem louco. Aparentemente, quarenta e quatro eram o suficiente para mim. Aqui estava eu, no depósito de um restaurante, com uma garrafa de uísque e um copo, esperando.
Os passos vindos do lado de fora da porta de aço me fazem ficar em alerta. É um risco, um suicídio, mas eu não sairia daqui até que obtivesse minhas respostas. Os saltos altos de Gianne ressoam pelo corredor escuro enquanto ela praticamente corre até onde estou, seu vestido vermelho fazendo sua entrada ainda mais dramática.
Giovanni está bem atrás dela, nos trancando no depósito para que ninguém possa nos ouvir, a porta de aço sendo empurrada com força.
— Merda, merda, merda!
Ele tritura o cigarro na boca enquanto ressoa a mesma palavra uma e outra vez.
— Esse velho doente de merda mentiu pra nós! – Gianne dispara contra seu irmão, suas mãos para o alto – Eu fudidamente te disse aquele dia, que ele não se importava com ela. Eu te disse!
— Isso não é minha maldita culpa – ele aponta pra irmã, sem pena – Trazer aquele imbecil para cá? Nem você podia prever isso!
— Calem a porra da boca... – meus olhos voam de um para o outro – E comecem a falar. Agora!
Eu sei que não posso ameaça-los, mas se o tom da minha voz indica algo é que minha paciência está há segundos de escapar.
— Gianne, fale.
Giovanni joga fora seu cigarro, pega outro da carteira e acende. É só um de seus vícios, uma das maneiras que ele encontrou para controlar seus demônios. Sua irmã, ao contrário, tem a mão cerrada, os dedos trêmulos tentando com toda força não se descontrolar na minha frente.
— Fale! – eu a aviso, só mais uma vez.
— Ele trouxe Cássio Mancini pra cá, aquele filho da puta doente... – seus dedos tremem enquanto apontam para porta – Para nosso restaurante. Depois de tudo o que ele fez com Cristina... – sua cabeça balança em negação - E nos apresentou como seu futuro genro!
Seus olhos estão fixos em mim, tão vermelhos de sangue, que reconheço nela vestígios da mulher que todos temem.
— Toda aquela ladainha de protegê-la contra as ameaças da milícia, depois da morte de Carmelo? Uma mentira de merda! Ele estava apenas nos distraindo, tomando vantagem sobre nós... Ele vai casar Luna com aquele fodido, por nada!
Algo estrala a minha esquerda e quando olho para Giovanni, ele está encarando minha mão.
— Droga, Enzo!... – ele aponta para mim.
Há cacos espalhados pelo chão e sangue escorrendo do que restou do copo. Não perco tempo, pego o lenço do bolso e enrolo sobre minha mão, mal me importando com o vidro que rasga.
— De novo. Do começo. Com a porra dos detalhes – rosno entre os dentes.
As mãos de Giovanni se atrapalham com o cigarro, gesticulando entre um trago e outro, quando dá sua versão:
— Ele nos pediu essa reunião, ok? Disse para Gianne que Luna estava se sentindo sozinha depois de ficar tantos dias trancada em casa... Toda essa merda que eu te falei por mensagem! Ele veio com Luna e não nos disse nada, só ficou ali esperando por alguém até que Cássio chegou. Você conhece meu pai... Ele nunca perde a cabeça, mas trazer Cássio para cá? A porra de um desrespeito! – ele mal consegue me olhar – Quando Ettore perguntou o que ele estava fazendo, Leonel só disse "algo que deveria ter feito há muito tempo" e anunciou que eles estavam noivos. Só assim!... Luna não sabia de porra nenhuma. Ela fugiu, correu da porra do restaurante sem dizer nada! Claro que Leonel foi atrás dela. Ele disse para Cássio que resolveria "o problema".
Ao menos, Giovanni tem a decência de parecer mortificado com o rumo da história.
— E não é só isso, Enzo – Gianne diz – Ela não está bem. Mal conseguiu olhar pra mim durante o jantar. Como se estivesse com vergonha, igual àquela vez na Mansão, só que pior. Eu disse a ela pra tentar ficar longe dele, mas você conhece Leonel melhor do que eu ou Giovanni... – ela cruza os braços e borra o batom com o dedão – Eu perdi o contato com minha fonte há dois dias, ele disse algo sobre "limpeza na casa", antes disso. Leonel deve ter se aproveitado que os funcionários estavam longe e encontrado uma maneira de puni-la. Ele anda batendo nela, de novo. Eu sei disso.
Tudo como eu havia previsto. Assim como eu tinha avisado. Eu tentei esperar o tempo certo para isso. O dia em que eu mataria Leonel e faria a Famiglia pagar o preço. Mas aqui estava eu, um rei sem coroa, sem tempo e com medo. Um desespero que eu não me permiti sentir antes, não depois de tantos anos.
Há medo nos olhos dos gêmeos também, parecem receosos. Eles sabem sobre o que isso se trata, quando eu previ o que aconteceria e mesmo assim foram contra.
— Ela correu para fora do restaurante e Leonel não a deteve. Por quê?
Eu os pergunto, lentamente.
— Ela disse não ao pedido e o enfrentou. Isso deve ter o surpreendido. Ela aproveitou e fugiu. – Gianne é categórica.
— Nenhum dos dois viu para onde ele a levou?! – eu espero realmente que essa não tenha sido a opção.
— Leonel a levou para casa. Eu chequei.
— Ettore?
— Lá em cima. Ele expulsou Cássio e agora está tentando reunir mais informações.
Olho para o chão. Os cacos espalhados se misturam com uísque arruinado e o vermelho do sangue. Não o suficiente. Se alguém no passado me impediu de cumprir o meu destino, nada me impedirá de tirá-la daquela casa. Não mais.
— Reúna os homens, todos eles – o sangue segue escasso no chão – Eu não me importo que eu ainda não tenha total apoio dos Amatto ou dos Santoro. Eu não dou uma merda sobre isso – e para se ter mais sangue, é preciso quebrar mais vidros – Diga a eles que se não estão comigo, eles estão contra mim. E qualquer um que ficar em meu caminho, irá pagar... Pela minha vida, pela Famiglia, pelo que fizeram a Dante De Santis, eu juro.
Tiro minha atenção do meu sapato sobre o vidro triturado e olho para aqueles que me juraram lealdade. Os gêmeos me encaram de volta:
— Há algo que vocês gostariam de acrescentar?
Minha voz é tão monótona como antes, mas seus olhos me vigiam com admiração e medo. Eu os deixei me guiar uma vez, não mais. Nunca mais.
— Não – Gianne é resoluta.
Giovanni também está acenando em concordância, quando um toque baixo vibra em seu peito. A tela do celular pisca branco e preto quando tira do terno, assim que ele me mostra, vejo o nome "Spettro".
— Atenda – dou permissão.
Giovanni entrega o celular para sua irmã.
— Aconteceu algo?
O silêncio reverbera dentro do depósito. Gianne escuta seu soldado relatar tudo o que está se passando na Mansão. Quando ela desliga sem respondê-lo, sei que algo ruim aconteceu.
— Leonel ameaçou Luna com uma faca, dispensou todos os funcionários e a trancou dentro da biblioteca. Nicola ficou de guarda.
Gianne não me vê chegando. Meus dedos apertam quando agarro a mão dela e aponto para o celular que segura. Isso a assusta, Giovanni se aproxima. Eu o olho em aviso, meu aceno breve como meu único sinal. Não.se.atreva!
— Diga ao seu soldado para intervir. Se for preciso matar Nicola e Leonel, faça.
Há desespero em seus olhos também e sei que não é por minha conta. É por Luna.
Ela se solta e seus dedos correm para digitar uma mensagem no celular, me obedecendo. As palavras ainda cantam uma música mórbida em minha cabeça. Ele ameaçou Luna, a trancou dentro da biblioteca. Estou me descontrolando e não posso. Não posso. Não posso. Não posso!
— Vincenzo... – Giovanni me chama.
O pano em minha mão está ensopado, sangue escorre por meu pulso. Sangue, há tanto sangue.
— AAAAANH! – soco a parede mais próxima, meus dedos se curvam dentro da palma.
Dor é a única coisa que me traz de volta.
Como se previsse minha reação, encontro Giovanni esperando quando me viro.
— Reúna os homens, hoje à noite, agora! O máximo que conseguir – tiro a chave do bolso e entrego a ele – Traga o carro.
Saiu do depósito com os gêmeos me seguindo.
O escuro corredor é a única testemunha, além de nós, que sabe o que está por vir.
Hoje será o dia que cumprirei minhas promessas.
Hoje será o dia que irei matar Leonel De Santis.
As luzes dos postes piscam na rua vazia.
Não tenho homens o suficiente, nem tempo.
Que se foda essa porra!
Tive que deixar Ettore para trás.
Não posso queimar essa ponta, ainda precisarei dele no futuro.
E essa é uma vingança que pertence a apenas um homem.
Hoje à noite, me torno rei.
Hoje à noite, irei salvar a única mulher que já amei.
— A rede? – pergunto a Giovanni.
— Fora.
— Spettro?
— Nenhuma resposta – Gianne fala, bem atrás de mim.
Estamos em uma parte remota da mata que dá para Mansão. Já estive aqui incontáveis vezes, à espreita, estudando a melhor entrada para invadir. Claro, há câmeras e alarmes por todas as partes e apenas cinco minutos até que os geradores voltem à vida.
A única saída era o soldado de Gianne, mas por sua falta de respostas, ele deve estar ocupado estrangulando Nicola.
— Luca? – o meu celular chia através da linha – Faça.
Não os vejo a essa distância. Nenhum som por entre as folhas. Quando o celular chia de volta é com a resposta:
— Feito!
Corremos uma pequena distância para cerca atrás do jardim do fundo. Não houve tempo pra troca de roupas. O terno ainda puxa quando posiciono minha colt. Giovanni pisoteia a grama bem atrás de mim com sua HK, ao seu lado está Gianne, uma pistola semiautomática em suas mãos. A mulher ainda usa seu vestido vermelho e botas, como a porra de uma lunática. Nem seu irmão conseguiu dissuadi-la de vir.
Há dois homens caídos perto da cerca assim que chegamos, mais um morto ao lado da entrada da casa. Todos com um tiro na cabeça.
— Foda-se! – Gianne sufoca ao meu lado.
Quando sigo o seu olhar, encontro um espaço vazio onde devia estar a estufa de Luna. A madeira queimada no chão é o único rastro de que um dia ela esteve lá. O filho da puta... Esse filho da puta destruiu a estufa, queimou as colunas. Destroçou qualquer lembrança que Luna poderia se agarrar.
Com dois "tcs, tcs" chamo sua atenção.
— Fo.co! – sussurro.
A parede do fundo é forrada de vidros, posso ver a cozinha daqui. Perto do arco que dá para sala, há outro homem caído, sua garganta cortada forrou o chão de sangue. Esse definitivamente não foi trabalho dos meus homens.
Aceno para Giovanni, que destrava a porta sem dificuldades.
— Graças a Deus!
Gianne sussurra para ninguém, agradecida por seu soldado ter conseguido realizar a tarefa. Ela contorna o corpo que está esparramado pelo chão da cozinha e passa para sala, fazendo a varredura habitual. Eu? Não tenho tempo pra essa merda!
"Droga!" ouço Giovanni sussurrar um pouco atrás. Assim que entro na sala de estar encontro Domenico ali, os olhos injetados de sangue, forçando o barbante sobre a jugular de Nicola, as mãos dele presas nos antebraços de seu ceifador. O estrangular da sua voz é o único som que vem deles. Nicola se debate, seu corpo grande depositado no chão, sem força. Os olhos de Domenico me encaram, seu queixo flexionado quase rasga com a força, agachado por detrás de sua vítima. Spettro está marcando Nicola, um aviso para outros que um dia tentarem.
Passam-se segundos, até que a vida se esvai do corpo...
— AAAAAAAAAAAAAAAAAAAH!
O grito que vem da biblioteca me puxa de volta. É a sua voz, eu reconheço. É ela quem está gritando! Corro até ali quando me vejo chutando a porta de madeira. Ela não cede. Uma. duas vezes. Atiro na porra da maçaneta até que ela cai.
Eu a chuto, a porta da biblioteca se abre. Esse fudido irá...
Sangue. Há tanto sangue. Perto da mesa, sobre a quina e as gavetas.
Há sangue sobre a cortina bege, respingado sobre os livros da estante.
Na pele clara de suas mãos, com gotas molhadas sobre sua face.
O atiçador pontudo da lareira pinga sobre o porcelanato claro, ao lado do corpo morto que jaza no chão.
Luna está ali, seus olhos mornos molhados de lágrimas não derramadas.
Não sei o que fazer. Nem ao menos esperava que isso fosse uma possibilidade.
Eu planejei toda minha vida para chegar até esse momento. O momento em que vingaria meus pais, vingaria Luna e a mim. O momento em que mataria Leonel De Santis e tomaria o que era meu.
Nada disso aconteceu.
Há um corpo morto no chão, com olhos enrugados e abertos encarando o teto forrado, uma arma em uma de suas mãos.
Há um corpo no chão, do homem que eu deveria ter matado... Mas não matei.
Foi ela, Luna o fez.
Ela está paralisada, em choque, olhando suas mãos cheias de sangue, como se não acreditasse que elas fossem capazes de tal ato. Todo seu corpo treme. Ela parece tão pequena daqui. A mesma menina que eu costumava consolar. A mesma menina que jurei salvar.
— Luna... – eu sussurro com medo que ela possa quebrar.
Quando Luna me olha, algo se desconecta em sua expressão. Parece alívio em seus olhos, porém, eu reconheço algo há mais por trás deles. Já o vi tantas vezes no espelho. Por trás do alívio e do medo, há o desespero e ele está gritando para sair. Não posso deixar isso acontecer.
Dou um passo em sua direção, lento. Ouço uma respiração engatar atrás de mim, provavelmente Gianne.
Luna desvia sua atenção para as pessoas atrás de mim. Isso só a faz piorar. Aproveito o momento e largo minha arma sobre a quina da mesa. Só assim, tenho sua atenção. Ou quase isso. Seus olhos estão treinados na arma. Sua respiração engata. Não, não, merda!
— Olhos em mim – sussurro de novo – Olhos em mim, Luna.
Ela olha dessa vez, realmente olha. Vejo em seu rosto o momento em que me reconhece. Sua pupila dilata, sua respiração para. Um segundo depois, seu corpo está caindo, seus olhos fechados. Merda! Corro até ela e a pego a tempo, antes de cair sobre todo o sangue de seu pai.
Sem esforço, a pego no colo. O sangue na barra do vestido se junta ao que está debaixo do meu sapato, os pingos no tecido se juntam ao meu próprio sangue na palma da minha mão rasgada.
Assim que me viro, encontro todos os olhos em mim.
Nada disso importa. Merda nenhuma disso uma vez importou. Um vazio estranho se aloja em meu estômago, a bala costurada em meu peito sendo torcida.
Eu falhei com todos, falhei com todos eles.
Pior. Eu falhei com Luna, minha pequena Luna.
— O que fazemos agora, Don? – ouço Luca me perguntar, reverência em sua voz.
O que eu deveria ter feito há muito tempo.
— Queimem a casa, não deixem nenhum vestígio.
Luna pesa em meus braços quando Giovanni me para.
— Os documentos?...
— Faça o que for preciso. Mas até o amanhecer, queimem tudo.
Não há incertezas em minhas palavras. Confio suficiente neles para saber que irão cumprir com seu dever.
Meus olhos ainda presos em Luna, enquanto a levo até o carro.
O que eu fiz a você, Luna?
— Para onde vai leva-la?
Sinto a presença de Gianne ao meu lado.
— Para Pietro. Ele já sabe.
Eu a levo até o meu carro, com Gianne abrindo a minha porta. Ela deve ter pegado a chave com o irmão. Nada é dito entre nós quando me sento no banco traseiro com Luna em meu colo e Gianne atrás do volante.
O silêncio se estala quando mais uma vez faço uma promessa a ela.
Eu farei tudo por você, Luna. Tudo.
Hey, mafiosxs! Capítulo 12 postado com sucesso! Esse dia chegou! O dia em que Vincenzo se vingou de Leonel De Santis. Ou quase isso. Quero a opinião sincera de vocês, o que acharam do capítulo? Tudo o que queriam, bem diferente do que imaginaram ou as duas opções anteriores? Me contem!! A opinião de vocês é muito importante pra mim!
E se preparem, que agora sim o livro começa e FINALMENTE vamos ver a relação de Vincenzo e Luna se desenvolver. Pro bem ou pro mal, a vingança só começou... UAHAHAHAHA (risada maléfica).
Enão se esqueçam: deixe sua estrelinha, adicione Hereditário na sua biblioteca eme segue no wattpad! Até a próxima!
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