Mice por Billie Marten
Tyler ficou parado por um instante, impressionado, antes de romper o silêncio com aplausos discretos. Seus olhos brilhavam, não só pela surpresa, mas também por uma espécie de admiração quase reverente pela habilidade da garota. As notas da música que ela tocara ainda flutuavam no ar, impregnadas de uma profundidade que ele não esperava presenciar em um estúdio quase vazio.
Foi então que a reconheceu. A garota que Christian Sacco havia tentado conversar na competição de guitarra. A mesma que, com uma frieza desconcertante, dera as costas para Sacco, alegando estar ocupada demais para conversar. Agora, ali estava ela, tão imersa na música que não parecia pertencer ao mesmo mundo de quem a observava.
Quando seus aplausos ecoaram na sala, ela se virou bruscamente, como um rato acuado que percebe que foi visto. O susto em seu rosto era evidente, seus olhos arregalados buscando o intruso. Ela não esperava ser observada e, claramente, isso a desconcertava.
Tyler tentou suavizar a situação, com um sorriso amigável, levantando as mãos em um gesto de desculpa.
- Desculpa, eu... Só estava procurando meu amigo, Tobby. Ele sempre fica por aqui no estúdio, e eu pensei que ele estivesse... - A voz dele tentava soar casual, quase descontraída, mas a tensão no ar não cedia.
Ela continuou a olhá-lo, avaliando-o rapidamente. Seu olhar era duro, desconfiado.
- Desde que cheguei, só eu estava aqui - Disse ela, sua voz fria, cortante, mas sem hostilidade direta, apenas distanciamento.
Tyler, tentando romper o gelo, deu um passo à frente e estendeu a mão.
- Sou Tyler, aliás...
Ela olhou para a mão dele por um segundo, sem intenção de retribuir o gesto. Seu silêncio era mais eloquente que qualquer palavra. Ignorando a tentativa de apresentação, abaixou-se para pegar seu material que começava a sair da bolsa, ajeitando rapidamente os cadernos com uma precisão quase mecânica.
- Tenho que ir. - Disse ela de forma seca, evitando qualquer contato visual. E com um movimento rápido, passou por Tyler em direção à saída, deixando no ar aquela sensação de distância impenetrável. Ele ficou parado por um momento, sentindo-se completamente desconhecido para ela, mesmo tendo acabado de testemunhar algo tão pessoal em sua música.
Ainda um pouco abalado pelo que havia presenciado no estúdio, Tyler sentiu o peso do silêncio ao seu redor e, sem muito ânimo, puxou o celular do bolso. Ele tentou ligar para Tobby, mas a chamada foi direto para o correio de voz. Poucos segundos depois, recebeu uma mensagem: "Tô em aula." Tyler soltou um suspiro de frustração. Claro, Tobby estava ocupado. Sempre estava.
Logan também não estava disponível, tinha mencionado que precisava passar o dia com os avós, que o criaram desde que ele era pequeno e esse sempre era o seu motivo de nunca cancelar com eles. Isso deixava apenas Tyler e Mathew para o ensaio. Só os dois. E isso o incomodava profundamente. A disputa de bandas estava a apenas 13 dias de distância, e cada minuto contava. Eles precisavam ensaiar sem parar, até seus dedos sangrarem se fosse necessário. Não havia espaço para distrações, para falta de foco — o tempo estava se esgotando.
Mas, para ser honesto consigo mesmo, Tyler também não estava exatamente "disponível" naquele momento. Ele só queria matar sua aula eletiva de cinema. A simples ideia de sentar naquela sala, ouvindo o professor entediante falar de algo que não tinha a menor relevância para ele, parecia insuportável. Mesmo agora, depois de toda aquela interação desconcertante com a garota no estúdio, a aula de cinema ainda parecia a pior das opções.
Ele guardou o celular de volta no bolso, subitamente decidindo que, entre ir para casa e voltar para a aula, o menos entediante, no final das contas, era encarar aquela aula.
Tyler começou a subir as escadas do corredor acima do auditório, os passos ressoando no chão de mármore. O peso da competição de bandas e as preocupações com os ensaios o acompanhavam, como uma sombra. Mas, naquele momento, tudo o que podia fazer era seguir em frente.
Entrou na sala de cinema com passos arrastados, sentindo o peso da rotina e a monotonia de mais uma aula que ele sabia que o entediaria profundamente. Se jogou na cadeira de sempre, no mesmo canto, abaixando a cabeça e fechando os olhos, como se aquilo pudesse afastar o inevitável. O professor já estava na frente da sala, ajustando o slide que, sem dúvida, seria uma verdadeira ferramenta de tortura. A sala escura, com o zumbido baixo do projetor, só tornava mais fácil a tentação de cochilar.
De repente, ele ouviu o som familiar de uma cadeira sendo puxada ao seu lado. "Ótimo, mais uma vez alguém não consegue se sentar sozinho", pensou, virando a cabeça apenas o suficiente para espiar discretamente pelo canto dos olhos. E então ele a viu. A bolsa, a mesma que a garota havia pegado do chão mais cedo, agora repousava ao lado da cadeira. Ele arregalou os olhos, o coração saltando no peito. "Não, não pode ser..."
Era ela. A garota iceberg. A tensão tomou conta de seu corpo enquanto ele rapidamente afundava o rosto entre os braços sobre a mesa. "Que sorte a minha", pensou, com um misto de incredulidade e desespero. Se ela percebesse que era ele ali ao lado, sem dúvida sairia correndo antes mesmo que o professor Kou começasse a aula.
Ele tentou respirar fundo, mas o desconforto de estar tão perto dela, depois da estranha interação no estúdio, tornava isso quase impossível. Sabia que, se ela o reconhecesse, a chance de alguma conversa ou interação amigável era praticamente nula. Tyler só queria sobreviver à aula sem ser notado, mas com a querida iceberg tão perto, tudo parecia mais complicado.
Quando Kou finalmente começou a falar, a sala se acalmou e a atenção se voltou para ele.
- Boa tarde, pessoal. - Começou Kou, sua voz suave e controlada. - Hoje vamos explorar um tema fundamental para entender o cinema: Cinema como Arte ou Entretenimento.
Ele fez uma pausa para observar as reações da turma. Alguns alunos pareciam já animados com o tema, enquanto outros estavam mais reservados. Kou prosseguiu, sua expressão envolta em uma aura de entusiasmo tranquilo.
- Vamos começar com uma questão simples, mas crucial: O que diferencia o cinema enquanto arte e enquanto entretenimento? Todos nós sabemos que o cinema pode ser uma forma poderosa de expressão artística, mas também pode simplesmente nos proporcionar um bom momento de diversão. Como conseguimos distinguir essas duas facetas?
Tyler se ergueu, ajeitando a postura e deixando o cabelo cair um pouco mais sobre seu rosto do que o normal, encostou as costas na cadeira e cruzou os braços, queria que sua imobilidade o deixasse invisível aos olhos da iceberg.
Kou caminhou lentamente pela frente da sala, passando um olhar atento sobre cada aluno.
- O cinema como arte é muitas vezes associado a uma busca por significado mais profundo, por um diálogo com o espectador que vai além do simples entretenimento. É uma forma de explorar temas complexos, de expressar emoções e ideias que podem ressoar muito além da tela. - Ele fez um gesto amplo com a mão, como se estivesse abraçando o conceito. - Por outro lado, o cinema como entretenimento busca engajar o público de forma imediata, oferecendo uma experiência que é, por vezes, mais leve, mais divertida ou até mesmo escapista. Filmes que nos fazem rir, chorar ou nos manter à beira do assento. Há uma habilidade enorme em criar tais experiências, mas a intenção é diferente da de um filme puramente artístico.
O professor parou e fez uma expressão ponderada.
- O que eu gostaria de discutir com vocês hoje é como essas duas abordagens podem coexistir, se é que podem. Será que um filme pode ser ambos: uma obra de arte e um entretenimento? Como os cineastas equilibram essas intenções em suas obras? E o mais importante, como isso afeta a nossa experiência enquanto espectadores?
Ele sorriu e fez um gesto convidativo para a turma.
- Vamos começar com uma discussão. Quero ouvir suas opiniões, exemplos de filmes que vocês acham que exemplificam essas duas facetas e como cada um de vocês interpreta o equilíbrio entre arte e entretenimento no cinema.
Tyler, embora não estivesse particularmente empolgado, sentiu uma pequena centelha de interesse ao ver que iceberg anotava tudo com muito vigor. Talvez a aula não fosse tão entediante quanto imaginava. Ele preparou-se para participar da discussão, pensando nos filmes que tinha assistido e nas diferentes maneiras como eles poderiam se encaixar nesse debate.
A conversa começou a fluir, e com o tempo, Tyler percebeu que a aula estava se tornando um pouco mais interessante do que ele esperava.
Durante a aula, Kou Nakahara anunciou uma atividade de dupla para a turma. A proposta era interessante, mas Tyler sentiu uma onda de desconforto ao perceber que iceberg seria sua parceira.
- Para a atividade de hoje, quero que vocês trabalhem em duplas para analisar um filme que combine elementos de arte e entretenimento. Escolham um filme que represente bem essas duas facetas e preparem uma apresentação sobre como ele consegue equilibrar ou interligar esses aspectos. - Explicou Kou, sua voz preenchendo a sala com um tom enérgico.
Tyler olhou para a garota pela primeira vez e ao acenderem as luzes da sala, seus olhos se encontraram. Ele sentiu um peso no estômago, sabendo que a tarefa de interagir com ela não seria fácil, principalmente após o encontro tenso no estúdio.
Ela parecia igualmente desanimada, seu rosto se contorcendo em uma expressão de desagrado quando percebeu quem seria o seu parceiro.
- Você vai ser minha dupla. - Disse, tentando manter um tom amigável, apesar de seu próprio desconforto. Ela levantou os olhos lentamente, visivelmente incomodada.
- Ótimo. - Respondeu, a frieza em sua voz não deixava margem para dúvidas sobre o quanto estava feliz com a situação. Tyler tentou forçar um sorriso, só não entendia o porquê.
- Vamos então... Você tem algum filme em mente ou começamos do zero? - Iceberg suspirou, fechando o caderno e pegando seu material.
- Não, não tenho nenhum filme em mente. Se você tem alguma sugestão, por favor, diga.
Ele sentiu a tensão no ar e decidiu tentar ser o mais colaborativo possível.
- Eu estava pensando em algo como A Forma da Água. Ele tem uma mistura interessante de arte e entretenimento. O que acha? - Ela olhou para ele com uma expressão indecifrável, mas deu um leve aceno de concordância.
- Pode ser. Vamos assistir ao trailer do filme e ver se conseguimos encontrar algo para apresentar.
Ambos começaram a mexer em seus celulares. Tyler, ainda tentando quebrar o gelo, procurava evitar o silêncio.
- Então. - Começou, tentando manter uma conversa. - O que você achou de A Forma da Água? Alguma ideia inicial sobre como abordar o equilíbrio entre arte e entretenimento?
Ela olhou para ele com um olhar de surpresa, como se fosse inesperado que ele se importasse com sua opinião.
- Acho que podemos focar em como o filme usa a estética visual para criar uma experiência que é tanto emocional quanto acessível. O que você acha? - Tyler assentiu, sentindo-se um pouco mais aliviado ao ver que estava disposta a colaborar.
- Sim, isso parece uma boa abordagem. Podemos analisar como a direção de arte contribui para a narrativa e também explorar como o filme mantém o público engajado com elementos mais leves. - Iceberg deu um pequeno sorriso, ainda cautelosa, mas menos rígida.
- Perfeito. Vamos, cada um, anotar nossas ideias e depois debatemos.
A atividade começou a fluir mais suavemente à medida que ambos mergulhavam na análise do filme. A tensão inicial foi substituída por uma colaboração prática, e Tyler percebeu que, apesar das dificuldades, trabalhar com ela estava começando a ser um pouco mais tolerável e até produtivo.
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