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☾✧ ━━ Eu escolho com cuidado o que irá passar pelos meus olhos para que a minha alma não seja contaminada (Ohime) ━✧☽
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Universo: Faaliye (Quadrante 2)
Planeta: Azuma
País: Yeou
Data local: Èr, 06 Zack de 1503 do novo reinado Qiang (outono)
Data Universo Homines (Planeta Terra - Brasil): Quarta, 23 de outubro de 2014 (primavera)
No momento em que entrei na sala, senti como dois pares de olhos se voltaram para mim de uma só vez. Que engraçado, aquilo seria possível? Já conhecia essas pessoas? Suas luzes me pareciam tão familiares que chegava a ser um convite para me sentir à vontade.
— Por favor, entre, senhorita — disse, olhando para a luz de quem falava. Será que eu o conhecia? — Existe algo em que eu possa lhe ajudar?
Por um momento fiquei parada, olhando fascinada para aquelas luzes a minha frente me sentindo intrigada com a familiaridade delas. Passar por tantos universos faz com que fiquemos descuidados em determinados meios, olhar para aquelas duas luzes me fez esquecer completamente que naquele universo, os costumes eram muito diferentes do que na Terra ou Himura, onde eu estive recentemente. De repente, fui arrancada dos meus devaneios pela minha própria consciência e senti vergonha por meus modos inadequados. Aquela foi uma maneira terrível de começar em um novo lugar.
— Boa tarde, senhor — disse eu ao homem que acabara de se pronunciar — O meu nome é Beatrice. Venho para entregar uma mensagem do professor Yakumo.
— Ah, sim — ele respondeu com um tom levemente divertido na voz, o que me fez ficar ainda mais constrangida com o meu comportamento — muito bem. Eu sou Qiang Huang. Estava aguardando novas mensagens dele.
— Majestade — inclinei-me rapidamente assim que ele se apresentou, Yakumo que esperasse, ele iria se arrepender. Como pôde me enviar para entregar uma mensagem ao Imperador que dominava 90% daquele planeta sem me avisar? E não era um Imperador qualquer, era o Rei Milenar, uma figura lendária até mesmo em Himura — é uma honra imensa encontrá-lo, Majestade.
— Oh não, o prazer é todo meu — sua voz levemente divertida me fez olhar para sua luz novamente. Conseguia entender o que o professor Yakumo estava me falando sobre seu cliente, o Imperador era realmente agradável aos olhos, até mesmo para mim que não podia enxergar mais do que seu ruah — Quanto ao recado, você se importaria de entregá-lo ao meu conselheiro?
— Boa tarde, senhorita — uma luz que parecia fria e formal apareceu no meu campo de visão — Me chamo Syaoran, como a senhorita está? Se você me permite.
Fiquei paralisado, reconhecendo aquela luz; não podia estar enganado. O que antes eram apenas suspeitas, agora se confirmava até pela voz familiar. Mas de onde? De onde o conhecia?
— Eu acho que te conheço — falei esquecendo completamente meus modos enquanto ele pegava o pequeno envelope da minha mão — Oh, obrigada.
Senti como meu dedo roçava a palma da sua mão, sua mão fria como o gelo. Ele não era humano? Eu costumava conseguir diferenciar o ruah de um ser humano para de outro ser, mas as luzes na minha frente eram tão contidas e centradas que era realmente difícil definir isso.
— Senhorita? — ele pareceu me olhar esperando que eu soltasse o pequeno papel.
— Ah, desculpa... — meu coração estava acelerado, tudo aquilo me parecia extremamente improvável. Por que o professor me mandaria até o Imperador? — Aqui.
Chegava a ser notável como a luz fria do servo do Imperador me penetrava. O imperador e seu servo não poderiam ser menos parecidos, isso estava claro. Ouvi o envelope sendo aberto por Syaoran e um suspiro vindo dele.
— Creio que é só isso — inclinei-me diante do Imperador à minha frente, o desejo de desaparecer da presença deles era avassalador, e a sensação opressiva de conhecê-los me enchia de ansiedade — Com licença, Majestade, senhor...
— Espere, senhorita — Syaoran me chamou, antes que eu pudesse me virar para partir. Me sentia estranha ali, meu corpo estava tenso por inteiro, e estava certa de que haviam percebido como instintivamente me encolhi. Era terrivelmente desconfortável não compreender a razão de estar assim — Perdoe-me pela indelicadeza...
— Se irá ser indelicado com a senhorita, Syaoran — o Imperador o interrompeu — Talvez seja melhor guardar as suas palavras.
— Sinto muito, Majestade — Syaoran falou com sua voz quase monótona — mas é algo que necessito saber. Por que a senhorita usa essa faixa nos olhos?
— Faixa? — por um momento o Imperador pareceu estar surpreso. Será que ele não notou a faixa em meu rosto? Impossível, era o primeiro que todos notavam no fim das contas. Talvez ele não tivesse dirigido de fato o olhar para mim até aquele momento? Me parecia uma explicação plausível, afinal, ele era o Imperador e não tinha motivos para olhar para alguma pessoa aleatória que chegou ali apenas para entregar um recado.
— Ah — apesar de estranhar a dúvida na voz do Imperador, eu consegui suspirar aliviada, era apenas isso que ele queria saber — Talvez dizer que eu sou cega não seria o suficiente para o senhor, já que com todo o cuidado fez essa observação excluindo a minha resposta mais óbvia, então permita-me divagar um pouco para responder. Dizem que os olhos são as janelas da alma... Dizem que se o seu olhar for bom, todo o seu corpo será repleto de luz. Prefiro que através dos meus olhos apenas essa luz seja visível. Eu escolho com cuidado o que irá passar pelos meus olhos para que a minha alma não seja contaminada.
— Está dizendo que enxerga essas luzes? — o Imperador me perguntou parecendo me estudar.
— Majestade, permita-me deixar essa resposta em aberto. Pode ser isso, como posso simplesmente ser uma cega sonhadora.
O silêncio caiu sobre o ambiente, eu não havia mentido, mas também não tinha falado a verdade, eles sabiam disso. Não sei o que me impulsionou a não mentir para eles da maneira que seria melhor, mas algo dentro de mim simplesmente me compeliu a dizer uma meia verdade. O clima ficou estranho e quando eu estava prestes a me despedir novamente, o Imperador voltou a falar.
— Oh, ainda não lhe ofereci chá. Que terrível falta de educação da minha parte. Syaoran, por favor, peça à Ah-Kum que traga um pouco de chá para a senhorita. Venha, por favor, sente-se.
Será que seria muito rude recusar? Eu queria simplesmente correr. Pensei nessa possibilidade, mas a descartei ao lembrar que eu poderia manchar a imagem do professor fazendo isso, então apenas sorri e aceitei o suposto "convite".
— Muito bem, Majestade — disse Syaoran, saindo às pressas e retornando em menos de dois minutos, um período marcado por um silêncio total.
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Após a chegada de Syaoran, não demorou para que uma senhora atravessasse a porta trazendo o chá. Senti seus olhos me perfurando e sua luz ganhando tanta intensidade que por um momento achei que ela me atacaria.
— O que você está fazendo aqui? — a pergunta dela soou ríspida, mas por mais que eu a olhasse, eu não a reconhecia e muito menos entendia sua raiva repentina.
— Perdão? — me dirigi confusa a ela — Do que a senhora está falando?
— Você não lembra?
— De que não me lembro? — me esforcei para recordar algo, mas como de costume, nada me veio à mente.
— O que está fazendo aqui? — ela perguntou de novo, dessa vez vários tons acima — Por que voltou?
— Senhora, não me lembro de ter estado aqui antes, então por favor, poderia me esclarecer? — senti o corpo tremer um pouco. Não poderia ser coincidência a luz dos dois serem tão familiares depois disso.
— Senhora Ah-Kum — o Imperador a chamou com a voz um pouco severa — Posso saber o porquê está tratando assim a minha convidada? Se a conhece ou tem algo a dizer, eu gostaria de saber.
— Peço perdão, majestade. Deve ter ocorrido um engano — disse ela, entregando a bandeja de chá para Syaoran e se retirando às pressas, numa evidente tentativa de escapar. Ela não estava enganada; ela me reconheceu e eu precisava descobrir a verdade. Yakumo certamente teria muitas explicações para dar quando nos víssemos novamente.
— Sinto muito por isso, senhorita — o Imperador se virou novamente para mim — A senhorita está bem?
— Estou bem — menti, eu estava ansiosa e tensa — não se preocupe com isso, Majestade. Talvez isso seja apenas por eu ter uma aparência comum.
Eu não sabia na verdade, não sabia minha verdadeira aparência, mas torci para que eles apenas acreditassem naquilo.
Assim que senti a xícara de chá nas mãos, eu acabei relaxando um pouco. Deixei meus dedos estudarem os detalhes da porcelana fina que eu estava sustentando, sem dúvidas havia sido importada de algum lugar distante.
— Muito obrigada, senhor — agradeci me permitindo desfrutar do aroma doce e suave da bebida quente em minhas mãos, até o chá tinha cheiro de bebida cara. Deixei que minhas memórias voltassem para um passado distante, onde eu podia desfrutar da companhia de pessoas importantes sem me preocupar com o que iria comer no dia seguinte.
— É uma pena que a senhorita não possa ver os detalhes do artesanato em suas mãos — a luz do Imperador ficou mais receptiva de repente, como se estivesse querendo me avaliar. Não pude evitar sorrir com a sua provocação barata — Eu estaria certo de que apreciaria a maneira impecável das pinturas de tal objeto.
Ah, então ele iria me medir daquela maneira... resolvi seguir o jogo que ele começou, mas me perguntei por que um Imperador se dignaria a ter tais assuntos com alguém de tão baixo valor quanto eu. Qualquer que fosse o motivo, ele conseguiu me fazer arriscar um pouco mais dos meus conhecimentos. Passei novamente os dedos pela porcelana e notei como ela era bem trabalhada, alguns desenhos em alto relevo estavam destacados no decorrer da xícara, lentamente passei meus dedos por figuras que pareciam flores... tentei com um pouco de dificuldade definir que tipo de flores que estavam desenhadas, mas não fui capaz, eu chutaria que eram Glicínias. Estudei mais um pouco a xícara nas minhas mãos, procurando por mais detalhes que me pudessem dar alguma pista sobre aquele objeto e pouco mais abaixo das flores, encontrei algo escrito em hanzi.
— Preciso confessar, majestade — disse com formalidade — que é uma lástima não poder observar visualmente esta obra, contudo, pelo tato, percebo que a porcelana que tenho em mãos apresenta detalhes em alto relevo, sugerindo que não se trata de uma peça antiga, embora isso não diminua seu valor. Considerando este aspecto e as tendências dos últimos tempos, arriscaria dizer que esta peça foi produzida aqui em Yeou, e não em um local remoto como supus inicialmente, visto que possui uma assinatura em relevo com caracteres locais. Posso estar equivocada quanto aos padrões da realeza, mas suspeito que contenha desenhos de Glicínias ou outra flor oriental, possivelmente em azul, seguindo a tradição das porcelanas brancas e azuis, mas com o charme de um item mais contemporâneo.
— De fato — ele pareceu satisfeito — devo recordar-me de não a subestimar uma próxima vez. Eu me considero uma pessoa de sorte, pois tenho alguém que traz coisas maravilhosas para a minha vida, além de pessoas muito intrigantes também.
— Não me considero digna de estar na presença de um senhor tão nobre, Majestade. Talvez não tenhamos outra ocasião, mas sou grata por esta oportunidade. Permita-me indagar, quem é o ilustre cavalheiro que lhe apresenta tantas novidades?
— O professor Yakumo, certamente — a voz do Imperador preencheu os meus ouvidos como uma bonita melodia e tudo o que eu queria era que ele seguisse falando, mas citar o professor Yakumo de repente me fez voltar para a realidade — Que carreira admirável ele deve ter, trazendo artefatos tão admiráveis e pessoas tão incríveis para dentro do meu palácio.
Senti meu rosto corar com seu elogio oculto e torci para que ele não notasse. Até mesmo sentir vergonha era algo novo para mim, ou talvez não fosse novo, e sim nostálgico.
— Obrigada, senhor. Yakumo certamente ficará feliz em ouvir isso.
Bebi meu chá, acanhada pela atenção especial que o Imperador me dedicava, embora relutasse em confessar minha felicidade. Ao terminar, percebi como o entorno começava a anoitecer e uma inquietação tomou conta de mim; já não era seguro permanecer na rua, a noite representava um perigo para mim.
— Desculpe-me, Majestade — disse, erguendo-me do sofá — temo que tenha me aproveitado excessivamente de sua generosidade. Peço perdão pelo transtorno. Acho que é hora de me retirar.
— Ah — ele pareceu um pouco decepcionado — sim. Perdoe-me por tê-la retido até tão tarde.
— Não há nada para perdoar, Majestade. Foi uma honra imensa estar na sua companhia. Obrigada e boa noite.
— Venha, senhorita — Syaoran me chamou enquanto se aproximava e somente naquele momento eu me lembrei que ele seguiu ali de pé o tempo inteiro — irei acompanhá-la até a porta.
Olhei por um período curto a luz do Imperador, tentando memorizar aquele momento agradável que tive e segui Syaoran para fora do ambiente.
— Precisa da carruagem até o local onde está instalada, senhorita? — ele me perguntou já do lado de fora da sala.
— Agradeço o cuidado, mas não será necessário — lhe ofereci um último sorriso e me despedi finalmente.
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Aquilo era estranho, eu tinha a sensação de conhecê-la e após o comportamento estranho da senhora Ah-Kum eu não podia levar essa sensação como uma simples coincidência, a questão era, de onde eu a conhecia? Sua luz vermelha misturada com tantas sombras pretas mostrava o grande sofrimento que ela carregava na alma e no fim Syaoran confirmou que ela era um Hansha sem ao menos eu precisar perguntar. Por que Yakumo não havia me dito? Uma hansha, como eu... eu não conseguia acreditar naquilo, se ela era uma hansha, então... ela tinha saído de dentro do palácio? Quem era ela afinal? O que aquela jovem queria de mim?
Embora tivesse boas maneiras, era evidente que ela não havia sido criada ali; mesmo que pudesse pertencer àquele palácio, desconhecia claramente nossos costumes. A maneira como se sentou sem me esperar revelou sua estranheza ao lugar. Então, qual seria o motivo de ela ter vindo tão longe em busca de ajuda? Por que procurar assistência tão distante?
Fiquei divagando em pensamentos até me desviar por instinto de um ataque de espada. Busquei com os olhos a luz de quem me atacou.
— Onde ela está? — um homem com a voz grossa perguntou ao tentar me atacar de novo.
— Ela quem? — perguntei me desviando com facilidade.
Eu não tinha uma espada ali, mas aquela coisa não me parecia algo que eu não desse conta, e mesmo tendo essa certeza, ainda não me sentia inclinado a atacá-lo, não quando ele parecia saber de coisas que me interessavam.
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Observações:
HANZI: Os caracteres chineses ou caracteres Han são logogramas utilizados como sistema de escrita do chinês, japonês, coreano e outros idiomas, como por exemplo o dong. Foram usados na Coreia do Norte até 1949 e no Vietname até o século XVII.
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