21. You're Somebody Else
Do outro lado do vidro, a chuva caía sem dar descanso por um segundo sequer para os apressados que corriam pelas ruas de Nova Iorque, se amaldiçoando por terem esquecido o guarda-chuva na mesa da sala ou em uma gaveta do armário do quarto.
Mas suas gotas pareciam ser mais interessantes do que qualquer coisa que Theodore Carter falava, há pelo menos vinte minutos em pé, junto com o resto da equipe que tinha ficado responsável pelo memorial de Eva Marlowe que acontecia na próxima semana. Ben sabia que as flores já tinham sido encomendadas porque essa tinha sido a única coisa que tinha escrito no caderno em sua frente, junto a vários riscos sem sentido que tinham perdido a graça depois dos primeiros cinco minutos.
Agora ele encarava a cidade cinza de Nova Iorque pelo vidro, com o queixo apoiado em uma das mãos e os olhos azuis fitando algo bem distante dali. As luzes dos prédios se refletindo, o som da viatura que chegava até o andar onde eles estavam, a buzina de um táxi apressado para chegar ao seu destino... Qualquer coisa que tivesse vida e, lembrasse a si mesmo, que o mundo não tinha parado.
— E esse é o exato momento que eu demito você por justa causa, Benjamin Elliot — Theo aumentou a voz e, se não fosse por isso, iria continuar sem a atenção do homem que estava sentado na outra ponta da mesa de madeira. — Nós podemos continuar essa reunião outra hora? Eu meio que preciso dele e nós podemos ver que esse não é um bom momento.
Theo falava com o restante da equipe e, um minuto depois, a sala já estava vazia. Ben juntou as poucas coisas que tinha trazido para a mesa para que pudesse voltar para sua própria sala, não esperando que o outro homem ali não tivesse pressa nenhuma para deixá-lo sozinho.
— Você ainda vai continuar fingindo que a janela é mais interessante que qualquer outra coisa no mundo? — Theo questionou, cruzando os braços. — Sério, Ben? Eu sei que o timing é uma merda, o memorial, a confusão com os jornais, Sky... Mas você não pode me deixar sozinho nessa.
Ele falava com propriedade, porque tinha sido para seu apartamento que o inglês tinha ido assim que tinha deixado o de Sky. Ainda parou no meio da sala dela quando ouviu algo se chocar com a parede, mas não olhou para trás quando o silêncio voltou a se fazer presente.
Ben nunca foi uma pessoa de muitas palavras, mas elas não foram tão necessárias pelo estado que ele chegou no apartamento de Theodore. Ele sabia que algo não tinha saído como o planejado no momento que colocou os olhos no homem e teve a confirmação quando eles terminaram a noite junto com as últimas gotas de um Whisky importado e um Benjamin que só aparecia depois de seis ou sete copos.
O fato dela ter terminado com ele foi a última coisa que ele confessou, um pouco de apagar de vez no sofá de Carter e acordar no outro dia sentindo como tivesse voltado aos seus vinte e poucos anos, quando costumava curar a ressaca com mais um porre. Não necessariamente o que ocorreu, já que ele tinha uma reunião marcada do outro lado da cidade.
Praticamente não tinham se visto novamente nos outros três dias, até aquela reunião. E por mais de todas as mensagens que Theo mandava para garantir que ele estava bem, Ben continuava sóbrio e fechado para qualquer um que se atrevesse a perguntar.
— Tenho sido um sócio de merda nos últimos dias, uh? Sinto muito — Ben se desculpou, levando o olhar até o amigo. — Você está certo, mas eu só... Continuo voltando ao nosso último encontro, Theo. O que eu disse de errado? Ou o que eu não disse, para ela achar que estava tudo bem em jogar tudo para o alto e... Shit.
Passou a mão pelo rosto, deixando que um pequeno sorriso surgisse nos seus lábios. Deveria estar perdendo a sua sanidade, pensou. Ou isso aconteceria a qualquer momento, se ele continuasse refazendo diversas e diversas vezes o momento que a vira pela última vez. E a cada vez que fazia isso, parecia encontrar um detalhe fora do lugar, um gesto estranho, algo que ele poderia ter dito ou feito e não tinha...
O sentimento de que poderia ser diferente estava acabando com ele.
— Você não pode mudar o que aconteceu lá, mate — Theo aconselhou, relaxando suas feições. — E eu sei que pode ser um saco escutar isso, mas você deveria começar a olhar para frente. Uma oportunidade de conversar com ela ou uma forma de esquecer isso e seguir sua vida de vez...
Seguir sua vida.
Theo sabia que falar era inúmeras vezes mais fácil que fazer e por isso não estranhou o momento que Ben sorriu sem mostrar os dentes, negando.
Talvez ele ainda não estivesse pronto.
Mas quando estaria?
— Queria que fosse tão simples — sorriu tristemente em direção a Theo, dando de ombros em seguida. — Eu sei que não posso ficar pensando nisso, mas eu só queria ela comigo no memorial. Os anos se passam e as coisas não estão ficando mais fáceis sem minha mãe aqui. Eu só... não sei se vou conseguir fazer isso sozinho.
Theo assentiu, caminhando até estar perto o suficiente de Ben para apoiar a mão no seu ombro, apertando-o.
— Você vai conseguir, Benjamin — falou baixo, assentindo. — Eu te conheço o suficiente para saber que você vai conseguir.
Ben levantou os olhos azuis até os dos amigo, arrastando a cadeira que estava sentado para se levantar, abraçando Theo assim que se colocou de pé. O outro fez o mesmo, tentando passar a confiança que sabia que o inglês precisava naquele momento.
Alguém que o dissesse que as coisas dariam certo.
Sabia que não era exatamente dele que Ben queria ouvir, mas não havia muito a ser feito.
Não falaram mais nada e Ben se afastou, colocando o notebook fechado embaixo do braço e carregando o pequeno caderno nas mãos, oferecendo um pequeno sorriso na direção do amigo assim que passou por ele, indo em direção a sua sala.
Ben nunca tinha sido um expert em como lidar com a mágoa. Tinha prova disso desde quando era pequeno e, em um ataque de raiva, deixou o velório da sua mãe pela metade para se esconder na casa dos avós, a alguns quilômetros de distância de onde tudo tinha acontecido.
Mas o homem sabia dizer a hora certa de dar passos para trás quando entendia que uma porta fechada era uma porta fechada.
E naquele momento Skylar Howard se parecia como uma porta fechada. Um fim.
Seus olhos foram diretamente para o porta-retrato que estava em cima da sua mesa assim que ele se sentou na cadeira, juntando os dedos e apoiando o queixo em cima das mãos unidas. Lá estava eternizada a lembrança do que um dia eles foram. Ela sorridente com os braços no seu pescoço enquanto ele a abraçava pela cintura, rindo de algo que provavelmente tinha sido dito na hora da foto. Seus olhos brilhavam e ele sentia falta daquele sentimento que estava presente sempre que estava na companhia de Sky. Sentia falta do que um dia eles foram.
— Me dê um sinal que não desistiu de nós, Sky — falou baixinho, negando. — Só um sinal.
Foi a última coisa que ele fez antes de colocar o porta-retrato dentro da sua gaveta, tirando da sua visão aquela memória que era tão dolorosa para o momento.
Esperava por uma resposta que não sabia que um dia viria.
E, ainda mais, esperava que aquele não fosse o fim.
Não daquele jeito.
♢♢♢♢
Sky Howard se arrependeu de ter levantado da cama assim que empurrou a porta pesada de vidro da cafeteria em Manhattan.
Sabia que as pessoas não estavam gritando, mas essa foi a sensação que ela teve assim que entrou no ambiente, xingando baixinho por não ter tomado uma aspirina antes de deixar seu apartamento. Também escolheu por não retirar os óculos escuros que escondiam as olheiras da noite anterior, mesmo sabendo que eles não eram necessários naquele dia nublado e muito menos dentro do lugar.
Ainda assim, a iluminação era incômoda para alguém que tinha dormido pouco mais de três horas.
Qualquer pessoa que a observasse por mais de trinta segundos sabia que ela tinha tido uma noite agitada, com resquícios de batom nos seus lábios, os cabelos loiros que não tinham visto uma escova estavam presos em um rabo de cabelo no topo da sua cabeça e vestindo uma roupa de malhar como se sua próxima parada fosse o Central Park, mesmo que ela só tivesse saído de casa para curar a ressaca com o remédio mais forte que conseguia pensar: cafeína.
Um ano antes, Sky não costumava trocar uma boa festa por uma noite dentro de casa, fazendo o máximo para que todas as que ela fazia acabassem nas revistas ou, ao menos, nos Trend Topics do Twitter. Sua agenda era lotada de nomes conhecidos então apenas bastava uma ou duas mensagens para lotar o apartamento que ficava no Upper East Side.
Mas assim que ela conheceu Ben, esses planos pareceram ter sido deixados de lado. Ela sabia que não contaria com a presença do único homem que queria chamar atenção se fizesse o convite, então preferia encontros mais calmos e que não contasse com pessoas que não eram de sua confiança.
E a única vez que ela achou que isso podia dar certo eles acabaram expostos em todas as revistas de fofocas.
— Bom dia, Sky! — a atendente simpática a cumprimentou, fazendo-a sorrir enquanto massageava as têmporas. — O de sempre?
— Bom dia, Molly — leu no crachá da mulher e percebeu que o sorriso em seu rosto cresceu. — Por favor.
A mulher assentiu em concordância antes de dar as costas a ela, preparando o Cappuccino que ela não trocava por nenhum outro no mundo desde que tinha descoberto aquele lugar.
Ou melhor, desde que tinha sido apresentada a ele.
Abaixou seu olhar para o celular que estava em suas mãos, passando rapidamente por todas as notificações que lotavam a tela principal. Muitos comentavam sobre suas fotos da festa da noite anterior, algumas mensagem de números desconhecidos que ela não fazia ideia como haviam chegado até o seu e notificações de Gale e Mika aparecendo a cada cinco minutos, certificando-se que ela estava bem.
Bloqueou sem responder ninguém, suspirando pesadamente antes de jogar o celular na bolsa e cruzar os braços. Seria tão mais fácil fingir que sabia exatamente o que estava fazendo se ninguém ficasse na sua cola vinte e quatro horas por dia, perguntando se ela tinha certeza sobre suas últimas decisões.
Não, não tinha. E se fosse ser sincera, ouvir sua razão pela primeira vez se parecia a coisa mais patética da vida a se fazer.
Como ela pode acreditar que tudo voltaria exatamente a ser como era antes de Benjamin?
— Dez dólares — Molly voltou a falar assim que colocou o pedido de frente a Sky, que a entregou uma nota amassada que estava jogado em sua bolsa nas mãos da mulher, recebendo um sorriso como resposta. — Tenha um ótimo dia!
Sorriu, arrumando a bolsa no ombro e abaixando o olhar para pegar seu pedido, contando os segundos para estar de volta ao seu apartamento, ignorando todo mundo que tentava chegar a ela e todas as ligações que continuavam a ir direto a caixa postal.
Arrependeu-se assim que o fez.
Havia não apenas um, mas dois copos de café encaixados em um apoio de papel. Um com seu nome e o outro com "Billy" escrito com uma caligrafia corrida, como todas as outras vezes que ela passava para pegar café ali. Sorriu ao lembrar que o apelido tinha virado uma piada interna entre ela e Ben, usando-o sempre que precisava se referir a ele mas não queria que as pessoas ao seu redor a ligassem com o mais novo dos Marlowe.
Já tinha garantido aos dois no mínimo meia dúzia de risadas.
— Alguma coisa errada, Mrs. Sky? — a atendente falou ao notar que a loira ainda estava parada ali, fazendo-a negar veemente.
— Não, tudo como sempre.
Respondeu e não notou sua voz embargada até a primeira lágrima escorrer pelo canto dos seus olhos, fazendo-a limpar discretamente com um dos dedos enquanto sorria.
Tudo estava como sempre.
Mas sempre não era mais o mesmo.
— Obrigada Molly, tenha um ótimo dia de trabalho.
Não esperou a resposta, ajeitando seus óculos escuros e andando rapidamente em direção a saída, tomando o cuidado mínimo para não esbarrar em ninguém ou tropeçar nos próprios pés. Mas tudo parecia extremamente desgastante naquele momento e as suas lágrimas já não iam embora dos seus olhos escuros com tanta facilidade.
Tanto tempo dedicado às aulas de teatro para ela não conseguir, de jeito nenhum, disfarçar um coração partido.
E, o café que parecia ser o único remédio que seria suficiente para acabar com sua ressaca, se tornou o pesadelo que ela tentava evitar a todos os custos quando colocava a sua cabeça no travesseiro. As lembranças.
Refazia o mesmo caminho que já tinha feito outras cem vezes no último ano, mas dessa vez se lembrando de todas as vezes que ela não esteve sozinha. De quando Ben a esperava na porta, usando o moletom mais discreto, um boné ao contrário que nada combinava com seu estilo e, vez ou outra, um óculos escuros, enquanto ela ia em direção ao balcão fazer o pedido de sempre.
Voltavam sorrindo de mãos dadas, sem se preocupar com o fato de que alguém poderia ver porque já tinham entrado em um consenso que aquela cafeteria confortável, esquecida no meio dos prédios do Upper East Side era segura. Segura para eles não terem que se importar com nada que não fosse a companhia um do outro e as risadas altas que davam enquanto estavam juntos.
Já tinham dançado sem música naquela mesma calçada que se parecia extremamente sem graça quando Sky caminhava sozinha, conversado sobre política, os astros e os últimos episódios de 'Are You The One?', que a mulher via antes de dormir e Ben, que preferia um livro, dava rápidas olhadas antes dos dois caírem no sono.
Agora, aquele caminho nada mais era que cimento sem graça embaixo dos seus pés, caminhando rápido o suficiente para o líquido nos dois copos balançarem de um lado para o outro, enquanto ela se questionava o que faria com aquele café preto sem açúcar, que nenhuma pessoa do mundo além de Benjamin Elliot Marlowe parecia gostar.
Ele e seus gostos peculiares. Café preto sem açúcar, livros históricos, Animal Planet, documentários, golfe e a garota de ouro de Nova Iorque.
Apressou o passo para chegar logo em casa, abrindo o zíper do moletom que vestia por cima da roupa amassada de malhar antes mesmo do elevador chegar ao seu andar, pendurando o óculos na gola da camisa e se arrependendo disso assim que olhou para seu próprio reflexo no elevador.
Nem toda a maquiagem do mundo seria capaz de disfarçar as olheiras arroxeados causadas pela insônia e pelas lágrimas que eventualmente caiam e deixavam seus olhos escuros mais fundos. Andie, sua maquiadora, teria um grande trabalho no dia seguinte, quando fossem tirar mais fotos para os novos posts do Colorful Sky.
Virou-se de vez assim que o elevador anunciou sua chegada ao andar, arrependendo-se assim que reconheceu de longe as costas do homem de terno que estava em sua sala, analisando a cidade de Nova Iorque pela enorme janela de vidro do local, sem perceber que tinha companhia.
Sky reconheceria aquele terno italiano e aqueles cabelos loiros escuros em qualquer lugar do mundo.
— Bloody Hell — xingou baixinho assim que viu a silhueta de Theo de longe, deixando suas chaves e sua bolsa em cima do balcão da cozinha antes de caminhar até a sala, se desfazendo dos tênis no caminho. — O que o universo está fazendo comigo?
Talvez levá-la a loucura, pensou assim que se colocou de frente ao melhor amigo de Ben. Sua figura ao lado do inglês era tão comum que ela teve que respirar fundo para se acostumar com o fato de que aquela não seria uma reunião para os dois se sentaram juntos e darem risadas das histórias que Theodore contava sobre Benjamin, como tinham feito outras dezenas de vezes enquanto bebiam cerveja.
— É bom te ver, Theo — falou assim que ficaram um de frente ao outro, sorrindo enquanto recebia um beijo rápido na bochecha do homem.
— Só queria que fosse em outra situação — Theo respondeu com um sorriso contido, fazendo-a assentir. — E eu vou ser bem rápido, Sky, porque eu não gosto de arrodeios. E eu não estou aqui para isso.
A loira assentiu, enchendo os seus pulmões de ar para se preparar para o que vinha a seguir. Sabia que ele não estava ali para jogar cartas, brindarem com Champagne ou qualquer coisa do tipo.
Sabia que Theodore Carter estava ali porque, uma semana antes, ela tinha quebrado o coração do melhor amigo dele.
E ela viu isso de longe, pelo olhar de repreensão que recebeu dele.
— Eu conheço o Ben, Sky. Eu o conheço desde o começo da faculdade, e você ia contra tudo o que ele queria para a vida dele — Theo falou, negando. — E quando vocês se conheceram, eu até brinquei que você tornaria a vida dele um programa de fofoca de televisão. Um que as pessoas pagariam muito caro para ver.
Theo sorriu enquanto se recordava da primeira vez que Ben tinha falado na mulher, sincero o suficiente para ele já ter percebido que os olhos do inglês já brilhavam em desafio para tudo o que viria a seguir com ela.
Alguém que o instingava.
Era isso o que Skylar Howard era para Ben no começo.
Até que ela se tornou algo mais. Algo que ele não viu crescendo até o momento que ficar sem sua presença por um dia ou dois não era algo agradável de se imaginar, muito menos o pensamento de uma das suas viagens para campanhas que duravam uma semana inteira.
Ela ganhou sua confiança e, quando isso aconteceu, levou todos ao seu redor a fazer o mesmo. Theo, que não era um grande fã do que estava acontecendo em um primeiro momento, começou a vê-la com outros olhos desde a primeira vez que estiveram os três no mesmo lugar, dividindo um vinho enquanto o amigo passava um dos braços pelas costas da mulher que sorria de algo que fora dito. Sua família, que via o relacionamento com uma blogueira sem muito futuro, até o momento que ele apareceu de mãos dadas com ela no aniversário de Penny, com um sorriso que não costumava ficar muito tempo no seu rosto.
Benjamin mostrava a todo mundo a sua forma de ver Sky Howard. Não a blogueira, não a boneca de plástico, não a mulher de nariz empinado que os jornais pintavam. Sky, que tinha um grande coração, uma adoração por crianças e milhares de qualidades que iam bem além do que estava na superfície.
A mulher por quem ele tinha perdidamente se apaixonado.
— Mas você mudou algo nele, algo grande — continuou, fazendo-a engolir em seco enquanto olhava em seus olhos claros. — E você o fez feliz. Só para quebrá-lo de uma vez só quando as coisas deram errado.
Skylar abriu a boca para se defender, mas mordeu a língua assim que as palavras faltaram. Ela não tinha, naquele momento, forças para contestar o que Theo dizia, mesmo que quisesse.
— Mas eu não estou aqui para julgamentos de valor ou discutir sobre o motivo que você teve ou não teve para terminar com ele e, por favor, não pense que eu acho que está sendo fácil para você.
Ela assentiu assim que o silêncio se fez presente, soltando o ar que prendia. Atrás do seu corpo, suas mãos tremiam como nunca antes e, mais uma vez, ela tinha que fingir ser a pessoa forte que era de frente as câmeras.
— E você veio aqui para...?
— Ele não teve tempo de te entregar, mas é um momento importante para ele e eu sei que te ver lá iria ajudá-lo — Theo respondeu por fim, estendendo um envelope preto e dourado para Sky, que o encarou por um longo instante antes de pegá-lo. — Se você se importa com ele, só vá. É a pior época do ano, ele só precisa estar cercado de pessoas que o amam e eu sei que você o ama, Sky. E o Ben é louco por você.
Ela sabia exatamente do que se tratava assim que colocou os olhos no envelope, apertando-o com seus dedos sem nem perceber que fazia isso. Ali estava o convite do evento que Benjamin tinha se dedicado dia e noite pelos últimos meses, quebrado o suficiente para pensar que tornar aquele dia perfeito como todos os outros anos conseguiria aliviar um pouco da dor que voltava sempre que dezembro chegava.
E naquele momento ela já sabia porque doía mais para ele do que para qualquer outro que sofria pela morte de Eva Marlowe.
— É sua decisão ir ou não, mas se você não for... Deixe-o seguir em frente, Sky. Não volte atrás dele se você não tiver certeza que o quer em sua vida.
A mulher passou a língua pelos lábios, assentindo lentamente só para Theo saber que ela tinha entendido exatamente o que ele queria dizer. Um ultimato. O fim de uma vez, ou a chance de um recomeço.
— Foi uma grande coisa que você fez, tirando-o da confusão da sua vida — falou, engolindo em seco. — Mas eu acho que você não pode decidir por vocês dois, Skylar. Você deveria pensar nisso.
Foi a última coisa que Theodore falou antes de colocar as duas mãos nos bolsos e caminhar em direção a Sky, dando um longo olhar em sua direção antes de passar ao lado do seu corpo, deixando o apartamento antes que ela pudesse quebrar o lacre do convite que tinha em mãos.
Sky sentou-se lentamente no sofá que estava atrás de si, respirando fundo antes de retirar o papel de dentro do envelope, deixando-o de lado antes que pudesse terminar de ler as primeiras linhas do texto escrito por Ben para o memorial. Sabia que era dele pelas vezes que tinha acordado no meio da noite apenas para encontrá-lo no celular, gastando mais tempo que o saudável com o bloco de notas aberto, tentando achar palavras que seriam suficientes para descrever sua mãe.
Naquele momento ela nem conseguiria passar das primeiras dez palavras sem que começasse a chorar copiosamente, desejando que pudesse abraçar e confortar Ben no que sabia que era a pior semana da sua vida. As fotos da sua mãe estariam nos jornais, nas revistas e em todo lugar que ele resolvesse olhar, eternizada por ser um exemplo para a alta sociedade de Nova Iorque e por ter deixado o melhor de si nos dois homens que agora construiam seus nomes na cidade.
Ela teria tanto orgulho de Aaron e Ben se estivesse ali para vê-los.
A loira desejou poder nunca ter recebido aquele convite e esquecer, de uma vez por todas, a presença de Benjamin Elliot Marlowe em sua vida. Ir para a sessão de fotos no dia seguinte, talvez aceitar o convite de jantar de um dos homens que lotavam suas mensagens, ir a uma festa na quinta avenida, acompanhar Gale nos bastidores de um dos seus shows. Seguir em frente.
Mas ela não podia.
Não podia fingir que nada tinha mudado nos últimos meses com Ben.
Se Theo falava que ele era uma pessoa diferente quando a conheceu, ela podia falar o mesmo quando se olhava no espelho.
A aprovação, que ela tanto procurou pelos últimos anos, não parecia mais importante que o seu próprio bem-estar. Já não mais perdia tempo lendo os comentários negativos das suas fotos e não era o fim do mundo quando as pessoas não citavam seu nome a cada cinco segundos nas redes sociais.
A vida real era mais importante que isso tudo.
E Sky não podia fingir que ela era a mesma pessoa que antes. Não queria.
Abraçou suas próprias pernas, apertando os olhos com força antes de jogar sua cabeça para trás, desejando que tudo sumisse da sua cabeça como em um passe de mágica. Não conseguia entender porque fazer a coisa certa se parecia tão difícil.
Deixá-lo para trás, seguir em frente, conhecer alguém que o faça mais feliz longe das revistas do que ela tinha feitos nos últimos meses. Evitar que sua presença na vida de Ben e a bagunça que ela fizera nela o fizesse acreditar, um dia, que apaixonar-se por ela tinha sido seu maior erro.
Deixá-lo ir.
Era exatamente o que ela deveria fazer.
Levantou-se do sofá em um pulo, pegando o convite com as mãos trêmulas antes que perdesse a coragem de uma vez. Não perdeu tempo tentando acender sua lareira, indo diretamente para a cozinha, procurando sem parar um isqueiro que ela sabia que estava perdido na segunda gaveta do armário.
Quase comemorou quando o achou, testando as chamas antes de posicioná-lo exatamente embaixo do convite preto e dourado, a poucos centímetros de distância, vendo as chamas laranjas subirem ansiosas para resumi-lo a pó em poucos instantes.
Uma lágrima percorreu em seu rosto assim que ela percebeu o que queimá-lo significaria. Deixá-lo ir.
A decisão de sua vida.
Ir atrás dele sabendo o que isso poderia significar em sua vida ou viver o resto da sua vida sabendo que tinha deixado Benjamin Elliot Marlowe para trás.
Algo que Sky não poderia decidir no cara ou coroa.
Mas que seria muito mais fácil se ela pudesse.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro