⚜ SORRISO DE MERDA ⚜ {capítulo 3}
Eu ainda sinto o suor correr pelas minhas costas enquanto as palavras de Lucius martelam na minha cabeça. "Quando estiver por baixo...". Um arrepio sobe pela minha espinha só de lembrar ele por cima de mim. Meeeerda! As coisas podem ser um pouco mais fáceis se ele fosse somente frio e não começasse com as insinuações sexuais. Porque obviamente era isso que ele tinha feito. Certo? Continuo meu caminho pelos corredores do Instituto até chegar ao dormitório das meninas. Sei que tinha marcado com elas no refeitório para contar as novidades, mas preciso tomar um banho rápido antes. Nosso dormitório fica do lado oposto do ginásio, é um pouco pequeno para 4 garotas, mas comparado ao orfanato, os quartos se transformam na melhor coisa que uma garota de 18 anos poderia ter, contando que se eu ainda estivesse lá, eu provavelmente estaria na rua, a procura de um emprego. Ao invés de camas e beliches enfileirados em um quarto branco e sem graça, cada uma tem sua própria cama e espaço para respirar. E a arquitetura aqui é um bônus a mais que eu nunca reclamaria, as janelas são gigantes com vidrais e as paredes beges forradas são claramente de outro século. De qualquer forma, a vista compensa tudo mesmo se eu dormisse em um papelão. Dava direto para as montanhas e a floresta de pinheiros que rodeia o Instituto.
Tiro minhas roupas e coloco no cesto de roupas sujas, que pelas graças da Santa Celina está vazio. Assim que entro no chuveiro e a água gelada toca meu corpo, um suspiro sai. Ainda com cada palavra gravada, eu me forço a relaxar, de novo. Um novo mantra substituindo o antigo: é bom estar aqui, bom ter um lar, bom ter amigas que se importam comigo. Não tive muitas escolhas quando me disseram que eu estaria morando no Instituo, mas hoje eu sei que só posso agradecer por ter essa oportunidade. Mesmo que as coisas entre eu e Lucius tenham se complicado, é aqui que finalmente consigo me sentir em casa.
Me apresso ao sair do banho, secando meu cabelo no processo. Talvez eu tenha enrolado um pouco mais do que preciso...
— Mas que mer... Que merda você está fazendo aqui?
Seguro a toalha no meu peito assustada ao encontrar Jeremiah deitado na minha cama. Com suas calças de treino e moletom, ele está deitado sobre a cama com os braços atrás da cabeça e os olhos fechados. Relaxado ao ponto de fazer você imaginar que ele estava dormindo. A primeira vez que eu o vi foi em uma das minhas sessões de fisioterapia, na enfermaria. Eu não lembro o porquê dele estar ali, algum machucado qualquer, o que eu me lembrava bem era do seu sorriso, como se seu rosto fosse feito para abriga-lo. Ele dava a todos, sem pestanejar. Ele sabe como isso afeta as pessoas, então o usa em qualquer oportunidade que pode. Matar o treino, roubar seu lanche, deitar em sua cama quando você estava só de toalha. Mas eu sei melhor. Atrás do sorriso, tem os seus olhos quase desinteressados demais para te dar atenção, todo aquele efeito "fumo maconha todos os dias e daí". Claro que isso não o torna menos interessante, é pior, o torna ainda mais bonito com aquela vibe de garoto mal que toda garota quer.
— Esperando por você – ele me diz ainda com os olhos fechados.
— Uhum...
Puxo a gaveta da cômoda para pegar um par de roupas, já sabendo que quando Jeremiah está com esse humor, ele não facilita. Bato a porta um pouco mais forte quando volto ao banheiro pra fazer meu ponto.
— Ainda com os olhos fechados, querida, você sabe... – ele grita da cama.
— Não vou trocar de roupa com você no quarto...
Assim que volto para o quarto, já vestida com um short jeans e uma bata preta, Jeremiah está com o celular em mãos digitando alguma mensagem. Chuto sua perna pra que ele abra espaço e deito ao seu lado.
— Fazendo?
— Avisando as meninas que estamos aqui.
Ele guarda o celular no bolso e me olha com aqueles olhos verdes escuros, quase escuros demais.
— Você sabe que vou ser punida se te pegarem aqui, certo?
Ele me olha um pouco mais e puxa meu cabelo molhado entre as pontas do dedo.
— E você sabe o quão bonita fica depois do banho, certo?
No começo, quando ainda estava conhecendo Jeremiah, cada cantada tosca que saía da sua boca me fazia corar como uma menininha do ensino médio. Depois de um tempo, quando o vi fazer o mesmo com todas as garotas e senhoras do Instituto, descobri que ele só gostava de instigar todas como um desafio doentio para saber até onde conseguia chegar. Por um tempo, achei engraçado. Hoje, eu só acho que ele sabe que é bonito demais para um garoto de 19 anos e gosta de testar limites por conta disso. Empurro seus ombros e rolo os olhos, não dando o prazer da minha resposta.
— Então? – instigo.
— Elas estão vindo.
— Não é disso que eu estou falando.
— Você ficaria mais bonita se estivesse nua...
Eu rio, sem poder controlar – Se eu receber uma advertência ou qualquer merda assim por sua causa.
— Sura não deixaria. Ela gosta demais dos meus olhos verdes...
— ... e seu sorriso de merda – completo seu bordão pela décima vez – Eu já sei.
— Você já sabe, não é querida?
Soco sua barriga uma vez, só por que posso, e sorrio docemente quando ele se encolhe. Considerar qualquer coisa que Jeremiah diz como uma brincadeira é sempre o melhor caminho. Eu sei que se desse qualquer brecha, ele aproveitaria, mas sei que assim como o Instituto, ele não leva nada a sério.
— Idiota...
O som da porta sendo aberta interrompe qualquer coisa que eu fosse falar. Celina entra vestindo seu uniforme dos dias de domingo, uma jardineira e uma camisa de girassóis, carregando uma garrafinha de suco nas mãos.
— Aqui... – ela me entrega o suco e encara Jeremiah – O refeitório fechou.
Moira vem logo atrás já com sua usual calça xadrez e camisa de banda dos anos 80. Dias de domingo podem ser meus dias favoritos aqui, são os únicos dias em que realmente adolescentes se vestem como adolescentes, quase como uma escola normal.
Moira cruza os braços assim que vê Jeremiah na minha cama – Cai fora, garoto.
— Nooop – Jeremiah cantarola.
— Esse era o plano? – Moira aponta para o garoto ao meu lado – Deixar suas amigas esperando pra conseguir o café, enquanto ficava com o Jem aqui?
— Não, eu só precisava tomar um banho rápido antes de ir.
— Ela gosta mais de mim...E você sabe, é Jeremi-AH.
Celina é a primeira a jogar uma almofada na cara dele antes que eu mesma fizesse. Ela senta na cama em frente a minha, pernas cruzadas, e me olha com expectativa.
— E aí, como foi o teste?
Moira a segue e se joga ao lado dela – Fodeu tudo ou só com ele?
Abro o suco e tomo um gole tentando disfarçar qualquer reação à insinuação de Moira, ainda com som da voz de Lucius na minha cabeça. "Resista mais forte".
— Foda-se! Você está corando? – esse é Jeremiah. Obrigada, idiota!
— O meu Deus! Vocês fizeram, não foi? – Moira acotovela Celina – Eu te disse! Eles ficaram se encarando por quase dez minutos, como um maldito pornô. Me diga que ele pelo menos usou as mãos em você.
— Grosso – Celina emenda.
Moira então começa um discurso de falsa moral: "Como se Samuel não usasse as mãos, a boca e o pau em você...". Enquanto isso, Jeremiah me encara. Algo brilha em seus olhos que eu não via em tempos, interesse.
— Isso é verdade?
— Claro que não! – então grito para as meninas – E se ele usou alguma coisa, foram os pés e não a mão.
— Isso explica muita coisa... – Moira diz com um sorriso comedor de merda no rosto. Celina ri e solta "isso é estranho até pra mim".
— Cala boca! Eu posso ou não posso contar o que aconteceu?
— Deixa a menina falar, antes que ela desista.
Eu já disse quanto eu amo a Celina? Bem, eu amo.
— Então?... – Jeremiah puxa.
— Então, eu fiz o teste. O teste regular, de defesa e confronto. Eu pensei que talvez ele não fosse pedir, mas não aconteceu.
— Eu te disse. – Moira pontua.
— E depois de toda a sequência de treino... Ele lutou comigo, chutou a minha perna recém-curada e me colocou no nível dois.
— Nível dois? Você está dizendo que depois de todo o nosso treinamento você conseguiu o nível dois? – Moira deixa escapar.
— Não é tão ruim assim. – Celina me defende.
— Ela devia estar no nível três. Você viu o potencial dela.
— Ela lutou com o Lucius. Eu nunca o vi treinando, mas a gente sabe a reputação que o cara tem.
— De qualquer jeito, agora ela está presa com o idiota do Jem aqui. Sonhos sendo realizados, Jem?
Jeremiah apresenta seu dedo do meio pra Moira, mas seus olhos ainda estão em mim.
— É meio reconfortante ouvir isso, eu acho – Com uma careta, bato meu braço contra de Jeremiah – Não vai me falar nada?
— Como ele sabia qual perna era a recém curada?
— Bem, ele foi meio que a Dominação que me resgatou do acidente. Então... Eu já te disse isso.
— Se ele é o cara que te resgatou, então por que chutar a perna ruim? Um pouco cruel, você não acha?
— Cruel? Isso aqui é quase um acampamento de sobreviventes do inferno. Não há nada cruel nisso – Moira diz.
— Sam já me disse que Lucius é um dos caras mais foda em campo. Faz sentido ele testar os limites dela. – Celina concorda.
— Exato. Em campo. Mas o que um cara de campo está fazendo aqui, aplicando testes em novatos? Se aproveitando das debilidades de uma das vítimas?...
Jeremiah deixou tudo um pouco solto no ar, meio dramático até para ele.
— Seu ponto é? – eu digo.
— Faz sentido eu estar no nível dois. Fui transferido pra cá só tem um ano, minhas habilidades podem ser consideradas ruins... – "Uma merda" Moira completa – Mas você? Depois de todo seu quadro de recuperação?
— Você acha que ele fez isso de propósito? – olho pra ele sem acreditar.
— Você não? O cara com certeza está querendo te deixar no nível dois.
Depois de um tempo em silêncio, Celina segue o raciocínio dele.
— Para te proteger. – ela diz.
— Ou pra me foder. Eu não sei... – Na minha cabeça, nada disso faz sentido.
Mas na de Moira, isso parece certo – Oh merda! Isso não deveria fazer nenhum sentido, mas depois de vê-lo no ginásio com você, totalmente faz.
— Ele me evitou durante todos esses meses...
— Mas você o conhece desde a infância, certo? – Jeremiah me pergunta.
Eu não pude contar toda a verdade para as meninas, muito menos para Jeremiah. Havia tantas coisas que eu gostaria de falar, mas o Instituto insistiu na minha discrição. Então eu contei meias verdades, como essa. Eles pensam que Lucius foi uma das Dominações encarregadas de cuidar de novos Principados no meu antigo Estado. O que era uma meia verdade.
— É, mas não desse jeito. Depois de tudo, eu não acho que ele possa me manter no nível dois se eu mostrar minhas habilidades.
— Mas por pelo menos um ano ou dois, você ainda vai estar longe do campo... E eles já vão ter descoberto a fonte do seu ataque – Jeremiah completa.
— Eu não posso acreditar que estou falando isso – Moira aponta para Jeremiah – Mas Jem pode estar certo.
Parei um pouco, assustada, mas não consigo refutar — Ok. Talvez vocês possam estar certos nisso.
Me sento e olho para as meninas, um novo plano se formando na minha cabeça. Se isso for realmente verdade, as coisas podem ser mais simples que eu imaginei. Um sorriso genuíno surge no meu rosto.
— E se Jeremiah está certo...
— Eu sempre estou – dessa vez Jeremiah coloca a cabeça no meu colo e me observa.
— Eu só preciso provar nos treinos que sou mais avançada do que os outros.
— E se todos forem tão ruins quanto Jem, isso pode ser realmente fácil. – Moira divaga.
— Eu posso pedir pro Samuel te ajudar nos treinos extras – Celine diz.
Sorrio para Celina mais uma vez em troca da sua confiança. Samuel é um dos Principados do sexto nível. Ele já está quase em campo aberto junto com as outras Dominações, um dos mais fodas do seu nível, que por coincidência também era o "namorado" da minha amiga. Os dois não tem muito tempo para ficarem juntos, mas Cel uma vez disse que depois de muita insistência resolveu dar uma chance para ele. Depois de duas semanas se encontrando, eles resolveram entrar nessa relação, mesmo não sabendo como isso ia ser.
— Bem, eu acho que tenho um plano, então.
O sorriso no rosto dos meus amigos é a única resposta que eu preciso.
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