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18°

ACEITAÇÃO.

Era disso que Beverly estava falando. Eu preciso me aceitar e viver. Hoje pela manhã decidi que não quero ser mais a garota medrosa e covarde. Decidi que quero ser aquela garota que vi no espelho, mas... Mas preciso fazer isso aos poucos. Ninguém muda da noite para o dia.

Apresso Beverly pela manhã. Ela está usando um dos meus uniformes que ficou um pouco folgado.

Antes de sair, pego um perfume que comprei há alguns meses. Um perfume masculino. O cheiro é cítrico e suave ao mesmo tempo, então comprei e guardei. Usei algumas vezes quando estava sozinha, então faltam três dedos do perfume, mas acho que ele não vai se importar.

Beverly reclama da dor de cabeça no caminho para escola e ameaça meu tio para parar de mastigar a maçã tão alto. Meu tio murmurou alguma coisa e atirou a fruta pela janela. Eu quis fazê-lo descer e pegar a maçã.

Quando chegamos, minha amiga me arrasta para sala de aula vazia. Beverly deita a cabeça na mesa e diz que vai tirar um cochilo.

Alguns minutos depois eu o vejo passar pela porta, o andar arrogante de sempre.

Damon sorri ao me ver e fico vermelha. Será que ele sabe que eu estava lhe esperando?

— Bom dia, baby. — ele ronrona. Ajeito os ombros e ergo o queixo. Vou brincar um pouco com ele.

— Bom dia. — lhe dou um sorriso. Observo como ele está hoje. Normal, eu diria. O cabelo bagunçado, a jaqueta preta por cima do uniforme, a calça escura e as botas da mesma cor. Ele tem sorte que o regulamento da escola exige apenas que usemos nossos uniformes, sem se importar se vamos acrescentar outros acessórios.

— Como você está? — parece uma pergunta boba, mas ele está hesitante e olhando para mim como se estivesse procurando algo errado.

— Bem... E você? — fico em pé e ele acompanha meus movimentos.

— Melhor impossível.

— Ótimo.

Ficamos nos encarando em silêncio por um tempo. Damon não desvia o olhar e eu também não. Tenho coisas a dizer a ele... Pedir na verdade e não dá para fazer isso sem mover os lábios.

— Eu... Nós podemos conversar? — escondo minhas mãos atrás das costas para ele não ver eu torcendo os dedos com o meu nervosismo.

— Você está misteriosa... O que foi? — ele se aproxima, parecendo cheirar meu perfume.

— Gostou do meu perfume? — arqueio a sobrancelha. Ele sorri e acho que já estava esperando que eu o provocasse.

— Eu adorei — aquele olhar que me faz ficar arrepiada — Diga-me, que fragrância você usa? — Damon dá outra passo para frente e apoia a mão na mesa, seus dedos tocando os meus quando procuro apoio para não me desequilibrar ao sentir meus joelhos enfraquecerem. Então estamos cara a cara de novo.

— É um perfume francês de rosas. — dou de ombros. Ele se inclina e seu nariz roça em meu pescoço. Ele inspira meu cheiro.

— Francês, é? Interessante... — quando ele se afasta, eu volto a respirar.

— Conversar — repito para trazê-lo de volta à realidade ou a mim mesma, não sei. Damon recua alguns passos e balança a cabeça — Sala de limpeza. Você vai sair primeiro. Eu vou te dar um sinal...

— Por que eu tenho que sair primeiro? — às vezes ele parece uma criança.

— Pode me obedecer pelo menos uma vez?! — reviro os olhos. — Eu vou sair logo depois, mas vou evitar que pensem que saí por sua causa.

— Como você quiser... — Damon passa por mim, mas antes sussurra em meu ouvido: — Baby.

Beverly recebeu reclamação dos dois primeiros professores por estar dormindo na aula. A culpa é minha por ter deixado ela beber tanto vinho... Mas nós nos divertimos e ela não mencionou que estava arrependida.

Não consegui me concentrar em nenhuma das duas aulas. Motivos: Brad ficou olhando para mim por cima do ombro durante todas as suas aulas. O outro motivo é Damon. Estou nervosa por falar com ele e o mesmo rir de mim...

Melhor acabar logo com isso.

Olho para Damon por cima do ombro. Ele está anotando alguma coisa que o professor disse e fico surpresa por ele estar prestando atenção. Ele enruga a testa para o caderno e morde o lápis, então passa a mão no cabelo. É tão lindo quando concentrado...

Nossos olhares se encontram e ele arqueia a sobrancelha. Fico corada. Afasto o fato de ter sido pega no flagra e aceno para ele com a cabeça. Damon entende e fica de pé.

Lhe dou as costas e pego o celular de Beverly. Ouço Damon pedir ao professor para ir ao banheiro e suspiro aliviada quando ele o dispensa.

Espero cinco minutos e ligo do celular de Beverly para mim mesma. Ela está cochilando, então devolvo o aparelho para bolsa quando o meu começa a tocar.

— Senhorita Macallister, pode desligar o telefone, por favor? — o professor pergunta. Beverly desperta ao meu lado, mas não desconfia do meu pequeno plano.

— É o meu pai. Posso atender, por favor? Ele vai ficar preocupado se eu não...

— Vá. Mas faça lá fora e não atrapalhe mais minha aula.

Não me importo com seu mal humor e saio correndo da sala.

Meus passos são apressados e meu coração está acelerado. Não acredito que menti para o professor para me encontrar com Damon na sala de limpeza. Talvez Beverly estivesse errada.

A porta está aberta e dessa vez ele não me puxa para dentro. Fecho a porta quando entro e me encosto na mesma.

— Oi — digo para o escuro. É claro que ele não acenderia a luz. Ele não responde — Damon? — dessa vez eu sussurro. Nada. — Eu sei que está aqui, consigo ouvir sua respiração e sentir seu perfume. Na verdade, eu consigo sentir sua arrogância pairando no ar.

Mesmo sabendo que ele está aqui, me assunto com sua risada rouca. Tateio a parede em busca do interruptor.

— Por que não facilita minha vida apenas uma vez? — não consigo achar o interruptor e paro no meio da sala. É pequena e ele deve estar na minha frente ou em um dos meus lados. — Eu te odeio.

Estico meu braço até o lado esquerdo, mas ele não está. Nem no braço direito. Ele está na minha frente. Antes que eu faça ou diga mais alguma coisa, a luz acende.

— Olá, baby.

Damon está encostado na prateleira, de braços cruzados e um sorriso no rosto. Canalha.

Meus pés estão formigando dentro dos saltos e minhas mãos suando. Eu as escondo atrás das costas e suspiro.

— Obrigada por acender a luz depois de me deixar às cegas  — lhe dou um sorriso falso e reviro os olhos.

— Por nada. É sempre bom ajudar. A propósito, o que você quer? — sua cara de entediado não me convence nem um pouco. Sei que ele está morrendo de curiosidade.

— Prometa-me que não irá rir de mim. — ergo o queixo e espero. Damon inclina a cabeça para o lado e depois do que parece ser uma eternidade, ele assente.

— Prometo. — lhe encaro por mais alguns segundos. Ele com certeza vai rir. Vai dizer que minha ideia é estúpida.

— Eu... Bom... — começo a andar em círculos e olho para o teto baixo. Agora entendi porque não achei o interruptor. Não há exatamente um, tem uma corda que liga e desliga a luz.

— Elle? — Damon chama minha atenção. Balanço a cabeça e encaro o chão, ainda andando em círculos.

— Tudo bem... Na verdade não é muito importante... Eu só… hum... Andei conversando com uma amiga... Ela disse que eu devia viver, sair dessa bolha... Mas eu... Não sei como fazer isso... — mordo o lábio, enquanto torço minhas mãos — E eu pensei que você poderia me ajudar com isso.

Arrisco olhar para Damon. Seu olhar é indecifrável.

Ótimo. Foi um erro. Isso foi estúpido.

— Quer saber? Esquece... Foi uma ideia boba. — lhe dou as costas. Quando chego à porta, ele já está segurando meu pulso. Não viro para ele. Não quero vê-lo rir de mim.

— Elle, espere — sua voz é suave, mas mesmo não viro para ele — Eu não acho uma ideia boba... Por favor, olhe para mim.

Viro para ele, mas Damon não solta meu pulso. Ele me dá um sorriso que chega a ser gentil.

— Vou ajudar você. Você quer ver o mundo, vamos fazer isso, mas não se envergonhe de querer experimentar algo novo. — sua voz é suave e gentil também... Não sabia que ele podia ser assim.

— Obrigada. — sorrio para ele. Talvez eu não o odeie tanto assim.

— Não me agradeça ainda. — Damon solta o meu braço e sinto uma coisa no meu blazer.

— Ah, tenho algo para você — tiro o perfume do meu bolso e lhe entrego. — Uma coisa por outra todos os dias.

— Hm — eu o observo espirrar o perfume no  pulso e cheira. — É bom. Gostei.

— Ótimo. — dou um sorriso convencido. Sabia que ele ia gostar.

— Você não roubou isso do seu pai, né? — seu olhar fica desconfiado. Ele acha mesmo que lhe daria um perfume do meu pai?

— Não! Era meu — reviro os olhos. Não lhe dou tempo para fazer perguntas. — Então, o que tem para mim?

— Entrego a você à noite. Vou levá-la a um lugar.

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