一 ...Então eu mandei tudo para a esposa dele no facebook. 一 Contei, ainda irada com o que tinha acontecido. 一 Ela me bloqueou. Você acredita que aquela vaca me bloqueou? Eu só queria ajudar!

一 Algumas pessoas estão tão imersas na própria mentira que não querem ver a verdade. 一 Consolou-me Victória. 一 Mas ele realmente não era para você. Da próxima vez que a gente for...

   一 Que tal... 一 Talvez eu esteja querendo demais, mas eu estava cansada desses desencontros amorosos em bares. 一 Se a gente não for mais?

Victória ergueu uma sobrancelha.

一 Deixa eu recapitular, então... 一 Ela ergueu a mão direita e, a cada tópico, levantava um dedo. 一 Nada de aplicativos. Nada de balada. Nada de bares. 

Eu fiz que sim com a cabeça, certa de que nenhuma dessas opções traria o homem certo. 

一 Tudo bem, então. Me vejo diante da única possibilidade que restou. 一 Victória puxou o celular e moveu o dedo pela tela por alguns minutos. 一 Só se eu te ajeitar para meu primo Matheus. 

一 Quem é esse? 一 Eu perguntei. Não conhecia muito sobre a família de Victória, e ela tinha muitos primos. 

一 Ele é técnico em informática e está solteiro há um tempo. 一 Enquanto dizia isso, Victória não tirava os olhos do celular. 一 Talvez vocês possam se dar bem. Bom, ele não é nenhum príncipe literário, mas...

一 Ninguém é. 一 Exclamei, um pouco frustrada. Já estava ciente que não encontraria homens como os dos livros em lugar nenhum. 

Ela sorriu e logo uma mensagem chegou no meu celular. Era um contato enviado por ela cujo nome estava registrado como "Matheus Primo" 

一 Se apresente. 一 Ela disse. 一 Ele vai ficar feliz em te conhecer.

***

A conversa com Matheus durou uma semana. Ele realmente era muito nerd, gostava de computadores, programação e coisas do tipo. Eu falei um pouco sobre os livros que eu lia, sem mencionar o pornô de aliens, e ele pareceu querer saber um pouco mais. Quando perguntei se ele tinha ambições na vida, ele me respondeu que sonhava em se formar em engenharia da computação, e ser de fato um programador. Um homem com sonhos mais altos que os meus, eu devo admitir. Também soube que ele gosta bastante de aprender línguas novas e é fã de quadrinhos e filmes de super-heróis. Espero que ele não seja do tipo que surta porque o personagem do gibizinho é gay.

Marcamos de nos ver na sexta-feira. Dei uma aula porca para um moleque do primeiro ano de física naquele dia, torcendo que ele não se arrependesse do dinheiro investido e nem fizesse propaganda negativa de mim, e logo me arrumei. Conforme tomava banho, percebi que não sabia como Matheus se parecia; Ele não tinha foto de perfil no whatsapp. Mas era um cara tão divertido e piadista que eu me dei ao luxo de relevar esse aspecto.      

Nós marcamos um lanche numa das lanchonetes preferidas dele. De início, pensamos em ir a um restaurante conceituado, mas eu não estava bem de grana e ele também não. Fechamos em uma lanchonete simples, mas gostosa, daquelas que a gente vai quando quer observar melhor a rua e fofocar sobre a vida das pessoas. Matheus não disse, mas eu percebi que ele adorava uma fofoca.

Como pensei finalmente estar encaminhada para o homem que daria certo, optei por me produzir um pouco melhor. Usei um vestido vermelho-paixão, me maquiei e até mesmo pus brincos! Seja lá como for esse homem, ele terá que aguentar o mulherão que eu sou. 

Pedi um uber até a lanchonete (um dinheiro que eu não estava podendo gastar, mas era um caso particular) e me sentei na primeira mesa que eu vi. A noite estava fresca e quieta, um presságio do início do outono. Havia uma família com uma criança ao meu lado e eu só pude reparar o quanto a criança se parecia com os dois. E aguardei. Aguardei até que Matheus chegasse.

Ele demorou quinze minutos. Meia hora. Quarenta minutos. Quando o relógio marcou uma hora, eu achei que ele não viria mais, mas antes que me levantasse para ir embora percebi um homem correndo lá no alto da rua. 

Poderia não ser ele, mas era um bom sinal. 

Quando o homem chegou, eu percebi que Matheus não era nem um pouco como eu imaginava. Certo, eu não imaginava um Brad Pitt da vida, mas ele era... Estranho. Era ruivo, vesgo, tinha entradas gigantescas na cabeça, espinhas por todo o rosto e era... Obeso. Realmente obeso. Nada contra os gordinhos, veja bem, acho que todo mundo tem seu charme, mas eu realmente não esperava um cara de 150kg. 

Ele se sentou na minha mesa e eu soube que aquele era, de fato, o Matheus. Bem, ele não era nenhum galã de novela, mas eu já havia visto piores. E, de qualquer forma, ele era uma boa pessoa. O que importa é o interior, não é mesmo? Eu também não sou nenhuma Gisele Bundchen. 

一 Me desculpe pela demora. 一 Ele suava horrores. Eu conseguia ver uma pocinha se formando na camiseta do Flash que ele usava. 一 Perdi o ônibus. 

Ele não tinha carro, mas até aí tudo bem, porque eu também não tinha. Pedimos um x-bacon cada um e comemos silenciosamente. 

一 Então... 一 Ele tentou desfazer o clima pesado que se formou entre nós. 一 Você está decepcionada com a minha aparência?

一 O que? Não. 一 Um pouco, para falar a verdade, mas depois de um tempo olhando pra ele, percebi que ele ficou até mesmo bonitinho. Eu estava disposta a tentar. 一 Você não é feio. Por que pergunta isso?

一 A maioria das mulheres foge quando me vê. 一 Ele deu de ombros. 一 Fico feliz que você esteja disposta a ir em frente comigo.

Fiquei realmente me sentindo mal. Quem eram as megeras que haviam rejeitado Matheus?

Gelo quebrado, a conversa fluiu consideravelmente bem. Falamos sobre música, cinema, política 一 Por incrível que pareça, Matheus era de esquerda 一 e até arrisquei um pitaco sobre a copa do mundo que estava por vir. Ele conversava bem, era realmente divertido. Gostei dele, de verdade. Nesse mundo de aparências, passar um tempo com um homem inteligente e divertido era de fato algo para se comemorar. 

Dado momento, Matheus terminou o seu lanche e pôs vinte reais em cima da mesa. Eu já tinha terminado o meu faz tempo e também coloquei ali os vinte reais. O garçom os recolheu e nós agradecemos a boa comida.

一 Agora que nós conhecemos melhor um ao outro... 一 Ele esboçou um sorriso. 一 Eu gostaria de te convidar para a minha casa. 

Mais uma vez, esses homens acham que eu sou fácil assim. Pareço ser o tipo de mulher que dá no primeiro encontro? Que absurdo. Diante de tamanho desrespeito, respirei fundo e respondi, educadamente:
    一 Topo. 

***

Por mais que eu quisesse dar a você uma resposta diferente, mais uma vez eu não gozei. Não posso culpar Matheus, ele se manteve ofegante e cansado durante todo o sexo. O pênis dele também não era lá dos maiores, mas ele conseguiria me fazer feliz se tivesse se esforçado um pouquinho.

De qualquer forma, eu terminei aquela noite espremida em uma cama de solteiro ao lado de um monte de caixas de pizza e latas de cerveja. Não parecia o melhor date possível, mas como eu não tinha muita sorte, agradeci por ao menos ele ser uma pessoa agradável. 

Não foi assim tão agradável quando ele soltou um pum na minha presença, mas todo mundo faz isso um dia, no final das contas; Resolvi relevar. 

Quando eu acordei, por incrível que pareça, ele já estava de pé. Eu conseguia ouvir barulhos de escovação do banheiro, e Matheus já estava vestido. 

一 Mariana, você já acordou? 一 Ele saiu com a boca cheia de pasta. 一 Bom dia. Como está?

Eu estava bem, mas havia ainda uma pergunta a se fazer que eu me esqueci no dia anterior.

一 Você é casado? 一 Eu realmente deveria ter questionado isso antes de ir para a cama com ele. 

一 Eu? Não. 一 Ele me respondeu, veementemente. 一 Por que a pergunta?

Suspirei em alívio e terminei de me vestir. Bom, nem todo mundo era canalha como Guilherme. 

一 Bom dia para você também. 一 E sorri, para tentar não soar muito amarga. 一 Como foi a noite?

Para mim, foi incrivelmente tediosa, mas talvez não tivesse sido tão ruim assim para ele. 

一 Foi boa, só que... 一 Ele ponderou, como se estivesse hesitando em falar aquilo. 一 Eu posso te fazer um comentário?

Eu assenti com a cabeça. 

一 Você já pensou em fazer um regiminho?

EU? Fazer um regiminho? Quem era ele para dizer aquilo? 

一 Por que você está dizendo isso? 一 Eu sabia muito bem o porquê daquela conversa, mas mesmo assim decidi fazer a sonsa. 

一 Sei lá, você é um pouco gordinha. 一 Eu de fato estou alguns quilos acima do peso. 一 Não gosto de mulheres gordas. Foi difícil manter a ereção. Pensei que talvez, sei lá, se você emagrecesse, poderia ficar muito bonita e eu poderia te chamar de namorada. Que tal?

Honestamente, aquele foi o maior insulto que eu já recebi nos últimos dias. Sem dizer uma palavra, peguei minha bolsa e caminhei até a porta, chamando o Uber mais brava do que o usual. Estou para dizer que prefiro o Guilherme me fazendo de amante. 

一 Não? 一 Ele perguntou, cínico, fingindo que não entendia o motivo da minha revolta.