Capítulo 1: As Surpresas De Uma Biblioteca
Sophia
Normalidade não era uma da minhas características. Ironia e sarcasmo sim, mas, normalidade não. Minha vida não era o tipo perfeitinha, só que eu não tinha muito do que reclamar. Em Whistis Vill não há muito do que reclamar, à não ser a falta de coisas para fazer.
Minha cidade podia parecer tranquila, e até era, tinha tudo que qualquer outra cidade do norte da Califórnia teria, pessoas diversas, gente sempre atrasado para o trabalho, grandes prédios, mas o diferencial era: Uma adolescente de 15 anos que adora tudo que fuja da normalidade. No caso eu. Ah me chamo Sophia.
Talvez eu fuja da normalidade justamente por não ser normal... assunto para outra hora, temos tempo.
--- Você não deveria estar arrumando seu material escolar, não? As aulas já começam amanhã! --- Meu irmão Heitor, um rapaz loiro de 16 anos, olhos tão azuis quanto os meus e da minha mãe, Tereza, falou, ele estava parado na porta do meu quarto.
--- Não é como se eu estivesse animada para voltar a escola. --- Falei ainda deitada na cama de solteiro, os olhos focados no teto branco --- Não gosto de lá. O primeiro dia de aula só serve para eu ver as pessoas que eu conheço e não gosto, e as que eu não conheço, mas sei que não vou gostar.
--- Sua positividade é adorável... --- Falou com sarcasmo, aposto que revirou os olhos, mania passada pra todos na família --- Não faça drama, é só mais uma volta as aulas...
--- Nunca é só uma volta as aulas... --- Murmurei me sentando na cama sem ânimo.
--- Quê é isso?! --- Heitor exclamou arregalando os olhos e vindo até a cama, com passos rápidos --- O quê você fez com seu cabelo, garota? --- Perguntou franzindo as sobrancelhas.
--- Do que você esta falando? --- Perguntei confusa, olhei de canto de olho para os fios de cabelo que caiam em meus ombros --- Ah...isso... --- Encarei a mecha de cabelo que eu tinha, recentemente, pintado de azul - Resolvi mudar um pouco... --- Dei de ombros.
--- Hum, tá... --- Heitor franziu os lábios e ajeitou os óculos redondos no rosto fino --- O cabelo é seu. Quero só ver quando nossa mãe perceber isso aí! --- Ele sorriu e saiu do quarto.
--- Idiota... --- Murmurei revirando os olhos e me deitando de novo.
Fechei os olhos com calma, vi imagens borradas, haviam alguém se arrastando pelo chão rochoso, um vulto corria ao redor da pessoa e se jogava contra ela, atacando-a, ouvi gritos, lamúrias...era horrível! Com o susto me sentei de novo, ofegando.
--- Nunca é só uma volta as aulas... --- Falei para mim mesma me jogando na cama outra vez.
Segunda de manhã...
Acordei com meu despertador tocando insistentemente, odeio acordar cedo. O despertador foi presente de Megan, minha melhor amiga. Megan tinha pele bronzeada, cabelos castanhos cacheados e longos, além de lindos olhos verdes, e assim como eu tinha 15 anos.
Me levantei e tomei um banho, tive que arrumar as pressas minha mochila, vesti o uniforme, uma camisa branca com gola polo e o símbolo da escola do lado direto do peito, de trás para frente e tive que vestir de novo e ainda quase não achei meus tênis brancos, que fizeram o favor de se enfiar embaixo da cama.
--- Até que enfim! Achei que tinha morrido. --- Heitor reclamou já sentado a mesa, ele estudava na mesma escola que eu, só que uma série a frente --- Nem sei porquê você tem despertador, ele não adianta de nada. --- Debochou pegando uma torrada.
--- E eu não sei porquê você tem cérebro, ele não adianta de nada! --- Rebati, Heitor abriu a boca para responder, mas foi interrompido.
--- Podem ir parando os dois! --- Minha mãe apareceu na porta da cozinha, os cabelos loiros presos em um coque elegante e uma pasta preta na mão, minha mãe era advogada, uma das melhores da cidade --- É muito cedo para estarem brigando! Tenho que ir já está na minha hora, e vocês não se atrasam, hoje é apenas o primeiro dia de aula! --- Alertou.
--- Pode deixar mãe, responsabilidade é meu segundo nome! --- Heitor falou com um sorriso de canto, o loiro se mantinha focado em seu café da manhã.
--- Achei que fosse Dylan. --- Falei de modo despreocupado pegando a caixinha de leite e pondo um pouco no meu copo.
--- Se pronuncia responsabilidade! --- Heitor sibilou me fazendo revirar os olhos.
--- Tchau, vejo vocês dois à noite. Tenham uma boa aula! --- Minha mãe se virou e começou a sair da cozinha após um "tchauzinho" em coro meu e de Heitor.
Um tempo depois Heitor e eu saímos de casa rumo a escola, nossa casa ficava em uma rua de classe média perto do Centro da cidade, já nossa escola ficava à duas ruas do Centro, de casa até na escola eram de 10 a 15 minutos de caminhada. Quando chegamos em nossa escola, um grande prédio de três andares, Heitor se juntou ao grupo de amigos dele e eu segui para a minha sala.
Megan era minha melhor amiga, e na escola eu sempre andava com ela, não me dou muito bem com os outros alunos da escola, eles são tediosos. No primeiro dia de aula Meg nunca aparecia, eu já estava acostumada, ela viajava nas férias e voltava muito em cima para a volta as aulas. O pai de Megan, Heinrich, era o diretor da nossa escola, o Centro Estudantil Whistis Vill.
Eu tinha acabado de subir as escadas compridas, que levavam a minha sala, quando senti um tranco no ombro e quase cai, mas alguém me segurou a tempo.
Uma energia estranha passou por todo meu corpo, como a sensação de um choque elétrico. Levantei a cabeça para ver em quem eu tinha esbarrado, e vi um menino moreno, um pouco mais alto do que eu, olhos castanhos emoldurados por óculos redondos de grau e expressão de surpresa, susto. Eu tinha derrubado os livros dele! Merda!
--- Aí meu Deus! Me desculpa! --- Pedi quando nos afastamos, não ficamos perto por mais de dois segundos --- Eu sou mesmo desastrada, sinto muito!
--- Está tudo bem! --- Ele se apressou em falar, logo pegou os livros que haviam caído e os arrumou nos braços --- Eu também sou um desastrado. --- Sorriu.
--- Certo... --- Sorri constrangida, mas será possível que eu só passo vergonha?! --- É aluno novo? --- Perguntei pra descontrair o clima estranho. Nunca vi esse garoto por aqui antes.
--- Sou sim, ah, eu me chamou Jonathan. --- Se apresentou pondo os livros na mochila com certa dificuldade.
--- Sou Sophia. --- Falei, ele me encarou e franziu o cenho para a mecha de cabelo azul recém adquirida em meu cabelo loiro --- Tenho que ir, então até mais!
--- Até mais, Sophia! --- Exclamou enquanto eu ia para sala, que ficava ao fim do corredor, não tinham muitos alunos lá quando entrei, apenas um grupinho de alunas novas, e um garoto loiro que escutava música com um fone de ouvido.
Quando me sentei, em uma cadeira a frente dele, perto da janela, ele me encarou de relance, senti outro choque passar por meu corpo, ele pareceu desconfortável, e se virou para o outro lado rapidamente. Não é normal ficar sentindo choques toda vez que encontra um menino, com certeza não é.
Quando a sineta tocou, nosso professor de história, o Sr.Hopkins, entrou na sala, ele era um homem de meia idade, negro e careca, com óculos fundo de garrafa enfeitando o rosto gordo e fala arrastada, Jonathan entrou na sala e sentou em uma cadeira ao lado do garoto loiro.
O Sr. Hopkins decidiu sortear grupos para fazer um trabalho, o primeiro do semestre. Eu sou péssima com sorteios, tenho um azar pavoroso. Após colocar os nomes dos alunos em pedaços de papel, o sorteio começou.
Primeiro grupo: Julho, Marina e Mary Katie.
Segundo grupo: Rafaela, Leonardo e Félix.
Terceiro grupo: Sophia, Jonathan e Herik.
Não prestei atenção em quais eram os outros grupos, sei que Jonathan é o garoto em quem eu esbarrei, procurei com os olhos entre os alunos para ver quem poderia ser o Herik, e meu olhar caiu no garoto que estava aqui na sala quando eu cheguei, o loiro, ele tinha olhos verdes e me encarava com a sobrancelha levemente arqueada. Ele era o Herik.
Após um curta discussão sobre como seria o trabalho, Jonathan, Herik e eu saímos da sala para ir à biblioteca da escola. Nossa escola foi fundada à uns quarenta anos eu acho, mas ainda era bem conservada, uma arquitetura rústica era a principal característica da escola.
--- Vou perguntar para aquela senhora o que ela sabe e procurar um livro sobre o primeiro tema. --- Jonathan disse apontando para a Senhora Rouge, a encarregada de cuidar da biblioteca da escola, assenti e ele se afastou.
--- E o que nós dois fazemos? --- Herik perguntou pondo as mãos nos bolsos da calça jeans. Parecia entediado, aposto que ele é aluno novo, apesar de termos três séries do primeiro ano aqui na escola, não me lembro de já tê-lo visto antes.
--- Procuramos um livro? --- Fiz uma pergunta retórica arqueando a sobrancelha. Ele revirou os olhos e sumiu entre as prateleiras, sem dizer nada.
Depois de um tempo procurando livros, alguns outros grupos passaram por aqui e saíram com vários livros sobre seus temas, acabei encontrando o loiro de novo entre as várias prateleiras, Herik já tinha uns quatro livros grossos nos braços.
--- Vai ficar aí parada ou vai vir me ajudar? --- Perguntou com um humor péssimo --- O trabalho também é seu.
--- Eu sei. Tenho opção? Me dá um desses aí. --- Falei.
Andei até ele para pegar um dos livros, já estava perto dele quando senti meu pé bater contra algo no chão, me desestabilizei e acabei caindo em cima de Herik, que, para me segurar derrubou os livros que segurava no chão provocando um alto barulho.
--- Quê que foi isso? --- Jonathan saiu detrás de uma prateleira, enquanto Herik me colocava de pé outra vez, o moreno tinha as sobrancelhas franzidas --- Que houve?
--- Eu tropecei... --- Murmurei em resposta sentindo meu dedão do pé latejar. Mas que droga!
--- Só se for nas próprias pernas que você tropeçou! --- Herik exclamou pegando os livros que tinham caído.
--- Escuta aqui estressadinho, tem alguma coisa no chão, sim! --- Exclamei franzindo as sobrancelhas --- Bem aqui... --- Apontei para o chão, perto da prateleira onde eu perdi o equilíbrio.
--- Espera aí... --- Jonathan foi até perto da prateleira, colocou o livro que segurava em cima da pilha de livros que Herik segurava e se ajoelhou no chão, ele passou a mão pela madeira do assoalho por um tempo até falar --- Acho que achei alguma coisa...tem uma...porta aqui ou... uma janela...
--- Janela? --- Perguntei me abaixando.
--- Porta?--- Herik perguntou fazendo o mesmo, Jonathan tinha razão, olhando de perto pude ver marcas que desenhavam um quadrado no chão --- Isso não é uma porta...
--- Tampouco uma janela... --- Falei percorrendo as linhas com o dedo indicador --- Será que tem como abrir? --- Questionei curiosa.
--- Deve ter...espera para que mesmo nós queremos abrir isso? --- Herik perguntou se sentando no chão.
--- Nós eu não sei, mas eu quero saber o que tem aí.--- Falei me sentando também e encarando os dois.
--- Já sei! --- Jonathan exclamou pegando algo no bolso da calça jeans, ele tirou de lá um objeto que eu não sei bem o que era, fino e comprido quase como uma lâmina e era dourado.
--- Quê é isso? --- Perguntei enquanto ele aproximava o objeto das marcas do quadrado.
--- Achei na rua... --- Ele deu de ombros passado a lâmina ao redor das marcas no quadrado, franzi as sobrancelhas e olhei para Herik, que tinha a expressão de descrença no rosto, ele percebeu meu olhar e deu de ombros.
Após percorrer todo o quadrado com o tal objeto, Jonathan guardou ele de novo no bolso e retirou a tampa que havia se soltado. Ele colocou a tampa de lado e revelou um espaço retangular, não muito fundo, feito de madeira, onde havia nada mais, nada menos que um livro velho.
--- Um livro? É sério? --- Herik franziu as sobrancelhas, sua expressão era de deboche --- Isso foi uma perda de tempo.
--- Não foi não, ele é diferente, esse livro é mesmo diferente... --- Jonathan murmurou, encarei o livro, as páginas já estavam amareladas pelo tempo, a capa era de couro marrom, com símbolos estranhos gravados.
Aqueles símbolos...
Um flash back de alguém deitado ao lado de um livro passou por meus olhos, esse mesmo livro, havia uma energia dourada envolvendo-o, eu ouvi gritos e murmúrios de palavras estranhas, mas familiares. Fechei e abri os olhos com força, vi que Jonathan estava sentado e ofegante, os braços para trás apoiados no chão, Herik tinha um dos olhos fechados e uma das mãos apoiada discretamente na cabeça.
O sinal tocou, anunciando o final da aula de História. Jonathan cruzou as pernas e sua respiração voltou ao normal, Herik abriu os olhos e eu encarei os dois, minha respiração estava irregular. Será que eles viram o mesmo que eu? Será que eles são como eu?
--- Vocês, ah...estão bem? --- Jonathan perguntou. Herik murmurou algo como um "sim" e eu assenti --- Acho que esse livro deve ser estudado mais de perto....
--- Que quer dizer? --- Perguntei, ele não respondeu, colocou as mãos dentro do compartimento onde o livro estava e o pegou --- Você...tem certeza disso?--- Questionei surpresa.
--- Sim, ele...bem deve ter um motivo para ele estar enterrado. --- Falou se levantando, fiz o mesmo.
--- Se tem um motivo para ele estar enterrado, talvez, devesse continuar enterrado... --- Herik falou, mas como Jonathan e eu não falamos nada, ele bufou e fechou o compartimento de novo --- Vai ler ele? --- Perguntou.
--- Pretendo. --- Jonathan respondeu enquanto Herik se levantava sem muita vontade.
--- Quero fazer isso também! --- Herik e eu falamos em uníssono. Estranhei isso, mas acho que tanto ele, quanto Jonathan, viram o mesmo que eu.
--- Podemos nos encontrar no parque, inventamos uma desculpa, temos o trabalho para terminar mesmo, e lemos o livro sem ninguém saber, e depois devolvemos ele para a escola, como se nunca tivesse saído.--- Jonathan sugeriu --- Concordam?
--- Sim! --- Falei e Herik assentiu balançando a cabeça --- Agora, vamos sair daqui, não podemos levantar suspeitas, quando a aula terminar marcamos o horário.
Saímos com cuidado da Biblioteca, levando alguns livros para disfarçar, e marcamos de nos ver as 16:00 horas da tarde de hoje, no parque da cidade. Espero não me arrepender de ter aceitado esse encontro. Que será que esse livro esconde?
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