Capítulo 4: Família: Sinônimo de Confusão!
Sirius
Quando o dia de domingo amanheceu a expectativa pelo festival me atingiu em cheio. Era muito bom ter um corpo outra vez, embora ainda não tenha me acostumado completamente com ele, e ser um adolescente "normal" era mais complicado do que parecia.
--- Rafael ainda não desceu? --- Raquel perguntou entrando na cozinha, onde eu já tomava meu café da manhã --- Ah, bom dia.
A ruiva estava muito bonita, o vestido vermelho era simplis, mas combinava com ela, assim como os cabelos soltos e a maquiagem suave que ela havia passado.
Eu havia me vestido de forma simplis também, Rafael me garantiu: na dúvida vá de jeans! E foi o que eu fiz, além da grossa pulseira que escondia o Selo Celestial em minha mão.
--- Não, quando passei pelo corredor ele parecia estar no banho, ouvi o chuveiro ligado. --- Respondi --- Bom dia! --- Sorri.
--- Não sei como ele demora tanto pra se arrumar! --- Raquel reclamou de sentando num dos banquinhos de madeira ao redor do balcão de mármore --- Viu meu tio?
--- Jasper disse ontem que ia sair cedo, durante o jantar, não lembra? --- Franzi as sobrancelhas e peguei umas torradas, eu estava ficando ótimo na cozinha --- Ele vai a mansão.
--- Acho que não prestei muita atenção. --- A ruiva confessou montando um sanduíche enorme --- Eu ia preferir ver meus avós, a ir no festival.
--- Por que? Achei que estivesse animada, não está? --- Perguntei bebendo metade do café expresso que tinha feito.
--- Os bolos são os únicos atrativos que vejo lá... --- Ela respondeu após me encarar por um tempo --- E estou preocupada com meu avô também, sabe que ele não esta bem.
--- Bom dia, raios de sol! --- Rafael entrou na cozinha e um aroma forte e amadeirado tomou conta de tudo --- Como estão?
--- Tomou banho com perfume? Pra quê tudo isso? --- Raquel franziu as sobrancelhas.
--- Ao contrário de você maninha, eu preso muito por aqueles que estão ao meu lado, principalmente as garotas que terão a honra de sentir o cheiro do meu perfume! --- O ruivo disse convencido, ri dele e tomei outro gole do café.
--- Não é honra se qualquer um em um raio de cem metros consegue sentir seu cheiro. --- Raquel rebateu. Rafael revirou os olhos.
Sophia e Herik nos encontraram aqui, assim como Jonathan, e fomos juntos para o parque. Não pude evitar o deslumbre quando cheguei lá, embora fosse uma decoração simplis, eu achava linda, as coisas humanas sempre me chamaram a atenção, e agora que vivo no meio deles, não é diferente.
--- Onde estão os palcos pra bandas de rock? --- Raquel perguntou espiando por cima do ombro, para olhar em volta.
--- Devem estar do outro lado do parque, acho que vi algo parecido depois daquelas barracas de muffins. --- Sophia respondeu pegando o celular no bolso da saia --- Will acabou de chegar. --- Avisou.
--- Samantha está com ele? --- Rafael perguntou.
--- Que interesse todo é esse, ruivo? --- Sophia provocou sorrindo.
Paramos perto de algumas barracas, Herik, Jonathan e Raquel foram experimentar os pudins e eu peguei mais um refrigerante, era uma bebida muito boa! Embora Herik tenha me dito que eu estava virando um viciado, não entendi bem o conceito.
--- Ele acha que se ela se apaixonar por ele vai conseguir uma vaga no coral! --- Raquel exclamou voltando da barraca --- Mas vai cair do cavalo.
--- Vai mesmo, você não faz o tipo dela, Rafael. --- Herik disse cruzando os braços, o relógio que encobria seu Selo era discreto --- E nem o tipo do coral, acredite!
--- Não é pelo coral! E ela é uma garota incrível e muito bonita. --- Rafael argumentou --- Vamos procurar seu namoradinho, vem loira. --- Ele puxou Sophia pelo braço.
--- Espera aí, vou procurar os palcos! --- Raquel foi atrás deles.
--- Desde quando ela gosta de rock? --- Jonathan perguntou franzindo as sobrancelhas, e comendo mais pudim.
--- Ela não gosta, tá querendo fugir do Yuri. --- Herik respondeu, dei um longo gole no refrigerante --- Ele detesta rock, então não tem chance de ir pra lá.
--- E por que ela iria querer fugir dele? --- Perguntei afastando o cabelo dos olhos, eles ainda estavam compridos, mas não na cor original, cinza --- Eles não tinham um "caso". --- Fiz aspas com os dedos.
--- Ele acha que tem um "caso" com ela. --- O loiro respondeu começando a andar --- Raquel disse que ele não sai do pé dela desde a festa de fim de ano.
--- Então foi com ele que ela ficou? --- Jonathan perguntou, enquanto seguimos atrás de Herik, que assentiu --- Mistério solucionado então! --- Brincou.
Passamos em mais algumas barracas lindas, e por mais que eu quisesse mais refrigerante, Herik e Jonathan me proibiram de beber mais que dez latinhas. Um absurdo. Não vimos mais Raquel, e Sophia só apareceu depois de meio dia, com Will, mas tiveram que ir ajudar a mãe dele com a barraca dela.
--- Acham que vamos sentir falta disso? --- Jonathan perguntou observando a feira --- Quando formos Guardiões de verdade não vamos poder fazer nada disso.
--- Acho que sim, coisas como essa vão fazer falta. --- Falei, Herik assentiu.
--- Eu tentei acreditar que poderíamos ter uma vida normal, mesmo com os poderes, mas agora sei que não podemos. --- O loiro suspirou --- Sabe, mesmo que façamos coisas de adolescentes, como agora, a maior parte das nossas conversas são voltadas a isso, aos poderes e ao que somos agora, o que vamos ser depois dos dezoito. --- Herik encarou as árvores.
--- Você tem razão, é difícil ser normal com algo assim pesando nos ombros, embora eu não tenha uma definição exata de normal. --- Admiti --- Sobre o quê deveríamos falar? Como adolescentes normais, digo. --- Sorri.
--- Seguindo o padrão que conheço... --- Herik pareceu pensar, Jonathan agora comia biscoitos --- Futebol, garotas, jogos, talvez filmes e seriados também, garotas de novo, futebol. --- Herik contou nos dedos.
--- Todos assuntos nos quais eu não tenho experiência! --- Exclamei sorrindo --- Mas se quiser podemos falar sobre Técnicas de Manipulação, ou sobre mapeamento de áreas, eu posso até te contar detalhadamente como aconteceu a rebelião da segunda área.
Herik e eu começamos a rir e Jonathan se engasgou, tendo que correr até a barraca mais próxima para beber água, quando a crise de risos passou e Jonathan voltou, o moreno sorriu e comentou:
--- Realmente somos caras estranhos! Mas isso é bom, pessoas normais não são interessantes. --- Ele sorriu pondo as mãos nos bolsos da calça jeans.
--- Verdade, acho que concordo. --- Assenti devagar --- Isso tudo ainda é meio novo para mim. --- Encolhi os ombros.
--- Isso, exatamente, o quê? --- Jonathan perguntou, ajeitando a corrente simplis no pescoço.
--- Ser normal. --- Respondi --- Estar com outros da minha idade, embora eu seja mais velho do que aparento. --- John sorriu --- Fazer coisas normais e ir a escola, festas, essas coisas. Não fazíamos isso na Província do Céu. --- Contei.
--- E vocês faziam o quê lá? --- Herik questionou --- Vamos sentar, meus pés estão me matando! --- Ele se adiantou para um banco.
--- Nós treinavamos, e estudavamos a maior parte do tempo. --- Falei quando já estávamos sentados --- Desde pequenos era isso que nos ensinavam, ser bem estudado era tão essencial quanto lutar bem, e a maioria só queria ser alguém importante na guarda da sua respectiva área.
--- E o que você queria? --- Jonathan me perguntou pondo os braços atrás da cabeça.
--- Eu queria que tivessem orgulho de mim. --- Confessei --- As Flores tinham acabado de aparecer, acho que já falei sobre isso, e eu era o único adolescente na Força criada por Alvorada, embora muitos outros estivessem participando por baixo dos panos, mas do lado errado.
--- Você queria continuar trabalhando pra Alvorada? Ou tinha alguma outra coisa em mente? --- Herik questionou.
--- Queria continuar na Força, nunca quis um cargo alto, mas quando comecei a trabalhar com Alvorada vi que queria fazer mais pelos outros do que por mim. --- Contei com um sorriso --- Mas vou poder fazer isso como Guardião.
--- Nós vamos. --- Herik garantiu.
--- E seremos ótimos Guardiães! --- Jonathan sorriu.
***
O festival havia sido incrível, muitas músicas boas, embora não vi muito sentido nas letras de algumas. Raquel disse que era melhor me concentrar mais na melodia do que na letra.
--- Que dia! --- Raquel exclamou tirando as sapatilhas e as jogando num canto da sala --- Essas férias serão animadas!
--- Estou contando com isso! --- Rafael se dirigiu ao corredor que leva a cozinha, Raquel e eu fizemos o mesmo --- Tio? Já chegou? --- Chamou entrando na cozinha.
--- Cheguei a tardezinha. --- Japser respondeu perto do fogão --- Como foi o festival? --- Perguntou pegando uma frigideira.
Rafael contou detalhadamente como estava o festival, e sua opinião sobre os bolos, biscoitos, doces e sobre cada banda e cantor que ele ouviu. Raquel escutou tudo enquanto tomava um suco junto comigo.
--- Aproveitem enquanto podem... --- Japser disse pegando um pote com tempero, ele estava fazendo aula de culinária, Ezra até havia dado umas dicas --- Logo, logo os treinos vão voltar, em!
--- Estive pensando e acho que deveriamos começar a treinar com armas, armas de fogo. --- Raquel disse se sentado no balcão --- Elas podem ser mais práticas que as espadas com que você nos fez treinar.
--- Acho precipitado. --- Japser balançou a cabeça, mexendo com uma espátula o que tinha dentro da frigideira --- Mas posso convocar a Assembleia para...
--- Deveríamos fazer isso sem falar com a Assembleia. --- A ruiva o interrompeu --- Eles só iam atrapalhar e se quer saber, minha vontade é de não fazer mais parte dela. --- Raquel encarou as costas do tio.
Rafael se engasgou com o suco que havia começado a beber, e eu arregalei os olhos deixando o copo quase cheio sobre o mármore do balcão. Raquel querer sair da Assembleia? Nunca imaginei tal coisa!
--- A questão não é só a Assembleia, eles são nossa família também, Raquel. --- Jasper se virou com a espátula numa mão e um pano de prato na outra --- Você não pode simplesmente achar que vou fazer as coisas pelas costas deles!
--- Como se eles não fizessem pelas nossas! --- A ruiva rebateu --- Sei muito bem que têm coisas que não contam pra gente, e sei que eles acham que sabem o quê é melhor para o Sirius e os outros, mas eles não sabem!
--- A Assembleia fez tudo por eles, nós fizemos tudo por eles, e foi graças a isso que eles chegaram até aqui, com um treinamento militar e psicológico, além de treinamento médico. --- Os olhos castanhos de Jasper estavam sérios, muito sérios --- Treinar eles com armas de fogo não fazia parte do que combinamos. Vocês são crianças!
--- Nosso treinamento tinha armas bem mais perigosas do que armas de fogo, tio! --- Rafael argumentou pondo o copo de vidro em cima da geladeira.
--- Armas brancas! Não posso deixar vocês usarem armas de fogo! --- Jasper pois a espátula e o pano na pai --- Já fizemos muitas coisas que...que desviaram da lei, colocar armas de fogo nas mãos de vocês não vai ser uma delas.
--- Já fizemos coisas bem piores que segurar uma arma de fogo, tio. --- Raquel disse num tom frio.
--- Estávamos em guerra, não estamos mais.
--- Acho que ele tem razão, Raquel... --- Comecei, tentando amenizar as coisas --- Nos colocar para usar armas de fogo não é a melhor opção, sabe que nem vamos usar isso, não em Orbis Caelesti. --- Falei.
--- Vocês não estão em perigo só lá! --- A ruiva rebateu --- Filhos Das Estrelas vieram aqui ano passado, quase mataram Herik e Sophia! E os dois só tinham adagas para se proteger. Adagas! --- Exclamou descendo do balcão.
--- E os poderes também. --- Jasper pois as mãos na cintura --- Não se esqueça que eles tem os poderes para se defenderem, e eles não têm mais que dois anos aqui, a Ascenção não está tão longe.
--- Por isso mesmo eles deveriam estar mais preparados! --- A ruiva cruzou os braços --- Mervus pode estar morto, mas não sabemos que outras criaturas estão espreitando.
Troquei olhares com Rafael. A briga ia ser feia, o ruivo tentou argumentar, mas Jasper estava irredutível, e seu tom era sério quando respondeu.
--- Eu não vou deixar vocês usarem armas de fogo. Ponto final. Não adianta discutir, nem vou levar isso a pauta, não vale a pena. --- Ele tirou as mãos da cintura.
--- São essas suas atitudes covardes que me deixam tentada a ir embora! --- Raquel exclamou, depois de respirar fundo ela continuou --- Sua sorte é que minha guarda está com você, e não com meus avós.
Levei a mão a boca e Rafael arregalou os olhos. Silêncio. Uma veia se alterou no pescoço de Jasper e ele franziu as sobrancelhas.
--- Está dizendo que queria ir embora? --- Questionou.
--- As vezes sim, mas eu não posso, eu tenho que ficar aqui, tenho uma missão, não tenho? --- Raquel ergueu o queixo --- Faço parte da Assembleia e não sou ouvida, minha opinião não importa!
--- Quel, sua opinião importa sim, a Assembleia que é antiquada, eles não estão prontos pra nós! --- Rafael se aproximou da irmã com um sorriso --- Não pode me deixar aqui, maninha.
--- Eu não deixaria, nunca. --- Raquel garantiu quando ele pois a mão sobre seu ombro --- Mas ficar na responsabilidade de alguém que não se importa com o que eu penso, não é fácil. --- Ela encarou Jasper.
--- Eu me importo com o que você pensa, só que me importo mais com sua segurança. --- Ele rebateu --- Com a de todos vocês. Não são só você, Rafael e Sirius sob meus cuidados, Jonathan, Herik e Sophia também são minha responsabilidade.
--- Então pense na segurança deles! --- Raquel pediu --- Andar com facas e adagas é tão diferente de ter uma arma? --- Perguntou.
--- Claro que é, Raquel. --- Japser respirou fundo e olhei de um para o outro sem saber o que falar --- Não vou colocar vocês para mexer com esse tipo de coisa, nem cogite essa ideia! Eu não abri mão da minha vida para cuidar de vocês e deixar que se metam em uma confusão dessas...
--- Acha que sua vida acabou só por ter que cuidar de nós? --- Raquel o interrompeu --- Largou sua carreira no exército e agora acha que somos culpados?
--- Eu não disse isso...
--- Mas é o que pensa! --- Raquel exclamou indo até a saída da cozinha --- Meus pais não escolheram morrer. --- Ela saiu pisando duro e ouvi a porta da frente bater com força.
Senti o cheiro forte de queimado antes de Rafael desligar o fogo e fumaça subir da frigideira que a pouco Jasper mexia.
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