Capítulo VI
Capítulo VI
1908 words
Abro os olhos lentamente, mas a luz do sol incide no meu rosto. Tento fechar as cortinas telecineticamente, mas o meu poder falha. Simplesmente viro-me para o lado onde Jéssica deveria estar, entretanto não a vejo e levanto-me bruscamente e saio do quarto a sua procura.
─ Jéssica? – chamo desesperado, pois não sinto a sua presença por perto. – Jéssica?
Escuto um barulho vindo da cozinha e teletransporto-me até lá e para o meu alívio encontro-a parada perto do fogão, segurando um prato. Ela não me vê, portanto, aproveito a sua distração para me aproximar devagar dela e antes de chegar perto o suficiente, admiro como está linda usando apenas a minha camisa. A cada dia eu me apaixono mais por ela, talvez seja por isso que eu não consigo usar grande parte dos meus poderes sem sentir dor ou falhar na primeira tentativa.
Eu sempre soube que o amor deixava os humanos fracos, mas não fazia ideia do poder que esse sentimento tinha muito menos dos efeitos que teria comigo.
Encurto a distância entre nós e beijo o seu pescoço. Jéssica vira-se e sorri para mim. Tento beijá-la, mas algo nela me repele, é como se não fosse a mesma de sempre.
─ O que foi meu amor? – pergunta confusa com o receio que demonstrei.
Ela é a mesma sim. Receio que seja a minha mente que está perturbada com tudo que está por vir, com a fuga de Isadora e pelo fato de eu ainda não ter dito a verdade a Jéssica. Como será que ela reagirá depois de saber que tentei matá-la e substituir a sua alma pela alma de outra mulher? Uma que eu amei tanto e que esteve sempre comigo dentro da minha espada! Suspiro e tento me concentrar apenas neste exato momento.
─ Eu te amo Jéssica! – digo e ela se entristece. – O que foi?
Sem responder a minha pergunta, ela apenas vira-se ficando de costas para mim, pega mais um prato e arruma tudo na mesa. Pensei que tivéssemos resolvido o mal entendido do banheiro ontem à noite e agora. O que foi que eu disse de errado?
Suspiro e procuro ser paciente, uma virtude que perdi há muitos milênios, mas que por ela eu tento recuperar.
─ Me perdoe Jéssica, eu não quis magoar você. – digo.
Ela não diz nada e me aproximo para resolver definitivamente isso.
─ Eu sei que assustei você, mas eu prometo que aquilo jamais se irá repetir. Está bem? – seguro o seu braço e colo os nossos corpos num abraço muito confortável. Apesar de eu não ter sentido nenhum conforto com o ato.
Surpreendentemente, Jéssica me beija e eu retribuo. Agarro-lhe pela cintura na tentativa de sentir a eletricidade percorrer os meus nervos como sempre, mas tudo o que eu sinto é a boca gelada e o seu corpo frio como se não tivesse vida. Afasto-me e procuro nela o que está diferente.
─ O que foi Zael? Tem medo de mim agora? – de repente, observo os seus olhos mudarem de cor e tornarem-se mais escuros, como se uma legião de demônios a tivesse possuído. Afasto-me mais e concluo tratar-se de Isadora. A minha preocupação com Jéssica me invade novamente deixando-me desesperado.
─ Jéssica? – retiro-me da cozinha apressado e procuro por Jéssica pela casa. Mas é inútil, pois aqui, nesta casa eu não sinto o seu cheiro, nem ao menos a sua presença. Volto à cozinha e encontro Isadora ainda parada com um sorriso maquiavélico no rosto. Tento sufocá-la telecineticamente, mas não funciona e continua sorrindo, aproximo-me dela e trato de apertar o seu pescoço fisicamente. – Diga-me onde está a minha mulher, Isadora? – exijo apertando ainda mais o seu pescoço.
Conforme eu a sufocava com mais força, Isadora simplesmente sorria com um olhar negro e vazio. O que foi que eu fiz com ela? Sinto-me responsável por isso, pois por minha culpa ela foi morta e ainda assim, eu aprisionei-a num lugar solitário. É tudo culpa minha.
─ O que você quer Isadora? – pergunto.
Inesperadamente, o seu corpo desintegra-se diante de mim e torna-se num pó escuro que conforme o vento sopra, desaparece da minha frente. Entretanto, escuto a sua voz no meio do pó que paira pelo ar dizendo novamente as mesmas palavras:
─ ″ Ficaremos juntos para sempre″.
─ Isadora? – grito sem saber onde achar Jéssica. O que ela fez com a minha mulher? – Isadora?
Zael?
Escuto Jéssica à distância e teletransporto-me até a sala, mas não a encontro. Escuto novamente a sua voz a chamar pelo meu nome, mas não a vejo nesta casa. Teletransporto-me por fim para o jardim da casa, o brilho do sol fere os meus olhos e cubro o rosto por segurança. Enfim, sinto a sua mão tocar o meu tórax e só então consigo vê-la, com um olhar assustado.
Levo a minha mão em direção ao seu rosto e tento acalmá-la. Sinto que o meu corpo está molhado e somente depois de alguns segundos, percebo que ainda estou deitado sobre a cama.
Antes de me levantar, ela me abraça e sinto o seu corpo tremer de susto. É óbvio que aquilo que eu vi foi só mais um sonho, porém, resta-me descobrir o que a deixou tão assustada assim.
─ O que aconteceu Jéssica? – pergunto.
─ Você sonhou com alguém de nome Isadora. – ela explica e noto que está incomodada com algo. Bem, depois de ouvir-me chamar por outra mulher no sonho, com certeza qualquer mulher ficaria assim. – Vai me explicar quem é essa mulher?
Fico sem saber como explicar a ela, portanto tomo a decisão de mudar de assunto e fazê-la se esquecer do que acabou de acontecer. Dou a ela um abraço muito apertado e acaricio os seus cabelos. Suspiro e muitas imagens surgem em minha mente, todas elas envolvendo Isadora e a espada. Eu preciso achá-las e resolver o problema.
─ Vai ficar tudo bem meu amor! – digo a encarando. – Eu agora preciso encontrar a espada e impedir a Kesabel.
─ E como você fará isso? – questiona preocupada.
─ Você sabe que existo há vários milênios e que antes de você eu conheci outras humanas... – por um momento penso em contar-lhe toda a verdade, mas não posso, não pretendo causar mais dor a ela. – Uma delas me amou tanto que acabou tendo algum tipo de conexão com a minha espada. Por isso eu acho que devo ir até o lugar onde a conheci e que também morreu, talvez lá esteja a minha espada.
Jéssica baixa o seu rosto e suspira. Desce da cama, caminha até o guarda-roupa e começa a despir-se. Não compreendo a sua atitude, então desço também e caminho até ela. Jéssica separa uma calça jeans e uma blusa de capulana azul com pontinhos brancos.
─ Está brava de novo comigo? – pergunto coçando a cabeça, muito confuso.
─ Não Zael. Eu irei com você. – diz e eu fico sem ação. – Estamos juntos nessa desde o começo meu amor. – conclui terminando de se vestir e por fim, ela leva um par de botas pretas.
─ Deixa que eu, o Karion e a Kiara resolvemos isso. – falo e puxo-lhe de volta a cama. – Você fica aqui e ajuda o Lucas a cuidar da Valentina e das gêmeas.
─ Mas... – interrompo-a imediatamente com um beijo de despedida.
Aproveito o máximo, pois pretendo levar comigo o gosto que os seus lábios tem para que, quando Isadora e eu nos encontrarmos finalmente, eu não fique confuso sobre os meus sentimentos. O amor que sinto por ela é diferente do que alguma vez senti por Isadora, por isso levarei comigo o cheiro dela, o sabor dos seus lábios como um lembrete de que terei que voltar para ela.
─ Saiba que não importa o que aconteça eu vou sempre amar você.
Desde a derrota de Kesabel, por precaução, Jéssica e eu, tomamos a decisão de criar um quarto na nossa casa com todas as informações ‟mitológicasˮ que ela colecionou e outras que eu forneci a ela. Neste quarto, eu guardo dentro de um baú, alguns dos meus pertences, tais como as minhas adagas, espadas, livros e outros manuscritos que achei necessários para Jéssica estudar. Ela gosta de ficar aqui, lendo, e às vezes escrevendo tudo que vivemos os rituais que teve que fazer e também escrevendo algumas histórias que conto a ela sobre a magia com a qual eu me envolvi ao longo dos meus milênios.
Jéssica ficou tão animada com a ideia que criou uma espécie de biblioteca. Eu nunca havia mostrado a ela o meu lado guerreiro, por medo que ela tivesse medo de mim, porém antes da minha partida, eu a mostrarei, já que prometemos transparência na nossa relação.
Levo-a até o quarto das relíquias e respiro fundo antes da minha transfiguração. Desde o dia em que Jéssica fez o ritual de evocação ela não voltou a ver a minha face demoníaca. Mas já é hora de encarar isso de uma vez.
Lentamente, sinto o meu poder fluir, ela me observa com o olhar atento e talvez impressionado com o que vê. Por mais que eu tente impedir as emoções negativas em mim eu não consigo, pois esse é um dos preços a ser pego por ser o que eu sou. Fui impedido de voltar a ver a luz, essa é a minha maldição, por isso aproveito o máximo que posso ao lado de Jéssica, pois ela é a minha luz.
Envergonhado com a minha aparência, baixo o meu rosto e espero a manifestação dela. Entretanto, ao contrário da reação que eu esperava, Jéssica aproximou-se e segurou a minha mão esquerda e com a sua outra mão, levantou o meu queixo e exibiu o seu lindo sorriso.
─ Eu ainda amo você Zael. – diz. – Não tenha vergonha de você mesmo, meu amor. Melhor do que qualquer outra pessoa eu reconheço o quanto você tem se esforçado para ser melhor do que já foi no passado.
─ Não tem medo de mim? – pergunto inseguro.
─ Eu durmo todas as noites ao seu lado há dois anos – diz tornando a distância entre nós menor ainda. – acredite Zael, é ao seu lado que eu mais me sinto segura. Você é o meu guardião.
Sorrio aliviado e fico mais a vontade para fazer o que eu precisava para sair e caçar Kesabel e a minha espada.
Preparo-me adequadamente para sair e evoco Karion e Kiara. Os dois aparecem e dou a eles todas as instruções.
─ Vocês irão primeiro e sigam qualquer resquício da magia da minha espada, e depois me informem. – digo e os dois de seguida se teletransportam.
Assim que eles se retiram, evoco uma das minhas espadas, duas adagas e uma armadura que cobre o meu corpo inteiro, e por fim o elmo dourado de Nyda, a bruxa que adicionou magia na minha espada perdida e me mostrou a época em que Jéssica nasceria. O elmo de Nyda é mágico, possui uma pedra de rubi no centro dele, dois chifres semelhantes aos dos antílopes, ligados ao rubi, e mais dois chifres, um de cada lado da orelha. A bruxa me avisou de que muitas coisas mudariam assim que eu conhecesse Jéssica, e se ela me tivesse dito que as coisas acabariam dessa forma, eu jamais teria acreditado nela.
Preparo-me para enfrentar novamente a Kesabel e, espero que dessa vez ela não tenha se fortalecido ainda mais.
Teletransporto-me até Ciarubra*, próximo ao mar e aguardo um tempo para recuperar as forças. Estou cada vez mais fraco, mais humano por isso deverei tomar bastante cuidado com a Kesabel.
Ciarubra* - cidade fictícia
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