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Agosto, dia 27

Ele contemplou o caderno que segurava nas mãos trémulas. Algumas das suas páginas tinham a tinta que segura as palavras já borrada de lágrimas derramadas em ocasiões anteriores. A última carta estava inacabada e a folha onde fora escrita estava rasgada a meio. No entanto, não fora essa a razão que o impedira de continuar a escrever.

— Querido, o almoço está pronto.

Ele girou a cadeira onde estava sentado para olhar a mulher na porta. Apesar de carregar no ventre o seu segundo filho, continuava tão bonita e deslumbrante como quando a conhecera.

Uma criança apareceu no vão da porta do escritório. Já se aguentava nas suas duas pernas, mas andava a cambalear, ainda a apanhar o jeito à gravidade. O rapazinho de cabelos negros inclinou-se para a frente com murmúrios infantis, possivelmente chamando pelo pai. A mãe apanhou uma das mãos rechonchudas da criança antes de se inclinar preguiçosamente para a pegar no colo.

— Trancas-te aqui toda a manhã para ler esse diário todos os anos, exatamente neste dia. Tem sido assim nos últimos 14 anos. Não achas que já chega?

O bebé soltou um pequeno risinho histérico e bateu palmas, ignorando a conversa entre os pais. A mãe sorriu-lhe por uns minutos, durante os quais o marido se manteve em silêncio a observá-los.

— Sabes que é a única maneira de a manter viva, Carol. — Ele girou a cadeira de novo, ficando virado para a secretária. — Eu já vou.

A mulher suspirou.

— Não, não é — murmurou, sem que ele a ouvisse.

As palavras ficaram no ar, suspensas. Ela fixou o seu olhar no marido por instantes, ignorando o filho mais velho que lhe puxava os cabelos castanhos com uma força considerável. Há 14 anos que ele reservava a manhã daquele dia para o passado: dava a sua atenção às memórias contidas naquele velho caderno de capa de couro castanho e dispunha-se a sentir de novo toda a amargura que aquelas páginas carregavam. Não importava onde estivessem nem o que ela fizesse para o tentar distrair ou ocupar a sua mente. Era um pequeno ritual inquebrável.

Ela compreendia-o nos primeiros anos. Era o luto que o fazia ler tudo o que escrevera nos últimos tempos de vida da irmã. Mas, com o passar do tempo, a mulher achava aquilo cada vez menos saudável. Não obstante, ela não se atrevia a impedi-lo. Tinha de ser ele a acabar com aquele hábito de livre e espontânea vontade. De outro modo, ela poderia apenas agravar a situação.

— Não faças os teus pais esperar, Sam. E o Óscar e o Max telefonaram há bocado. Pediram para ligares de volta — acrescentou ela, em voz alta, antes de regressar à cozinha.

Ele olhou para a última página do diário — ou pelo menos a metade que dela restava — antes de o fechar e arrumar de novo na gaveta, de onde só sairia no ano seguinte, dali a exatamente 365 dias. Ainda se lembrava do dia em que iniciara aquela carta.

O horário de visitas tinha aberto à pouco tempo. A Martha estava a dormir em casa e o John fora comer, por isso ele foi o primeiro a entrar. Ela estava pálida. Mais pálida que o costume, já que Diana era uma daquelas raparigas naturalmente brancas, que teria de passar inúmeras horas debaixo da torreira do sol para se bronzear, se ela realmente se importasse com o seu tom de pele.

Os seus olhos tinham aberto devagar ao ouvir a voz dele a cumprimentá-la. O sorriso que ela esboçou foi frouxo antes de sucumbir a um ataque de tosse feio e violento. Ele tinha puxado a pequena poltrona que se encontrava no canto do quarto para a beira da cama e acariciado a sua mão suavemente, pensando que não havia nada que pudesse fazer por ela.

"Estou cansada, Sammy", dissera ela depois de se voltar a deitar pacificamente, "Tão cansada. Tenho lutado a minha vida toda. Mas já estou farta de lutar... Preciso de descansar."

Ele lembrava-se de ter agarrado a irmã numa questão de segundos, num abraço apertado, para a impedir de continuar a gastar as suas forças.

"Obrigada por me teres dado a minha última dança", sussurrara ela, referindo-se à tentativa de a animar que o irmão mais velho tinha feito alguns dias antes. 

Nesse dia, Diana tinha se levantado da cama de hospital pela última vez, para dançar com Samuel, amparada nos seus braços. Já não tinha forças para se suster de pé sozinha, mas o balançar do seu corpo ao som da sua música favorita tinha enchido o seu coraçãozinho com a esperança de que elas voltariam, mais cedo ou mais tarde.

"Perdoa-me...", tinha pedido ela depois, numa voz arrastada, com a boca bem colada ao ouvido do irmão. De outro modo, ele não teria sido capaz de escutar e entender aquele murmúrio.

"Está tudo bem, Di. Podes descansar, agora. Eu não fico chateado. Dou-te o meu perdão se o quiseres mesmo, ainda que não haja nada para perdoar. Eu fico bem. Eu e os pais ficamos bem, apesar das saudades de te termos por perto e bem de saúdeDescansa agora, minha prima ballerina"

Os seus olhos não tinham demorado muito tempo a fechar, levando-a para um sono sem sonhos. Ele depositara um beijo singelo na sua testa antes de sair. Nem se dera ao trabalho de arrumar a poltrona. Talvez o John ou a Martha a fossem utilizar depois dele.

Ele fora comer qualquer coisa na cantina do hospital, encontrando o pai adotivo pelo caminho. Regressaram ambos à sala de espera daquela ala hospitalar e sentaram-se nas cadeiras. O pai foi ver a Diana, mas ela estava a dormir, pelo que não se demorou lá dentro muito tempo. Quando saiu do quarto dela para a zona de espera, ligou à mulher. Ela já estava a caminho do hospital.

Samuel começara a escrever a última carta minutos antes da mãe chegar até eles, ainda afundados nas cadeiras almofadadas da sala de espera. Não tivera tempo de a terminar. Quase três horas depois da sua conversa com Diana, um médico apareceu. Martha tinha acabado de pousar as suas coisas ao lado dele para ir ver da sua irmã. Mas não teria mais nenhuma oportunidade. Diana tinha morrido pacificamente e sem dor, durante o sono.

Só muito tempo mais tarde é que Samuel compreendeu que tinha dado a Diana permissão para poder morrer em paz, sem se aperceber. Nunca tinha contado aos pais as últimas palavras que trocara com a irmã e tencionava levar aquele segredo consigo para o seu próprio túmulo.

— Vamos, rapaz.

Samuel levantou-se da cadeira do escritório. Ao lado da secretária, um cão com vários tons de castanho, um cruzamento de Kelpie australiano, espreguiçou-se para seguir o dono. Era o mais recente sucessor de Rover, o primeiro cão que ele e a mulher adotaram depois de comprarem a sua própria casa e que tinha morrido há cerca de três anos, pouco depois do nascimento do pequeno Daniel. Aquele novo cão, a que chamaram de Marlo, era bastante mais calmo que Rover. Parecia nem ter metade da energia que o outro tinha na sua idade. Contudo, era carinhoso e uma excelente companhia, especialmente para o seu filho bebé.

Antes de sair da divisão para se juntar aos pais, à mulher e ao filho que já o esperavam à mesa, Samuel olhou a prateleira ao lado da porta. Era exclusiva para molduras e pequenos objetos decorativos, já que por baixo tinha a pequena e larga estante, que mal lhe passava a cintura.

As lágrimas marejaram-lhe os olhos quando contemplou a sua foto favorita.

Estava desfocada, mas valia para ele muito mais que qualquer outra. Na imagem, a pequena Diana estava sentada no meio da sala de estar dos seus pais e segurava o seu primeiro par de sapatos de ballet  contra o peito. Os seus lábios detinham o maior sorriso do mundo. Atrás dela, um jovem Samuel abraçava-a, com os braços apoiados nos seus ombros frágeis. Tinha feito uma careta para a máquina fotográfica, imortalizando para sempre a expressão gozona.

A fotografia, colocada entre uma foto do Daniel ao nascer e uma outra, de família, no primeiro Natal em que a Carol viera jantar com ele, os pais e a irmã, parecia ter sido tirada há séculos. Olhar para ela dava-lhe um misto de felicidade nostálgica e raiva.

As memórias são tanto uma bênção como uma maldição.

Antes de sair do escritório, Samuel reparou no livro quadrado que surgia junto aos pés da baixa estante. Era um dos muitos livros ilustrados do filho, que a toda a hora apareciam espalhados pela casa. Aquele em particular, era uma versão ilustrada da Bíblia, oferecida ao pequeno pela mãe da Carol.

Com um resfolegar irritado, ele pegou no livro. Tanto a família dele como a da Carol são cristãs e insistem para que o pequeno Daniel, e o seu futuro irmão, também o sejam. Samuel aceitou que educassem os filhos na religião que ele abandonou há 14 anos, desde que não o envolvessem no assunto. Contudo, ver coisas como aquelas a cruzar o seu caminho constantemente fazia com que a velha raiva que sentia contra Ele aflorasse de novo. Sam nunca seria capaz de perdoar a morte prematura da irmã, que não chegara sequer a fazer 17 anos.

— Querido! O almoço vai ficar frio — exclamou Martha da cozinha.

Já no corredor da casa, Samuel deixou cair o livro ilustrado numa caixa de brinquedos.

— Já vou, mãe! — respondeu, olhando uma última vez para aquele objeto.

Quem me dera esquecer.

E, forçando um sorriso que não era sequer capaz de esconder a amargura das suas feições, Samuel foi de encontro à sua família.

[editado: Dez 2024]

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