Relatos de uma órfã
Quando se é órfã, você sempre fica meio sem espectativas de vencer na vida. Digo isso porque desde que me conheço por gente, sofri o famoso pão que o diabo amassou".
Meus pais morreram em um trágico acidente de avião quando eu ainda era um bebê de três meses. Minha pessoa foi enviada para os parentes mais próximo, um casal de tios no interior de São Paulo.
Os dois eram uns amores, tendo vagas lembranças de brincadeiras, risadas, cuidado e afeto. Não podiam ter filhos por problemas fisiológicos, então me tratavam como se eu fosse a filha deles.
Entretanto tudo durou muito pouco. Vivi com eles um pouco mais de dois anos porque como meus pais eles também haviam falecido. Uma morte muito dolorosa para mim que menos de 3 anos.
Diante do novo aspecto de minha vida fui enviada para mais um parente, porém da parte do meu pai, um tio solitário e bem ranzinza.
O mesmo era rico, tão rico que por mais que gastasse sempre tinha mais e mais dinheiro. Conteúdo apesar da riqueza, era um homem amargurado e violento, tão violento que tinha dias que me escondia para não apanhar, outras, era espancada pelos mais motivos banais.
Por existir. Por ser uma garota e lembrar de sua filha. Por brincar. Por me atrasar para tomar banho ou coisas do tipo. Por querer aprender sobre coisas...
Meu tio havia se casado tempos antes, e desse casamento um fruto, uma garota que por sua violência, tanto esposa quanto filha ainda pequena haviam o abandonado, desta maneira sobrava para mim, uma garotinha de quase 4 anos
Com ele vivi cinco anos, até que um dia me expulsou alegando que o dava muitas despesas e era seu pior desgosto. E mais uma vez, lá estava eu sozinha e com pouco idade, oito anos e pouco.
Com nenhum parente mais próximo e vivo, o jeito foi me enviarem para um orfanato de uma cidadezinha bem pequena chamada Borá, de quase oitocentas e cinquenta pessoas
Neste lugar vivi meus piores momentos. Era obrigada a trabalhar para meu próprio sustento, pois a diretora sempre dizia que se eu não ajudasse era rua da amargura.
Sem saída e de menor, fazia de tudo um pouco, desde varrer, passar pano, lavar louça, limpar os inúmeros quartos das crianças mais novas, servir os alimentos aos tais... até fazer alguns tipos de comidas.
Apanhava quase todos os dias pelas mais diversas coisas... Por não ter limpado direito um lugar.
Por uma criança que estivesse cuidando começasse a chorar. Por dormir um pouco mais. Por atrapalhar alguém mais velho com uma pergunta... e assim por diante.
Eu não sabia o que era um sentimento de carinho e afeição, um gesto de bondade ou o tal do amor ao proximo. Era sempre tratada como qualquer coisa, me diziam que eu não valia nada e nunca valeria, que meus pais haviam morrido por desgosto em ter uma filha como eu, que meus tios se mataram por terem que me aturar. Por ter sido expulsa do último lar por ser uma escória da sociedade.
Chorava todo o fim do expediente, não entendia a causa de ter que passar por tudo aquilo. Toda a noite quando ia dormir falava com Deus. Perguntava a Ele do porque eu vivia daquele jeito? Se tudo o que os outros falavam de mim era verdade? Se eu sempre iria sofrer... e que se a resposta fosse sim, se Ele pedia me levar deste mundo, pois apesar de nova já estava cansada demais de tudo e queria um pouco de alívio.
Apesar de sempre fazer as mesmas perguntas a Deus, esse era o único momento em que me sentia um pouco melhor, pois quase sempre Papai me respondia, me fazendo lembrar de passagens do livro dEle, de histórias que eu escutava de desconhecidos que iam para o orfanato adotar as crianças e tal.
Conheci a Deus quando ainda morava com o tio ranzinza. Toda a noite depois que ele jantava, sentava na frente de sua enorme Tv e colocava em seus programas de esporte, todavia sempre dormia quando começava um programa de louvor e pregações.
Aquele era o momento que eu tinha para assistir sem ele saber ou era castigada. De longe assistia até o final as músicas e as palavras que os homens e mulheres diziam.
Era bom poder ouvir e aprender sobre os caminhos e planos de Deus. Hoje, morando onde moro, não vejo mais televisão, mas sempre me recordo de cada coisinha que aprendia na época, na casa do tio ranzinza.
No orfanato permaneci até completar meus dezessete anos, quando por escolha propria fugi. Acreditava que qualquer lugar fosse melhor que aquilo.
Tinha saído somente com a roupa do corpo, andando sem rumo até sair de Borá e boca a boca chegar na grande São Paulo. Lá, morei por um ano na rua, pois ainda era de menor e não conseguia emprego e nem moradia por não ter grana para bancar.
Quando completei dezoito anos, enfim consegui um emprego de faxineira em um escritório de advocacia e vi pela primeira vez as coisas começarem a dar certo.
Eu estava feliz, era respeitada por todos do trabalho, me tratavam tão bem que chegava a ser estranho, mas era bom.
Ali aprendi tudo que havia negado a mim desde pequena e comecei a dar sinais de interesse na profissão nesta época. Queria muito aprender esse mundo que eles viviam, só que tinha um problema, eu era analfabeta! Nunca havia ido em uma escola porque o tio ranzinza não perdia seu tempo com minha educação e no orfanato diziam que gente como eu não merecia ser culta.
Ali no local de trabalho, por outro lado, todos queriam que eu vencesse na vida, assim passei a frequentar escola noturna e na parte da manhã trabalhava no escritório e ainda me deixavam absorver todo o conhecimento que eles me davam.
Minha alfabetização durou cinco anos e após o término fui sem demora para a universidade afim de realizar meu sonho. Sempre questionei a Deus de todo o sofrimento que tinha passado, até Ele me mostrar que sem os acontecimentos, eu não seria quem era hoje... uma pessoa forte, de pensamentos decisivos, coração bom e uma enorme vontade de vencer sem pisar nas pessoas.
Hoje aos vinte e nove anos, sou formada em direito e trabalho com meus colegas do mesmo escritório ao qual um dia entrei como faxineira.
A vida sempre me foi muito dura, mas também me mostrou as maravilhas de me manter integra, esperançosa e fiel a minha maneira de ser. Por mais que tudo esteja difícil, por mais que você não veja uma saída no seu caminho, coloque tudo aos pés de Cristo, que tudo Ele fará.
Boa sorte em sua vida, com Ele.
Adriene Jordana Mel
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