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Agridoce
Recebi mensagem dela dizendo que estava na fila da bilheteria. Fui até lá e, sorrindo, puxei-a pela mão. Eu tinha vários ingressos. Escolhi comédia porque era adequado para o momento.
— Oi! — ela disse, correspondendo ao meu sorriso.
Trocamos beijos no rosto e entramos juntas na sala escura; faltava pouco tempo para começar o filme, mas algumas pessoas ainda estavam entrando. Sentamo-nos no meu lugar estratégico, de onde eu podia assistir ao filme sem barreiras, pois à minha frente ficava apenas o pessoal da primeira fileira.
Depois que nos conduzi até ali, observei se ela havia gostado ou não do lugar, e como não se manifestou, entendi que sim ou simplesmente que era indiferente. E foi então que me ocorreu que ela podia ter ficado constrangida de reclamar. Fiquei preocupada e resolvi perguntar se preferia mudar de fileira, mas ela me interrompeu antes que eu pudesse abrir a boca.
— Comprei balas — avisou em um tom pueril e me encantou com aqueles olhos brilhantes de uma criança que acabara de ganhar um brinquedo novo.
— Desculpa, nem perguntei se tu queria pipoca — comentei ao perceber que ela não havia comprado ou pedido.
— Eu amo essa bala. Se tu quiser pipoca, eu pego, mas não gosto muito.
— Não, tudo bem, também não gosto tanto de pipoca. — respondi, aliviada, quase enfatizei minha frescura sobre limpeza dos dentes depois.
O sorriso no rosto dela denunciava que estava feliz, e aquilo me deixava nas nuvens. Estar com ela era tudo de bom. Sua companhia me fazia muito bem e havia muito tempo não me sentia tão em casa com alguém, mesmo quando nos falávamos apenas por telefone. Era interessante pensar na nossa relação, parecia que tínhamos uma espécie de ligação.
Minha semana fora extremamente corrida, mas ainda assim pensei várias vezes em me convidar para a casa dela, quando chegou da Alemanha, mas fiquei com medo de estar indo rápido demais e me contive.
Senti uma vontade imensa de ir abraçá-la na quinta-feira, depois do programa. Como não o fiz, passei boa parte daquela noite em claro, me culpando por ser tão covarde. Na sexta, tive que acordar muito cedo, então precisei caprichar na maquiagem para disfarçar as olheiras, mas meu trabalho fora em vão, pois Alcides as notou assim que me viu. E não ficou só nisso, pois além da minha cara de sono, ele não deixou passar o sorriso bobo e frouxo que estampava meu rosto desde que encontrei Carina a primeira vez.
— O que está acontecendo contigo, Helô? — ele perguntou com certa malícia no tom, fitando-me os olhos e me fazendo enrubescer.
— Nada. Por que esta pergunta? — indaguei, tentando desconversar.
— Tu anda pelos cantos sorrindo para esse celular. Venho observando há um tempo já. Tu não vai me falar, Helô?
— Alcides, não está acontecendo nada. Só estou conversando com uma amiga e ela me faz rir com algumas bobagens que envia.
— Eu sabia que tinha alguém. Daqui a pouco tu aparece namorando, que eu sei.
— Para, Alcides — pedi.
Naquele momento o meu celular tocou e era Carina. Olhei para Alcides sorrindo e sentindo meu rosto em brasa.
Pedi licença para atender e saí. Ela deve ter achado que eu havia acabado de acordar, pois falei quase sussurrando. Consegui ouvir John Mayer tocando baixinho ao fundo, Without You, música que ela me enviou logo depois que desligamos.
Nós nos falávamos o tempo inteiro, mas aquilo não era mais o bastante. Eu precisava vê-la, tocá-la, senti-la, e estava ansiosa aquele sábado. Meu coração acelerava só de ouvir o sinal de mensagem chegando e me frustrava quando não era dela.
***
Enquanto os trailers eram exibidos, eu observava Helô, encantada. Ela era tão decidida, tão segura. Escolheu um lugar estratégico. Esperta, gostei. Resolvi oferecer as balas que eu havia comprado. Fiquei encantada com aquilo, mas agradeci por ela não ter querido pipoca; odiava pipoca. Enchia meus dentes de cascas de milho, passava dias para sair, pois nem sempre o fio dental conseguia tirar. Ela me pareceu gostar das balas. Comemos quase o pacote inteiro antes de começar o filme.
— Tu é um dragão!
— Um minidragão. — Ela fez a piada e rimos.
— O que tu queria me perguntar que precisava ser pessoalmente?
— Eu queria? — indagou em tom de brincadeira.
Eu sorri, colocando uma bala na boca dela, que lambeu o meu dedo. Estremeci com aquela atitude, mas disfarcei minha empolgação e retirei o dedo.
Peguei uma para mim, ainda esperando sua resposta.
— Pergunta íntima e pessoal.
— Ah, lembrei! — Ela fez que responderia, mas o filme começou e ela desconversou, apontando para a tela.
Riu igual uma criança do filme. E eu não sei se me diverti mais com a história ou com as risadas dela ao meu lado.
Perdi as contas de quantas vezes senti vontade de beijá-la e, em determinado momento, quase fiz isso, mas quando estava iniciando o trajeto que ligaria minha boca à sua, ela me olhou com cara de sapeca e agarrou o pacote de balas da minha mão.
— É a última! — exclamei em um tom de falsa indignação.
— Vamos dividir, então? — propôs e mordeu a bala, que já era pequena, partindo-a ao meio. Segurou a metade e pôs na minha boca.
— O teu ficou maior, sua trapaceira! — protestei, e ela mostrou a língua com o pedaço de bala.
Não sei se aquilo foi uma provocação, mas o fato é que depois daquela cena, não consegui mais resistir. Puxei-a pelo rosto e tomei seus lábios para mim, saciando aquela necessidade que já me afligia.
No primeiro momento, ela pareceu hesitar, mas seu receio durou apenas uma fração de segundo. Logo em seguida, cedeu e correspondeu àquele que fora o melhor beijo da minha vida.
A despeito da minha ânsia em senti-la, nosso primeiro beijo foi lento, delicado e explorador. Os pedaços da bala se batiam e ela mencionava sorrir todas vezes que isso acontecia, fazendo com que eu me sentisse ainda mais apaixonada. Sua língua era macia e buscava a minha com uma suavidade provocante, que fazia meu corpo inteiro arrepiar. Eu poderia morar naquele beijo para sempre.
***
A companhia da Carina era simplesmente fantástica. Nunca havia me divertido tanto em uma sessão de cinema, mas preciso confessar que aquela animação toda tinha mais a ver com ela do que com o filme em si.
Sua timidez parecia ter deixado de existir e notei que ela não precisava de muito para se sentir à vontade com alguém, bastava conquistar a sua confiança, e acho que eu havia conseguido isso.
Durante o filme notei que ela tirou a atenção da tela para me olhar por diversas vezes. Disfarcei, mas amei isso. Ainda bem que ela não podia ouvir os meus pensamentos, ou teria descoberto a vontade que eu estava de beijá-la.
Depois que o filme acabou, algumas pessoas, tipo eu e ela, ficaram esperando o pós-crédito. Notei que ainda havia uma bala dentro do pacote que ela segurava e resolvi implicar, puxando-o para mim e pegando a última.
Quando pus a bala na boca, senti vontade de pedir que ela viesse pegar o pedaço dela, mas temi ser atirada demais. Resolvi dividir sozinha e pôr a metade em sua boca, e foi aí que ela me beijou.
No primeiro momento, me assustei, pois não esperava aquela atitude, mas logo em seguida me rendi ao sabor agridoce daquela língua macia e perfeita, que se enroscava na minha como se a conhecesse de longa data. Bah! Aquele beijo foi perfeito. Como podia ser possível? Mesmo que eu nunca mais beijasse na vida, estaria satisfeita por ter experimentando os lábios da Carina.
As luzes se acenderam e nos afastamos ao mesmo tempo, por instinto. Ela me olhou bem dentro dos olhos e sorriu, linda. Apenas sorri de volta, deixando que ela visse o tamanho da minha felicidade.
***
Eu estava com meu coração querendo sair pela boca quando acenderam as luzes e nos afastamos. Eu a fitei nos olhos, apreciando aquele sorriso, que eu já amava também. Ela me pegou pela mão e saímos da sala, que já estava deserta.
— Está com fome? — perguntou e notei que, depois do nosso show de balas, precisávamos de algo salgado. Resolvi chamá-la para minha casa; acho que foi o açúcar falando, mas tomei coragem.
— Eu preparo algo pra gente.
— Capaz que tu vai cozinhar pra mim hoje? — indagou, admirada. Mal sabia ela das minhas intenções.
Fomos para a minha casa no meu carro, pois ela havia ido de taxi para o shopping. No caminho, ela contava uma história para a qual não dei muita atenção, pois todo aquele açúcar no meu organismo estava me fazendo pensar em outras coisas.
— Tu precisa ver! — ela disse e a porta do elevador se abriu, dando acesso à minha sala. Notei seu rosto mudar ao sair. — Bah! Tu mora aqui? Que.. que coisa mais futurista! — gaguejou antes de falar aquilo, e eu ri.
Nunca imaginei que ouviria aquilo, mas Helô achou o meu apartamento futurista. Eu gostava de coisas em cores padrão, tons de preto e branco. O meu quarto era da Carina fora da empresa, mas a minha sala era moderna, como eu gostava. Havia controle remoto para quase tudo: cortinas, luzes, áudio e vídeo e até para a geladeira. Não era preguiça, era praticidade. Exagero, eu sabia, mas enfim, eu gostava.
— Fica à vontade — falei e sorri.
Fui lavar as mãos, enviei uma mensagem e pus o celular em uma bancada, voltei à sala. Liguei o som. Começou a tocar Muse — Can't My Eyes Off You — e deixei. Fui onde ela estava parada, com um sorriso congelado no rosto.
— Tu é rica! — comentou em tom de brincadeira. — É dona daquela empresa?
— Não, mas o meu cargo me dá poder de dona. E não tenho do que reclamar. Não vou bancar a modesta, eu ganho muito bem, sim — expliquei tentando não parecer metida e mudei de assunto em seguida. — Tu toma alguma coisa antes do jantar? — perguntei e a puxei pela mão, levando-a até o sofá, onde eu costumava deitar para ouvi-la todas as noites.
— Estou deslumbrada com o tamanho disso aqui. Jamais pensei que tu morasse num lugar tão...
— Tri legal! Arrumei tudo do jeito que eu sempre sonhei — eu disse e a puxei pelo rosto para um beijo que ela correspondeu, reticente. — Tu ficou fria por causa da minha casa "futurista"? — perguntei, sorrindo.
— Não, desculpa. Só fiquei meio boba com tanto luxo. — falou e riu, beijando-me em seguida.
Cheguei a me sentir culpada por isso em determinado momento da minha vida, mas eu trabalhava demais e não tinha mais tempo para sentir culpa.
— Tu é muito linda, sabia? — afirmei e vi o sorriso dela iluminando a minha vida, e a beijei novamente.
Puxei-a contra mim e senti seu coração acelerado de encontro ao meu peito. Acariciei sua nuca e agarrei suavemente os cabelos, conduzindo o beijo maravilhoso.
Ouvi o miado rouco do Michael, chamando nossa atenção. Helô se afastou e soltou um gemido fofo ao ver aquele gato preguiçoso com cara de quem desprezava todo mundo.
O antissocial B. Jordan se esticou, roçou a cabeça na mão dela e recebeu carinho. Que gato safado! Paola o pegou no colo, e ele ficou furioso porque ela o beijou. Agora Helô nem precisou chegar perto; ele já foi todo animado e a tirou de mim.
— Ele é muito lindo, Carina! — elogiou ao coçar o queixo do bichano.
— Sim, mas estávamos conversando, lembra? — perguntei e ela me olhou com os olhos semicerrados, depois me abraçou.
Eu a apertei em mim, aspirei aquele cheiro que já havia me deixado viciada. Acariciei seus cabelos e senti suas mãos nas minhas costas. Ela afastou o rosto e me beijou.
Deitei devagar com ela sobre mim, sentindo sua entrega enquanto me beijava com paixão. Um arrepio intenso dominou todo o meu corpo quando ela sugou minha língua e mordeu meu lábio inferior para tomar fôlego. Inverti a posição e deitei sobre ela.
— Linda! — falei, fitando seus olhos.
Ela me puxou pela roupa e voltou a me beijar. Eu já estava totalmente entregue àquelas sensações, meu corpo exigia o dela e acariciei sua coxa, deixando claro o meu desejo, mas quando o clima começou a esquentar, a campainha tocou.
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