Parte 12
Mesmo que Daisy já soubesse que Angelo não estava com Madeleine, a surpresa pareceu não ter uma intensidade menor. Ela ficou parada, pensativa, encarando a cara envergonhada dele. O sentimento transferido para Tyler não o causou o mesmo efeito.
O menino, antes calmo e aparentemente maduro, sentiu-se amargurado ao observar o rapaz que era visto por ele e pela mãe como "protetor", o "cara que nunca deixa Maddy se encrencar". Aquele disfarce de protetor teve ali seu final. A fantasia da proteção já não tinha mais vazão para existir, e o resultado foi a amargura do menor, mostrada com a tensão que desabafava no mais velho.
— Onde tá a Maddy? Você deixou ela sozinha? O que aconteceu?
Angelo abaixou a cabeça para olhar diretamente nos olhos do garoto. E foi tão direto no olhar quanto foi na resposta: — Sua irmã está na casa de uma amiga de confiança, Tyler. Vim aqui avisar agora, pois soube há alguns minutos. Sabe como Madeleine é... Decidiu do nada dar uma fugida pra sair com uma amiga. Amanhã ela estará aqui.
O rosto do caçula mudou de amargo para morno, aliviando-se internamente e externamente suspirando fundo.
Daisy sentiu-se confusa com a informação, algo que impedia o alívio que viria normalmente. Se Madeleine estava segura, por que ele se entristeceu quando ouviu sobre ela enquanto guia? Aquilo não batia. E um incômodo apareceu com força nela, pois era uma dúvida agoniante, que bloqueava aquela boa sensação geralmente confirmada por um fundo suspiro.
— Quando eu falei dela, você soou triste... mesmo sabendo que ela estava bem — ela o questionou, sem pensar muito em qualquer tipo de vergonha.
Angelo deu um leve sorriso de canto de boca antes de responder, parecendo entender a confusão e achando graça dela.
— Eu me senti abatido porque não gosto de falar sobre ela desde que terminamos. — Ele abaixou a cabeça em posição de angústia, quando esta foi interrompida quando viu em sua mão um papel dobrado. — Ah! Quase me esqueço! Essa folha é sua, eu acho. Achei no banco, perto da estação, quando voltei e... Aproveitei a oportunidade pra vir aqui.
Daisy pegou a folha, sorridente e agradecida. Abriu-a rapidamente, mas não tão rápido que pudesse evitar que o rapaz fosse embora sem responder mais nada. Quando tinha algo a perguntar sobre a carta, só se reparava em sua voz de despedida e em sua sombra o seguindo.
Ficou a encarar o rosto bobo, de alegria disfarçada de Tyler, como se encarasse o nada. Pensava, organizando os acontecimentos.
"Na carta diz que ela estava sendo perseguida e que seu agressor descobriu seu endereço, minha casa, e por isso teve de fugir. Não quis me colocar em risco. Aí quando chego em seu bairro, seu ex-namorado me guia até sua casa, e quando falo dela, ele fica cabisbaixo, não manifestando mais aquele exagero em dar passos lentos e me ajudar. Muda por completo a aura. A mãe dela diz que a filha faz isso direto, essas fugas e travessuras. E agora Angelo me vem com essa... de que ela está na casa de uma amiga, e me dá uma justificativa para sua tristeza repentina. É razoável, mas tem algo que não encaixa. Por que ela mentiria pra mim? Aliás... será que as coisas que ela falava eram todas verdadeiras? E aquele ataque no meio da noite por uma suposta mensagem na rádio? Ela é tão manipulável assim? Não sei no que acreditar, mas não admito a ideia dela ter mentido pra mim. Acho que não estou tão acostumada com essa falsidade como sua mãe está, talvez o verdadeiro eu de Madeleine. E meu girassol... Por que ela o pegou? Será que ele está bem hidratado?"
Depois de alguns minutos, Daisy estava novamente no quarto, com Tyler soltando pequenas exclamações de chacota sobre Madeleine.
— Esse pijama nela ficou parecendo uma lona de circo... Ela é magrela. — E ria sozinho, não mais vendo motivos para ser piedoso com a irmã.
A garota vestia um pijama azul claro, de braços curtos, botões e pequenos ursinhos de diversas cores por todo o conjunto. E finalmente parou um pouco de pensar e deu atenção às tolices de Tyler, reparando no pijama e dobrando a cabeça para encarar alguns ursos sorridentes.
— Se ficar sem comer um pouco, você fica igual ela na sua idade. Deve ter uns dezesseis, né? Ela tem dezenove. Você se parece demais com ela... Bem que poderia ser nossa irmã do meio, aí brincaríamos e...
Daisy parou de ouvi-lo e encarou novamente o papel amassado, refletindo profundamente. Aquela letra redonda e bem desenhada e de caligrafia perfeita... Madeleine tinha um talento, pensava. Nem Daisy conseguia manejar tão bem o pincel numa tela quanto ela uma caneta numa folha. Recordava dos lembretes que deixava quando precisava sair. Como ligar a máquina de café, o que tinha para beliscar na cozinha, a que horas voltaria... A moça não gostava mesmo de acordá-la.
— ... mas nada que não pudesse ser resolvido com uns belos cascudos. Não acha? — o mais novo terminava a fala, acordando a outra do transe.
— O quê? Desculpa. Estava distraída.
— Com o quê? Com esses garranchos aí? Que bobagem... Esquece isso. Aliás, ela escrevia mal assim desde criança. Tem um caderno de escola dela aqui. — O garoto remexeu na gaveta, achou o objeto e entregou a ela.
A menina animou-se, mas quando ia abri-lo, Evelyn surgiu na porta, em aparência exausta, mas de fala animada.
— Comprei algumas coisas pra você. — E deixou-as no colo de Daisy, lugar do caderno. — Acredita que aquele velho não queria dar desconto? Imagina... Compro lá há anos, e aquele mercado não seria nada sem mim! E ainda me fez várias perguntas! Oras! Se eu quero comprar uma escova de dentes no meio da noite, tenho esse direito! Velho enxerido! E quão desorganizadas as prateleiras estavam... Imagine que...
O garoto suspirou, balançando a cabeça e segurando-se para não mandá-la parar de exercer seu traço, este que parecia ser comum na casa. O hábito tanto dela quando dele lembravam o de Madeleine. Além de paranoica e compassiva, outra característica marcante da moça era sua fala quase que imparável quando estava inspirada.
Quando a mãe terminou de falar, Tyler contou onde Madeleine estava. Num pequeno sorriso, embargando as exclamações de certeza confirmada, ela apagou a luz. O menino rapidamente pegou no sono e Daisy ficou na vontade de apreciar mais da caligrafia da pequena Maddy.
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