~ Capítulo 22 ~
Aparentemente, Hisur ainda não havia agido. Pelo menos o vídeo de eu acertando o seu rosto incontáveis vezes ainda não tinha sido vazado e eu continuava na equipe brasileira rumo às olimpíadas para combater pelo Brasil.
Gerson e eu tínhamos ido fazer a parte burocrática de me pesar, enquadrar em qual parte eu concorreria, tirar fotos com patrocinadores brasileiros e outras coisas que mais eram para atiçar a mídia do que qualquer outra coisa.
Outros colegas que também competiriam estavam ali ao meu lado, também tirando fotos e sorrindo e fazendo entrevistas. Meu coração ainda estava apertado imaginando em qual momento o meu passado em Dubai ficaria conhecido para todos ali, mas aparentemente eu era tão insignificante e saber da minha vida fosse ainda mais insignificante, porque ninguém parecia sequer fazer ideia de que eu tinha ido para fora do país e ainda por cima me casado.
Se fosse um artista conhecido, ou quem sabe o tal de Montanha bonitão da equipe de vôlei, esse escândalo não teria saído da boca de ninguém. Mas com era só Malena concorrendo pelo judô feminino e as pessoas não me achavam assim tão bonita, esse tipo de informação parecia ser um segredo só meu e de Gerson. Talvez também da minha mãe, embora ela tivesse optado por não fazer perguntas a respeito para mim.
Foi melhor, afinal, todas as vezes que eu pensava em Rashid, meu coração se apertava no peito.
Como naquele momento que a saudade parecia açoitar-me fortemente.
Precisei pedir licença para as fotos e entrevistas e fui para um canto do grande salão para respirar novamente. Os olhos já se enchiam ficando úmidos e prestes a derramarem lágrimas e era melhor tentar não ser sentimental na frente de tanta gente. Céus, o que estava acontecendo comigo? Voltei minha atenção para baixo, olhando para o chão enquanto tentava acalmar o meu coração dolorido.
Caramba, porque ele tinha que ter sido uma pessoa tão boa no fim? Para causar esse tipo de coisa em mim?
Nosso início tinha sido no mínimo estranho, mas as coisas tinham melhorado. Tínhamos começado a nos tolerar e até mesmo apreciar a presença um do outro. E eu nunca tinha sentido que realmente fosse tão amada até descobrir em Rashid um amante. Ainda tinha gravado na mente a forma como ele sorria e também como os olhos brilhavam parecendo iluminar tudo ao redor.
Seria difícil demais para explicar para minha mãe que eu realmente cogitava a hipótese de abandonar o meu adorável Brasil, pelo menos um pouco, só para viver em outro país com uma pessoa por quem eu tinha desenvolvido um forte sentimento.
Ela com certeza acharia que eu estava zoando. Por que eu acharia isso se alguém me contasse uma história maluca de casamento obrigatório por conta de leis islâmicas malucas e então realmente um sentimento sendo despertado no tempo de convivência...
― Finalmente te encontrei, vamos. ― Ouvi.
Meu coração disparou quando senti uma mão gélida tocar na altura do meu cotovelo. Olhei assustada para o idiota dono daquela mão e paralisei pelo susto. Achei que ele demoraria mais tempo no hospital, porque a grande verdade é que ele ainda estava roxo e feio por conta dos machucados que eu tinha feito nele.
Hisur estava ali, no Brasil, com o rosto ainda inchado e machucado, mas os olhos que não mentiam o quanto de raiva ele sentia de mim por isso. Pela forma como ele apertava o meu braço, ele só demonstrava que estava querendo me fazer pagar pelo que eu tinha feito nele.
― Eu não vou com você em nenhum lugar. ― Disse séria.
Onde estava Gerson? Tentei vasculhar o lugar com o olhar, mas não encontrei Gerson. Havia muita gente reunida, também não seria fácil encontrá-lo. Devia estar apresentando outra pessoa. Ele era responsável por outros talentos que estavam ali também.
― Eu te garanto que você vai sim, Malena. ― A voz de Hisur era maliciosa. Sem paciência, tentei tirar a mão de Hisur de cima de mim, discretamente para não chamar a atenção daquela mídia toda reunida. O que eles mais queriam era ver uma cena para conseguir ter uma matéria. Eu não podia os dar isso. Porque provavelmente era o que Hisur queria também, que eu explodisse.
― Ah é? ― Disse com sarcasmo. ― Não bastou o rosto assim para saber que agora estou na minha terra e você não pode fazer nada? ― E para minha surpresa, Hisur começou a gargalhar de forma tão medonha que eu acabei me encolhendo com um medo que crescia na altura da minha coluna em grande pavor do que Hisur poderia estar tramando,pelo menos era o que indicava a sua risada ácida.
― Oh, Querida... É muito mais fácil fazer o que eu quiser aqui do que em Dubai, sabia? Bom, acho que você deve saber como moradora de uma favela, não é mesmo? Afinal, o que algumas pessoas daquelas bandas não aceitam por dinheiro, não? ― Aquilo era uma ameaça? Sentindo que eu estava sendo ameaçada, consegui puxar o meu braço de Hisur tentando controlar a sensação incomoda que se apossava do meu peito.
Ele não estava de todo errado. Realmente, muitas pessoas faziam qualquer coisa por dinheiro. E estando Hisur no Brasil, eu sentia sim um pouco de medo do que ele seria capaz de fazer. Pelo menos, a única vantagem, é que a justiça não estava do lado dele no Brasil, diferente de Dubai, onde as leis poderiam me fazer morrer por traição sem sentido.
― Veio aqui então para me ameaçar? ― Disse entredentes.
Hisur sorriu daquela maneira nojenta dele que parecia pervertida e grotesca. Dei um passo para trás sentindo todo o nojo daquele olhar, mas isso só fez com que Hisur gargalhasse antes de voltar a falar:
― Interprete como quiser, Malena. O que está em jogo aqui é muito mais do que eu divulgar o seu vídeo e impedi-la de competir. ― Trinquei os dentes tentando respirar fundo. A minha vontade era de bater naquele enfezadinho de novo.
― Eu não me importo.
― Nem com a sua vida? ― Ele parecia descrente. Engoli em seco.
― Nem com a minha vida. ― Disse. Não que fosse verdade. Desde que minha mãe, meu irmão, Gerson e Rashid estivessem bem, eu ficaria bem, mesmo que morta.
Como se lesse a minha mente, Hisur repuxou os lábios num sorriso sem dentes macabro e murmurou quase como se sussurrasse:
― Nem se estivermos falando da vida do seu irmão? Fiquei sabendo de uma coisa interessante. Parece que ele está devendo dinheiro para alguns homens aí... Drogas, não é mesmo, Malena? Não tá fácil... ― E talvez porque eu já estivesse completamente fora de mim, já que Hisur estava falando do meu irmão e não de qualquer um, levantei a mão para dar um tapa em Hisur, a maior besteira que, com certeza, eu faria na vida, na frente da mídia, causando um estardalhaço óbvio para todos que estivessem ali. Antes disso, outra surpresa se fez bem na minha frente.
Rashid segurava o meu pulso com uma mão enquanto seu olhar parecia raivoso e marcante direcionado diretamente para Hisur. Ele parecia ter calculado cada uma das palavras que ele diria naquele segundo.
― Eu posso não ter conseguido te colocar na prisão com Yala, Hisur, mas tenha certeza de que farei isso se ousar tocar em Malena ou em qualquer um da família dela. ― E aparentemente Hisur também não esperava que Rashid aparecesse, porque ele deu um passo para trás, realmente transtornado e chocado, pelo menos por alguns segundos, antes de voltar a adotar uma face de indiferença.
― Ah, veio salvar a donzela em perigo, Rashid? Oh, que bonito da sua parte. Só deixa eu te avisar que na vida real não existem príncipes e princesas, bem e mal. Existe apenas o desejo e eu, com certeza, vou conseguir realizar o meu. ― Para minha surpresa, Rashid também deu um sorrisinho de lado.
― Ah, eu realmente quero ver você tentando.
― Sabe que não é páreo para mim, Rashid. Já não ficou claro isso com Yala? ― Perguntou Hisur que também tentava desestabilizar Rashid. Contudo, diferente de mim que perdia as estribeiras rapidamente, Rashid parecia ser a pessoa controlada nas emoções respondendo baixo, mas não menos ameaçador:
― Há uma diferença de antes para agora, Hisur.
― Ah é? ― Ele parecia achar graça, como se achasse que Rashid estivesse mentindo quanto a isso. Mas Rashid logo demonstrou que não e, para minha surpresa, ela falou e agiu rapidamente:
― Agora estou lutando com o auxílio da minha família. E pode ter certeza de que vamos te vencer. ― E então Rashid abaixou lentamente a minha mão, aproveitando para entrelaçar os seus dedos com os meus.
― Bom, eu vou achar divertido de ver você tentar. Que tal começar tentando salvar o irmão dela, hã? Se não pegá-lo, pode ter certeza de que vou matá-lo e filmar para que você veja, Malena. E então a próxima será a sua mãe, mas acho que não precisarei chegar a tanto para que você aceite ser minha. ― E como se desse a conversa por finda, Hisur fez um sinal de continência e piscou.
Ameacei segui-lo para bater nele até que ele ficasse desacordado até o dia seguinte, mas Rashid me segurou pelos ombros fazendo com que eu o encarasse nos olhos ainda atônita. Ele realmente estava ali?
― Respira. Precisamos ser frios para lidar com ele. E te garanto, habibti, que bater nele não nos ajudará a lidar com essa situação. ― Ouvir a voz de Rashid me fez literalmente acordar e pousar meus olhos sobre os dele, percebendo que Rashid realmente estava ali, comigo, no Brasil.
Toquei minhas mãos no seu rosto ainda me sentindo como se estivesse sonhando, mas Rashid sorriu da mesma maneira que eu me lembrava de seu sorriso e toda a possibilidade de ser sonho caiu por terra. Em um ímpeto, fiz a primeira coisa que me passou na mente naquele segundo, que obviamente foi beijá-lo sem me preocupar onde estávamos, com quem estávamos ou o que infelizmente me aguardava em um futuro nada promissor.
Rashid correspondeu ao meu beijo e só se soltou para me puxar para fugir dos flashes que começaram a cair em cima de nós. Ainda meio tonta, segui com ele até um carro. Percebi que Rashid havia alugado um porshe no Brasil. Estanquei no lugar e o encarei sem acreditar naquilo.
― Isso é sério? Gastasse dinheiro com comida, não com o aluguel de um carro caro desse! ― E para minha surpresa, Rashid me empurrou gentilmente para o carona, abrindo a porta e me ajudando a entrar. Pisquei atônita até vê-lo entrar para dirigir e então partirmos pelas ruas da cidade.
Só consegui voltar a falar alguns minutos depois, quando todas as informações daquele dia tinham sido digeridas por mim.
― Você está aqui mesmo?
― Não, habibti, é uma projeção de Rashid feita por computador. ― Ele brincou e eu revirei os olhos.
― Você podia ter aparecido menos esnobe. Agora a mídia toda vai me notar só para comentar que estou saindo com um homem rico que aluga porshes no Brasil. ― Rashid riu enquanto ajeitava o relógio no pulso aproveitando que tínhamos parado no sinal.
― Tenho que aproveitar que é o Ham que está pagando.
― Está extorquindo o seu irmão.
― Na verdade, foi tudo ideia da Pam. ― Assenti tentando não sorrir bobamente.
― Que ideia? ― Rashid respirou fundo ao perceber que já íamos iniciar o assunto difícil. Sem ousar olhar para mim, ele começou:
― Vamos buscar o seu irmão, colocar alguns seguranças para olhar a sua mãe enquanto tratamos o seu irmão e pagamos as dívidas dele. Depois, só precisamos lidar com o seu vídeo, mas isso é o de menos. Meu pai tem uns conhecidos em Dubai, qualquer coisa você concorre pelo meu país. Quanto a questão de você ter me traído também. Parece que Ham conhece o rei de Omã que por acaso conhece a família do Sheikh Mohammed Rashid ao ponto de pedir esse favorzinho. ― E aparentemente Rashid havia realmente pensado em tudo. Chocada, não consegui nem esboçar reação.
― O que? ― Foi o que consegui falar de melhor. Rashid riu para minha surpresa.
― Calma, linda, vamos agora ver o seu irmão e você aproveita para fazer uma mala para você. Vamos tirar umas férias em São Paulo. ― Acabei não aguentando e gargalhando.
― E de onde você tirou a grande ideia de que você conseguiria entrar na favela com um carro desses, querido Ra? ― Gargalhei de nervoso, mas diferente de mim, Rashid nem sequer se manifestou nervoso.
― Oras, da Pam. Ela disse que normalmente eles acham que é miliciano entrando com a mina. ― Apertei um lábio sobre o outro, aparentando mais do que nervosismo. Eu realmente queria de verdade que Pam e Rashid estivessem certos, porque sendo bem sincera, se eles não tivessem, eu ia ver Rashid sendo morto e eu realmente não queria nem nos meus piores pesadelos sonhar com algo tão horrível como isso.
Pelo resto do caminho até em casa, continuei fazendo preces e pedindo para que se Deus, Alá, quem quer que fosse, me ouvisse, que salvasse Rashid e nos ajudasse para que aquele plano repleto de furos desse certo, porque parecia que ele tinha muitas chances de nos ferrar bonito.
**
Eu arregalei os olhos sem acreditar quando vi os meninos que guardavam a entrada arregalando os olhos diante do carro e se afastando como se estivessem vendo o maior magnata da favela entrando. Quando me viram então, aí que eles sorriram mais e deram tchauzinho enquanto seguíamos ruas estreitas a dentro.
Rashid até que estava se saindo bem com o carro, sem arranhá-lo, nas ruas estreitas. Felizmente, de frente a minha casa estava vazio, o que significava que o vizinho de lado não estava ainda em casa para usar aquele espaço.
― Você é muito sortudo, Rashid! ― Disse fazendo com que ele piscasse.
― Tenho você como amuleto de sorte, linda. ― E para quebrar o clima total, minha mãe bateu com os dedos no vidro do carro como se quisesse realmente saber o que eu estava fazendo ali, sem o Gerson, aquela hora da tarde, com um homem ao meu lado.
Considerando que eu nunca havia apresentado a minha mãe para nenhum homem na minha vida, essa era realmente uma curiosidade com sentido e tanto.
― Oi mãe. ― Disse saindo do carro e Rashid fez o mesmo.
Minha mãe devia estar chegando do trabalho, porque pescou a chave da bolsa para abrir nossa casa e me encarou confusa.
― Quem é esse nosso visitante que você nunca trouxe para casa, Malena? ― Ela perguntou franzindo o cenho. Provavelmente temia que eu estivesse pegando o dono da boca, certeza. Arrumei a voz e tentei:
― Mãe, lembra que eu havia me casado em Dubai por causa das leis de lá? ― Minha mãe franziu o cenho parecendo tentar buscar a lembrança na memória e quando tudo pareceu fazer sentido, ela sorriu voltando sua atenção totalmente para Rashid.
― Oh, você é o marido da minha filha? ― Felizmente Rashid entendia e sabia falar alguma coisa mínima de português, porque ele assentiu sorrindo e respondeu singelo:
― Sim. ― Isso pareceu ser o suficiente para a minha mãe que sorria bastante.
― Entrem, entrem! A casa é simples, não repara a bagunça, senhor...? ― Minha mãe nem sequer tinha feito o favor de lembrar qual era o nome do homem com quem fiquei um tempo casada, para ver o tanto de atenção que ela deu.
― Rashid. ― Ele respondeu sorrindo também.
Minha mãe foi abrindo a casa e acendendo as luzes e colocando água no fogão para fazer café. Rashid sorriu e me deu as mãos me fazendo sorrir também.
― Não sabia que o senhor era rico, a Malena só me contou que você era cozinheiro... ― Disse minha mãe e para minha total vergonha continuando: ― Ah, e que você também era daquela religião de lá do oriente. Muçulmano, não é mesmo? ― Rashid assentiu.
― Mãe, ele fala e entende pouco português. Só para você saber. ― Minha mãe decidiu me ignorar e Rashid sorriu e tentou responder:
― Sou muçulmano. Não sou rico... Sou realmente... cozinheiro? ― Ele parecia testar a palavra na boca, na certa achando estranho. Tentei explicar para ele o que significava e logo fez sentido e ele assentiu.
― Ah sim... Gosta de café?
― Adoro. ― Ele respondeu solicito, mas logo completando para mim, em inglês: ― Vá logo arrumar a sua mala para partirmos e tente achar o paradeiro do seu irmão para o levarmos logo também. ― Concordei.
A verdade é que não queria deixá-lo sozinho com a minha mãe, porque sabia que uma hora ou outra eles acabariam não se entendendo porque minha mãe não sabia falar inglês e Rashid não sabia lá tanto português assim, mas acabei os deixando a sós mesmo assim.
Tentei arrumar a minha mala em velocidade recorde, colocando as primeiras coisas que eu encontrava pela frente. Qualquer coisa eu lavava as peças, não precisaria de tanta coisa assim, se queriam saber.
E enquanto preparava a minha mala em velocidade recorde, comecei a fazer ligações tentando encontrar onde meu irmão tinha parado e se alguém das pessoas que eu conhecia e ainda mantinha certo contato ali na favela sabiam onde ele estava.
Precisava achá-lo antes de terminar a minha mala, pensei convicta.
Contudo, antes que eu sequer conseguisse ter ação de achar alguma coisa do tipo, ouvi um barulho imenso vindo da cozinha e minha mãe gritando enlouquecidamente. Corri para a cozinha e me assustei total ao ver que Rashid havia imobilizado o meu irmão encostando a cabeça dele na parede da cozinha.
― O que está acontecendo? ― Perguntei e Rashid bufou.
― Seu irmão achou que eu tinha vindo ameaçar a mãe dele e tentou me atacar. ― Revirei os olhos.
― Jean, ele é meu marido. ― Não que isso fosse resolver, mas insisti em falar. ― E é bom que precisamos conversar. ― Completei para Jean que ainda não parecia sóbrio, os olhos voltando na direção de Rashid para mim.
― Está se prostituindo para esse homem rico, Lena? ― E por Deus, eu não me aguentei. Aproveitei que Rashid mantinha Jean imobilizado na parede e lhe dei um tapa no rosto agradecendo por Rashid não ter entendido as palavras que Jean tinha dito em português.
― Cê nunca mais diga isso na sua vida se não quiser perder essa bagaça que você tem no meio das pernas da próxima vez. Rashid é meu marido, nos casamos e ele vive em Dubai, um dos lugares mais caros do mundo, já ouviu falar, Jean? É por isso que ele tem dinheiro, se você está se perguntando. ― Meu irmão estava lento demais para fazer qualquer coisa e, percebendo que estava em desvantagem ali, ele assentiu lentamente.
― O Rashid vai te soltar e você vai sentar aqui para a gente conversar, tá bom? ― Perguntei enfaticamente. Jean concordou com a cabeça. Quase respirei aliviada.
Disse para que Rashid soltasse meu irmão e ele realmente se sentou. Minha mãe aproveitou para nos servir café, um pouco perdida do que estava acontecendo ali.
― Você precisa se tratar, Jean. Está trazendo problemas para a vida de mamãe agora, não percebe? Está usando o dinheiro da aposentadoria dela suado para bebidas e todo mundo dessa favela já sabe da dívida exorbitante que você tem de ficar pedindo grana para os donos da boca. ― Jean se remexeu na cadeira. Era óbvio que ele não estava gostando do assunto.
― Ninguém te chamou aqui para se meter na história não. ― Ele tentou, ficando na defensiva.
― Não estou aqui por você, estou pela mãe. ― Menti. Precisava blefar, porque talvez essa fosse a minha única chance de colocar o plano que eu e Rashid tínhamos conversado em colocar em prática. ― E vou te dar a real, Jean, essa também é a sua única chance. Vou levar mamãe para morar comigo lá em Dubai. E posso até te levar também, pagar as suas dívidas, sabe? Mas esbarramos em um problema. Lá é um país muçulmano, sabe? Lá não tem bebida. Por isso, você vai precisar ficar limpo para viver por lá. Então, sim, estou te dando uma única chance de vir comigo e Rashid, temos um amigo aí que pode te ajudar a se livrar das bebidas. Mas você tem que querer. É a sua única chance.
Jean parecia ainda absorto remoendo as minhas palavras e eu aproveitei para traduzir para Rashid o que eu tinha acabado de falar. Ele concordou com a cabeça enquanto bebericava o café que minha mãe tinha feito.
― E se eu não quiser? ― Foi a pergunta mais lógica que Jean conseguiu pensar.
Precisei de todo o meu auto controle para não xingá-lo. Ele já não tinha visto o trabalho que tinha causado na minha vida e de mamãe que ficava o defendendo e passando a mão na cabeça dele mesmo ele não criando coragem de correr atrás da vida dele e trabalhar?
― Eu tenho um irmão que trabalha com construção. Podemos até conseguir um trabalho para ele, se ele quiser vir conosco. ― Disse Rashid e eu fiz questão de rapidamente traduzir para que mamãe e ele ouvissem. Mamãe pareceu gostar da ideia sorrindo.
― É um trabalho honesto. Mas lá eu poderei professar minha fé em Jesus Cristo? ― Perguntou mamãe e Rashid rapidamente a respondeu:
― Sim. Não sei se haverá comunidades de brasileiros cristãos, mas desde que haja respeito pelos nossos horários também de rezar, a senhora poderá se reunir com seus afins e rezar também. ― Mamãe concordou parecendo que isso era suficiente para que ela decidisse assim, rapidamente, mudar.
Quem olhasse acharia que para minha mãe parecia tão fácil. Mas era porque a nossa vida até ali não tinha sido nada fácil. Mamãe havia batalhado muito e ainda teve que vencer diversas batalhas diárias com o meu pai. Para ela, ver os filhos em uma boa situação de vida e poder rezar e professar a fé dela eram as únicas coisas que realmente importavam para ela. Por isso, fosse em que lugar ela estivesse, ela estaria feliz assim.
Vendo que nossa mãe já parecia tendenciosa a aceitar até mesmo se mudar para outro país, Jean abaixou a cabeça e acabou bufando.
― Não sei se tenho forças o suficiente para me ver livre das bebidas. ― E talvez fosse a primeira vez que eu estivesse em uma conversa tão franca com o meu irmão, onde ele realmente me passava os medos dele no tom de voz.
Para minha surpresa, minha mãe segurou a mão de Jean e sorriu afável.
― Com fé em Deus, meu filho, não haverá mal que nos tire da senda do bem. ― E meu irmão arregalou os olhos parecendo ser a primeira vez que realmente ouvia a minha mãe.
A cena comovente fez meus olhos ousarem se encher de lágrimas, mas eu não as derrubei. Sorri e coloquei a minha mão por sobre a mão de mamãe e de Jean, mostrando que eu também estava ali para o que desse e viesse. Para o que precisassem de mim.
― Eu vou tentar. Quero realmente ficar livre da bebida. Não quero mais ser dependente dela. ― Disse Jean enfático.
― Vá arrumar as suas coisas rapidamente então. Partimos daqui a pouco. ― Jean acabou aceitando meio torpe, saindo da cozinha. Foi só quando ele saiu que pude realmente respirar mais profundo e piscar diversas vezes.
Os caminhos da minha família pareciam finalmente estarem se arrumando para o melhor.
Saindo do torpor, pisquei mais algumas vezes rapidamente quando vi que Rashid agora estava com as mãos dele em cima das minhas, o que evidenciava o pleno apoio dele. Assenti aliviada mais uma vez e ele me informou:
― Já avisei o Nick e a gente chega lá de madrugada. Também já aluguei um hotel para a sua mãe e para nós. ― Concordei meneando a cabeça.
― Obrigada Rashid. ― Falei verdadeiramente. Ele sorriu de lado.
― Não tem de quê, linda.
Esse é o penúltimo capítulo que vou postar hoje!
Falo melhor no próximo!
Espero que estejam gostando! <3
Bjinhoos
Diulia.
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