Sonhos febris
Todo o seu corpo doía. Cada parte, cada célula. Quando deixaram a comida, não tinha forças para comer, ou beber. Apenas ficou jogado no chão frio, gemendo até no simples ato de respirar.
A porta se abriu, viu a luz surgir e sumir. Continuou parado no mesmo lugar. Por um momento pensou se tudo começaria de novo, mas reconheceu o cheiro e os passos leves eram familiares e reconfortantes. Sentiu uma mão quente em sua testa e alguém o sentava no chão.
A água veio a seus lábios e sorveu com dificuldade, mas quando a comida veio na primeira colherada virou para o lado e vomitou. Nada parava em seu estômago, e pela primeira vez um deles falou:
– Vai ficar fraco.
Balançou a cabeça e fechou os olhos com força.
Ouviu um suspiro e sabia que o outro havia sentado a seu lado. Automaticamente se aproximou, seu corpo febril buscando calor. Sentiu um pano lhe envolvendo e um braço firmou suas costas na parede para que não escorregasse ao chão. Estava fraco demais para se firmar sozinho. Foram dias sem água e comida, não tinha sensibilidade nem mais para sentir as surras, o que era um alivio.
– Não sei por que faz essas coisas se sabe que vai ser punido.
Sentiu uma mão na sua esmagada e gemeu enquanto o outro a analisava. – Começou a cicatrização muito rápido. Quando vierem vão ter que quebra-la de novo para consertá-la.
–Isso é reconfortante. – Falou com ironia. O outro não reconhecia ironia, como a maioria os que viviam como eles e podia imaginar mesmo no escuro sua face confusa. Deu um suspiro e isso o fez gemer mais.
– Eles pegaram pesado com você de novo. Só não foi morto ainda por que ele te considera o melhor de nós.
Não havia inveja ou admiração. Apenas o ar monótono de sempre. Sorriu. No fim, todos eles perdiam a capacidade de discernimento, de expressar as emoções. Ele ainda tinha parte disso, não queria perder. Mas sabia que o outro não entenderia se explicasse. Nem que o que sentiam por ele não era consideração, ele o queria por perto para tortura-lo de todas as formas, para quebra-lo em pedaços. Remover qualquer traço seu, e construir o que ele queria.
–Você aprendeu a falar rápido, até um mês era um completo selvagem. Mas agora tem que aprender a ficar quieto, ou isso sempre vai se repetir.
Sorriu de modo fraco com o comentário. Fechou os olhos. Se sentia reconfortado com o calor ao seu lado.
– Não deveria vir aqui.
–Não vão descobrir. Eu sou o melhor para me infiltrar. – Novamente, nenhum exaltação, só constatação.
– Ainda assim, não devia vir.
Ficaram em silêncio. Estava quase apagando. Quando finalmente o outro se levantou lhe estendeu o casaco: -Não deixe aqui, vão descobrir.
O outro pegou sem falar nada. O ajudou a deitar no chão duro. Sentiu uma mão em sua testa e em seu cabelo, um gesto simples, mas que o fazia se sentir mais humano, que era tudo o que não era ali. Preso naquela cela, não passava de um animal.
E então ele saiu sem nenhuma palavra. Viu por um momento os cabelos vermelhos na luz, e depois nada. Sem obrigado, sem palavras e explicações. Eles não precisavam disso.
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Dessa vez não acordou gritando. Abriu os olhos devagar. Sentia frio e dor, mas não estava em um chão frio, mas entre lençóis macios. O sonho estava distorcido em sua mente, só lembrava de alguém lhe cuidando. Talvez por isso não tenha gritado dessa vez, ou mesmo não sentia que conseguiria. Cabelos brancos entraram na sua visão embaçada e uma mão pousou na sua testa.
– Ainda não baixou.
–Acalme-se Kakashi, vai ceder. Pode ir, eu fico com ele.
Shizune
Sua mente estava confusa, como se faltasse um pedaço. Algumas cenas pulavam em sua cabeça, mas não sabia se era real. O assustava. Não gostava disso. Se sentia no escuro, não gostava do escuro.
Foi onde sempre estivemos.
Gemeu. Aquela voz de novo? Fechou os olhos devagar e sentiu vontade de deixar vazarem.
Não seja fraco!
Voltou ao escuro, onde sempre voltava.
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O moreno de rabo de cabalo olhava pela janela da biblioteca com o copo de conhaque nas mãos enquanto Itachi desligava o telefone e dava um suspiro. Sua cabeça latejava. Nunca havia sentido tanto medo quanto na noite anterior, quando pensou que perderia Sasuke. Quando ligou para Kisame e o homem não atendeu, sua intuição gritou. Mesmo agora, com Sasuke dormindo no quarto exausto, ainda sentia o arrepio sútil no corpo daquele medo incomum.
Itachi Uchiha podia ser um policial de certo modo até cruel. Não teria nenhum problema em fazer justiça com as próprias mãos, e já havia torturado e matado pessoas para essa justiça. Podia ser um "Puto frio", e considerar muitas vezes que os fins justificam os meios.
Mas ele amava seu irmão.
E seu pai havia o colocado em risco. Não sabia bem como, mas descobriria.
A chuva caia forte lá fora, e mesmo já sendo mais de dez, o céu estava escuro. Kakashi entrou sem bater na porta. Mostrava marcas da noite em claro no rosto.
–Como ele está? – Shikamaru perguntou ao mesmo tempo que Itachi. Viram Kakashi desabar no sofá com um suspiro.
–A febre não cedeu ainda, mas dormiu.
Naruto havia salvado a vida de Sasuke. O garoto Uchiha havia contado tudo o que acontecera, desde a chegada o ruivo, ao recado estranho para Fugaku, a interferência de Kisame (que estava hospitalizado com ajuda de Shikamaru com um nome falso) e a chegada providencial de Naruto. Sasuke estava meio embriagado, não lembrava dos detalhes, mas disse que Naruto conhecia o ruivo, e que pareciam até amigos.
– O que diabos foi aquilo? – Shikamaru perguntou finalmente.
–Então viu mesmo tudo?
– Estava de vigília Kakashi.
–E não interferiu?
– Seria problemático. Não sou de ação, sou mais de estratégia.
Ninguém retorquiu. Era verdade. E ele havia ajudado demais já. Chamou amigos para levar Kisame sem levantar suspeitas, e os garotos bêbados, que não lembravam do que aconteceu já estavam em suas casas.
–Não vou contar nada disso na divisão. – falou com um suspiro. – Os da sétima querem a guarda do garoto, só estão esperando uma oportunidade para vocês escorregarem. Pediram legalmente, mas Tsunade interviu. Vocês não vão querer o menino nas mão de Orochimaru. Eu tenho impressão que as intenções dele não são muito boas.
–Eu tenho certeza disso. – Kakashi apertou os punhos. – Obrigado Nara. E seu pai Itachi?
– Ele não falou, mas sabia o que o tal aviso significava e desligou na minha cara.
– Como diabos o seu pai se meteu com essa gente? Se o ruivo conhecia Naruto, é de se suspeitar que a Akatsuki está no meio.
–Não tem como ter certeza Kakashi. – Mas ele tinha. Não sabia como, mas isso fazia todo o sentido de um jeito meio obscuro.
–Ele é professor universitário não é. – Shikamaru perguntou olhando para a chuva. – Como os outros que morreram nos últimos dois anos. Deixe adivinhar: ele é médico.
–Como se não soubesse já. – Itachi suspirou. Como sempre, ele e o Nara pensavam na mesma linha de raciocínio.
–Você tem que fazer seu pai falar Itachi. Ele recebeu um aviso, o próximo pode ser a morte. E nem você nem Sasuke ou sua mãe estão seguros.
O Uchiha não respondeu. Tinha certeza que Fugaku não falaria, justamente por isso. O aviso foi claro, seu pai podia ser um filho da puta frio, mas ainda cuidava da família, de um jeito meio torto. Ele não abriria a boca se soubesse que um deles estaria na mira de alguém caso fizesse isso.
– Ele não vai falar. – Shikamaru sentenciou entendendo a situação. – Vou trazer amanhã a lista dos professores assassinados e tudo o que poder relacioná-los. Vou levar a descrição do tal ruivo comigo também e ver o que a divisão descobriu sobre o garoto loiro no hospital que possa identifica-lo. – Tomou o resto do conhaque. – É problemático.
O moreno saiu da sala sem olhar para os outros dois. Não precisava. Ele estava junto com eles agora.
Itachi e Kakashi continuaram parados, exaustos: - O que acha Hatake?
– Que essa história é a porra de um nó juntando tudo. Não bastasse Naruto, agora você e seu irmão... Daqui a pouco descubro até minha vó metida nessa história.
– Não acredita em destino? – O outro zombou e os dois riram, confortados por fazerem piada até em uma hora daquelas.
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Era um corredor escuro. Apenas a luz da lua impedia a total escuridão alternada pelas janelas de vidro. Os passos eram silenciosos. Ouvia cada som. Naquele andar, haviam duas pessoas. Uma delas era o alvo.
Já estivera duas vezes do lado de fora, mas nas duas não obedecera as ordens. Da última vez passou quatro semanas na sala de punição, foi seu limite, a quase morte.
Mas agora não hesitaria, por seus próprios motivos.
Fora ele que o jogara no inferno. Sem ele nunca seria o que era naquele momento, no que fora transformado. Aquele homem roubara tudo o que poderia ter sido, e mesmo que se sentisse compelido em desobedecer cada ordem recebendo todas as punições, faria aquela por si. Por toda a sua humilhação.
Suas mãos tremeram. Pela primeira vez sentiria prazer de fato em matar, jogando para fora todo o animal que era.
O homem não o viu entrar. Continuou sentado entre seus livros e tomando seu café sobre a poltrona confortável da biblioteca da universidade. Gaara lhe falara sobre universidade e livros, lhe ensinara a saber aqueles símbolos. Gaara lhe ensinara a falar, lhe diminuindo da condição de animal. Ele sempre sabia de muitas coisas sobre como era do lado de fora. Podia até sentir sua presença no prédio próximo, lhe vigiando. Sabendo que aquela era sua última chance. Mais um desobediência e seria morto, mesmo sendo quem era.
Se aproximou devagar e removeu a katana. Ele continuava de costas, se levantando com um longo suspiro cansado. Poderia mata-lo pelas costas, mas nesse caso, faria questão de olhá-lo. Total questão.
Em um átimo estava nas costas do homem com a lâmina transpassada ameaçando a garganta. O copo que o outro segurava caiu no chão se quebrando. Encostou a boca no ouvido.
–Minato Namikaze. Olhe para a morte. – sussurrou passando a lâmina devagar no pescoço, sem aprofundar de fato, apenas causando um leve sangramento.
O homem se virou, para sua surpresa, sereno. Parecia aceitar o que estava acontecendo. Encontrou aqueles olhos muito azuis, tão parecidos com os seus que se assustou. Os do homem se arregalaram, e para sua surpresa, ele sorriu.
– Eu pensei que... – o homem tentou se aproximar e ameaçou com a katana. De repente ficou confuso, por não ser a reação que o esperava, não era como a reação dos outros, o homem parecia feliz em vê-lo. E havia algo mais... naquele cheiro, naquela expressão.
–Ele disse que havia te matado. – o homem começou a chorar. Conhecia monstros suficientes, passara a vida toda entre eles. E aqueles olhos azuis não eram de um monstro. Aquele homem não havia feito o que lhe disseram, teve certeza.
Abaixou a katana devagar, e antes que falasse qualquer coisa, recebeu algo inesperada: um abraço.
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Abriu os olhos confuso ainda sentindo o calor do abraço, mas com dificuldade de montar o pensamento, organizar os fatos. Queria papel e lápis para desenhar, sabia que fora importante.
Novamente a mão na testa. Tentou focar e ver o Lobo Branco, ou Shizune. Mas não eram nenhum dos dois, nem mesmo o Corvo. Sentado ali ao seu lado na cama, com a mão na sua testa e o fitando estava Sasuke.
–Acordou Dobe. Pensei que ia dormir pra sempre.
Naruto se sentou rapidamente, o que lhe gerou forte tontura e foi amparado pelo outro. Confuso, estava confuso... A última lembrança que tinha de Sasuke...O que ele estava fazendo ali?
–Você parece que viu um fantasma. – O moreno murmurou de modo fraco e balançou a cabeça. – Então é como Itachi falou, não lembra de nada...
–O.o que aconteceu? – o loiro perguntou receoso se afastando dos braços do outro e sentando na cama desconfiado.
–Não me olhe assim Dobe, não vou aprontar pro seu lado. – Sasuke suspirou e bagunçou o cabelo escuro. Parecia cansado. Se levantou e foi até a janela sem olhar para Naruto, que continuava o seguindo com o olhar desconfiado e pronto para qualquer coisa.
Lá fora a chuva havia parado, mas a paisagem ainda era... triste.
– Escute... Só vou falar uma vez isso, não tem reprise.
–O que é reprise?
–Só escute tudo bem? – falou impaciente.
–Não sou surdo. – Naruto cruzou os braços.
–Você não está ajudando Naruto. – O moreno se virou vermelho.
E Naruto se calou, por que ele o chamou de Naruto e não de Dobe (que nem sabia o que era, mas desconfiava que não era coisa boa), e por que ele estava vermelho. Queria saber o motivo da vergonha do outro lá. Ficou curioso.
Sasuke suspirou e pigarreou algumas vezes.
–E.eu queria me desculpar. Fui um idiota, só estava descontado em você. Do começo, não foi sua culpa com Karin, ela era uma vadia, e sempre fazia isso.
–O que é uma vadia?
–Naruto!
Se calou e bufou.
–Continuando, não foi sua culpa o que veio depois, só estava agindo como um idiota, minha vida estava fodida e queria descontar em alguém toda a raiva que eu estava sentindo. Fodida, antes que me interrompa, quer dizer que estava pior que ruim.
–E por que sua vida estava furdida?
–Fodida. – corrigiu. Abaixou o olhar e voltou ao colchão sentado e encarando o loiro de olhar curioso e ingênuo e desandou a falar– Meu pai nunca me deu atenção Naruto. Meu irmão sempre foi um prodígio, eu sempre fui comum demais pra ele. Queria chamar atenção, nos últimos anos só causei problemas, e acabei até sendo preso por vandalismo e expulso da escola que minha família inteira estudou por gerações. Tivemos uma briga feia, tomei um porre em um dos eventos sociais dele e fizemos um escândalo, falamos coisas horríveis um pro outro. Ele ficou muito decepcionado, disse que não era seu filho. Para uma família como a minha, escândalo é pior do que morte. Não nos falamos mais. Meu pai e eu nos odiamos.
O loiro ficou pensativo:- Tenho certeza que ele não te odeia.
–Como sabe? – perguntou em deboche.
–Não entendi quase nada da sua história. – Naruto falou sério. – Não sei o que é "porre", nem "vandalismo". Só sei que você e seu pai estavam com raiva no momento, a gente faz muita besteira quando está com raiva. Não tem como ele odiar você. O Corvo me falou sobre pais, odiar não está no trabalho deles.
Sasuke o olhou por um segundo atônico e depois gargalhou, como nunca na vida. Ele quase nunca ria, na verdade, mas a maneira tão simples que o outro expôs os fatos... Sem complicações ou desvios. Naruto era mesmo ingênuo.
– Não gosto quando riem de mim. – O loiro fez um olhar triste.
– Não estou debochando de você Dobe. – falou puxando o ar.
Naruto o olhou e sorriu de leve, ainda incerto. Depois olhou pela janela entristecido.
–O que foi agora, já me desculpei. – o moreno resmungou mal-humorado.
–Eu não tenho pais, se os tivesse não perderia tempo odiando nenhum deles. Você não sabe a sorte que tem Sasuke.
Sasuke não respondeu. Continuaram sentados por algum tempo em silêncio. Naruto olhando pela janela, e Sasuke para o chão de madeira. Até que Sasuke levantou e esticou os braços doloridos. Ainda sentia o corpo depois da noite anterior.
– Até que você não é burro Dobe. – replicou.
O loiro não o olhou, mas sorriu de modo disfarçado. Quando Sasuke chegou a porta do quarto e abriu parou alguns segundos antes de sair: - E, apesar de não lembrar, obrigado por salvar minha vida. Mas não se acostume. Eu não peço desculpas e obrigado com frequência.
Fechou a porta depressa. Naruto ficou olhando na direção surpreso.
Esse imbecil pode ter salvação. Pensando seriamente em não mata-lo.
Naruto nem se incomodou com a voz dessa vez, apenas balançou a cabeça, ainda espantado, em concordância.
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Itachi empurrou Kakashi com tanta força que eles quase rolaram pelo corredor.
–Ele está saindo, anda!
Tiraram o ouvido da porta de Naruto depressa e entraram em uma das portas com rapidez antes que o jovem Uchiha os pegasse espionando. Kakashi estava se sentindo um idiota, mas o curiosidade vencera os princípios.
Fecharam a outra a porta e ficaram ouvindo os passos de Sasuke, quase correndo para o quarto. Itachi mordia a bochecha internamente para não rir e o outro olhava assombrado.
– O que você falou pra ele?
–Nada. – o moreno deu de ombros. – Dessa vez não tenho nada com isso.
Kakashi assobiou: - Foi algo que nunca imaginei ouvir do seu irmão.
Itachi concordou com a cabeça. Estavam sentados no chão de encontro a porta, sussurrando.
–Itachi?
–Hum?
–Estamos parecendo dois imbecis, vamos levantar daqui. Me sinto uma velha fofoqueira.
–Eu também. Não ouvimos nada tudo bem?
– Por mim...Minha boca é um túmulo minha velha.
Olharam um para o outro e seguraram o riso.
–Ok, ok. Vá ver Naruto, eu vou ver Sasuke. Se bem o conheço ele deve estar quase tendo um ataque depois da demonstração de sentimentos.
Os dois se levantaram, colocando a melhor cara de "não sei de nada" e foram ambos a seus destinos.
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Encontrou o loiro sentado na cama olhando para a janela pensativo. Quando deu por sua presença o sorriso que ele deu foi tão aliviado que Kakashi riu ao caminhar até ele e sentar no colchão. Acariciou o cabelo bagunçado e o outro ficou vermelho.
–Está se sentindo melhor?
–Confuso. – Naruto mexeu com os dedos. – Eu fiz algo que não devia ontem? – perguntou de forma preocupada.
Kakashi riu alto: - Engraçado você não lembrar.
Naruto cruzou os braços no peito e virou a cabeça para o lado com irritação: - Não gosto quando riem de mim.
–Mal-humorado assim parece o Naruto negro. – replicou removendo a mão da cabeça do garoto e o olhando de um jeito paternal, como se observasse uma criança bonitinha fazendo birra.
–Pareço com quem? – O outro o olhou mais confuso ainda.
–Hum... Nada. Você não acordou assustado hoje. Não sonhou?
Os olhos de Naruto ficaram mais pensativos e ele voltou a olhar pela janela antes de falar: -Sim, não foi ruim. Mas não lembro direito... Lobo Branco. – O menino franziu a testa. – Você vai gostar de mim se eu for uma pessoa...ruim?
Kakashi franziu a testa de forma irritada: - Quem disse que você é ruim Naruto?
– Hum... Eu não sei... Eu só vejo uma imagens as vezes. – Ele ficou triste e deu um suspiro. – Eu posso ter machucado pessoas. Isso ruim.
Ficaram em silêncio por um longo tempo. Kakashi olhou o rosto entristecido e lembrou do outro Naruto. Violento, irônico, capaz de tudo... Mas ainda assim ele não conseguia olhar para aquela figura na sua frente e imaginá-lo fazer algo por sadismo.
– Não tem como alguém como você ser ruim Naruto. – O menino o olhou surpreso. – De alguma forma, tenho certeza disso.
Colocou a mão de novo naquela cabeça confusa e sorriu. Ao sair do quarto, ainda tinha aqueles olhos azuis sobre ele.
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Kakashi perdeu um sorriso triste do garoto. Naruto não tinha tanta certeza do que ele falara, mas ainda assim sentiu um alívio no peito. Se ergueu testando o corpo. Nada do torpor de mais cedo, tudo normal. Foi para a janela e respirou fundo. Foi quando ouviu o choro baixo. Correu os olhos e viu por cima do muro vizinho Hanabi sentada na escada da varanda com o cachorro no colo chorando. Naruto subiu no parapeito depressa e pulou por cima do muro sem tocá-lo para não sair aquele som horrível por toda a casa. Pousou com suavidade na grama e quando se colocou na frente da menina ela deu um gritinho assustado.
–Oi Hanabi! – sorriu sentando ao lado dela sem se importar com a cara de espanto da outra.
–Co.como entrou aqui?
Apontou para o muro como se fosse a coisa mais normal o mundo. Ela arregalou os olhos para o muro alto.
–Você solta teias também? É o homem-aranha?
Naruto a olhou confuso e ela bufou limpando o rosto e fungando: - Definitivamente Naruto, tenho que te arranjar uns quadrinhos.
– Por que seus olhos estavam vazando? – ele a olhou de forma curiosa. O rosto da menina esquentou de forma forte e ela ficou olhando para o cachorro que dormia com seus carinhos na perna.
–Não estava chorando seu bobo. – replicou.
–Pra mim parecia... – olhou desconfiado. – Seu nariz ficou vermelho e escorrendo.
Ela limpou depressa e ficou resmungando baixo. Então ficou com o rosto triste e encarou os olhos azuis fixos nela.
– Meu pai morreu faz uns meses Naruto. Eu moro com minha irmã, mas ela faz faculdade e não tem tempo pra mim...sinto falta do papai. Ela não é como ele. – ela fungou e desviou os olhos para um ponto qualquer no jardim. Naruto olhou para frente em uma postura semelhante e deu um suspiro.
–Eu não conheci meus pais, pelo menos não sei se conheci. Mas tenho o Lobo Branco, corvo, Shizune, e até Sasuke, que é um chato. Eles preenchem muita coisa. Eu ia gostar de ter uma irmã também. Deve ser legal. – deu de ombros.
–Você não lembra dos seus pais? – Hanabi perguntou menos chorosa.
–Não lembro de muita coisa. – Naruto ficou vermelho. – Eu perdi minha memória, Shizune falou.
–Por isso pergunta tanto?
Ele a olhou de modo triste: -É chato eu perguntar tanto?
Ela deu de ombros e sorriu: -Não acho. Como vai saber se não perguntar?
Naruto sorriu e cutucou ela com o ombro que riu em resposta.
–Tenho certeza que sua irmã gosta muito de você. Não tem como não gostar.
Hanabi corou ainda mais forte e o empurrou com o cotovelo: - Bobão.
Foi quando o som começou. Naruto olhou para cima, para o segundo andar e sorriu. A menina seguiu seu olhar.
–Gosta? Hinata toca violão. Ela é boa né?
– É bonito demais. – Naruto sorriu mais largo ao saber o nome do objeto. – Me faz lembrar coisas boas...
Fechou os olhos e suspirou.
–Que tipo de coisa?
Contou sobre a lembrança da ruiva e do loiro, da música e da cama com o sol batendo e o cheiro de café.
Hanabi balançou a cabeça pensativa: - Tem cara de coisa de pais.
Abriu os olhos depressa: - Como assim?
–Esse negócio todo sabe, podem ser seus pais, você disse que não lembra. Parecem pais pra mim. – ela falou com simplicidade. Naruto piscou os olhos. Na troca os dois não haviam reparado que a música havia parado até a porta da varanda abrir. Naruto foi atingido por um cheiro doce que o envolveu. Algum recanto seu reconheceu o cheiro e se levantou, se virando depressa.
–Hanabi, eu vo...
A garota parou de falar ao percebê-lo. Seus olhos se abriram surpresos, como se estivesse vendo um fantasma.
Ela era baixa, tinha a pele muito clara e cabelos negros longos que contornavam um rosto delicado como da irmã e dois olhos muito claros e agora bem abertos de espanto. Usava uma saia longa clara e uma camiseta branca que deixaram Naruto com a pele do rosto queimando. Ficou olhando como um idiota sem saber o que falar. Ela vinha até ele, primeiro devagar. Depois correndo.
E para grande espanto dele e de Hanabi se jogou em cima dele o derrubando e caindo junto no gramado com força. Naruto ficou estático de surpresa. E ainda estava assim quando ela levantou a cabeça que escondera na curva do seu pescoço.
Os olhos dela estavam vazando e ela soluçou: -Pensei que tivesse perdido você.
E o beijou.
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